Acórdão nº 0761/04 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2005

Magistrado ResponsávelANTÓNIO MADUREIRA
Data da Resolução01 de Março de 2005
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1. RELATÓRIO A..., Ld.ª, com os devidos demais sinais nos autos, interpôs recurso da sentença do Tribunal Administrativo de Círculo (TAC) de Lisboa de 31/1/2003, que negou provimento ao recurso por ela interposto do despacho do Vereador ..., da Câmara Municipal de Sintra, de 31/3/2001, que lhe indeferiu um pedido de licenciamento de alteração de obras num prédio seu.

Apresentou alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões: 1.ª) - A pretensão formulada pela ora recorrente, em 1997.10.20 foi tacitamente deferida pelo PNSC, em 1999.03.23 e pela CMS, em 1999.05.25, pois aquelas entidades não se pronunciaram definitivamente, nos prazos legalmente estabelecidos para o efeito (v. arts. 29°, 35°/5 e 7, 41°/2 e 3/c e 61°/1 e 2 do DL 445/91, de 20 de Novembro) - cfr. texto n°s 1 a 3; 2.ª) - O parecer da Comissão Directiva do PNSC, de 1999.04.12, nunca poderia impedir ou afectar a validade do deferimento tácito do pedido de licenciamento da recorrente, pois é claramente intempestivo, não vinculando minimamente a CMS (v. arts. 35° e 61° do DL 445/91, de 20 de Novembro, de 1999; cfr. Ac. STA (Pleno), de 1991.06.23, 8MJ408/309) - cfr. texto n.ºs 4 e 5; 3.ª) - Dos termos do acto sub judice não resulta, de qualquer forma, o reconhecimento da existência e efeitos dos referidos deferimentos tácitos, pelo que, inexistindo voluntariedade na produção dos efeitos revogatórios, falta desde logo um dos elementos essenciais do acto recorrido, que, contrariamente ao decidido na sentença recorrida, é nulo (v. art. 133°/1 do CPA) - cfr. texto n°s 6 a 10; 4.ª) - O despacho sub judice revogou os referidos actos tácitos constitutivos de direitos, violando frontalmente o art. 95.º do DL 169/99, de 18 de Setembro (LAL) e os arts. 140°/1/b) e 141° do CPA, pois não foi invocada nem se verifica qualquer ilegalidade daqueles actos - cfr. texto n°s 11 e 12; 5.ª) - O despacho em análise violou frontalmente o disposto nos arts. 3° e 29° do DL 445/91, de 20 de Novembro, pois indeferiu a pretensão da ora recorrente sem se basear em qualquer dos fundamentos taxativamente indicados na lei - cfr. texto n°s 13 e 14; 6.ª) - O despacho em causa não se refere, nem sequer indica qualquer norma legal ou regulamentar aplicável in casu, pelo que foram violados os arts. 2°, 9°, 119° e 266°da CRP e o art.º 3° do CPA - cfr. texto n° 14; 7.ª) - As normas invocadas nos pareceres e informações desfavoráveis constantes do processo camarário no âmbito do qual foi praticado o acto sub judice - nomeadamente o PDM de Sintra - são inaplicáveis in casu pois está apenas em causa o licenciamento de alterações realizadas durante a execução de uma obra licenciada antes da entrada em vigor daquele instrumento de gestão territorial ao abrigo do art. 29°/1 do DL 445/91, de 20 de Novembro, e, em qualquer dos casos, a sua aplicação viola os princípios da segurança, confiança e publicação dos actos normativos (v. arts. 2°, 9°, 119° e 266° da CRP; cfr. art. 3° do CPA) - cfr. texto n° 14; 8.ª) - Os referidos normativos sempre violariam frontalmente o conteúdo essencial do direito de propriedade da ora recorrente, pois imporiam limitações ao seu exercício, sem fixar qualquer indemnização (v. art. 62° da CRP), pelo que sempre deverá ser recusada a sua aplicação in casu (v. art. 204° da CRP e art. 4°/3 do ETAF - cfr. texto n° 15; 9.ª) - O parecer do PNSC, além de claramente intempestivo, não se fundamentou em quaisquer condicionantes legais e aplicáveis in casu pelo que nunca poderia determinar o indeferimento da pretensão da ora recorrente, enfermando a sentença recorrida de manifestos erros de julgamento (v. art. 266º da CRP e art. 3º do CPA - cfr texto n.ºs 15 e 16; 10.ª) - O despacho recorrido não foi antecedido de audição da recorrente, pelo que foram violados os artigos 8º e 101º/1 e sgs. do CPA, bem como o princípio da participação dos particulares na actividade adaministrativa constitucionalmente consagrado (v. art. 267º/1 da CRP), sendo assim claramente nulo ou, pelo menos, anulável (v. art. 133º/1 do CPA) - cfr texto n.ºs 17 a 19; 11.ª) - A aliás douta sentença recorrida ao decidir que in casu não era exigível a audição prévia à recorrente, maxime face aos fundamentos inovatoriamente invocados no parecer que antecedeu o acto em análise, enferma de manifestos erros de julgamento, pois não se verificam, nem foram invocados pela entidade recorrida, quaisquer dos pressupostos previstos no artigo 103º do CPA, que permitiriam a dispensa dessa audição - cfr. texto n.ºs 19 e 20; 12.ª) - O acto sub judice, ao indeferir a pretensão da ora recorrente, negou e restringiu direitos e decidiu em contrário da pretensão formulada pela interessada, tendo revogado anteriores actos constitutivos de direitos, pelo que tinha necessariamente de ser fundamentado de facto e de direito, ex vi do disposto nos arts. 268º/3 da CRP e 124º e 125º do CPA - cfr. texto n.ºs 21 e 22; 13.ª) - O despacho recorrido não contém quaisquer razões de facto e de direito do indeferimento da pretensão da recorrente e da revogação de anteriores actos constitutivos de direitos, limitando-se à emissão de meros juízos conclusivos, não indicando nem concretizando a aplicação de quaisquer normas eficazes e aplicáveis in casu, nem remetendo de forma expressa e inequívoca para determinada informação ou parecer que contenha a respectiva fundamentação - cfr. texto n°s 23 a 25; 14.ª) - Contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida o despacho sub judice enferma de manifesta falta de fundamentação, ou, pelo menos, esta é insuficiente, obscura e incongruente, tendo violado o disposto nos arts. 268°/3 da CRP, 124° e 125° do CPA - cfr. texto n°s 25 a 27; 15.ª) - 0 acto recorrido ofendeu abertamente o conteúdo essencial do direito fundamental de propriedade privada da ora recorrente, consagrado nos arts. 61° e 62° da CRP, pois revogou o deferimento tácito e indeferiu a sua pretensão sem se basear ou invocar normativos válidos e eficazes, criando assim restrições ao referido direito mediante simples actos administrativos, pelo que a sua nulidade é inquestionável (v. art. 133°/2/d) do CPA) - cfr. texto n°s 28 e 29; 16.ª) - O acto sub judice, ao indeferir a pretensão da ora recorrente, violou os princípios da igualdade, justiça, boa-fé, confiança e respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos da ora recorrente, pois, perante o deferimento tácito da sua pretensão, as anteriores deliberações e informações favoráveis da CMS, impunha-se o deferimento da pretensão em análise - cfr. texto n°s 30 e 31; 17.ª) - A aliás douta sentença recorrida enferma assim de manifestos erros de julgamento, tendo violado, além do mais, o disposto nos arts. 2°, 9°, 61° e 62°, 119°, 204°, 266°, 267°, 268° da CRP, 3°, 8°, 100° e segs. 103°, 124°, 125°, 133°, 140°, 141° do CPA, 3°, 29°, 35°, 41°, 61° do DL 445/91, de 20 de Novembro e o art. 95° do DL 169/99, de 18 de Setembro.

  1. 2.

    A autoridade recorrida contra-alegou, tendo defendido, em síntese: -que não houve qualquer deferimento tácito, dado se tratar de legalização de obras e não de licenciamento prévio; - que, a ter havido deferimento tácito, o mesmo seria nulo, em face do parecer desfavorável da Comissão Directiva do Parque Natural Sintra-Cascais (artigo 13.º do Dec.Lei n.º 151/95, de 24/6); - que sempre seria nulo por violar o PDM de Sintra, que, contrariamente ao defendido pela recorrente era aplicável; - a assim não ser, não teria havido revogação do licenciamento, mas sim a sua caducidade; - tratando-se de legalização de obras, nunca haveria deferimento tácito, pois que o poder de legalizar é discricionário; - o acto está devidamente fundamentado e não viola o direito de propriedade da recorrente.

    Terminou, defendendo o indeferimento do recurso e a confirmação da decisão recorrida.

  2. 3.

    O Exm.º Magistrado do Ministério Público emitiu o douto parecer de fls 172 a 175 dos autos, que se passa a transcrever: "Da matéria de facto dada como provada na sentença recorrida - não impugnada no presente recurso jurisdicional - resulta que o acto contenciosamente recorrido indeferiu o "requerimento (da ora recorrente) de licenciamento respeitante às alterações efectuadas no decorrer da obra" em questão - cfr fls 99 in fine, peças do processo instrutor, nela referidas, de fls 101-102v; 607; 549-550; 533; Art° 11° da petição do recurso e fls 136 das alegações do presente recurso jurisdicional.

    Trata-se pois de pedido de licenciamento a posteriori de obras executadas em desconformidade com o projecto aprovado, consubstanciando, por isso, um pedido de legalização de obras executadas sem a licença prévia legalmente exigida, nos termos do art° 29°, n° 2 do Decreto-Lei n° 445/91, de 20 de Novembro.

    Ora, na senda do entendimento que este STA tem vindo a perfilhar, nesta matéria, o silêncio da Administração não vale aqui como autorização ou deferimento tácitos, sendo-lhe inaplicável o regime do deferimento tácito dos pedidos de licenciamento de obras particulares previsto nos Art°s 35°, n°s 5 e 7 e 61°, nº 1, ambos daquele diploma e no Artº 108 do CPA.

    Neste sentido, por todos, o recente Acórdão do STA, de 12/10/04, rec. 0908/03 e a jurisprudência nele expressamente invocada, a que inteiramente aderimos.

    Improcederão, assim, todos os vícios assacados ao acto impugnado, com fundamento em ilegal postergação dos alegados autorização e deferimento tácitos do pedido de licenciamento da recorrente e, em consequência, embora com fundamento diverso do indicado na sentença recorrida, o alegado erro de julgamento quanto à sua improcedência.

    A considerar-se, diferentemente, ter ocorrido autorização e deferimento tácitos do pedido de licenciamento em questão, improcederia, não obstante, o mesmo alegado erro de julgamento, por improcedência daqueles invocados vícios do acto recorrido, conquanto também por razões distintas das enunciadas na sentença recorrida.

    Com efeito, nos termos...

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