Acórdão nº 0223/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 25 de Fevereiro de 2003

Magistrado ResponsávelALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em Subsecção, na 1.ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

1.1. A..., interpôs recurso contencioso de anulação das deliberações da Câmara Municipal de Cascais, de 22 de Janeiro de 1997, que declararam a nulidade de acto tácito de deferimento e indeferiram o pedido de alteração do Alvará de Loteamento n.º 941, de que é titular.

1.2. A sentença de fls. 138-146, de 24 de Outubro de 2001, julgou o recurso improcedente.

1.3. Inconformada, a recorrente deduziu o presente recurso jurisdicional, concluindo nas suas alegações: "I - Nulidade da sentença por falta de fundamento de direito.

A douta sentença (...) está ferida nulidade contemplada na alínea b) do n.º 1 do artigo 668.º do Código do Processo Civil, falta de fundamentação de direito que justifique a decisão.

Vejamos, então, em que moldes esta afirmação se apresenta correcta na situação em apreço: 1 - As deliberações camarárias impugnadas padecem do vício de violação de lei.

2 - Ambas as deliberações camarárias impugnadas se fundam numa pretensa violação ao disposto no Plano de Urbanização da Costa do Sol, ou seja, é este o fundamento utilizado pela Câmara Municipal de Cascais quer ao deliberar a nulidade do deferimento tácito reconhecido pela sentença, transitada em julgado, proferida no processo n.º 645/96 da 1.ª Secção do Tribunal Administrativo do círculo de Lisboa, quer na deliberação de indeferimento do pedido de alteração do Alvará de Loteamento constante do requerimento n.º 5589/95, de 14 de Junho.

3 - Apresenta-se, claro, que, para que tais violações fossem concebíveis, seria necessário que o Plano de Urbanização da Costa do Sol estivesse em vigor.

Mas não está.

- Com efeito, este Plano nunca foi publicado.

5 - A publicação feita abrangeu apenas o Decreto-Lei n.° 37251 de 28 de Dezembro de 1948, que aprovou o Plano.

6 - O Plano propriamente dito não consta das folhas do Diário do Governo.

- A recorrente nunca o viu, não tendo sido trazido à sua esfera jurídica para aí produzir efeitos através de publicação ou de qualquer outra forma de publicidade.

7 - O Plano de Urbanização tem natureza normativa ( cfr. Osvaldo Gomes, Plano Director Municipal, Coimbra, 1985, página 24).

- Como tal, nunca ganhou eficácia, porquanto um principio geral de direito, que já vigorara em 1948 ( e que, nos nossos dias, se encontra acolhido no artigo 5.° n.° 1, do Código Civil e nos artigo 122 n.° 2, da Constituição), determina que os actos normativos só sejam eficazes, e portanto aplicáveis aos destinatários, quando tornados públicos.

8 - Passados mais de dez anos desde a publicação do Decreto-Lei n.° 37251 de 28 de Dezembro de 1948, o Ministro das Obras Públicas , por despacho de 17 de Fevereiro de 1959, aprovou o Regulamento do PUCS, que veio substituir o Regulamento inicial, e mais tarde, por despacho ministerial de 14 de Dezembro de 1962, foram aprovadas alterações aos condicionamentos da Zona HE do PUCS, constantes do mapa anexo ao Regulamento aprovado em 1959, (protesta-se juntar às presentes alegações fotocópia autenticada do regulamento do PUCS, dentro do prazo de dez dias.

9 - Sucede que, não há conhecimento da publicação em qualquer jornal oficial do Regulamento do PUCS, nem sequer do despacho ministerial de 14 de Dezembro de 1962.

10 - Se confrontarmos o teor do capitulo V, atrás transcrito nas alegações, com a fundamentação de direito das deliberações camarárias impugnadas, somos forçados a concluir que as mesmas tiveram subjacente o Regulamento do PUCS aprovado por despacho ministerial de 17 de Fevereiro de 1959 e não o Regulamento inicial do PUCS.

11 - Pois, se o Regulamento inicial do PUCS se poderá considerar coberto pelo Decreto - Lei n.° 37 251, o mesmo já não se passa com o referido Regulamento do PUCS aprovado por despacho ministerial de 17 de Fevereiro de 1959.

12 - Isto porque, a considerar-se que o Regulamento inicial do PUCS foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 37251, e não prevendo este diploma qualquer esquema ou regime para alteração a tal Regulamento, só por diploma de igual força é que o Regulamento poderia ser alterado, e não por simples despachos ministeriais, mas, mesmo que assim não se entendesse, então ter-se-ia que aplicar a norma de carácter geral contida no artigo 30° do Decreto - Lei n.° 33.921, de 5 de Setembro de 1944 - diploma ainda em vigor aquando foi proferido o mencionado despacho ministerial, e consequentemente as alterações ao Regulamento inicial do PUCS teriam que ser aprovadas por portaria do ministro competente.

13 - Em qualquer das situações, o certo é que se impunha a publicação no jornal oficial do diploma que alterasse o Regulamento inicial do PUCS, ou por se tratar de decreto-lei, ou por se tratar de portaria, isto de acordo com o estipulado no parágrafo 1° do artigo 2° alíneas b), g) e h) do Decreto n.° 40 424, de 7 de Dezembro de 1955.

14 - Verifica-se, assim, que o Regulamento do P.U.C.S., aprovado em 17 de Fevereiro de 1959 não revestiu a forma exigida ( Decreto - Lei ou Portaria), nem foi publicado em jornal oficial, o que faz com que este instrumento urbanístico não se possa considerar válido e eficaz ( cfr., neste sentido, o Acórdão do S.T.A. de 4 de Novembro de 1993, proferido no recurso n.° 31789, e os que nele são citados).

15 - Face ao exposto e tendo-se as deliberações camarárias impugnadas baseado no Regulamento do P.U.C.S. aprovado em 17 de Fevereiro de 1959, com as alterações introduzidas pelo despacho de Dezembro de 1962, tem, forçosamente, de concluir-se que as referidas deliberações incorreram em erro nos pressupostos de direito, o que faz com que se não possam manter na ordem jurídica.

II - Ofensa de Caso Julgado 16 - A sentença do processo n.° 645/96 deve considerar-se um "caso julgado".

"Caso julgado" é a autoridade especial que a sentença adquire quando já não é susceptível de recurso ordinário.

O caso julgado supõe a «incontrovertibilidade da situação jurídica, tal como surge fixada pelo juiz na sentença» A sentença, adquire, assim, uma força vinculante que permite afirmá-la como «uma espécie de lex specialis no caso concreto».

17- O nosso ordenamento jurídico contém um princípio geral de subordinação da Administração aos Tribunais, que se analisa na imposição do dever de respeitar a autoridade do caso julgado formado pelas correspondentes sentenças: Cfr artigos 208.º n.º 3 e 214.º n.º 3 da Constituição.

18 - A doutrina, a jurisprudência e a própria Lei têm-se inclinado para a aplicação da sanção da nulidade aos actos administrativos desconformes com a sentença ou ofensivos do caso julgado, tal como acontece com as deliberações proferidas pela Câmara Municipal de Cascais e que foram impugnadas no processo referente à sentença de que aqui se recorre.

19 - À nulidade dos actos desconformes está subjacente a decisão constitucional de submeter a autoridade administrativa à judicial, no quadro da necessidade de harmonizar os diferentes poderes do Estado.

20 - De tudo se deve, enfim, concluir que o deferimento tácito da alteração ao Alvará n.° 941 reconhecido judicialmente, através da sentença de 11/10/96, proferida no processo n.° 645/96, à agravante, é insusceptível de ser revogado através das deliberações camarárias referidas nos pontos V e VI da matéria de facto dada como provada na sentença aqui impugnada, pois, as mesmas contrariam aquele deferimento tácito e ofendem o caso julgado, têm...

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