Acórdão nº 0862/02 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 27 de Novembro de 2002

Magistrado ResponsávelANGELINA DOMINGUES
Data da Resolução27 de Novembro de 2002
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1.1 - A... (id. a fls 2) interpôs no Tribunal Administrativo de Círculo do Porto recurso contencioso de anulação da deliberação do Conselho Nacional de Reserva Agrícola de 2-02-99, que revogou a deliberação da mesma entidade de 8-5-97, a qual havia concedido provimento ao pedido de desafectação de uma parcela de terreno integrado na R.A.N. para efeitos de instalação de um posto de abastecimento de combustíveis.

1.2 - Por decisão do T. A. C. do Porto, proferida a fls. 372 e sgs, foi julgada procedente a excepção de irrecorribilidade contenciosa do acto impugnado, suscitada pelo Mº. Público, e, com tal fundamento rejeitado o recurso contencioso, "por manifestamente ilegal".

1.3 - Inconformada com esta decisão, interpôs a Recorrente o presente recurso jurisdicional, cujas alegações, de fls 392 e seg, concluiu do seguinte modo: "

  1. Ainda que assistisse razão ao Ministério Público, quando este configura o acto recorrido como um parecer vinculativo emitido no âmbito de um determinado procedimento administrativo, a natureza jurídica de verdadeiros e próprios actos administrativos deste tipo de pareceres tende a pacificar-se na doutrina e na jurisprudência.

  2. Assim sendo, o particular pode impugnar o parecer quando a lesão que ele potencia se efectiva, i. é, quando procedimento é concluso (seja com uma decisão expressa desfavorável, seja através do facto jurídico do silêncio da Administração, uma vez decorrido o prazo legal para esta se pronunciar).

  3. Ora, em Março de 1999, se não se formou um verdadeiro e próprio indeferimento tácito do pedido de licenciamento, pelo menos, e no que à (aos actos da) Câmara Municipal diz respeito, verificou-se o pressuposto processual substitutivo da decisão administrativa em falta, designadamente, a actualidade do interesse processual em agir contra (os actos de) esta entidade administrativa.

  4. Pelo que, mesmo em tal hipótese, com a verificação do acto extintivo do procedimento (ou do facto que constitua um pressuposto processual substitutivo de tal), poderia a Recorrente sindicar contenciosamente o parecer sub juditio.

  5. De todo o modo, nos termos legais, nenhuma das pronúncias das autoridades da RAN lhes são solicitadas pelas autoridades responsáveis pelas "licenças, concessões, aprovações e autorizações administrativas" previstas no n.º 1 do art.º 9.º do DL 196/89.

  6. Diferentemente, eles são pedidos às comissões regionais da RAN pelos próprios particulares, nos termos do n.º 1 do art.º 11.º do citado diploma legal, sendo os particulares requerentes os destinatários dos ditos "pareceres"; G) Neste caso foi a própria Recorrente a requerer a desafectação do terreno em causa à Comissão Regional de Reserva Agrícola de Entre-Douro-e-Minho e pedir a reapreciação do primeiro parecer desta comissão, tendo sido por isso ela (Recorrente) a directa destinatária não só da resposta desta Comissão (nomeadamente, da primeira deliberação - de indeferimento - da CRRAEDM de 14.03.97), mas também e ainda das duas decisões tomadas subsequentemente pela Comissão Nacional da RAN (da reapreciação do Recorrido de 08.05.97 e, finalmente, da deliberação recorrida de 02.02.99) H) Para além de a Recorrente não ser sequer uma mera interessada, mas a formal destinatária de tais decisões, não se verifica qualquer cronologia ou convergência de actos e procedimentos: é que quer o "parecer", quer a sua "reapreciação", não foram solicitados e emitidos, sequer, durante ou no âmbito do (de um) processo de licenciamento de obras particulares, mas muito antes de um tal procedimento se ter iniciado.

  7. Por tudo isto, o acto recorrido (bem como os que o antecederam) não é, não pode ser qualificado sequer como um "acto interno do procedimento, ainda que interinstitucional ou inter-orgânico.

  8. Finalmente, quer a doutrina, quer a jurisprudência, não deixaram de ressalvar estes casos de autonomia estrutural e funcional dos procedimentos - e das relações jurídico-administrativas subjacentes - cujos sujeitos ou pólos são, por um lado, particulares, e por outro lado, organismos da Administração Central, em que os "pareceres" vinculativos, autorizações ou aprovações a emitir pelos mesmos organismos constituem tão só condição necessária para se iniciar um procedimento urbanístico junto de uma Câmara - razão pela qual são contenciosamente recorríveis pelos seus (únicos) destinatários.

  9. Segundo o Ac. STA de 07.02.91, o acto que põe termo ao "processo gracioso de acabada regulamentação" regulado no regime da Reserva Agrícola, e "que determina irremediavelmente o sentido de qualquer pretensão de utilização daqueles solos (da Reserva Agrícola) para fins não agrícolas", assume "a natureza de acto lesivo recorrível quando não consinta diferente destino do agrícola aos solos questionados".

  10. Ao invés do que é afirmado pelo MP, e se analisarmos agora a natureza e estrutura do acto recorrido, ele não é nem um "parecer" emanado por uma comissão regional ao abrigo da al e) do n.º do art.º 17º do DL 196/89, nem é uma "reapreciação" de um desses pareceres, pedida pelos interessados ao CNRA nos termos do n.º 2 do mesmo artigo e emanada ao abrigo da al. f) do art.º 15 - não se revendo assim em qualquer das competências atribuídas aos órgãos da RAN pelo DL 196/89 (ou por qualquer outro diploma urbanístico).

  11. Muito pelo contrário, trata-se de um verdadeiro, indiscutível e aliás assumido (atento o respectivo teor literal) acto administrativo revogatório, onde é manifesta e inequívoca "a manifestação da vontade decisória" (cfr. Ac. STA de 17.10.89, P.º n.º 25.281, e Ac. STA de 11.05.00, P.º n.º 45.675, "Antologia..", cit., Abril-Julho 2000, ABÍLIO MADEIRA BORDALO, pág. 137) - acto esse aliás que só pode ter sido emanado ao abrigo da genérica competência atribuída aos órgãos da administração pelos art.º s 138.º e segs. do CPA, uma vez que, repete-se, não se encaixa de modo algum em qualquer das competências referidas no número anterior."...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT