Acórdão nº 664/2002.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Maio de 2011

Magistrado ResponsávelFERNANDES DO VALE
Data da Resolução17 de Maio de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça 1 – “AA, Lda” instaurou, em 03.10.02, na comarca de Alcobaça, acção ordinária contra BB e “CC, Lda”, pedindo: I – A condenação solidária dos RR. a pagar-lhe: a) – A quantia de € 150 567,13, referente às facturas nº/s 000000, de 24.08.01, no valor de € 23 343,74, 000000, de 29.08.01, no valor de € 7 003,12, 000000, de 31.12.01, no valor de € 46 687,46, 000000, de 14.12.01, no valor de € 53 107,01, e 000000, de 28.02.02, no valor de € 20 425,78; b) – A quantia de € 12 579,63, a título de juros de mora vencidos até 02.09.02, contados à taxa legal de 12% ao ano e constantes das notas de débito ids. nos arts. 36º a 40º da p. i.; c) – A quantia de € 1 485,05, a título de juros de mora, à taxa legal de 12& ao ano, vencidos entre o dia 02.09.02 e a data da entrada em Juízo da p. i., calculados sobre a quantia de € 150 567,13 e até integral ressarcimento da A; d) – Os juros vincendos, à taxa legal de 12% ao ano, contados desde o dia da entrada em Juízo da p. i. e até integral e efectivo ressarcimento da A.; e e) – A quantia de € 590,79, referente às notas de débito ids. no art. 53º da p. i. ; II – O reconhecimento do direito de retenção a favor da A. sobre todo o construído id. no art. 2º da p. i., para garantia do pagamento das facturas ids. na al. a) do petitório final; III – A restituição do construído id. no art. 2º da p. i., até ao efectivo pagamento das facturas ids. na al. a) do petitório final, condenando os RR. a entregarem à A. as chaves das moradias e do portão de acesso à obra e, bem assim, a absterem-se de praticar todo e qualquer acto que possa lesar ou ameaçar lesar o direito de retenção do construído até ao efectivo pagamento daquele crédito da A.; IV – A condenação dos RR. no pagamento à A. de uma indemnização, a liquidar em execução de sentença, a título de prejuízos materiais; e V – A condenação dos RR. no pagamento à A. da quantia de € 30 000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, à qual acrescerão juros contados sobre esta quantia, à taxa de 7% ao ano, desde a citação até integral pagamento.

Fundamentando as suas pretensões, alegou a A., muito em resumo e essência, factos demonstrativos de débito dos RR. para consigo dos montantes peticionados, em capital e juros, por falta de tempestivo pagamento do acordado preço correspondente ao construído pela A. no âmbito dum contrato de empreitada celebrado com o R. e a que a R., mais tarde, aderiu, com o consentimento da A., a qual também pagou, com o consentimento dos RR., o abastecimento de água e energia eléctrica a duas moradias mais cedo disponibilizadas aos respectivos interessados, sendo certo que à A. – que vem sofrendo danos não patrimoniais em consequência da conduta dos RR. – assiste o direito de retenção sobre o por si construído, em garantia do pagamento do mencionado débito dos RR.

Citados, contestaram os RR., pugnando pela improcedência da acção e aduzindo factos que determinam a imputação à A. do incumprimento ou cumprimento defeituoso do contrato, a cuja resolução aqueles, por isso, procederam, obrigando-os a gastos suplementares, tanto mais que, ao tempo da suspensão da obra, já, há muito, havia decorrido o prazo acordado para a respectiva conclusão, sujeitando a A. (que, antes, já havia abandonado a obra) ao pagamento aos RR. do montante da correspondente multa.

Em reconvenção, pediram, por seu turno, os RR.-reconvintes: a) – A condenação da A.-reconvinda a pagar-lhes a quantia de € 39 175,59, a título de multa pelo não cumprimento do prazo para a execução do contrato; b) – O reconhecimento e declaração de resolução do contrato de empreitada objecto dos autos, a qual foi efectuada, extrajudicialmente, pelos RR., por carta de 31.07.02; c) – A condenação da A.-reconvinda a pagar-lhes, a título de indemnização por prejuízos materiais, a quantia de € 30 000,00, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação até integral e efectivo pagamento; e d) – A condenação da A. a pagar-lhes o valor correspondente a indemnização por lucros cessantes, a apurar em execução de sentença.

A A. replicou, contestando a reconvenção e alegando que a resolução do contrato de empreitada, consumada pelos RR., consubstancia uma desistência da empreitada, concluindo pela total improcedência da reconvenção.

Após vicissitudes processuais várias, foi proferido despacho saneador tabelar, com subsequente e irreclamada enunciação da matéria de facto tida por assente e organização da pertinente base instrutória (b. i.).

Prosseguindo os autos a sua tramitação, veio, a final, a ser proferida (em 23.10.09) sentença que, julgando improcedente a reconvenção (de cujo pedido a A.-reconvinda foi absolvida) e, parcialmente, procedente a acção: I – Condenou, solidariamente, os RR. a pagar à A.: 1 – A quantia de € 150 567,12, referente às facturas identificadas na al. V) dos factos provados; 2 – A quantia de € 14 064,68, a título de juros de mora vencidos até à propositura da acção; 3 – Os juros vencidos e vincendos sobre a quantia de € 150 567,12, à taxa prevista no art. 102º, § 3º do C. Com., desde a propositura da acção até integral pagamento; 4 – A quantia de € 590,79, referente às notas de débito ids. nas als. mm) e nn) dos factos provados; II – Reconheceu à A. o direito de retenção sobre a obra construída, id. na al. b) dos factos provados, com excepção das moradias ids. nas als. d) e j) dos factos provados, até ao efectivo pagamento das facturas referidas na al. v) dos factos provados; III – Determinou que a A. seja restituída à posse da obra construída id. na al. b) dos factos provados, com excepção das moradias ids. nas als. d) e j) dos factos provados, até ao efectivo pagamento das facturas referidas na al. v) dos factos provados; IV – Condenou os RR. a entregarem à A. as chaves das moradias e do portão de acesso à obra, com excepção das moradias ids. nas als. d) e j) dos factos provados e, bem assim, a absterem-se de praticar todo e qualquer acto que possa lesar ou ameaçar lesar o direito de retenção do construído, com a referida excepção, até ao efectivo pagamento daquele crédito da A.; V – Condenou os RR. a pagar à A. a quantia que se vier a liquidar, em incidente de liquidação, correspondente ao custo dos trabalhos referidos na al. ccc) dos factos provados e ao proveito que a A. retiraria dos mesmos; VI – Condenou os RR. a pagar à A. a quantia que se vier a liquidar, em incidente de liquidação, correspondente ao proveito que a A. retiraria dos trabalhos contratados que não chegou a efectuar em consequência do facto dos RR. terem desistido da empreitada; VII – Absolveu os RR. do demais peticionado.

Inconformados, apelaram os RR., tendo a Relação confirmado, integralmente, a sentença recorrida, por acórdão de 29.06.10.

Daí a presente revista trazida pelos RR.

, visando a revogação do acórdão recorrido, conforme alegações culminadas com a formulação das seguintes (e transcritas, na íntegra) conclusões: 1 – A decisão em causa interpretou erradamente a prova – pelo menos parte dela – produzida em juízo; 2 – É manifesto que as facturas reclamadas pela A., nos presentes autos, enfermam de manifesta insuficiência na exposição, concretização e documentação da factualidade sobre que versavam, nomeadamente, sobre quais trabalhos feitos, material incorporado, data de execução, etc.; 3 – Entendeu-se, na decisão recorrida, dar como provado a efectiva incorporação pela A., na obra, dos trabalhos que esta fez corresponder às facturas que juntou como prova; 4 – Acontece que nenhuma testemunha ouvida em audiência de discussão e julgamento foi peremptória a fazer a correspondência entre as facturas e os trabalhos realizados; 5 – Como salienta o Prof. LEBRE DE FREITAS in Código de Processo Civil anotado Vol. I, pág. 322, "Na petição inicial deve o autor indicar…a causa de pedir, isto é, alegar o facto constitutivo da situação jurídica material que quer fazer valer – ou, no caso de acção de simples apreciação da existência de um facto, os elementos que o integram –, num e noutro caso se tratando do facto concreto que o autor diz ter constituído o efeito pretendido”; 6 – Com efeito, a A. não esclareceu os factos que traduzem a causa de pedir; 7 – Nem trouxe aos autos quaisquer elementos de prova que possam demonstrar o pedido; 8 – Nas facturas juntas aos autos, a A. apenas refere que se trata de "parte do orçamento datado de 14/07/1999"; 9 – Com efeito, a A. não provou a que trabalhos respeitavam as facturas emitidas e, ora, peticionadas, com a suficiente precisão, em que consiste a sua pretensão, facto que obstaculiza a defesa dos RR.; 10 – Apodíctico será dizê-lo, mas, correndo o risco da redundância, sempre se diz: que defesa está ao alcance de alguém que não sabe, ao certo, do que vem demandado?! 11 – Como se vê, foi impossível aos RR. defender-se senão por futurologia, senão com base em hipóteses (hipóteses de pretensões e hipóteses de defesa a essas hipotéticas pretensões), senão "às cegas"; 12 – A defesa a que os RR. têm direito, como vertente indeclinável da efectividade da tutela jurisdicional constitucionalmente consagrada enquanto pilar de um Estado de Direito, não é uma defesa incerta, eventual, aleatória, hipotética, obscura - mas sim uma defesa certa, eficaz, plena, segura, clarividente; 13 – O direito de defesa não pode ser um direito meramente formal, assistindo aos RR. o direito de conhecer os factos que lhe são imputados, por forma a poder exercer sobre eles o contraditório; 14- Não pode a A. singelamente apresentar aquelas facturas e depois vir para Tribunal dizer que afinal respeitavam a estes ou aqueles trabalhos; 15 – Temos, pois, que o processo civil não vive de dúvidas, incertezas, empirismos ou estimativas mas sim de certezas! 16 – Pois, na dúvida, sempre valerá o princípio segundo o qual “in dúbio pro reo”; 17 – Ora, aqueles elementos de prova testemunhal, pelo menos assim se indica como tal, não trouxeram aos autos senão de meras hipóteses, suposições, incertezas, aproximações e...

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