Acórdão nº 218/08.8TTPNF.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Abril de 2011

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução13 de Abril de 2011
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 31 de Janeiro de 2008, no Tribunal do Trabalho de Penafiel, 2.º Juízo, AA instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra BANCO BB, S. A., pedindo que, declarada a ilicitude do seu despedimento, a ré fosse condenada: (i) a reintegrá-lo no respectivo posto de trabalho; (ii) a pagar-lhe as retribuições vencidas desde os 30 dias anteriores à data da entrada da acção até ao trânsito da decisão final, com actualizações anuais e juros legais, desde o vencimento de cada prestação; (iii) a pagar-lhe a diferença do subsídio de Natal no ano de 2007 e a comparticipação nos lucros do exercício de 2007 e dos anos seguintes, com juros legais desde o vencimento das atinentes prestações; (iv) a reembolsá-lo do acréscimo pago na prestação do crédito à habitação, com juros legais desde o pagamento do valor acrescido de cada prestação mais gravosa; (v) a indemnizá-lo pelos danos não patrimoniais sofridos, em valor não inferior a 35.000 euros, com juros legais desde a citação; (vi) no pagamento de sanção pecuniária compulsória.

A acção, contestada pela ré, foi julgada parcialmente procedente, sendo a ré condenada (i) a reconhecer a ilicitude do despedimento do autor, (ii) a reintegrá-lo no respectivo posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria — a determinar em sede de liquidação — e antiguidade, (iii) a pagar-lhe a quantia de € 1.500, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde a data da sentença proferida e até efectivo e integral pagamento, (iv) a pagar-lhe, com as actualizações anuais, as retribuições que deixou de auferir desde 31 de Dezembro de 2007 e até à data do trânsito em julgado da sentença, deduzindo-se o subsídio de desemprego que o autor eventualmente haja auferido no mesmo período de tempo, o qual deverá ser entregue pela ré à Segurança Social, cuja liquidação se relega para o respectivo incidente, (v) a reembolsar o autor do acréscimo pago nas prestações do crédito à habitação, também a liquidar no respectivo incidente, com juros legais desde o momento do pagamento do valor acrescido de cada prestação mais gravosa, (vi) na sanção pecuniária compulsória de € 100, por cada dia de incumprimento da ordenada reintegração, desde a data do trânsito em julgado da sentença proferida até à reintegração do autor no posto de trabalho, absolvendo-se a ré do mais peticionado.

  1. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação, aduzindo que a sentença recorrida apresentava contradição insanável, sendo nula nos termos do artigo 668.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, que a infracção disciplinar imputada ao autor assumia natureza continuada, tendo este violado o dever de não concorrência com a entidade empregadora, que não ocorria prescrição da infracção disciplinar e, além disso, que o autor não tinha direito a indemnização por danos não patrimoniais.

    O autor contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso da ré, e ajuizou recurso subordinado, em que concluiu que devia ser reintegrado na categoria de gerente do Balcão do Hospital Padre Américo e que se justificava a condenação da ré em sanção pecuniária compulsória não inferior a 1.000 euros, por dia.

    A ré contra-alegou, defendendo a improcedência do recurso subordinado.

    O Tribunal da Relação do Porto indeferiu a pretendida nulidade da sentença recorrida, considerou prescrita a infracção disciplinar imputada ao autor, reduziu para € 700 a indemnização por danos não patrimoniais, condenou a ré a reintegrar o autor ao seu serviço, com a categoria de gerente, e fixou a sanção pecuniária compulsória na «quantia diária de euros 500,00, condenando-se o réu a pagar ao autor euros 250,00 (e igual quantia a favor do Estado), desde a data do trânsito em julgado da decisão até à reocupação efectiva do autor no seu posto de trabalho».

    É contra esta decisão que a ré agora se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as conclusões que se passam a discriminar: «1. Ao não apreciar o processo disciplinar no seu todo, limitando-se apenas a retirar dele e a dar como provado que o recorrido foi notificado da nota de culpa no dia 24 de Julho de 2007, o Tribunal da Relação do Porto não fez uso adequado dos poderes que lhe são conferidos pelo art. 712.º do CPC.

  2. Com efeito, cabia ao Tribunal da Relação, face à questão que estava em causa — a prescrição — apreciar o processo disciplinar na sua totalidade, de modo a verificar se elementos havia que conduzissem à interrupção da contagem dos prazos estabelecidos no art. 372.º do Código Trabalho.

  3. Ora, ao limitar-se a verificar a data da notificação da nota de culpa ao recorrido como sendo aquela que, nos termos do art. 411.º do Código do Trabalho, interrompe os prazos estabelecidos no art. 372.º do mesmo diploma, a Relação ignorou a existência, no processo, dum inquérito prévio necessário para a elaboração da nota de culpa, inquérito esse que, nos termos do art. 412.º do Código do Trabalho, deveria ser o que relevava, no caso, para a apreciação da prescrição e que tem o mesmo efeito de interromper a contagem dos prazos do citado art. 372.º 4. O processo disciplinar, como documento de suporte do despedimento do recorrido que nunca o pôs em causa e, pelo contrário, expressamente o aceitou, conforme consta dos autos (fls. 209), deveria ser tomado no seu todo, incluindo, antes de mais, o inquérito preliminar que dele faz parte integrante.

  4. No caso, sendo a infracção praticada pelo recorrido uma infracção continuada, e praticada a última, no dia 29 de Junho de 2006, como deu como provado o Tribunal da Relação do Porto, a partir da consulta do processo disciplinar, só a partir dessa data se inicia a contagem do prazo de um ano da prescrição.

  5. Prazo esse que foi interrompido com o inquérito prévio que faz parte integrante do processo disciplinar e que se mostrava absolutamente necessário para a elaboração da nota de culpa e não com a notificação da nota de culpa ao recorrido, como se afirma no acórdão recorrido.

  6. Esse inquérito prévio que consta dos autos e foi aceite pelo Instrutor como preliminar do processo disciplinar e que dele faz parte integrante, não foi tido em consideração na apreciação feita, o que, a ter sido, levaria a dar como não verificada a prescrição, atento o estabelecido no art. 412.º do CT.

  7. O Banco recorrente, em 12 e 13 de Junho de 200[7], teve conhecimento de irregularidades praticadas pelo recorrido, por intermédio do cliente a quem o recorrido, seu Gerente interino, aliciara a retirar o dinheiro do Banco, sob a promessa de juros na ordem dos 30% ao ano em “negócios” em que ele tinha interesse próprio.

  8. No dia seguinte, 14 de Junho de 200[7], o Banco recorrente, através do seu Gabinete de Inspecção, a unidade orgânica que tem competência para o efeito, iniciou o inquérito para apurar as irregularidades que indiciariamente haviam sido imputadas pelo cliente ao recorrido.

  9. O inquérito vertido no Relatório n.º 22/2007, que faz parte integrante do processo disciplinar e que a ele ficou apenso e que se encontra junto aos autos, foi concluso no dia 6 de Julho de 2007, demorando a sua feitura 22 dias de calendário, pelo que se conclui que foi conduzido de forma diligente e célere.

  10. Desse Relatório foi dado conhecimento ao Conselho de Administração, único Órgão que detém o poder disciplinar na recorrente, que, com base nele e sob proposta da Direcção de Recursos Humanos, no dia 19/07/2007, mandou proceder disciplinarmente contra o recorrido com intenção de despedimento.

  11. Nomeado o Instrutor, ainda nesse dia, este, aceitando o Relatório elaborado pelo Gabinete de Inspecção como preliminar do processo, e com base no que nele foi apurado, elaborou a nota de culpa de que o recorrido foi notificado no dia 24 de Julho de 2007.

  12. Verifica-se, assim, que os prazos constantes do art. 412.º do Código do Trabalho foram integralmente cumpridos.

  13. Consequentemente, a excepção de prescrição não se verificou no caso em apreço.

  14. Tivesse o Tribunal da Relação em atenção a existência do referido inquérito preliminar, forçosamente teria de concluir que os prazos estabelecidos no art. 372.º do CT haviam sido interrompidos no dia 14 de Junho de 2007 e, portanto, a prescrição não se verificara quando o recorrido foi notificado da nota de culpa no dia 24 de Julho de 2007.

  15. Aliás, o processo disciplinar e respectivo inquérito que precedeu, jamais foi posto em causa, impugnado ou merecedor de qualquer censura, incluindo por parte do recorrido que expressamente o aceitou (fls. 209).

  16. O Tribunal da Relação, dentro dos poderes que detém, em conformidade com o estipulado no art. 712.º, n.º l, alínea b), do CPC tinha o dever de trazer aos autos a existência do inquérito preliminar e ao abster-se de o fazer, violou esse normativo, 18. Tanto mais que essa omissão se repercutiu de modo extremamente relevante para a não aplicação do direito substantivo ínsito no art. 412.º do CT, 19. Dando como certa a excepção da prescrição que, afinal, atenta a existência desse inquérito e por força do art. 412.º do CT, jamais poderia ter sido dada por verificada.

  17. E assim, impôs ao Banco recorrente que um seu trabalhador, cujo comportamento gravíssimo ficou devidamente provado...

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