Acórdão nº 10598/2002-7 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Julho de 2003
Magistrado Responsável | ROSA MARIA COELHO |
Data da Resolução | 01 de Julho de 2003 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I - A ... intentou contra B ... a presente acção declarativa, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe, com juros legais desde a citação, a quantia global de esc. 100.478.650$00, correspondente aos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos em virtude de, sendo administrador da ré, esta ter declarado unilateralmente e sem justa causa a sua exoneração desses funções em 10.11.99, o que foi decidido em manifesto abuso do direito e, bem assim, a remunerações e fringe benefits que deixou de auferir pelo cargo de administrador da ré desde 31 de Dezembro de 1999 até à data da propositura da acção, no caso de se comprovar que não teve lugar a assembleia geral da ré que o exonerou daquele cargo, hipótese em que o mesmo cargo se manteria.
Também para o caso de se comprovar a não realização daquela assembleia geral, pede ainda a condenação da ré a pagar-lhe indemnização correspondente às remunerações pecuniárias e "fringe benefits" que deixar de auferir desde a propositura da acção até à nomeação de novos corpos sociais da ré, em montante a liquidar em execução de sentença.
Logo na petição inicial pediu a notificação da ré para juntar aos autos os documentos identificados no art. 117º desse articulado.
A ré contestou, defendendo a sua absolvição de todos os pedidos formulados.
No decurso da audiência preliminar onde se procedeu a saneamento e condensação foi proferido despacho que determinou a notificação da ré para juntar aos autos os documentos requeridos nas al. d), e) e g) daquele art. 117º.
Deste despacho agravou a ré pedindo a sua revogação, recurso que foi recebido com subida diferida e efeito meramente devolutivo.
Após audiência de julgamento foi proferida sentença que absolveu a ré de todo o pedido.
Apelou o autor, pedindo a revogação da sentença e a condenação da ré no pedido formulado na p. i..
A ré contra-alegou, defendendo a improcedência deste recurso.
Colhidos os vistos, e uma vez que a ré disse manter interesse na apreciação do agravo por si interposto, impõe-se, nos termos do disposto na parte final do nº 1 do art. 710º do C. P. Civil, começar pela apreciação do recurso de apelação, apenas se passando a conhecer do agravo se a sentença não for confirmada.
Nas alegações apresentadas no âmbito da apelação, o autor formulou conclusões do seguinte teor: A - A douta sentença recorrida reconhece que a destituição do autor do cargo de administrador da R. foi efectuada sem justa causa e que essa destituição, antes do termo do mandato, mesmo que lícita, gera responsabilidade civil da R. para com o A..
B - A destituição do A. - ainda que constituindo um acto aparentemente lícito - enfermou de abuso de direito, sendo por isso um acto substancialmente ilícito, nos termos do art. 334º do CC, como o A. demonstra nos arts. 95º a 100º da sua p. i..
C - A assembleia geral da Ré, realizada em 11.11.99, foi ferida de nulidade, nos termos do art. 56º, nº 1, al. a) do CSC, como se demonstra nas alegações supra em 3.1 a 3.6.
D - Considera o A. que o abuso de direito cometido pela Ré, tornando ilícita a sua destituição, lhe confere o direito a ser indemnizado por danos não patrimoniais sofridos, nos termos do art. 483º do CC..
E - E que ficou provado o nexo de causalidade entre o acto ilícito da Ré e a doença referida sob o nº 40 dos factos provados.
F - À situação sub judice é aplicável o art. 1172º, al. c) do CC, por força do art. 987º, nº 1 do mesmo código.
G - O A. alegou e provou os danos materiais que sofreu com a sua destituição do cargo de administrador da Ré antes do termo do mandato: "os proventos esperados" e perdidos. Era o que lhe competia nos termos do art. 342º, nº 1 do CC.
H - A douta sentença recorrida parece assentar grande parte da sua decisão no pressuposto de que "... o Autor foi destituído do cargo de Administrador delegado da Ré, continuando, no entanto, a exercer o cargo que antes exercia, nos termos do contrato de trabalho entre ambos celebrado, referido no art. 2º dos factos provados". O referido facto provado nº 2 não permite esta conclusão, nem tal foi sequer alegado pela Ré, nem foi discutido ou objecto de prova.
I - Competia à Ré, nos termos do art. 342º, nº 2 do CC, alegar e provar quaisquer factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado pelo A., o que não fez.
J - O bónus de desempenho e as ajudas de custo constituíam parcelas, certas e regulares, da retribuição do A. como administrador da Ré, de montante fixo mensal.
L - O montante dos prejuízos sofridos pelo A . em consequência da privação do uso da viatura e do telemóvel poderia e deveria ser relegado para liquidação em execução da sentença (se condenatória), nos termos do art. 661º, nº 2 do C. P. C..
Nas contra-alegações apresentadas, a ré pugna pela improcedência do recurso.
Em face do conteúdo das conclusões do apelante - que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso - são questões sujeitas à nossa apreciação: - Saber se a deliberação em causa é nula por violação do art. 56º, nº 1, al. a) do CSC; - Saber se a destituição do apelante foi declarada com abuso do direito por parte da Ré; - Saber se, sendo por isso ilícita a destituição, a mesma confere ao apelante o direito a ser indemnizado pelos danos não patrimoniais sofridos e com nexo causal relativamente a ela.
- Saber se o exercício, pelo apelante, do cargo anterior, ao abrigo de contrato de trabalho, era, em relação aos danos patrimoniais por si sofridos, um facto cuja prova cabia à apelada; - Saber se o bónus de desempenho e as ajudas de custo eram parcelas certas e regulares da retribuição do apelante enquanto administrador da apelada; - Saber se os prejuízos relativos à privação do uso de veículo e de telemóvel deviam ser liquidados em execução de sentença.
II - Na sentença descrevem-se como provados os seguintes factos: 1. A ... foi nomeado para o Conselho de Administração da Sociedade B ..., por deliberação da assembleia geral de 10.7.97, para o triénio de 1997/99.
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Em consequência disso, o Autor suspendeu o seu contrato de trabalho com a Ré a partir de 10.7.97.
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Pelo exercício das funções de administrador delegado, o Autor auferia a remuneração mensal base de Esc. 600.000$00, paga 14 vezes por ano.
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O A recebia também, através de transferência para a sua conta bancária, juntamente com a sua remuneração base mensal, um bónus de desempenho anual no montante de Esc. 4.356.000$00, a que correspondia a quantia liquida mensal de Esc. 252.915$00.
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A Ré processava ao Autor ajudas de custo juntamente com o vencimento mensal.
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Pelo exercício do...
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