Acórdão nº 02A3281 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Janeiro de 2003

Magistrado ResponsávelREIS FIGUEIRA
Data da Resolução21 de Janeiro de 2003
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Relatório. "A, Limitada" intentou contra "B, Limitada" acção com processo ordinário, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de 62.603.459 escudos, a título de capital e juros vencidos, bem como juros vincendos desde a propositura. Na primeira instância a acção foi julgada parcialmente procedente e assim a Ré condenada a pagar à Autora: a) 32.811.593 escudos a título de capital e juros vencidos sobre as parcelas de capital, desde os vencimentos e até 02/04/97 (data da propositura) b) juros vincendos (diz-se vencidos, mas por evidente lapso), desde 03/04/97 até efectivo pagamento, à taxa supletiva dos juros comerciais que for vigorando (e que na data da sentença era de 12% ao ano). Da sentença recorreram de apelação tanto a Autora como a Ré. A Relação de Lisboa julgou improcedente o recurso da Ré e parcialmente procedente o da Autora, em consequência do que: a) condenou a Ré a pagar à Autora (mais) a quantia de 800.000 escudos (de brochuras e "lay outs"), com juros de mora à taxa legal desde a citação e até integral pagamento, nesta medida alterando a sentença recorrida: b) no mais confirmou a sentença: c) condenou os representantes da Ré na multa de 30 UCs, como litigantes de má-fé. O recurso. Recorrem de novo Autora e Ré, agora de revista para este Supremo Tribunal de Justiça. Alegando, concluíram como para cada uma se passa a transcrever. Recurso da Autora: 1ª O objecto do presente recurso de revista circunscreve-se ao problema de saber se à recorrente deve ser paga, a título de indemnização por lucros cessantes, uma quantia equivalente ao valor de comissões de 3% calculados sobre o preço da venda de cada área residencial ou comercial, acrescida de IVA à taxa em vigor, que integram o chamado Edifício "..." sito no Campo Grande, em Lisboa. 2ª O referido contrato de comercialização foi unilateral e infundadamente resolvido pela recorrida, produzindo-se assim ilicitamente a extinção do vínculo contratual, o que veio a determinar que a C, Lda. (antecessora da recorrente na relação material controvertida) ficasse em consequência impedida de continuar a promover a comercialização das referidas áreas residenciais e comerciais, hoje constituídas em fracções autónomas do prédio .... 3ª Ora, as partes convencionaram que à cobrança dos honorários ou comissões, que se fixaram em 3% sobre o preço de venda de cada área residencial ou comercial, acrescido de IVA correspondente, a C, Lda. tinha direito à sua cobrança integral logo após o recebimento do sinal respeitante a cada venda. 4ª A douta sentença de 1ª Instância considerou que a recorrente não tinha direito às comissões. 5ª O douto acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, alterando a resposta ao n. 2 da base instrutória, veio fixar definitivamente em sede de matéria de facto, que o preço das fracções autónomas por vender, à data da resolução do contrato, era, pelo menos, de Esc: 589.500.000$00. 6ª O mesmo acórdão, porém, veio também dizer que a pretensão ressarcitória da recorrente só poderia proceder, caso a mesma tivesse alegado e provado a posterior venda das fracções autónomas que se encontravam por comercializar à data da resolução do contrato. 7ª O acórdão da Relação veio ainda dizer que a A. nada alegou neste âmbito, tal como, apesar de a ré ter junto com a contestação alguns contratos promessa, nunca declarou pretender aproveitar-se de tal facto os termos do artigo 264º n. 3 do Cód. Proc. Civil. 8ª Ora, os referidos contratos promessa não se reportam a fracções autónomas que houvessem ficado por vender à data da resolução infundada do contrato de comercialização imobiliária que as partes subscreveram. E daí que a recorrente não tivesse qualquer interesse ou utilidade prática em observar o ónus imposto pela referida norma do n. 3 do art. 264º do Cód. Civil. A pretensão ressarcitória da autora não incidia sobre as comissões devidas pela celebração dos ditos contratos promessa já celebrados, mas sobre os contratos celebrandos. 9ª A invocação da referida norma processual está assim deslocada. 10ª A existência dos contratos promessa que a ré juntou aos autos para servirem de suporte à pretensão por ela deduzida na contestação de uma mal invocada excepção de compensação de créditos e débitos com a autora, não são complemento ou concretização de outros factos que a autora haja alegado na petição. 11ª A causa de pedir da presente acção não se consubstancia na celebração dos referidos contratos de promessa de venda de fracções, mas no contrato de comercialização e na sua ilícita resolução. 12ª De qualquer forma sempre se dirá que, segundo o princípio da aquisição processual, o Tribunal deve tomar em consideração todas as provas realizadas no processo, mesmo que não tenham sido apresentadas, requeridas ou produzidas pela parte onerada com a prova (art. 515, parte do Cód. Civil). Por outro lado. 13ª O contrato de comercialização imobiliária está datado de 12/02/92, data em que os DL 285/92 de 19/12/12 e DL 77/99 não estavam em vigor, pelo que as disposições dos referidos diplomas não são aplicáveis sob pena de ilegal retroactividade. 14ª Daí que as disposições restritivas dos referidos diplomas legais sobre o momento em que as comissões são exigíveis não possam aplicar-se ao caso. 15ª Acresce que a natureza do contrato de comercialização celebrado tem a natureza mista de contrato com normas próprias de um contrato de mediação e com cláusulas específicas de um contrato de mandato. 16ª Ora, a cláusula existente no contrato sobre o pagamento dos honorários ou comissões insere-se num pressuposto: o da vigência do contrato. 17ª Acontece que a ré, de modo infundado e ilícito, pôs termo à vigência do contrato e, com o tê-lo feito, não se libertou das suas obrigações ou de uma sucedânea obrigação de indemnizar a recorrente. 18ª O prédio construído no Campo Grande foi-o para venda. E se o prédio tinha problemas em ver-lhe concedida a licença de utilização (facto impeditivo de vendas), tais problemas eram exclusivamente imputáveis à ré, que não pagou atempadamente ao empreiteiro, como ficou provado. 19ª E está adquirido para o processo de que o prédio já tem licença de utilização, como resulta do facto de o regime de propriedade horizontal haver sido constituído e registado na Conservatória como decorre da certidão que a autora juntou com as suas alegações (facto do seu conhecimento superveniente) para a 2ª Instância. 20ª Não se pode pois concluir que a ré, mesmo sem a resolução do contrato de comercialização, poderia não vender os imóveis, e muito menos que a autora não deva ser ressarcida do valor das comissões sobre esperadas vendas. 21ª Quando muito, o Tribunal da Relação, como também a 1ª Instância deveriam, no limite, ter condenado a ré no pagamento das comissões que se mostrassem devidas em sede de liquidação a operar em execução de sentença. 22ª No limite, já que o valor de Esc: 589.500.000$00 atribuído pelo Tribunal da Relação de Lisboa às fracções autónomas que ficaram por vender à data da resolução do contrato de comercialização, era suficiente para condenar desde logo a ré em função desse valor. E isto porque; 23ª A questão está deslocada, por motivos imputáveis à ré, da esfera do normal desenvolvimento da relação contratual nascida do contrato de comercialização imobiliária celebrado pelas partes, para a esfera da patologia dessa relação, oriunda da resolução infundada do contrato operada ilicitamente pela ré. 24ª Neste patamar da responsabilidade civil contratual, estando como estão verificados todos os elementos constitutivos da responsabilidade civil da recorrida, não pode esta deixar de ser condenada a pagar à autora uma indemnização equivalente a 3% calculados sobre a verba de Esc.: 589.500.000$00, acrescida de IVA à taxa correspondente em vigor e nos respectivos juros de mora, por ser esse o valor dos lucros cessantes da recorrente. 25ª Ou na quantia que se liquidar em execução de sentença. 26ª O douto acórdão recorrido violou assim as normas do contrato de comercialização imobiliária junto com a petição e as normas dos artigos 798º e 806º do Cód. Civil, por erro de interpretação e aplicação. Recurso da Ré. 1. A cessão de créditos (alegadamente) celebrada entra a ora Recorrente e a C não produz efeitos na esfera jurídica da ora Recorrente porquanto, tal como ficou provado nos presentes autos o referido negócio apenas lhe foi notificado aquando da citação para a presente acção. 2. Ora, nos termos da melhor jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça, um dos elementos essenciais na causa de pedir é precisamente o da notificação da cessão de créditos ao devedor, a qual tem, necessariamente, de ter ocorrido em momento anterior ao da propositura da acção. 3. Assim, não tendo ficado provado nos presentes autos o conhecimento da cessão de créditos, por parte da ora Recorrente, em momento anterior ao da citação, não pode senão entender-se que não se encontram preenchidos todos os requisitos para que tal negócio produza efeitos em relação à Recorrente (cfr. art. 582º n. 1 do CC). 4. No entanto, ainda que assim não se entenda, sempre terá que se considerar que o contrato de comercialização imobiliária que constitui fundamento da presente acção é nulo, por ser contrário a uma disposição legal de carácter imperativo e por C se encontrar a actuar em clara violação de normas legais de natureza igualmente imperativa. Senão vejamos, 5. Ficou provado nos presentes autos que a sociedade C não se encontrava licenciada para o exercício da actividade de mediação imobiliária, não possuindo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT