Acórdão nº 06S699 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 28 de Junho de 2006

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução28 de Junho de 2006
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. Em 27 de Janeiro de 2004, no Tribunal do Trabalho de Viana do Castelo, AA, com o patrocínio do Ministério Público, intentou acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra Empresa-A, pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de 16.393,66 euros, acrescida de juros de mora, a título de complemento de subsídio de doença.

Alegou, em resumo, que foi admitido ao serviço da ré, em 26 de Abril de 1978, para desempenhar as funções de engenheiro mecânico, tendo, no ano de 1997, ascendido à categoria de chefe de departamento de apoio fabril e reparações. Desde 1968, a ré sempre pagou aos quadros técnicos da empresa, que se encontravam de «baixa» por doença, um complemento do subsídio de doença, que completava até ao valor do salário ilíquido, o pagamento efectuado pela Segurança Social e, a partir de 1974, também aos restantes trabalhadores, embora em moldes diferentes; porém, em Junho de 2001, o conselho de administração da ré deliberou suspender tal atribuição, pelo que, tendo o autor estado de «baixa» por doença no período de Março de 2001 a Dezembro de 2002, a ré apenas lhe pagou o referido complemento nos três primeiros meses de «baixa».

A ré contestou, pugnando pela improcedência da acção, tendo alegado que a atribuição daquele subsídio dependia de deliberação do conselho de administração e aplicava-se aos trabalhadores, quadros técnicos da ré, que se encontravam em regime de isenção de horário de trabalho, correspondendo o mesmo à diferença entre o subsídio de doença a processar pela Segurança Social e o salário ilíquido; em 1974, a ré alargou a atribuição do subsídio a todos os restantes trabalhadores do quadro permanente, mas tendo como base de cálculo o salário líquido; acresce que o autor não se encontrava em regime de isenção de horário de trabalho quando entrou de «baixa» médica, mas mesmo assim a ré decidiu atribuir-lhe durante os primeiros três meses de «baixa» o suplemento de doença com referência ao seu salário ilíquido, mas como o subsídio de doença que o autor recebia da Segurança Social era superior ao seu salário líquido, considera não ser devido complemento de subsídio de doença.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença que, entendendo que o complemento de subsídio de doença integra a retribuição, face à irredutibilidade desta e à expectativa que a ré criou nos seus trabalhadores quanto ao respectivo recebimento, julgou a acção procedente e condenou a ré a pagar ao autor a quantia de 16.393,66 euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal, e até integral pagamento.

  1. Inconformada, a ré interpôs recurso de apelação, que a Relação julgou procedente, revogando a sentença recorrida, e, em consequência, julgou a acção improcedente, absolvendo a ré do pedido.

    É contra esta decisão que o autor se insurge, mediante recurso de revista, em que pede a revogação do acórdão recorrido ao abrigo das seguintes conclusões: 1) Tal como a sentença da primeira instância, também a jurisprudência tem entendido que os complementos das prestações da segurança social podem integrar o contrato individual de trabalho, constituindo um direito do trabalhador; 2) No caso vertente, atenta a matéria de facto provada, os complementos de subsídios de doença para os quadros com disponibilidade de horário, que constituíam um uso da empresa, pelo menos, desde data anterior a 1968 e que, até ao limite do salário ilíquido, foram deliberados pelo conselho de administração da recorrida, em 31.01.1968, e sempre foram observados desde a sua aprovação até Junho de 2001, 3) Integram-se não só nos usos da empresa (n.º 2 do artigo 12.º da LCT), como numa manifestação do poder regulamentar da entidade patronal, aflorado no artigo 39.º, n.º 2, da LCT, enquanto declaração receptícia de manifestação da vontade contratual da entidade patronal (artigo 7.º da LCT), bastando a adesão tácita dos trabalhadores a esta manifestação de vontade, para que os contratos de trabalho se tenham por alterados por acordo das partes, 4) Tendo, assim, os trabalhadores quadros técnicos da recorrida, que ingressaram na empresa antes de Junho de 2001, com o estatuto de disponibilidade de horário, por força do seu contrato individual de trabalho, direito aos complementos de subsídio de doença até ao valor do salário ilíquido como parte integrante da sua retribuição; 5) Este direito aos complementos de subsídio de doença até ao valor do salário ilíquido não podia ser válida e unilateralmente retirado, nem pela deliberação do conselho de administração da recorrida, datada de 1970 (que pretenderam transformá-lo num acto precário, mas que não alteraram os usos da empresa, que se mantiveram inalterados desde 1968 até 2001), nem pela decisão não escrita do mesmo conselho de administração de Junho de 2001 (que determinou a retirada dos complementos de subsídio de doença do ora recorrente), 6) Atentos, no primeiro caso, a perda de valor da deliberação de 1970 pelo seu não uso prolongado e pela derrogação pelos usos da empresa, e, no segundo caso, o princípio da irredutibilidade da retribuição, consignado no artigo 21.º, n.º 1, alínea c), da LCT; 7) Acresce que o n.º 3 do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 225/89, de 6.07 (que regulamenta a Lei de Bases da Segurança Social e procede à harmonização com a legislação comunitária quanto a benefícios complementares dos concedidos pelo regime geral de segurança social) consigna a responsabilidade directa das empresas pelo pagamento dos benefícios anteriormente concedidos, se não aderirem ao esquema de prestação gerido por entidade autónoma ou nos períodos anteriores à transferência de responsabilidade; 8) De igual modo, a Lei de Bases de Segurança Social reconhece expressamente os direitos a prestações complementares anteriormente adquiridos e em formação; 9) Também a legislação comunitária, verbi gratia, a Directiva 98/49/CE do Conselho, [de 29/06/1998], protege os direitos dos beneficiários de regimes complementares de pensão (que, tal como os complementos de doença, são complementos de prestações previdenciais), designadamente, quando se deslocam na Comunidade Europeia; 10) Em consonância, o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias tem vindo a decidir que o artigo 119.º do Tratado CE (actual artigo 141.º do Tratado de Amesterdão) é aplicável aos regimes complementares de pensões, atenta a clara natureza laboral de tais benefícios; 11) Assim, a Relação, ao interpretar os artigos 31.º e 32.º, n.º 3, do Decreto--Lei n.º 225/89, os artigos 7.º, 12.º, n.º 2, 21.º, n.º 1, alínea c), e 39.º da LCT, e os artigos 405.º e 406.º, n.º 1, do Código Civil, no sentido de que a entidade patronal pode fazer cessar o pagamento dos complementos de subsídios de doença, correspondentes à...

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