Acórdão nº 98B1090 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Abril de 1999
Magistrado Responsável | FERREIRA DE ALMEIDA |
Data da Resolução | 14 de Abril de 1999 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. A, B e outros requereram providência cautelar não especificada contra "C", "D", "E", "F", "G", "H", "I", "J", "L", "M", "N", e "O", pedindo que seja ordenado às requeridas que se abstenham de utilizar a antiga estação de recolha de eléctricos do Arco do Cego, em Lisboa, para aí desenvolverem a sua actividade comercial e de nela depositarem autocarros bem como produtos combustíveis ou similares. Alegam, em suma, que a actividade que as requeridas iriam desenvolver naquele terminal do Arco de Cego provocaria uma degradação ambiental e na qualidade de vida dos requerentes que têm, por isso, todo o interesse e todo o direito de a ela se oporem. 3. A providência cautelar acabou por ser indeferida na 1ª instância, e no agravo entretanto interposto foi proferido acórdão que confirmou aquela decisão de indeferimento. 4. De novo inconformados, os A.A. agravaram para este Tribunal, concluindo as suas alegações pela forma seguinte: 1º) o litígio dos autos envolve os moradores da zona do Arco do Cego e as empresas rodoviárias, ora recorridas, que pretendem utilizar a antiga estação de recolha de carros eléctricos da Carris, situada na mesma zona, e como terminal de carreiras "expresso"; 2º) os agravantes pretendem defender os seus interesses difusos referentes ao ambiente, saúde e qualidade de vida contra aquela utilização do terminal para carreiras "expresso"; e isto porque esta utilização, com a poluição de todo o nível que lhe está associada, afectará aqueles direitos dos moradores da zona do Arco do Cego; 3º) há, pois, um conflito entre os direitos destes moradores e o interesses das requeridas em melhorarem a sua exploração comercial já que os transportes que efectuam constituem actos tipicamente comerciais (artº366 do Cód. Comercial); 4º) neste conflito, os direitos em confronto são desiguais já que os dos agravantes são direitos que se conexionam com a sua personalidade moral, enquanto os das requeridas se conexionam com a sua actividade económica lucrativa; 5º) daí que se devesse ter dado prevalência aos direitos e interesses dos agravantes nos termos do art. 335º nº2 do C. Civil; ao não fazê-lo o acórdão recorrido violou o disposto no art. 66º nº1 da Constituição. 6º) não há qualquer conflito de direitos e interesses entre os moradores da zona do Arco do Cego e os moradores da Av. Casal Ribeiro onde se encontrava o terminal daquelas empresas - recorridas, até porque esta providência cautelar não se dirige sequer contra os moradores da zona da Av. Casal Ribeiro que até nem são parte nestes autos; 7º) mas mesmo que esse conflito existisse, há que considerar que a zona do Arco do Cego é uma zona habitacional por excelência ao contrário da Av. Casal Ribeiro que, como é público e notório, tem uma ocupação predominantemente do terciário; 8º) daí que a lesão do ambiente e da qualidade de vida dos moradores seja mais intensa no Arco do Cego do que na Av. Casal Ribeiro "zona despovoada em termos habitacionais" o que confere prevalência aos interesses e direitos dos agravantes, moradores do Arco do Cego; 9º) os interesses dos utentes do terminal rodoviário de "expressos" também não tem grande relevo já que esses utentes são-no esporadicamente; 10º) o mesmo se passa com os interesses dos 38 trabalhadores do terminal da Av. Casal Ribeiro já que não são esses interesses que, aqui, se debatem e estão em causa; 11º) a transferência do terminal rodoviário da Casal Ribeiro para a área do Arco do Cego vai provocar uma enorme poluição sonora e atmosférica por força da sobrecarga de autocarros que irão ser depositados no terminal e que circularão nas artérias de toda aquela zona; 12º) é por força disto que irá ser violado o ambiente, a saúde e a qualidade de vida dos moradores do Arco do Cego, a tal ponto que se justifica o deferimento da presente providência; 13º) assim, o acórdão recorrido violou os arts. 1º, 36 nº1, 65º nº1, 66º e 67º nº1 da Constituição da República Portuguesa, o art. 335 do CCIV, e o art. 3 a) da Lei nº 11/87 de 7/4. Pedem a revogação do acórdão recorrido, e o deferimento da providência cautelar nos termos em que esta foi requerida. 5. Contra-alegou tão só a "C" que - defendendo que não é parte substantiva neste conflito - pediu a confirmação do acórdão recorrido quanto a si. 6. Os factos dados como provados, nas instâncias, são os seguintes: a)- a requerida "D" suscitou junto da Câmara Municipal de Lisboa a necessidade de desactivar o seu terminal da Av. Casal Ribeiro em Lisboa; b)- em fins de 1995, a Carris decidiu concentrar a sua frota de "eléctricos" na Estação de Santo Amaro por razões de funcionalidade e economia de exploração, disponibilizando a Estação do Arco do Cego; c)- a C.M.L. propôs então à D que, a título provisório, fosse transferido o terminal para a Estação da Carris do Arco do Cego; d)- a deslocação do terminal para o Arco do Cego implicará um significativo aumento de circulação na zona envolvente; e)- tal aumento de circulação determinará o aumento correspondente de poluição sonora dela emergente; f)- e aumentará significativamente também a poluição atmosférica; g)- a poluição sonora e atmosférica são susceptíveis de afectar a qualidade de vida dos residentes da zona e, em casos clínicos pontuais, afectar-lhes-à também a saúde; h)- a zona do Arco do Cego é fundamentalmente uma área residencial; i)- a zona onde actualmente opera a "D" - Av. Casal Ribeiro - apresenta níveis de poluição atmosférica superiores aos legalmente permitidos; j)- a requerida D, com a mudança, visa melhorar as condições de operacionalidade dos seus serviços; l)- a D recebe no seu terminal da Av. Casal Ribeiro cerca de 150 a 160 autocarros diários, número que sobe significativamente às 6ª feiras e às 2ª feiras e durante a época de Verão; m)- para o terminal do Arco do Cego apenas transitam os autocarros de serviço expresso que actualmente utilizam o terminal da Av. Casal...
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