Acórdão nº 0335210 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Novembro de 2003

Magistrado ResponsávelFERNANDO BAPTISTA
Data da Resolução06 de Novembro de 2003
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I. RELATÓRIO No .. Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de ......... o ICOR-Instituto para a Conservação Rodoviária, com sede na Praça da Portagem, 2800-225, Almada, promoveu contra Maria ............, José ............. e mulher Margarida ..........., Teresa .......... e marido Joel ............, Isabel ........... e marido Michel ........... a expropriação por utilidade pública das parcelas nºs 91.1 e 91.2, da planta cadastral do Projecto de Construção da Variante Nascente de ".............".

A Declaração de Utilidade Pública, com carácter de urgência, foi concedida pelo Governo através do Despacho nº 5176-A/2000, de 25 de Fevereiro, do Secretário de Estado Adjunto e das Obras Públicas, publicado no Diário da República nº 53, II Série, de 03.03.2000.

Foram realizadas as vistorias "ad perpetuam rei memoriam", conforme documentado nos autos .

Às parcelas em questão foi atribuído pelos árbitros o valor de 64.353.853$00, bem assim às benfeitorias o valor de 2.139.000$00, o que perfaz uma indemnização total de 66.492.853$00.

Por decisão de 2001.07.11, a propriedade da parcela de terreno expropriado foi adjudicada à expropriante (fls. 193).

Inconformada com o montante indemnizatório fixado na decisão arbitral, interpuseram recurso os expropriados, peticionando que à mesma fosse atribuído o valor global de 236.283.930$00 .

Da mesma forma, a expropriante interpôs recurso da decisão arbitral, peticionando que a indemnização fosse fixada em 35.615.680$00.

Expropriante e expropriados respondem aos recurso interposto pela outra parte (fls. 255 ss e 267 ss).

Após nomeação de peritos e prestação do compromisso legal (fls. 304 e 332), procederam estes à avaliação da parcela de terreno expropriada, nos termos que constam dos relatórios de fls. 353 a 362 e 372 a 381, tendo os Srs. Peritos nomeados pelo tribunal e pelos expropriados fixado o valor da indemnização global em 571.542,88 Euros (fls. 359) e o Sr. Perito nomeado pela expropriante fixado tal valor em 217.106,09 Euros (fls. 381).

Expropriados e expropriante apresentaram as respectivas alegações, sustentando a procedência do seu recurso e improcedência do recurso da parte contrária.

Foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente o recurso interposto pelos expropriados e improcedente o recurso interposto pela expropriante e, em consequência, fixou-se em 571.542,88 Euros o valor da indemnização devida aos expropriados, pela expropriação das parcelas de terreno supra identificadas, valor indemnizatório este a actualizar desde a data da publicação da declaração de utilidade pública até ao trânsito em julgado da sentença, de acordo com a evolução dos índices de preços no consumidor, com exclusão da habitação, publicados pelo I.N.E. (fls. 449).

Da sentença foi interposto recurso de apelação pela expropriante, onde alegou e apresentou as seguintes "CONCLUSÕES 1ª. Dos dois relatórios apresentados resulta que a área integrada em "Espaços Industriais" é de 2.050 m2, e a restante (22.019 m2) em RAN.

  1. Não pode concordar-se com a metodologia seguida no laudo majoritário e sancionado pela douta sentença no que respeita à classificação de parte do terreno integrado em RAN (5.956 m2) como "equiparado a apto para a construção".

  2. O legislador, ao distinguir o solo apto para construção do solo para outros fins, não adoptou um critério abstracto de aptidão edificatória já que, abstracta ou teoricamente, todo o solo, incluído ou integrado em prédios rústicos, é passível de edificação, mas antes um critério concreto de potencialidade edificativa.

  3. Para que determinado solo seja classificado como apto para construção não basta a verificação de alguma das circunstâncias enumeradas nas quatro alíneas que integram o referido nº 2 do art. 25º - necessário se torna que, na prática, de acordo com as leis e regulamentos em vigor, seja possível a construção nesse solo e que esta constitua o seu aproveitamento económico normal.

  4. A interpretação integrada das regras de classificação e avaliação dos solos impostas pelo Código das Expropriações obriga a que sejam classificados e avaliados como solos para outros fins aqueles cujo destino efectivo ou possível- numa utilização económica normal e tendo em conta as suas circunstâncias e condições de facto - não possa ser a construção, de acordo com as leis e regulamentos em vigor.

  5. E assim será mesmo que, relativamente a tais solos, se verifique alguma das situações previstas no nº 2 do art. 25º do CE.

  6. Na verdade, nos termos do princípio geral enunciado no nº 1 do art. 23º do CE/99, a justa indemnização visa «ressarcir o prejuízo que para o expropriado advém da expropriação, correspondente ao valor real e corrente do bem de acorda com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilidade pública, tendo em consideração as circunstâncias e condições de facto existentes naquela data».

  7. A aplicação "cega" das regras constantes do art. 25º do CE, nos casos em que a construção não é possível face às leis e regulamentos em vigor, (ou nos casos em que, sendo a construção possível, não constitua o aproveitamento económico normal) conduziria à violação do princípio geral do nº 1 do art. 23º, determinando que a indemnização não correspondesse ao valor real e corrente do bem, «de acordo com o seu destino efectivo ou possível numa utilização económica normal».

  8. Aliás, mesmo o nº 1 do art. 26º do CE/99, impõe que «0 valor do solo apto para a construção calcula-se por referência à construção que nele seria passível efectuar se não tivesse sido sujeito a expropriação, num aproveitamento económico normal, de acordo com as leis e os regulamentos em vigor».

  9. A própria redacção da al. a) do nº 2 do art. 25º reforça a interpretação defendida, ao exigir que o acesso rodoviário e demais infraestruturas nela referidas tenham «as características adequadas para servir as edificações nele existentes, ou a construir».

  10. Assim, face ao actual Código das Expropriações, são inconstitucionais, por violação do principio da justa indemnização por expropriação, as normas do nº 1 do art. 23º e nº 1 do art. 26º desse código, quando interpretadas por forma a incluir na classificação de "solo apta para a construção" solos em que, de acordo com as leis e regulamentos em vigor (no caso, em virtude da sua integração em RAN) não é permitida a construção ou esta não constitua a seu aproveitamento económico normal, expropriados para implantação de vias de comunicação.

  11. A interpretação das normas citadas do actual Código das Expropriações segundo a qual os terrenos integrados em RAN - expropriados com o fim de neles se implantarem vias de comunicação - podem/devem ser classificados como aptos para construção viola o princípio constitucional da justa indemnização por expropriação, condensado no art. 62º/2 da CRP, uma vez que conduz a que seja atribuído ao expropriado uma indemnização que ultrapassa o valor real e corrente, ou valor de mercado, distorcendo, deste modo, em benefício do expropriado, a necessária proporção que deve existir entre as consequências da expropriação e a sua reparação.

  12. Porque assim é, na avaliação do solo integrado em RAN, deve seguir-se o laudo do Sr. Perito indicado pelo apelante, único que respeita os critérios legais e atende à realidade da área em causa, distinguindo a parte do solo de culturas arvenses da do solo de vinha em ramada.

  13. Também não pode aceitar-se a avaliação do solo integrado em espaços industriais, já que o laudo majoritário incorreu em lapsos manifestos, para além de utilizar parâmetros desfasados da realidade.

  14. Em primeiro lugar, apesar de considerar aplicável, nos termos do nº 10 do art. 26º do CE, um factor correctivo pelo facto de os expropriados não terem que suportar o risco e o esforço inerentes à actividade construtiva de 5% (cfr. 5º parágrafo de fls. 356 e ponto 11. da matéria assente, o certo é que essa percentagem não foi deduzida no cálculo efectuado (a fls. 357).

  15. A correcção desse lapso conduziria, só por si, a que o valor unitário encontrado para o metro quadrado de terreno fosse corrigido de 51,20 E para 48,64 E, e que o valor da área de terreno classificada como "Espaços Industriais" seria de 99.712,00 E e o próprio valor do terreno considerado «equiparado a apto para a construção industria» - sem prescindir - de 231.759,88 E.

  16. Em termos dum aproveitamento económico normal para a nossa realidade económica, numa região onde predomina a industria tradicional, não pode aceitar-se que se ficcione um aproveitamento industrial em dois pisos, com diferentes custos.

  17. No caso dos autos, tal como considerou o Sr. Perito subscritor do laudo singular, o custo de construção deverá ser fixado em 274,34 E, que haverá de ser multiplicado pelo coeficiente de ocupação do solo de 0,6 m2/m2.

  18. A fixação da percentagem máxima de 15%, a título de localização, qualidade ambientar e equipamentos existentes na zona (nº 6 do art. 26º do CE/99) não se justifica, já que na sua fixação se devem ter em conta as seguintes factos notórios (por serem do conhecimento geral)-. a localização relativa da parcela face ao todo nacional; as acessibilidades de ......... relativamente aos principais centros vizinhos, a conhecida dificuldade de recrutamento de mão-de-obra; a distância de aeroportos ou instalações portuárias; os níveis de investimentos relativamente a outras zonas do país, etc. - e assim, o factor "localização, qualidade ambientar e equipamentos existentes na zona", deve fixar-se em 10%, conforme sustentou o perito indicado pelo apelante.

  19. A douta sentença em crise violou, entre outros, o disposto nos artigos 62º da CRP, nos arts. , 22º a 27º do CE.

TERMOS EM QUE, Dando provimento ao presente recurso, e revogando a sentença em crise, farão Vossas Excelências, Ilustres Desembargadores, a habitual JUSTIÇA" Contra-alegaram os expropriados (fls. 485 ss), sustentando a manutenção da sentença...

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