Acórdão nº 1/08.0EAMDL.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Outubro de 2009

Magistrado ResponsávelLUÍS TEIXEIRA
Data da Resolução21 de Outubro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REC. PENAL.

Decisão: NEGADO PROVIMENTO.

Indicações Eventuais: LIVRO 596 - FLS. 51.

Área Temática: .

Sumário: I-Quer pela sua natureza jurídica quer pelas atribuições concretas enumeradas no artigo 5º, do Decreto-lei nº 274/2007, de 30 de Julho, a ASAE não é um organismo que deva integrar-se no conceito de força de segurança para os efeitos do disposto no artigo 164º, alínea u), da CRP.

II- Nos termos do artigo 15ºdaquele DL a ASAE passou a deter poderes de autoridade e é órgão de polícia criminal.

III- Enquanto órgão de polícia criminal pode não só levar a cabo as tarefas ou actos ordenados pela autoridade judiciária como as que o Código de Processo Penal permita ou exija.

IV- Quer a atribuição da natureza de órgão de polícia criminal por acto legislativo emanado do Governo, quer o exercício ou prática dos actos ao abrigo do CPP, não estão feridos de inconstitucionalidade.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Recurso nº 1.08.0EAMDL.P1.

Processo nº 1.08.0EAMDL.

Acordam em conferência na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I1. Nos autos de processo sumário nº 1.08.0EAMDL, do Tribunal Judicial de Vinhais, foi o arguido B………….., casado, empresário, nascido em 11/01/1969, filho de C………….. e de D……………, natural de Moçambique e residente na Rua …………, n.º …., …º andar, Torre de Moncorvo, Julgado e condenado: - Pela prática de um crime contra a genuinidade, qualidade ou composição de géneros alimentícios e aditivos alimentares, p. e p. pelo art.º 24, n.º 1, al. c) e n.º 2 alínea c) do DL n.º 28/84 de 20 de Janeiro, nas penas de: - 2 (dois) meses de prisão, substituída por 60 dias de multa; e - 80 (oitenta) dias de multa, à taxa diária de € 25,00.

Em cúmulo material, na pena de 140 (cento e quarenta) dias de multa, à razão diária de € 25,00, o que perfaz um total de € 3.500,00 (três mil e quinhentos euros) - pela prática de uma contra-ordenação p. e p. no art.º 58.°, n.ºs 1, al. a) e 2 do DL n.º 28/84 de 20 de Janeiro, na coima de € 400,00 (quatrocentos euros).

Foi ainda: - Decretada a publicidade da decisão condenatória.

- Decretada a perda a favor do Estado dos bens apreendidos.

  1. Não se conformando com a decisão, dela recorre o arguido, formulando as seguintes conclusões: 2.1. O aqui arguido suscitou um incidente de inconstitucionalidade do D.L. 237/2005 de 30 de Dezembro e do artigo 15 do D.L. 274/2007 de 30 de Junho.

    2.2. Este último diploma, através do seu artigo 15, vem conceder à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica “poderes de autoridade” e de “órgão de polícia criminal”, ou seja, tal como outros órgãos de autoridade, a GNR, PSP e PJ (criados por lei).

    2.3. Nos termos da alínea u), do artigo 164 da C.R.P onde refere que “regime das forças de segurança”, legitima extrair o entendimento segundo o qual, quer o regime geral, quer os regimes especiais correspondentes a cada força de segurança, devem integrar a reserva absoluta da competência parlamentar.

    2.4. A Autoridade de Segurança Alimentar e Económica como força policial e de segurança, e estando esta investida de poderes funcionais para a pratica de certos actos de policia, de prevenção e detecção criminal os quais se projectam sobre direitos fundamentais, não pode deixar de ser reclamada a sua regulação em forma de lei – reserva absoluta da competência legislativa da Assembleia da Republica.

    2.5. A acrescer e a reforçar a interpretação invocada, longe esta de ser peregrina, o artigo 272 da CRP, inserida no título respeitante à Administração Publica, tem como titulo e tema “a polícia”, dispondo no seu nº 2. que “as medidas de policia são as previstas na lei, não devendo ser utilizadas para alem do estritamente necessário.” Relevando o legislador constitucional uma acentuada preocupação na possibilidade da actividade policial na prossecução dos seus fins – previstos no nº 1. do artigo 272 da CRP – poder interferir de forma especialmente intensa com direitos e liberdades fundamentais do cidadão.

    2.6. O legislador constitucional entendeu expressar a necessidade das medidas da polícia terem uma previsão na lei – imposição constitucional da tipicidade e de reserva legislativa. Aliás vide “Acórdão do Tribunal Constitucional nº 304/2008 publicado na 1ª serie do D.R, nº 116 de 18 de Junho de 2008.

    Por outro lado; 2.7. O D.L. 274/2007 de 30 de Junho, o governo atribui, através do seu artigo 15, à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica “poderes de autoridade” e de “órgão de polícia criminal”.

    2.8. Os actos praticados in casu, de detenção e constituição de arguido são actos de polícia que implicam a diminuição dos direitos liberdades e garantias dos cidadãos. Direitos fundamentais estes que se encontram consagrados nos artigos 24 e seguintes da C.R.P., e, constituindo estes uma pedra basilar de um estado de direito democrático.

    2.9. Consagrou por isso o nosso legislador constituinte no artigo 165 da C.R.P., que “é da exclusiva competência da Assembleia da Republica legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao governo; (…) b) Direitos liberdades e garantias; (…) 2.10. A Autoridade de Segurança Alimentar e Económica é estatutariamente um órgão de Polícia Criminal definido por decreto-lei governamental e não por via parlamentar como lhe era exigível.

    2.11. A atribuição do estatuto de Polícia, dos seus poderes e competências é uma reserva da competência da Assembleia da República que não foi respeitada.

    2.12. De onde se extrai e se invoca para todos os efeitos legais a inconstitucionalidade do D.L. 237/2005 de 30 de Dezembro e do D.L. 274/2007 de 30 de Junho (nomeadamente no seu artigo 15.) por legislar em matérias abrangidas por reserva de acto legislativo, relativa e absoluta da Assembleia da Republica, nos termos da alínea u), nº 1. do artigo 164 da CRP e do artigo 165, nº 1., alínea b) da C.R.P. e do nº 2 do artigo 272 do diploma fundamental.

    2.13. Ora, os tribunais aplicar normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados. (vide artigo 207 da C.R.P.). o que implicaria uma abstenção pelo Tribunal a quo da aplicação da D.L. que atribui competências á ASAE para proceder como autoridade de policia criminal, dando como inexistentes, ilegais e nulos os actos praticados no uso desta inconstitucionais competências.

    2.14. Pelo que violou o tribunal a quo o vertido no artigo 207 da C.R.P., aplicando o D.L. 237/2005 de 30 de Dezembro e do D.L. 274/2007 de 30 de Junho (nomeadamente no seu artigo 15.) e permitindo inclusive que tal “autoridade de polícia” restrinja os direitos liberdades e garantias do arguido estabelecidas no artigo a C.R.P..

    2.15. Na determinação da medida da pena o juiz e auxiliado pelo artigo 72, nº 2 do C.P., atenderá a todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor do agente ou contra ele. No mesmo artigo, de forma exemplificativa enumera alguns dos factores mais importantes que podem ser tomados em consideração.

    2.16. Alguns dos factores, que por lapso do Tribunal a quo não considerou, tem dignidade judicial para a sua consideração para a determinação da medida da pena; - a quantidade apreendida com relevo jurídico-penal p. p. pelos artigos 24, nº 1. alínea c) do D.L. 28/84, de 20 de Janeiro é de 12,335 Kg. O local onde os produtos se encontravam à venda era uma arca tipo “Iglo” onde se encontravam mais de quinhentos quilos de mercadoria congelada, ou seja, 2% da totalidade dos produtos à venda.

    - A instalação prévia pelo arguido do sistema de HACCP.

    - A intensidade actual da frequência das deslocações à loja pelo arguido (depois deste incidente), os contactos diários com a encarregada da loja, ou seja, um comportamento mais assíduo e diligente, após a ocorrência do ilícito, relevam quer uma fraca intensidade da negligência quer a preparação do agente para a manutenção de uma conduta lícita.

    - A instauração de um processo disciplinar a fim de averiguar a falha nos procedimentos e evitar situações como a presente.

    - A forma colaboradora, espontânea e esclarecida com que o arguido confessou os factos, não os negando, mas esclarecendo a falha.

    2.17. Sem prejuízo da dupla valoração (artigo 72, nº 3 do C.P.), são os factores invocados, relevantes para a determinação da medida da pena, diminuindo ao agente quer a culpa, quer a ilicitude (baixa), quer a necessidade da pena.

    2.18. Caso assim não se entenda, o que só por mera hipótese se admite, julga-se adequada ao agente uma pena de um mês de pena de prisão e uma pena de multa não superior a 40 dias. Obviamente, e atendendo a que a execução de prisão se torna desproporcional, inadequada e desnecessária face às necessidades de prevenção, pois não está em causa a realização de futuros crimes, substituindo a pena de prisão nos termos do artigo 43 nº 1. do C.P. por pena de multa, julgando-se adequada uma pena de 20 dias.

    2.19. Pelo que deveria o Tribunal a quo ter considerado tais factores para a determinação da medida da pena nos termos do artigo 72 e 73 do C.P., facto que não tiveram dignidade na matéria de facto provada e não provada, mas que se julgam relevantes e provados atenta a prova testemunhal, cujas passagens se invoca.

    2.20. Violando assim o Tribunal a quo na sua deficiente e lacunosa apreciação ( com o devido respeito) da matéria de prova carreada para os autos, nomeadamente por consequência o artigo 72 e 73 do C.P.

    2.21. Também não se pode concordar o arguido relativamente à condenação acessória da publicidade da decisão condenatória. Atento os factores referidos, o grau de ilicitude, a culpa diminuta, e essencialmente a desnecessidade de prevenção geral, pois a reafirmação da norma, a sua validade e eficácia estão asseguradas.

    2.22. Atenta a publicidade do ilícito quer nos jornais locais, quer entre a população, a acrescer que se trata de uma vila com pouco mais de dois mil habitantes e foi do conhecimento público tal infracção.

    2.23. Não existindo necessidade acrescida da tutela dos bens jurídicos e da preservação da expectativas comunitárias...

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