Acórdão nº 2813/08.6TALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelPAULO GUERRA
Data da Resolução16 de Dezembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra: I - RELATÓRIO 1.

No processo de recurso de contra-ordenação n.º 2813/08.6TALRA do 2º Juízo Criminal da Comarca de Leiria, a arguida X..., Ldª, com sede na Rua …., em Leiria, em sentença datada de 10 de Março de 2009 que revogou parcialmente a decisão da autoridade administrativa (Inspecção Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território), foi condenada · pela prática da contra-ordenação p. e p. pelos artigos 36º a 40º e 86º, nº 1, al. v) e nº 2, al. c), do Decreto-Lei nº 46/94, de 22 de Fevereiro, na coima de 3.500,00 € (três mil e quinhentos euros) e · pela prática de uma contra-ordenação p. e p. pelos artigos 17.º, n.º 1 e 20.º, n.º 2 do Decreto-Lei nº 239/97, de 9 de Setembro, conjugado com a portaria n.º 178/97 de 11 de Março, em admoestação.

Faz-se notar que a decisão administrativa, datada de 11 de Outubro de 2007, condenara a arguida pela prática da contra-ordenação p. e p. pelas disposições conjugadas pelos artigos 36.º a 40.º e 86.º, n.º 1, al. v) do DL n.º 46/94 de 22 de Fevereiro, numa coima no valor de € 6500, e pela prática da contra-ordenação p. e p. pelo artigo 17.º, n.º 1 do DL n.º 239/97 de 9 de Setembro, conjugado com a Portaria n.º 178/97 de 11/03, numa coima no valor de € 1000, o que, em cúmulo, redundou numa condenação numa coima unitária no valor de € 7000.

  1. Inconformada, a arguida recorreu da sentença condenatória, finalizando a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): «1. Foi a ora recorrente condenada no pagamento de uma coima pela prática de uma contra-ordenação p. e p. nos termos dos arts 36° a 40° e 86° n.° 1 alínea v) do Decreto-Lei n.° 46/94 de 22 de Fevereiro, no valor de 3.500,00€.

  2. A matéria de facto dada como provada é insuficiente para proferir condenação da Arguida quanto à alegada prática da contra-ordenação prevista no artigo 86º, n.° 1 do Decreto-Lei 46/94 de 22.02 por dela não constar que se tenha dado como provado que a arguida tenha efectuado qualquer descarga.

  3. A arguida não efectuou, nem efectua, qualquer descarga de resíduos tratados para o domínio público; 4. A ETAR da arguida, devidamente licenciada, é composta por três lagoas, destinadas a receber os resíduos líquidos produzidos, sendo as duas primeiras obrigatórias e a terceira de carácter facultativo.

  4. Os resíduos, após terem sido tratados em nas duas primeiras lagoas, ficam depositados na terceira, onde acabam por desaparecer pelo efeito da evaporação, não sendo necessário procederá sua descarga.

  5. A terceira lagoa tem capacidade em muito superior á efectivamente utilizada pela Arguida, nunca atingindo o seu limite máximo de águas, sendo que ai se encontra diversas comunidades de animais.

  6. Apenas é imputada à Recorrente o facto de produzir águas residuais, sendo certo que as licenças previstas na lei, no âmbito do Decreto-Lei 46/94 de 22 de Fevereiro, são tipificadas, existindo necessidade de requerer a respectiva licença quando se procede à descarga de águas para os solos ou para cursos de água.

  7. A Recorrente não efectuou qualquer descarga, uma vez que a Recorrente não retira, das lagoas, os resíduos, mantendo-se aqueles ali para efeitos de evaporação, estando por isso fora do âmbito da lei supra referida.

  8. O que a lei pune, é o facto de as descargas serem feitas, para o domínio público ou particular, por efeito de espalhamento em solos ou águas fluviais, sendo certo que a necessidade de licença se traduziria, no presente caso, no facto de a mesma ser necessária, para retirar da terceira lagoa os resíduos e proceder ao seu espalhamento.

  9. Não será necessária qualquer licença para fazer circular as águas residuais pelas lagoas que compõem a ETAR, mas apenas se entenderia como necessário - e que não acontece no presente caso - se as águas dessa última lagoa fossem retiradas para domínio público ou privado.

    11. Não se encontra sequer demonstrado que a Recorrente tenha efectuado qualquer descarga de resíduos tratados, nem tal se presume, sendo certo que efectivamente o não fez.

  10. A entender-se existir culpa da arguida, sempre a mesma seria mitigada, nunca se podendo considerar as infracções como gravosas, sendo que a Arguida delas não retirou qualquer tipo de benefício.

  11. A arguida não praticou por isso qualquer a contra-ordenação de que vem acusada pelo que deverá ser absolvida.

  12. A arguida cumpre todos os requisitos previstos em legislação ambiental referentes à exploração agrícola.

  13. A arguida solicitou a renovação da licença de descarga de resíduos.

  14. Para o caso de se entender que a Arguida praticou a contra-ordenação tendo em conta, a existir infracção, o seu grau reduzido, circunscreve a mera admoestação, com efeito de censura, nos termos do artigo 51° do Decreto-Lei 433/82, os efeitos de prevenção geral e especial inerentes às normas alegadamente violadas.

  15. Termos em que deve ser a decisão que nesta sede se recorre ser revogada e substituída por outra que absolva a arguida e ora recorrente e, em consequência, determine o arquivamento dos autos ou, quando assim se não entender, que substitua a coima aplicada pela sanção de admoestação por se encontrarem reunidos os requisitos para tal.

  16. Ao decidir como o fez, o Tribunal violou, entre outras, as normas previstas nos artigos 36° a 40° e 86° n° 1 alínea v) do Decreto-Lei n.° 46/94 de 22 de Fevereiro, e nos artigos 51° do RGCO.

    (…) Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Exa doutamente suprirá deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, e consequentemente ser a sentença recorrida substituída por outra que absolva a Recorrente da prática da contra-ordenação p. e p. pelo artigo 86° n.° 1 alínea.v) do Decreto-Lei n.° 46/94 de 22 de Fevereiro».

    3.

    O Ministério Público em 1ª instância respondeu ao recurso, opinando que a sentença recorrida deve ser mantida na íntegra, concluindo nos seguintes termos (transcrição).

    1º - Atento o preceituado nos artigos 36°, n.° 2 e 86°, n.° 1, alínea v) e n.° 2. do DL n.° 46/94 de 22 de Fevereiro, resulta que para o preenchimento dos elementos típicos da aludida contra-ordenação é necessário, apenas, a descarga de resíduos e efluentes sem a necessária licença, em domínio público ou particular.

    2º - No caso concreto foi dado como provado, e bem, que para tratamento dos efluentes a arguida construiu uma ETAR, onde estão incluídas três lagoas, para onde vão as águas residuais inerentes à sua actividade, sendo assim rejeitadas as referidas águas para um sistema particular, sem para isso estar devidamente licenciada.

    3º - A arguida, enquanto proprietária das citadas instalações, estava obrigada a obter os devidos licenciamentos para o exercício da referida actividade, bem como a realizar todas as obras que se mostrassem necessárias a essa obrigação, incluindo a de adequação da ETAR aos fins determinados se tal se mostrasse necessário, suportando as despesas inerentes.

    Pelo que se concluiu, e em nosso entender correctamente, que a arguida praticou a contra-ordenação de que vinha acusada.

    4º-- Assim sendo, cremos que se deverá concluir que o Mmº Juiz fez uma correcta avaliação da matéria cm análise, socorrendo-se do preceituado no artigo 127° do C.P.Penal. Mais se deverá concluir que inexiste insuficiência da matéria provada para a decisão de direito, uma vez que a sentença ora recorrida fornece a indicação dos elementos devidos, i. é, de todos os elementos objectivos e subjectivos constitutivos da contra-ordenação em referência e dos necessários à determinação da medida da coima.

    5º- Na verdade, o tribunal consagrou na decisão os factos dados como provados supra-mencionados. os quais só por si permitem a aplicação do direito ao caso nos termos nesta enunciados.

    6º- Nestes termos, tendo presente as normas aplicáveis ao caso, e tendo em atenção a gravidade da contra-ordenação, que é elevada (i.é. ponderando a importância do bem tutelado - visa a protecção do ambiente e tutela a segurança da sua qualidade. mais concretamente a qualidade da água e do solo -. que se desconhece em que medida a Recorrente lesou a qualidade da água e solo, que a mesma possui estação de tratamento de águas. que a rejeição de águas residuais e afluentes foi feita em sistema privado e que a infracção cometida não trouxe beneficio à recorrente), que a recorrente actuou a título meramente negligente, não sendo a culpa elevada (à data do auto de notícia a arguida já possuía a referida licença, estando a mesma caducada. e diligenciou pela sua renovação em Julho de 2007) e não olvidando que a arguida já incorreu em infracções ambientais anteriormente, julgamos que bem andou o Mmº Juiz ao considerar inaplicável a sanção de admoestação (artigo 51º, n°1 do Regime Geral das Contra-ordenações e Coimas) e ao considerar adequada a coima de €3.500,00, sendo certo que a contra-ordenação relativa à falta de licença para rejeição de águas residuais é punida por uma coima que oscila entre € 2.493.99 e €2.493.489,49.

    7° - Em face do exposto, somos de entender que sempre teria o Mmº Juiz que condenar a arguida pela prática da aludida contra-ordenação e aplicar a coima de €3.500,00, não se tendo verificado violação de qualquer princípio ou preceito legal ou a existência de qualquer irregularidade ou nulidade

    .

    4.

    Admitido o recurso e subidos os autos a este Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se, a fls. 551, no sentido de que o recurso não merece provimento, opinando que: « (…) Não há no processo de contra-ordenação recurso da matéria de facto nos termos do n.º 3 do artigo 412° do CPP.

    A matéria de facto é suficiente para a decisão de condenação, por não estarem ausentes da mesma os factos que integram o conceito de descarga (de águas residuais).

    Não há motivo para aplicar à Recorrente uma admoestação, em detrimento da aplicação da coima.

    É nosso parecer que o recurso deve improceder» 5.

    Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, foram colhidos os vistos, após o que foram os...

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