Acórdão nº 2614/06.6TBMTS.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelGARCIA CALEJO
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : As prescrições presuntivas constituem presunções de pagamento, tendo como fundamento e base obrigações que costumam ser pagas em prazo curto e em relação às quais não se costuma exigir recibo de quitação.

Em contrário das prescrições extintivas, as prescrições presuntivas apenas dispensam o beneficiário do ónus de provar o pagamento. A presunção de pagamento por banda do devedor faz deslocar o ónus da prova do não pagamento para o credor. Ou seja, existindo a presunção de pagamento a favor do devedor, competirá ao credor ilidir essa presunção, demonstrando que aquele não pagou. Esta presunção de pagamento não dispensa, porém, o devedor de alegar o pagamento.

A ilisão da presunção de pagamento, só poderá ser feita por confissão expressa do devedor, sendo certo que a confissão extrajudicial só releva quando for realizada por escrito (art. 313º do C.Civil), ou por confissão tácita, considerando-se, neste contexto, confessada a dívida, se o devedor se recusar a depor ou a prestar juramento em tribunal, ou praticar em juízo actos incompatíveis com a presunção de cumprimento (art. 314º do mesmo Código).

O art. 317º al. b) do C.Civil estabelece a prescrição presuntiva relativamente a créditos de comerciantes, sobre coisas vendidas a quem não seja comerciante que se não destinem ao seu comércio (ou porque ele não se dedique a tal comércio ou porque dedicando-se, destine a coisa para uso próprio) e a créditos de industriais desde que a actividade desenvolvida pelo devedor se não destine à sua indústria.

A actividade de um condomínio de um imóvel (no sentido do exercício da compropriedade sobre o imóvel) deve circunscrever-se à gestão e administração do prédio, mais especialmente às partes comuns, o que se efectuará através de actos da assembleia de condóminos e do administrador, pelo que o desempenho de uma actividade comercial ou industrial foge, claramente, à concepção e à finalidade de um condomínio.

Por isso, não podendo um condomínio exercer qualquer actividade industrial, não existe qualquer hipótese de ser aplicado, no caso, a reserva constante na última parte do art. 317º al. b).

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- AA, Serviços de Limpeza Ldª, com sede na Rua de M..., ..., Leça do Balio, Matosinhos, propôs a presente acção com processo ordinário contra Condomínio da BB, com sede na Rua A... F... C... nº …/…, Porto pedindo que a R. seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 15.676,68, acrescida de juros de mora à taxa legal sobre a quantia de 10.126,51 € desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Fundamenta este pedido, em síntese, dizendo que prestou os serviços de limpeza à R. constantes das facturas que junta, que deviam ser pagos no prazo de 30 dias, o que não fez, apesar de ter sido interpelada para o efeito.

A R. contestou alegando, em resumo, que os trabalhos de limpeza a que dizem respeito as facturas, realizados no período compreendido entre Junho de 2000 e Fevereiro de 2001, foram pagos à A., pagamento que se presume, nos termos do art. 317º al. b) do C.Civil.

Termina pedindo se julgue improcedente a acção.

A A. respondeu sustentando que a R. não pagou as limpezas, sendo que o art. 317º al. b) do C.Civil não presume qualquer pagamento da dívida. Por outro lado a R., expressamente e por escrito, confessa a dívida.

Termina pedindo se julgue improcedente a excepção invocada pela R.

O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido o despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes e se organizou a base instrutória, se realizou-se a audiência de discussão e julgamento, se respondeu à base instrutória e se proferiu a sentença.

Nesta julgou-se procedente a excepção da prescrição presuntiva do pagamento invocada pela R. e, em consequência, considerou-se a acção improcedente, absolvendo-se a R. do pedido.

Não se conformando com esta decisão, dela recorreu a A. de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, tendo-se aí, por acórdão de 9-07-2009, julgado improcedente o recurso, confirmando-se a sentença recorrida.

1-2- Irresignado com este acórdão, dele recorreu a A. para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.

A recorrente alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões: 1ª- Salvo o devido respeito que é muito o douto acórdão violou o disposto no artigo 317°, Alínea b) do Código Civil e os artigos 1° e 7° do Código Comercial.

  1. - O douto acórdão faz uma errada interpretação dos artigos 317°, al. b), 314°, 355° e 357º, nº 2, 1436° e 1437° do Código Civil e dos artigos 502° e 552° do Código de Processo Civil.

  2. - A presente acção foi julgada improcedente dado que quer o meritíssimo juiz de primeira instancia quer os Excelentíssimos Desembargadores julgaram procedentes a excepção de prescrição invocada pela Ré.

  3. - Pode-se resumir em duas questões a fundamentação do Douto Acórdão: A) Que a qualidade de não comerciante de um condomínio é facto notório, não necessitando tal facto de ser alegado nem provado: “é o que resulta directamente da natureza jurídico-legal do condomínio que o julgador não pode ignorar” (sic) B) O documento nº 1 junto com a réplica, não impugnada pela Ré, não constitui confissão judicial da dívida.

  4. - Ora esta argumentação com todo o devido respeito que é muito labora em erro.

  5. - Louva-se o acórdão no artigo 1436° do Código Civil, onde são definidas as funções do administrador, para fundamentar o decidido.

  6. - Ora, entende a recorrente que este artigo nada pode ter a ver com a qualificação de comerciante ou não da Ré, ou ainda, sobre se a Ré recebeu a prestação da Autora como particular ou como destinada a uma actividade comercial.

  7. - Como é sobejamente sabido, e isso sim um facto notório, existem muitos condomínios onde se exerce o comércio.

  8. - Esses condomínios, que estiveram em voga nos anos 80 e 90, são construídos exclusivamente por fracções autónomas destinadas ao comercio, em que a Administração do Condomínio, normalmente entregue a empresas especializadas, é responsável pela limpeza das partes comuns, por fazer publicidade para atrair clientes, para gerir certos espaços comuns como espaços para atrair clientes, por exemplo com áreas de divertimento par crianças.

  9. - Exemplos conhecidos desses centros comerciais são os muito conhecidos Shoping Center Brasília e Dallas na Cidade do Porto 11ª- Shoping Center Amoreiras na cidade de Lisboa.

  10. - E um sem número mais de centros comerciais de pequena, médio e grande dimensão que proliferaram por todo o País nas décadas de 80 e 90.

  11. - Ora os serviços de limpeza contratados pelas administrações desses Centros Comerciais, são destinados em exclusivo ao comércio.

  12. - Todos estes exemplos, sobejamente conhecidos, são exemplos de prédios constituídos em propriedade horizontal em que a administração de condomínio contrata serviços, não como um simples particular, mas para os destinar a uma actividade comercial.

  13. - Pelo que não se pode considerar, sem mais, e como facto notório que os serviços de limpeza contratados por um condomínio sejam de não comerciante.

  14. - Na vida quotidiana, os condomínios praticam actos de comércio.

  15. - Mesmo não considerando o exemplo flagrante dos centros comercial constituídos em propriedade horizontal, é normal e correntes muitos prédios (constituídos em propriedade horizontal) terem uma parte habitacional e uma parte denominada comercial, onde existem lojas, normalmente situadas nos pisos térreos.

  16. - Nas denominadas partes comerciais onde só existem loja, o condomínio contrata a limpeza desses espaços.

  17. - Ora esse contrato não pode deixar de se considerar como um acto de comércio.

  18. - Relembrando aqui o que dispõe o artigo 1° do Código Comercial: “A lei comercial rege os actos de comércio sejam ou não comerciantes as pessoas que nele intervêm”.

  19. ...

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