Acórdão nº 1761/06. 97UPRT.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelSEBASTIÃO PÓVOAS
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1. No âmbito do recurso de revista a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça, quanto à matéria de facto, é muitíssimo limitada, apenas podendo averiguar da observância das regras de direito probatório material (artigo 722.° n. ° 2) ou mandar ampliar aquela decisão (artigo 729.°, n.° 3) Só à Relação compete censurar as respostas ao questionário ou anular a decisão proferida na 1.ª Instância, através do exercício dos poderes conferidos pelos n.°s 1 e 4 do artigo 712°.

O Supremo Tribunal de Justiça só pode usar da faculdade do n° 3 do artigo 729.º do Código de Processo Civil, perante patente contradição da matéria de facto apurada pelas instâncias ou se a mesma for de tal modo omissa que se revele insuficiente para ulterior subsunção, essencial para a sorte da demanda.

  1. Sendo um documento particular da pena do recorrente e cuja autoria (letra e assinatura) não foi impugnada pelo recorrido, tem a força probatória a que se refere o artigo 376.º, n.ºs 1 e 2 do Código Civil, ou seja, os factos nele compreendidos “consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante”, sem prejuízo da indivisibilidade da declaração, nos precisos termos do artigo 360.º.

  2. Tal documento apenas faz plena prova da proveniência das declarações nele contidas e de quem as subscreveu valendo, no mais, apenas como declaração confessória.

  3. São pressupostos do enriquecimento sem causa a deslocação patrimonial, o ter ocorrido à custa de outrem e a ausência de causa justificativa.

  4. O enriquecimento sem causa só pode ser invocado a título subsidiário, sendo que a alegação e prova daqueles pressupostos cumpre ao demandante devendo, “in dubio”, considerar-se que a deslocação patrimonial teve justa causa.

  5. A prova da ausência de causa da deslocação patrimonial não se basta com o facto de um dos co-titulares de uma conta conjunta levantar, da totalidade das quantias que se provou terem sido depositadas pelo outro co-titular, se ficaram improvados os motivos porque o fez.

  6. O conceito de causa de pedir é delimitado pelos factos jurídicos dos quais procede a pretensão que o demandante formula, cumprindo às partes a alegação desses factos, nos quais o juiz funda a sua decisão, embora possa atender, ainda que “ex officio”, aos instrumentais, que resultem da instrução e da discussão e aos que sejam complemento ou concretização de outros.

  7. O juiz está limitado pelo princípio do dispositivo, mas a substanciação (ou consubstanciação) permite-lhe definir livremente o direito aplicável aos factos que lhe é lícito conhecer, buscando e interpretando as normas jurídicas. Tal princípio pode mesmo implicar uma convolação da situação jurídica alegada pelas partes e a sua submissão a diferentes normas, desde que não altere a causa de pedir.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA intentou acção, com processo ordinário, contra BB pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de 53.288,00 euros, acrescida de juros desde a citação.

    Alega, nuclearmente, ter, a convite do Réu, acordado com este constituírem uma sociedade em Portugal destinada à importação e exportação de bens; para início da sociedade transferiu a quantia de 10.433.280$00 da sua conta pessoal para uma conta conjunta com o Réu; que este levantou essa quantia e a sociedade nunca foi constituída.

    O Réu contestou e deduziu pedido reconvencional, do qual, oportunamente, o Autor foi absolvido da instância, por procedência da excepção de incompetência internacional.

    Na 6.ª Vara Cível da Comarca do Porto a acção foi julgada improcedente e o Réu absolvido do pedido.

    O Autor apelou para a Relação de Guimarães que confirmou o julgado.

    Inconformado, pede revista, assim concluindo a sua alegação: - Ao contrário do que é afirmado na douta sentença recorrida, o Réu deve ao Autor a quantia de € 53.288,00 (cinquenta e três mil, duzentos e oitenta e oito euros).

    - O documento do Finibanco, datado de 25/06/2001, junto em audiência de julgamento pelo Autor, terá de levar necessariamente a uma resposta diferente à matéria de facto constante dos artigos 1.º a 6.° da Base Instrutória, acima transcritos, que foram incorrectamente julgados pelo tribunal “a quo”.

    - Este documento consiste numa autorização de transferência bancária do Recorrente AA, da sua conta pessoal n.° ..., para a conta bancária conjunta com o Réu com o n.° ..., através da qual consta a seguinte declaração “Autorizo que se faça a transferência do valor de 10.433.280$00 para a conta n.° ..., cujo valor será posteriormente transferido para a Conta Empresa (Sociedade Importadora de Cabinda) a abrir proximamente” - A autorização de transferência dada pelo Recorrente AA, da quantia de 10.433.280$00 para a conta conjunta com o Recorrido n.° ..., foi concedida no pressuposto de ambos virem a constituir em Portugal uma sociedade comercial por quotas (‘a abrir proximamente’), em que seriam sócios o Autor e o Réu, que teria por objecto a importação e a exportação de bens (‘Sociedade importadora de Cabinda’), tendo como objectivo servir para o arranque dos negócios da referida sociedade comercial e para pagar aos fornecedores da empresa, sendo certo também que tal sociedade comercial, nem outra, foi constituída em Portugal pelo Autor e pelo Réu.

    - Nada justifica que o Réu/Recorrido tivesse transferido da conta conjunta n.° ... de que era titular com o Autor/Recorrente, a referida quantia de 10.433.280$00, sem autorização deste, para a sua conta pessoal com o n.° ....

    - Resulta da letra e do espírito do documento acima mencionado que aquele montante transferido teria como objectivo servir para o “arranque” dos negócios da nova sociedade comercial de importação e exportação de bens a constituir em Portugal pelo Autor e pelo Réu.

    - A sentença recorrida julgou incorrectamente a matéria de facto que consta dos artigos 1.º a 6.° da Base Instrutória, devendo os mesmos serem considerados provados com base no documento de autorização de transferência bancária do Finibanco, assinado pelo Autor/Recorrente AA, documento este junto aos autos por este na audiência de julgamento.

    - O Autor alega na Petição Inicial o seguinte:

    1. A quantia total actual, depositada pelo Autor, de 53.288,00€ (cinquenta e três mil, duzentos e oitenta e oito euros), foi posteriormente levantada, pelo Réu, da conta bancária conjunta, atrás mencionada, sem previamente avisar o Autor de tal levantamento (artigo 17° da PI.) b) Não tendo o Réu nunca informado o Autor do destino dos referidos 53.288,00€ (cinquenta e três mil, duzentos e oitenta e oito euros), por si levantados (artigo 18° da P.I.); c) Até hoje nunca nenhuma Sociedade Comercial foi constituída em Portugal pelo Autor e pelo Réu (artigo 19° da P.I.) d) Pelo que o Réu se locupletou ilegitimamente e fez sua a quantia actual de 53.288,00€ (cinquenta e três mil, duzentos e oitenta e oito euros), que o Autor depositou naquela conta bancária conjunta.

      - A matéria de facto atrás referida, alegada pelos Autores nos artigos 17°,18°, 19° e 20.° da P.I., que é controvertida, não foi incluída na base instrutória, como devia ter sido, carecendo ser averiguada, por ser relevante para se decidir sobre a existência ou inexistência de enriquecimento sem causa e a exigibilidade imediata do valor do pedido.

      -Isto significa haver a necessidade de ampliar a matéria de facto, em ordem a constituir base suficiente para a decisão do direito, nos termos do artigo 729° n.° 3, do Código Civil.

      -Deste modo devera ser anulado o acórdão recorrido e ordenada a baixa dos autos à relação para ampliação da matéria de facto, nos termos sobreditos, devendo a causa ser novamente julgada, em conformidade com o disposto nos artigos 729° n.° 3 e 730° do Código do Processo Civil.

      -Ficou provado que “a quantia total depositada...

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