Acórdão nº 842/06.3TTAVR.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução18 de Novembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA REVISTA Sumário : 1. Os contratos de trabalho portuário constituem verdadeiros contratos de trabalho e estão sujeitos à regulamentação especial que os contempla (a LTP e diplomas conexos), à lei subsidiária para que aquela primacialmente remete (a LTT) e, enfim, às leis gerais do trabalho (LCT e Código do Trabalho, consoante os casos).

2. Apesar de não o consignar expressamente, a LTP tornou possível a contratação de pessoal eventual, ao revogar o Decreto-Lei n.º 151/90, de 15 de Maio, extinguindo o anterior regime de exclusividade do direito à ocupação dos postos de trabalho por parte dos trabalhadores do contingente de cada porto, e ao prever, em sede de regulação do exercício da actividade de cedência temporária de trabalhadores portuários, que se aplica subsidiariamente à actividade das empresas de trabalho portuário o regime do trabalho temporário (artigo 9.º, n.º 3, da LTP).

3. Encontrando-se a ré licenciada para o exercício da actividade de empresa de trabalho portuário, nada mais lhe é exigível, no plano administrativo, para exercer a actividade de cedência temporária de trabalhadores portuários.

4. O facto de não ser materialmente possível obter a qualificação que a lei entende indispensável para a validade dos contratos de trabalho portuário não a torna dispensável, nem é de molde a conferir, na sua falta, validade aos mesmos.

Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 21 de Novembro de 2006, no Tribunal do Trabalho de Aveiro, AA e BB intentaram acções, com processo comum, emergentes de contrato de trabalho contra a ASSOCIAÇÃO DO TRABALHO P... (ETP) DE A..., as quais, mais tarde, vieram a ser apensadas, formulando os pedidos que se passam a transcrever, no que agora releva: O 1.º AUTOR: «I. Se declare que, por a Ré não ser possuidora de autorização, registo ou do respectivo alvará de empresa de trabalho temporário, é (são) nulo(s) o(s) contrato(s) de trabalho do autor com esta, ou II. Que o(s) contrato(s) celebrado(s) com o Autor é (são) nulo(s), por incumprimento dos requisitos previstos na legislação própria; seja como for, III. Se declare que, assim, e por determinação legal, o contrato existente é um contrato sem termo, celebrado entre o autor e a ré; IV. Se declare, ainda, que o despedimento do autor é nulo, por não existir justa causa e por não ter sido precedido de processo disciplinar, daí pedindo que V. A Ré deve ser condenada a reintegrar o A. como seu trabalhador, com a categoria de estivador, do tipo B, e as funções e remunerações inerentes, ou, em momento próprio, condenar em substituição no pagamento da indemnização correspondente à antiguidade, caso o autor venha a optar pela não reintegração; VI. Deve ainda a Ré ser condenada a pagar ao A. a quantia de € 23.234, acrescida de juros legais, contados desde o momento da citação até integral e efectivo pagamento, devida a título de retribuições vencidas e vincendas, que o A. deixou de auferir, desde 30 dias antes da propositura da presente acção até à data da sentença, férias e subsídios de férias e de Natal, VII. Remetendo para sede de liquidação em execução de sentença os créditos referentes às diferenças salariais (incluindo de subsídios de férias e de Natal), diferenças de valor da remuneração horária relativa às horas extraordinárias, diuturnidades e, ainda, o respeitante ao prémio mensal de assiduidade, subsídio de regularidade e prémio de produtividade; VIII. Seja condenada a ré a pagar ao autor juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde a data de vencimento de cada uma das diferenças ou prestações em falta, até ao momento do seu integral e efectivo pagamento, […].» O 2.º AUTOR: «I. Se declare que, por a Ré não ser possuidora de autorização, registo ou do respectivo alvará de empresa de trabalho temporário, é (são) nulo(s) o(s) contrato(s) de trabalho do autor com esta, ou II. Que o(s) contrato(s) celebrado(s) com o Autor é (são) nulo(s), por incumprimento dos requisitos previstos na legislação própria; seja como for, III. Se declare que, assim, e por determinação legal, o contrato existente é um contrato sem termo, celebrado entre o autor e a ré; IV. Se declare, ainda, que o despedimento do autor é nulo, por não existir justa causa e por não ter sido precedido de processo disciplinar, daí pedindo que V. A Ré deve ser condenada a reintegrar o A. como seu trabalhador, com a categoria de estivador, do tipo B, e as funções e remunerações inerentes, ou, em momento próprio, condenar em substituição no pagamento da indemnização correspondente à antiguidade, caso o autor venha a optar pela não reintegração — ao que acrescerá, pelo facto de o Autor se encontrar, ao momento do despedimento, de baixa médica, i.e., em situação de incapacidade temporária, por conta de um acidente de trabalho sofrido nas instalações da Ré, quando trabalhava por conta e interesse desta, pelo que, a não optar pela reintegração, terá ainda direito ao acréscimo preceituado no artigo 306.º do Código do Trabalho, VI. Deve ainda a Ré ser condenada a pagar ao A. a quantia de € 24.234, acrescida de juros legais, contados desde o momento da citação até integral e efectivo pagamento, devida a título de retribuições vencidas e vincendas, que o A. deixou de auferir, desde 30 dias antes da propositura da presente acção até à data da sentença, férias e subsídios de férias e de Natal, VII. Remetendo para sede de liquidação em execução de sentença os créditos referentes às diferenças salariais (incluindo de subsídios de férias e de Natal), diferenças de valor da remuneração horária relativa às horas extraordinárias, diuturnidades e, ainda, o respeitante ao prémio mensal de assiduidade, subsídio de regularidade e prémio de produtividade; VIII. Seja condenada a ré a pagar ao autor juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde a data de vencimento de cada uma das diferenças ou prestações em falta, até ao momento do seu integral e efectivo pagamento, […].» Alegaram, em resumo, que foram admitidos ao serviço da ré, o primeiro, em Agosto de 2002, e o segundo, em Junho de 2001, para desempenharem as funções de estivador, sendo celebrados sucessivos contratos, que a ré denominou «contrato de trabalho temporário portuário», não correspondendo à realidade o motivo indicado para a sua celebração, pois está em causa a satisfação de necessidades permanentes da ré, donde serem os contratos nulos e existir um contrato de trabalho sem termo, e também porque se verificaram mais que duas renovações, acrescendo que a ré não está licenciada para a actividade própria das empresas de trabalho temporário, pelo que, também deste ponto de vista, são nulos os contratos celebrados.

Mais aduziram que, em 25 de Novembro de 2005, quando se apresentaram ao serviço, foram ambos informados de que não havia mais trabalho para eles, o que configura um despedimento ilícito, que provocou danos não patrimoniais a ressarcir; alegaram, ainda, que prestaram trabalho ao sábado, que devia ser remunerado como trabalho extraordinário, tal como o trabalho prestado em dias feriado e de folga, e que a ré não lhes pagou diuturnidades, o prémio mensal de assiduidade, o subsídio de regularidade e o prémio de produtividade, conforme o estipulado no CCT aplicável.

As acções, contestadas pela ré, foram julgadas totalmente improcedentes e, em consequência, a ré foi absolvida dos pedidos formulados pelos autores.

2.

Irresignados, os autores apelaram para o Tribunal da Relação de Coimbra, que confirmou a sentença impugnada, negando provimento ao recurso de apelação, sendo contra esta decisão que os autores se insurgem, mediante recurso de revista, em que pedem a revogação do acórdão recorrido ao abrigo das conclusões seguintes: «1. (I) O regime jurídico aplicável in casu deverá ser: 2. entendem modestamente os ora Recorrentes, o preceituado no (até agora afastado) regime jurídico do trabalho temporário (RJTT, do Decreto-Lei n.º 358/89, de 17 de Outubro), 3. (i) quer por força da remissão legal prevista no próprio regime legal do trabalho portuário (RJTP), designadamente o seu artigo 9.º, n.º 3, do próprio Decreto-Lei 280/93, de 13 de Agosto, o qual remete, em caso de omissão, para a legislação do RJTT, 4. (ii) quer por ser o que directamente versa sobre o caso material em mérito, 5. por se tratar, ao fim e ao cabo, de um caso de regime de trabalho temporário, dado inexistir tal previsão especial, de trabalho temporário, em sede de (regime jurídico do) trabalho portuário, 6. o que não aconteceu em sede de douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, onde surge inibida a aplicação de tal regime (RJTT) — que perfilhou pela inibição deste, quando deveria ter postulado pela sua execução —, 7. de onde deverá ser aplicável in casu o regime de nulidade (do contrato de trabalho) especial ali previsto, i.e., e a final, a reintegração dos Recorrentes como trabalhadores efectivos da empresa Ré por nulidade do contrato e situação fáctica em mérito, – (a) quer por inexistência, por parte da Ré, de alvará bastante (a qual possui a licença para o exercício da actividade portuária, e não para a laboração de cedência de mão--de-obra temporária), – (b) quer por falta de autorização, por parte da entidade legal competente, ou, ainda, – (c) quer por falta de registo em listagem própria — em sequência respectiva, arts.° 7.º, n.º 1 e 5.°, do RJTT —, – (d) ou por renovação superior a duas ocorrências, ou – (e) por ultrapassar o limite temporal legal de um ano — [artigos] 20.º e 23.º do RJTT e 139.º e 141.º do Código do Trabalho — , – (f) ou por ilegalidade quanto ao motivo, ou (g) por fraude à lei —, – tudo de molde a converter os ditos contratos de trabalho, de termo certo a contratos efectivos.

8. (II) Quanto ao regime de nulidade (e respectivas consequências) cabido in casu: 9. a consequência atribuída (à nulidade contratual) deveria ter sido a da...

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