Acórdão nº 307/09.1YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Setembro de 2009

Magistrado ResponsávelMÁRIO CRUZ
Data da Resolução17 de Setembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA Legislação Nacional: ARTº 123 CIRE, ARTº 156 CPEREF E ARTº 12 Nº 1 CC Sumário : I. Na notificação de resolução de negócio feita pelo Administrador em favor da massa, tem o Administrador de indicar os concretos factos fundamento da medida II. Só dessa forma está o impugnante em condições de impugnar a resolução.

  1. A deficiência de fundamentação do acto não pode ser suprida em sede de contestação à acção de impugnação, com indicação de novo quadro factual ou outros vícios.

  2. Apesar de o CIRE contemplar prazos elegíveis mais alargados que o CPEREF para serem incluídos como fundamento de resolução de negócios em favor da massa, não pode a retroactividade atingir negócios jurídicos ou seus efeitos cuja possibilidade de destruição jurídica já não eram passíveis de ser alcançados face à lei antiga, por se encontrar caducado tal direito face a esta.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I Relatório AA, residente em Quinta da Beloura – Sintra, instaurou contra A Massa insolvente de “BB”, acção destinada a obter a “revogação” de acto do Administrador da Massa, que, por considerar prejudicial a esta o acto de venda celebrado em 2003.07.31 que BB havia feito ao A., de ½ de uma fracção autónoma de um imóvel, decidiu resolver tal contrato.

    Na referida acção formulou os seguintes pedidos: - que se declare que o DL n.º 53/04 de 18 de Março (que aprovou o CIRE) não tem aplicação ao acto celebrado em 2003.06.13 ou 2003.07.31.

    - que se considere que face ao disposto no art.° 156.° nº.1-a) do Dec-Lei 132/93 (que aprovou o CPEREF), caducou e ou prescreveu o direito de poder ser invocada a resolução do acto constante da decisão impugnada, no caso ora em análise, em 30 de Março de 2004, - que se reconheça que, em face do disposto no art.° 156.°, n.º 3 do mencionado diploma, ficou precludido o direito do D.º Administrador de Insolvência declarar a resolução do negócio jurídico celebrado e concluído em Junho de 2003 por ter decorrido lapso de tempo superior àquele que a norma legal prevê para o efeito, dado que os elementos ora em causa constam dos processos apenso a este processo de insolvência.

    - que se reconheça que a decisão impugnada foi ilegal e nula com as legais consequências ou, caso assim se não entenda: - que a impugnação seja julgada procedente por provada, revogando-se o acto impugnado, porquanto, da prova produzida não se verificam os legais pressupostos para a resolução em causa - que seja reconhecido ao impugnante o direito de uso e fruição do bem em causa a que se refere o art.° 1.305.° do CC, até ao transito em julgado da decisão; - que seja reconhecido ao impugnante o direito de retenção a que se refere o art.º 755.° do CC no que se refere às benfeitorias introduzidas na coisa.

    Por mera hipótese de raciocínio, e por mero dever de patrocínio, em caso de improcedência da impugnação, o que não se espera, - que seja a massa insolvente condenada a restituir ao impugnante não só os valores despendidos pelo A. na aquisição ao insolvente da metade do bem em causa - € 110.000,00, em dobro em face do disposto no art°.442 n°.2 do CPC, e bem assim o valor das benfeitorias introduzidas, cujo valor se relegará para execução de sentença uma vez que as mesmas não se encontram nesta fase liquidadas, a que acresce os juros de mora à taxa legal até efectivo pagamento" Para o efeito foi alegado que: - O CIRE só entrou em vigor 180 dias após a sua publicação (em 15 de Setembro de 2004) ; - ter ocorrido intempestividade da resolução, face ao disposto no art.156.º-1-a) e c) e 3 e 158.º-a) do CPEREF e 303.º do CC.; - foram violados os arts. 16.º, 17.º e 62.º da Constituição, ofendendo as regras da não retroactividade das leis e o caso julgado; - a resolução do negócio teria de ocorrer através de acção judicial instaurada pelo Administrador contra o terceiro insolvente, por apenso nos autos, uma vez que o negócio de compra e venda era um negócio formal, não sendo também por isso aplicável o art. 123.º do CIRE.- cfr. art. 126.º-1 e 2; - não foram invocados pelo Administrador os factos e pressupostos legais previstos no art. 120.º-2 e 4 em que pretende apoiar a resolução - a acção do administrador corresponde a uma acto de vingança pelo facto do pai do A. ter apresentado queixa crime contra ele; - serem falsos os factos atinentes à invocada simulação, ignorando o A., designadamente, a situação económica do vendedor insolvente; - inexistir má fé negocial; - lhe assiste o direito de retenção do bem porque é dono da fracção e foi pago o preço, consoante decisão já transitada em julgado, além de que nela realizou também benfeitorias, de boa fé; A Massa Insolvente de “BB” contestou a acção, alegando que: - o CIRE entrou em vigor em 15 de Setembro de 2004 mas aplica-se quer quanto às questões processuais quer às materiais; - mesmo considerando aplicável o CPEREF, a resolução do negócio continua a ser formal e substancialmene válida e eficaz- art. 157.º do CPEREF; - os fundamentos invocados para a resolução são verdadeiros; - a venda em causa foi simulada e com o único intuito de defraudar os credores do insolvente BB.

    Deduziu ainda pedido reconvencional, em que pediu que: - fosse reconhecida a validade e eficácia da resolução da compra e venda de metade da fracção “E”, operada pela carta registada junta como doc. n.º 1, e em consequência, a acção improceder; quando não, - fosse declarada a nulidade da compra e venda outorgada pelo Insolvente e pelo A., consubstanciada em escritura de 2003.07.31, por ser simulada e, em consequência, o A. condenado a entregar a metade da fracção autónoma “E” em causa à Massa Insolvente. Ou, quando assim se não entenda, - decretar-se a resolução dessa venda, deferindo-se o pedido reconvencional subsidiário nesse sentido. Ou, quando não, - ser julgada procedente a impugnação dessa mesma compra e venda ao abrigo do art. 157.º do CPEREF e, em consequência o A. condenado a entregar a metade da fracção autónoma em causa à Massa Insolvente para a qual reverterá livre de ónus ou encargos; - com cancelamento dos registos efectuados em consequência da escritura pública de compra e venda ou quaisquer outros que eventualmente se venham a efectuar relativamente ao bem em causa. Quando não procedam todos os pedidos anteriores, então - que seja o A. condenado a pagar à Massa insolvente a quantia de € 220.000, correspondente ao preço da metade da fracção que até então terá adquirido e não pagou ou, no mínimo, € 110.000 (diferença entre o preço real e o declarado como pago).

    O A. replicou, alegando que: - a contestação foi apresentada intempestivamente; - a reconvenção é inadmissível, não podendo a Ré invocar a impugnação pauliana por a ela se não referir o documento resolutivo que está na origem da presente acção de impugnação; - má fé processual da Ré; - o valor da reconvenção deveria ser € 110.000,00 A R. treplicou No despacho saneador (fls. 312) foram decididas as questões que se prendiam com a tempestividade da contestação (considerada tempestiva), admissibilidade da reconvenção (admitida), aplicação da lei no tempo (aplicabilidade do CIRE), inconstitucionalidade (não aceite) e validade formal da resolução (considerando-se ter a mesma sido feita pelo meio próprio).

    Quanto à caducidade do direito de o Administrador da Massa suscitar a resolução, foi relegado o seu conhecimento para final, porque foi entendido estar dependente do conhecimento da data em que o Administrador teria tido conhecimento dos factos que servem de fundamento à defesa.

    Da parte desfavorável do saneador foi interposto recurso pelo A., ora impugnante (fls. 346), que também reclamou quanto ao despacho de condensação (fls. 496).

    A Ré, por sua vez, pediu esclarecimentos, sobre as razões pelas quais se decidiu relegar para fase posterior o conhecimento quanto à caducidade da resolução (entendendo que havia elementos para desde logo julgar não verificada a caducidade); reclamou ainda quanto à falta de inclusão de factos na base instrutória. (fls. 351 e 354) O recurso do A. foi admitido como agravo, com subida em separado (fls.554 e No mesmo despacho, foram decididas as reclamações.

    No decurso da instrução, e uma vez observado o contraditório, foi fixado efeito devolutivo ao agravo. (fls. 761).(1) Efectuada audiência de discussão e julgamento, foram dadas as respostas aos quesitos da base instrutória (fls. 1535) e proferida Sentença em que se decidiu: - julgar improcedente a excepção de caducidade invocada pelo A. quanto à resolução do negócio em prejuízo da Massa (estando por isso o Administrador em tempo para poder resolver o negócio jurídico pelo qual o A. adquirira a ½ da fracção em causa a BB); - julgar no entanto procedente a acção, considerando sem efeito a resolução operada pela carta de fls. 48 e 49 do Administrador da Ré ao A., em que aquele o notificava dessa decisão e improcedente a reconvenção.

    - absolver a R. do pedido de condenação por litigância de má fé. (fls. 1548- 1565), Inconformada com a Sentença veio a Ré a recorrer (fls. 1574).

    O recurso foi admitido como apelação, com subida imediata e efeito devolutivo. (fls. 1578).

    Alegou a Ré (fls. 1607) (2) e contra-alegou o A.(fls. 2064).

    Nas contra-alegações do A. pediu ele também a condenação da Ré como litigante de má fé e ainda, subsidiariamente, para o caso de o recurso proceder, a apreciação dos pedidos subsidiários que formulou na p.i.

    A Relação justificou que não podiam ser apreciadas quaisquer das questões decididas já no saneador; entendeu que não relevavam para o processo as decisões proferidas noutros apensos; decidiu que não podia apreciar a má fé do ex-mandatário do insolvente, a existência de venda litigiosa, a existência de crédito litigioso, a nulidade da cessão da posição contratual e o conhecimento de insolvência iminente, por em linhas gerais, tais matérias não estarem contempladas no acto resolutivo que servia de fundamento à acção.

    Entendeu também que não podia reeditar-se a questão...

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