Acórdão nº 125/08.4TTMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEREIRA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: PROVIDA.

Indicações Eventuais: LIVRO 94 - FLS. 139.

Área Temática: .

Sumário: I- Considera-se prejuízo sério uma mudança na vida do trabalhador que se traduza numa alteração substancial das suas condições de vida, que se não restringe a prejuízos patrimoniais, podendo reflectir-se em aspectos de natureza pessoal, profissional, familiar e económica.

II- Essa mudança deve traduzir-se em algo acentuadamente perturbador para a vida do trabalhador, em qualquer dos aspectos assinalados, não bastando os simples incómodos ou transtornos que uma alteração de local de trabalho, como regra, implica.

III- Ocorre prejuízo sério para a trabalhadora, assistindo-lhe o direito a resolver o contrato, mediante indemnização, uma mudança do local de trabalho promovida pelo empregador que implique para a mesma, uma de duas situações: a) Passar a ter de fazer diariamente 120 Kms em viatura, por vias de tráfego muito intenso, ignorando se poderá chegar a tempo de recolher sua filha de três anos do infantário onde se encontra em virtude do estabelecimento encerrar às 19,00 horas; b) Passar a fazer-se acompanhar nessa viagem de sua filha, a fim de a deixar num outro infantário, perto do novo local de trabalho, cujas condições se ignoram, o que implica levantar diariamente a criança bem cedo, para que a mãe chegue a horas ao trabalho, dada a distância a percorrer e as dificuldades de trânsito, bem como retornar a casa sem saber as horas de chegada dadas as referidas dificuldades de tráfego.

IV- Constituindo a maternidade um valor social eminente, competindo aos pais cuidar e tratar dos filhos, qualquer desses valores seria irremediavelmente posto em causa, nas mencionadas hipóteses, pois, na realidade, a trabalhadora ficaria praticamente sem tempo, nem disponibilidade para cuidar, tratar, acarinhar e educar a filha – em suma, para exercer o papel de mãe.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Reg. 403 Apel. 125.08.4TTMAI.P1 (PC 125.08.4TTMAI) Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B…………. instaurou a acção declarativa de condenação com processo comum emergente de contrato individual de trabalho, contra C………….., pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a quantia de € 101.286,00, acrescida de juros, a título de indemnização pela resolução do contrato de trabalho a que procedeu por lhe advir prejuízo sério com a mudança de local de trabalho operada pela ré.

A ré contestou invocando que não se verifica justa causa para o resolução do contrato por parte da autora.

A Autora apresentou resposta.

Teve lugar a realização de audiência preliminar, tendo sido proferido despacho saneador, seleccionada a matéria de facto assente e elaborada a base instrutória, que não vieram a sofrer reclamação.

Procedeu-se a julgamento, tendo-se respondido à matéria de facto sem reclamação.

Proferida sentença foi a acção julgada totalmente improcedente e a ré absolvida do pedido.

Inconformada com esta decisão dela recorre a autora, concluindo do seguinte modo: 1.- A apelada, sob invocação de mudança total do seu estabelecimento, comunicou m 10.Maio.2007 à apelante que iria mudar as suas instalações e local de trabalho de ………, na Maia, para ……., em Estarreja; 2.- A sentença recorrida, dando como não provada a matéria de facto constante dos itens 1º, 3º, 4º, 5º, 13º, 14º, 17º a 28º, 31º a 33º, decidiu que tal mudança não acarretava prejuízo sério à apelante, julgando a acção totalmente improcedente, cometendo assim a sentença recorrida erro na apreciação da matéria de facto, violando o disposto nos artºs 315º nºs. 2, 3, 4 ; 441º nºs. 1 e 3 alínea b) ; 443º n.º 1 do Código do Trabalho; 3.- Violou de igual modo o disposto no art. 59º n.º1 alínea b) da Constituição da República Portuguesa; 4.- Que este Tribunal pode reapreciar e modificar, tendo como provados os factos constantes dos quesitos acima indicados, assim alterando a matéria de facto fixada pela instância e decidindo no sentido peticionado nesta acção, uma vez que se verificam todos os factos que constituem a causa de pedir, e que por isso foi causado à apelante com a referida mudança prejuízo sério que lhe confere direito a resolver a relação laboral sob invocação de justa causa – art. 712º n.ºs 1 alíneas a) e b) e 2 CPC; 5.- Por estipulação contratual, podem as partes alargar ou restringir tal faculdade de despedimento – art. 315º n.º 3 C.T.; 6.- À relação jurídico-laboral em questão é aplicável o Contrato Colectivo de Trabalho para o Sector Transitário publicado no BTE, 1.ª série, n.º 1, de 08.01.2005; 7.- Em cujos termos o empregador só é autorizado a transferir o trabalhador para outro local de trabalho para uma localidade diversa daquela onde se situa o estabelecimento onde presta serviço, desde que ocorra mudança total ou parcial da dependência onde presta serviço, sem prejuízo sério para o trabalhador e que, não ocorrendo tal condição, pode o trabalhador rescindir imediatamente o contrato, tendo direito à indemnização prevista no CCT. – – Cláusula 16.ª n.º 1 alínea b); n.º 4 alínea b); n.º 2; 8.- Subsidiariamente, não se provou que a mudança total de local de trabalho não causasse prejuízo sério à apelante e assim tal cláusula impõe à apelada a prova de que tal não ocorreu, não sendo autorizada a apelada fazer tal transferência - o que esta não logrou fazer, ocorrendo violação do referido clausulado.

  1. - Tendo julgado improcedente a acção, o tribunal a quo já não conheceu da questão relativa à determinação do valor que representava na remuneração mensal da apelante, à data da resolução contratual, o benefício do veículo disponibilizado pela apelada àquela, nos termos e para os efeitos do cálculo do montante indemnizatório a que aludem os arts. 315º n.º 4 e 443º n.º 1, por tê-la por prejudicada, pelo que deve proceder o pedido e se reconheça com justa causa a decisão, necessário se tornando conhecer também dessa parte do pedido, julgando-se assim totalmente procedente esse mesmo pedido.

  2. - Termos em que deve ser julgada procedente a presente apelação e em consequência decidir-se pela procedência do pedido na acção e condenando-se a apelada no pedido.

    A ré respondeu ao recurso pugnando pela sua improcedência.

    O Exmo. Senhor Procurador – Geral Adjunto nesta Relação emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso. Parecer a que respondeu a autora, mantendo os seus pontos de vista.

    Foi recebido o recurso e colhidos os vistos legais.

  3. Matéria de Facto Na primeira instância foram considerados provados os seguintes factos: 1. A Ré dedica-se à actividade de transitário de transportes internacionais de mercadorias de longo curso.

  4. No desenvolvimento dessa sua actividade, mediante contrato de trabalho verbal, admitiu a Autora ao seu serviço em 01.Janeiro.1991.

  5. Para esta desempenhar, mediante retribuição, funções administrativas nos escritórios da Ré, sitos em ……., na Maia, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, inerentes à categoria profissional de “oficial de 1ª”.

  6. À data da cessação do contrato de trabalho a Autora auferia um vencimento mensal de € 2.297,00.

  7. A que acrescia subsídio de refeição diário de € 5,37, por dia útil de trabalho.

  8. Tinha atribuído em permanência, para sua utilização na vida profissional e pessoal, um veículo automóvel utilitário ligeiro da Ré, com todas as despesas, de combustível, seguros, reparação e manutenção ao mesmo inerentes por esta suportadas.

  9. A Ré, sob invocação de mudança total do seu estabelecimento, comunicou à Autora no dia 10.Maio.2007 que iria mudar as suas instalações e local de trabalho para …………..

  10. Tendo em seguida enviado à Autora uma carta datada de 17.Maio.2007, junto dada por reproduzida para os legais efeitos, em que lhe confirmava essa mudança total do seu estabelecimento e local de trabalho da Autora para a localidade de …….., concelho de Estarreja, a ocorrer nos dias 14 e 15.Julho.2007.

  11. Dando ordem à Autora para se apresentar no seu novo local de trabalho no dia 16.Julho.2007, à hora habitual do início do período de trabalho, a fim de ali o prestar à Ré.

  12. A Ré confirmou à Autora, de forma clara e definitiva e sem margem para quaisquer dúvidas, que tal mudança era irreversível, disponibilizando-se para tentar resolver consensualmente com a Autora qualquer litígio dali decorrente, por carta que lhe enviou datada de 04.06.2007.

  13. A Autora comunicou à Ré a resolução do vínculo laboral com fundamento em justa causa, por carta que lhe enviou em 23.06.2007 sob registo postal n.° R0288046274PT, com aviso de recepção, e que esta recepcionou em 26.06.2007.

  14. A Autora residia então e reside na Rua …….., em ……, Maia, junto à Rua ………, entre a Areosa e Ermezinde.

  15. O que a Ré bem sabia.

  16. Na carta em que a Autora comunicou à Ré que esta deveria considerar resolvido o contrato de trabalho com fundamento e sob invocação de justa causa, manifestou-lhe também a irretratabilidade dessa sua decisão, na verificação da ocorrência de tal mudança do seu local de trabalho.

  17. Posteriormente veio a Ré, por circular interna, informar todos os trabalhadores, incluso a Autora, da alteração da data da mudança das instalações para ………...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT