Acórdão nº 1466/08.6TBPRD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelANABELA DIAS DA SILVA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: REVOGADA A DECISÃO.

Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO - LIVRO 332 - FLS 42.

Área Temática: .

Sumário: I - Se o réu-marido, comerciante em nome individual, exerce a sua actividade no estabelecimento comercial sito no locado, e continuando a fazê-lo, autorizou ou permitiu que a sociedade «F………., Ldª» aí, conjuntamente consigo, exercesse também o seu comércio, por os réus serem os únicos sócios da aludida sociedade, sendo o réu-marido dela gerente, e ainda a circunstância da sociedade carecer de local para continuar a sua actividade em consequência do encerramento do seu estabelecimento comercial, não se está perante qualquer cessão da posição contratual de locatário, nem um sub-arrendamento, nem mesmo um empréstimo ou comodato.

II - Tal acto é em tudo equiparável àqueles outros e tipificados negócios, considerando os efeitos que dela decorrem, já que, por via dessa autorização, a sociedade ficou juridicamente legitimada a utilizar o local arrendado para o exercício da sua actividade comercial, não obstante o réu-marido, manter-se no uso e fruição do locado, embora vendo esses seus poderes limitados pelos direitos que conferiu àquela sociedade.

III - Verifica-se uma alteração da qualidade do locatário que configura uma cedência de parte, não especificada, do locado, dependente da autorização do senhorio, visto tratar-se duma cedência não permitida por lei, cfr. art.° 1112.° do Código Civil.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Apelação Processo nº 1466/08.6 TBPRD.P1 Tribunal Judicial de Paredes – ..º juízo cível Recorrentes – B………. e mulher Recorridos – C………. e mulher Relator – Anabela Dias da Silva Adjuntos – Desemb. Sílvia Maria Pereira Pires Desemb. Henrique Antunes Acordam no Tribunal da Relação do Porto I – C………. e mulher, D………. intentaram no Tribunal Judicial de Paredes a presente acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra B………. e mulher, E………., pedindo que os réus fossem condenados a ver declarada a resolução do contrato de arrendamento referido em 3, 4, 5, 6 e 7 da petição inicial e, em consequência condenados a despejar, de imediato, o rés-do-chão e um anexo para quarto de banho, entregando-os livre de pessoas e coisas.

Alegaram para tanto que são donos e legítimos proprietários de um prédio urbano, sito em Paredes, que melhor identificam, tendo o antepossuidor do mesmo, por escritura pública de 1.06.1997, dado de arrendamento ao réu marido o respectivo rés-do-chão e um anexo para casa de banho, para o exercício, por este, de comércio a retalho de panos, tecidos e roupas feitas; esse contrato foi realizado pelo prazo de 1 ano, mediante o pagamento da renda mensal de 1.500$00, a pagar no 1.º dia útil do mês a que respeitasse; foi ainda estipulado que o arrendatário não podia dar ao locado outro destino sem o consentimento escrito do senhorio. Tal contrato mantêm-se vigente e a renda actual é de € 89,83.

Em Fevereiro de 2008 os autores tomaram conhecimento que os réus haviam cedido gratuitamente, sem sua autorização ou conhecimento, o uso do locado à sociedade “F………., Ldª”. Esta sociedade, até Junho ou Julho de 2003, teve o seu estabelecimento comercial noutro local da cidade de Paredes, mas desde que o mesmo aí encerrou e até 9.08.2007, ininterruptamente, passou a utilizar o arrendado como seu estabelecimento, aí comercializando artigos de confecção, sapataria e tecidos, e como sua sede, aí recebendo correspondência, encomendas e fornecedores. Aliás quando foi requerida a insolvência dessa sociedade, a sua sede, foi fixada no locado, e as respectivas citações e notificações foram aí efectuadas e recebidas pela dita sociedade.

*Os réus deduziram oposição e pediram improcedência da acção. Para tanto alegaram que a sociedade “F………., Ldª” nunca utilizou o locado como seu estabelecimento comercial, não tendo recebido no mesmo qualquer fornecedor, correspondência ou encomenda. Certo que nesse local foi afixado um edital respeitante ao processo de insolvência da mesma, mas tal sucedeu apenas por um dia, pois os réus, logo no dia seguinte, dirigiram-se ao tribunal a informar que o edital havia sido afixado em local errado.

Terminam pedindo a condenação dos autores como litigantes de má-fé.

*Os autores vieram responder pedindo a improcedência do pedido de condenação como litigantes de má-fé.

*Dispensou-se a realização de audiência preliminar, proferiu-se despacho saneador, seleccionou-se a matéria de facto e elaborando-se a base instrutória, que não mereceu qualquer censura das partes.

*Realizou-se o julgamento da matéria de facto, com gravação em sistema audio dos depoimentos prestados, após o que foi proferida a respectiva decisão, que também não sofreu qualquer reclamação.

*Proferiu-se, por fim, sentença onde se julgou a acção procedente, por provada, e em consequência, declarou-se a resolução do contrato de arrendamento dos autos e condenou-se os réus a entregar imediatamente, livre de pessoas e coisas, o locado aos autores.

*Inconformados com tal decisão dela recorreram, de apelação, os réus, pedindo a sua revogação e substituição por outra que os absolva do pedido.

apelantes juntaram aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões: 1. Entendem os recorrentes, que da prova produzida em audiência de julgamento decorre que os pontos 1, 5, 7 e 12, da base instrutória se encontram incorrectamente julgados e os meios probatórios constantes dos autos que o Tribunal usou para se convencer dos factos que logrou ficarem provados, impunham uma decisão diversa da recorrida.

  1. Tais pontos da base instrutória, foram incorrectamente julgados, pois, as provas produzidas em audiência de discussão e julgamento impunham uma decisão diversa da recorrida.

  2. A Mm.ª Juiz “a quo”, não fez uma análise crítica das provas produzidas, tendo existido um erro na apreciação do seu valor probatório.

  3. O Tribunal considerou como provado que os RR, sem autorização ou conhecimento dos AA permitiram que a sociedade mencionada em G), vendesse material que possuía no locado.

  4. Para dar com provado tais factos, o Tribunal atendeu ao depoimento da testemunha L………., que de acordo com a versão acolhida pela Mmª Juiz, disse que a testemunha viu parte desses materiais serem vendidos no local arrendado.

    6 - O curioso é que, ao ouvirmos o depoimento dessa testemunha no CD de gravação da audiência de discussão e julgamento, transcrito supra, em momento algum a testemunha refere ter visto esses materiais serem vendidos no local arrendado. O que a testemunha disse, foi que as suas amigas lhe mostraram artigos que compraram no local arrendado e ela reconheceu esses artigos, como sendo da sociedade.

  5. Mas vai mais longe a testemunha, quando afirma que está de relações cortadas com os recorrentes, “nunca mais lá fui, a minha mágoa é muita, sou incapaz de ir ao estabelecimento deles”.

  6. Ora, não se percebe como pôde a Mm.ª Juiz considerar tal depoimento sério e isento e não ter considerado credível o depoimento da testemunha G………., só porque sendo funcionário dos recorrentes no locado, tinha interesse na decisão da causa.

  7. Considerou ainda a Mm.ª Juiz o depoimento das testemunhas H………. e I………., pois, estes afirmaram que nos anos de 2003 e 2004, a sociedade referida, apresentou compras e vendas de materiais. Com base nisso, a Mmª Juiz partiu do pressuposto de que, a ser assim, tais vendas só poderiam ter ocorrido no local arrendado.

  8. Ora, mais uma vez, não esteve bem a Mm.ª Juiz, pois, não pode partir de pressupostos, tem que ter provas concretas de que efectivamente essas vendas ocorreram no local arrendado e isso não ficou provado nos autos, pois, nenhuma das testemunhas ouvidas afirmou ao Tribunal tal facto.

  9. Efectivamente as vendas poderiam muito bem, ter sido feitas noutro local, pois, é comum nestas situações os “restos” serem vendidos a feirantes.

  10. Quanto à resposta ao quesito 12, a Mm.ª Juiz deu como provado que a sede da sociedade em causa, foi fixada no local arrendado, atenta a cópia da sentença, junta a fls. 106/09 dos autos.

  11. Mais, uma vez, não esteve bem a Mm.ª Juiz, pois, o que consta na sentença é que a sede da sociedade foi fixada no ………. . Ora, para além do local arrendado se situar no ……….., também a residência dos Recorrentes se situa no ………. .

  12. O próprio administrador da insolvência, cujo depoimento se transcreve supra, disse ao Tribunal que a citação do Réu no processo de insolvência foi efectuada na casa do Réu, no ………. .

  13. Mas vai mais longe a Mm.ª Juiz para dar como provado tal quesito, atendeu ao depoimento da testemunha J………., que prestou no seu entender, um depoimento credível, seguro e isento, quando disse que viu o edital da insolvência fixado no local arrendado por mais de duas semanas.

  14. Mais, uma vez, é de espantar que a Mm.ª Juiz tenha considerado tal depoimento como credível, já que quando inquirida a testemunha, no sentido de saber se viu o edital e a que se referia, a mesma ter dito que “era um papel relativo àquele senhor (referia-se ao AA), pra ele sair, o que dizia não me lembro, já foi há muito tempo”. Remete-se para o depoimento na íntegra desta testemunha que já se encontra transcrito supra.

  15. Os depoimentos das testemunhas ouvidas em sede de audiência de discussão e julgamento, cujos excertos se deixaram supra transcritos, possuem uma muito relativa e débil força probatória, não sendo de todo idóneos e eficientes para suportar a decisão a que chegou o Tribunal “a quo”.

  16. Assim, entendem os recorrentes que o Tribunal “a quo” deveria ter respondido aos factos quesitados nos pontos 1, 5, 7 e 12 da base instrutória de forma diversa, dando-se pois em caso de dúvida razoável que não foi suprida pela prova produzida, como não provados tais factos.

  17. Não obstante tudo o que acima se expôs, entendem os recorrentes, que o Tribunal “a quo”, ao mandar entregar imediatamente, livre de pessoas e coisas, o local arrendado aos AA, por entender ter existido resolução do contrato de arrendamento, representa uma conduta...

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