Acórdão nº 670/04.0TCGMR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelÁLVARO RODRIGUES
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : I-O nosso ordenamento jurídico consagra a doutrina da causalidade adequada, na sua formulação negativa: «o facto só deixará de ser causa adequada do dano, desde que se mostre, por sua natureza, de todo inadequado e o haja produzido apenas em consequência de circunstâncias anómalas ou excepcionais»(ALMEIDA COSTA, Direito das Obrigações, 9ª edição, pg. 708)..

II- Para além disso, a doutrina em causa não pressupõe a exclusividade da condição, no sentido de que esta tenha só por si determinado o dano; podem ter colaborado na sua produção outros factos concomitantes ou posteriores, como se reconheceu, ainda recentemente, no Acórdão deste Supremo Tribunal de 31.03.2009, de que foi Relator, o Exmº Conselheiro Serra Baptista e Adjuntos o aqui Relator e o Adjunto neste autos, Exmº Conselheiro Santos Bernardino (Pº 08B2421,disponível em www.dgsi.pt).

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III- Com efeito, não é qualquer relação fenomenológica ou, se preferirmos, ôntico-naturalística que, embora seja condição próxima de produção de um resultado danoso (causal) entre dois fenómenos, releva para efeitos da teoria da causalidade adequada, mas aquela que for determinante no plano jurídico, isto é, entre um comportamento juridicamente censurável e o resultado danoso.

IV- Por isso, com inteira razão, a dogmática moderna tende a substituir a designação imprópria de teoria de causalidade adequada, que a praxis tradicional consagrou, pela da teoria ou doutrina da adequação, ou seja pela imputação normativa de um resultado danoso à conduta reprovável do agente, nos casos em que pela via da prognose póstuma se possa concluir que tal resultado, segundo a experiência comum, possa ser atribuída ao agente como coisa sua, isto é, produzida por ele.

Decisão Texto Integral: RELATÓRIO AA, BB, CC e DD, instauraram a presente acção declarativa de condenação com a forma de processo ordinário contra EE e E.D.P. - Distribuição de Energia, SA, todos com os sinais dos autos, pedindo a condenação solidária dos Réus no pagamento de uma indemnização no valor de € 498.127,85, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescido de juros contados desde a citação até integral pagamento.

Para tanto e, em suma, alegaram ser, respectivamente, viúva e filhos de GG, falecido no acidente que se deu da seguinte forma: Pelas 12.00 horas do dia 27.07.02, no Lugar do Tapado, freguesia de Conde, S. Martinho, em Guimarães, o referido GG, ao aperceber-se da queda de um trabalhador que efectuava reparações num telhado de um prédio urbano sito nas imediações – telhado esse a que acedera por meio de um escadote de alumínio – foi em seu socorro.

Sucede porém que, mal tocou no referido escadote, foi atingido e fulminado por uma corrente eléctrica resultante da descarga dos cabos eléctricos aéreos de alta tensão que atravessam aquele local, o que determinou a sua morte.

Mais referem que a casa onde as reparações estavam a ser efectuadas pertence aos Réus EE e FF, sendo que tal casa encosta a um posto de transformação que pertence à Ré EDP, encontrando-se a cobertura do posto eléctrico sensivelmente à mesma altura do cume do telhado, nada existindo a isolar e separar a casa do referido posto eléctrico.

Alegaram ainda que o telhado e beirais do prédio são facilmente escaláveis por qualquer pessoa, tanto a partir do caminho público como a partir das escadas exteriores de acesso ao 1° andar do prédio em causa, sendo que a distância dos cabos ao solo é de cerca de seis metros, diminuindo na inversa proporção da elevação dos degraus, até cerca dos três metros.

Concluem, assim, terem sido violadas as disposições regulamentares relativas à distância a que os condutores devem ficar, quer do solo, quer dos edifícios, tendo sido por causa dessa violação que o acidente ocorreu.

Por fim, invocam danos patrimoniais e não patrimoniais advindos do sinistro, terminando pelo pedido de indemnização acima indicado.

A Ré EDP contestou e deduziu o incidente de intervenção provocada da sociedade C.......... e das Companhias Seguradoras Fidelidade e Império.

Em sua defesa, aduziu que a causa do acidente não esteve na inobservância de distâncias regulamentares mas sim na indevida utilização de uma escada metálica sob as linhas de transporte de energia eléctrica, que se encontravam em tensão.

Alegou, ainda, que os l°s Réus é que são os donos do posto de média tensão a que os Autores se referem na petição, sendo eles quem o explora no seu interesse, competindo-lhes, por isso, a respectiva manutenção. Refere ainda que o edifício onde as obras decorriam também lhes pertence, sendo que à data da instalação do posto de transformação (PT) e respectiva ligação à rede pública de fornecimento não existia ainda o dito edifício.

Acrescentou, também, que as distâncias das linhas ao beiral e ao telhado do prédio dos l°s Réus não se encontravam, à data do sinistro, em conformidade com o Regulamento de Segurança das Instalações Eléctricas, sendo esse facto exclusivamente imputável ao dono do PT.

Por fim, refere, por um lado, que as obras que estavam a ser efectuadas no telhado respeitavam à construção de uma nova divisão, não tendo sido objecto do licenciamento que se impunha, e por outro, os trabalhadores não usaram das cautelas devidas na medida em que não pediram o desligamento da corrente eléctrica.

O Réu Martins e os herdeiros habilitados da primitiva Ré, FF, apresentaram também a sua contestação (tendo havido prévia habilitação de FF pugnando pela sua ilegitimidade, mais alegando que não estavam a ser efectuadas quaisquer obras de reparação no telhado e que a culpa do sinistro é imputável exclusivamente ao sinistrado, o qual ergueu a escada metálica provocando o contacto com os fios de alta tensão, os quais, não obstante, distam do patamar superior das escadas do prédio do contestante em 4,19 metros, mais distando 7,10 metros do solo. Acrescentaram que, na medida em que a escada metálica foi levada para o local por um trabalhador, em última análise a responsabilidade pertencerá ao comitente.

Os Autores replicaram concluindo como na petição inicial.

Admitidas as intervenções, apresentaram-se a contestar as Rés Companhia Seguradora Fidelidade-Mundial S.A. e Império-Bonança (que deram por reproduzida a contestação da EDP) e a sociedade C.......... (que pugnou pela sua ilegitimidade alegando não ter feito qualquer obra naquele local, apenas se encontrando dois trabalhadores seus a colocar uma chapa entre o caleiro e a parede da casa do 1° réu, sendo que aqueles não colocaram a escada em qualquer local de risco, tendo sido a actuação da própria vítima, ao desviar a escada, que desencadeou o acidente).

Em nova réplica, os Autores terminaram como na petição inicial.

Foi proferido despacho saneador, que julgou improcedentes as excepções de ilegitimidade arguidas, e foi seleccionada a matéria de facto assente e a controvertida relevante para a decisão da causa, que constituiu a base instrutória da acção.

Após a fase de instrução, veio a ser realizada a audiência de julgamento, com observância das formalidades legais, tendo-se, no decurso da mesma, atentado no não chamamento do ISS, irregularidade que se supriu.

O Instituto da Segurança Social, I.P. apresentou-se então a reclamar o reembolso do subsídio por morte e pensões de sobrevivência pagos, tendo as quantias sido actualizadas em requerimento de 17.03.08 (fls. 660), onde se esclarece que o montante pago a título de subsídio por morte é de € 4.057,72 e as pensões de sobrevivência, no valor actual mensal de € 242,76, ascendem já a € 17.778,22.

Requereu ainda o reembolso das quantias que viessem a ser pagas após a actualização, e ainda juros contados desde a citação.

Concluído o julgamento da causa, foi proferida sentença que decidiu: a) absolver a Ré C.......... - Caleiros e Estores, Lda do pedido; b) condenar a Ré EDP - Distribuição de Energia, S.A.

– e, na medida das apólices constantes dos factos 3° e 4°, em seu lugar, as Rés Companhia de Seguros Fidelidade, S.A. e Companhia de Seguros Império, S.A. – e também os Réus EE e os herdeiros habilitados de FF, HH, II, JJ e KK, solidariamente, no pagamento da quantia de € 275.841,90 (duzentos e setenta e cinco mil, oitocentos e quarenta e um euros e noventa cêntimos), sendo € 50.000,00 (cinquenta mil euros) por perda do direito à vida; € 5.000,00 (cinco mil euros) pelos danos não patrimoniais sofridos pela vítima antes do decesso; € 20.000,00 (vinte mil euros) a cada uma das autoras (viúva e filhas) a título de danos não patrimoniais sofridos por morte da vítima; € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros) a título de danos não patrimoniais sofridos pelo autor com a morte do pai; € 1.484,90 (mil, quatrocentos e oitenta e quatro euros e noventa cêntimos) pelas despesas de funeral e € 134.400,00 (cento e trinta e quatro mil e quatrocentos euros) a título de indemnização por alimentos devidos à viúva.

- Sobre a quantia de € 135.884,90 incidem juros à taxa de 4% contados desde a citação até integral pagamento; - Sobre a quantia de € 140.000,00 incidem juros à taxa de 4% desde a data da prolação desta sentença.

- Na responsabilidade solidária determinou-se uma repartição de culpas em 30% para a Ré EDP e 70% para os Réus EE, HH, II, JJ e KK.

- À quantia de € 135.884,90 será deduzido o montante de € 17.778,22 (dezassete mil, setecentos e setenta e oito euros e vinte e dois cêntimos), acrescido de juros à taxa de 4% contados desde a citação, ficando os Réus "EDP" e EE e habilitados de FF condenados a pagar o montante deduzido e respectivos juros até integral pagamento ao ISS, mais sendo de deduzir as pensões de sobrevivência que venham a ser pagas ao ISS a partir de Abril de 2008".

Inconformados, interpuseram recursos (independentes) de Apelação da mesma sentença para o Tribunal da Relação de Guimarães, os Réus EE e HH, II, JJ e KK, EDP- Distribuição Energia, SA, Companhia de Seguros Fidelidade - Mundial SA e Império - Bonança -Companhia de Seguros, SA e, a título...

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