Acórdão nº 3795/04.9TVLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADAS AMBAS AS REVISTAS Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL: ARTIGO 227.º Jurisprudência Nacional: AC. DO S.T.J. DE 11-1-2007, P. 4223/2006 IN WWW. DGSI.PT COMO TODOS OS DEMAIS QUE NÃO TENHAM INDICADA OUTRA ORIGEM, AC. DO S.T.J. DE 11-9-2007,C.J., 3, PÁG 40, AC. DO S.T.J. DE 4-10-2007 INFRA REFERIDO, AC. DO S.T.J. DE 9-10-2007, REVISTA N.º 2504/07; AC. DO S.T.J. DE 13-3-2007, P. 402/2007, C.J., 1, PÁG 118; AC. DO S.T.J. DE 4-10-2007, REVISTA N.º 1342/07-7ª SECÇÃO; AC. DO S.T.J. DE 22-1-2009 (SANTOS BERNARDINO) (P. 3301/2008) IN C.J.

Sumário : I - No âmbito da responsabilidade pré-contratual, e para se avaliar se houve violação das regras da boa fé geradoras de responsabilidade à luz do disposto no art. 227.º do CC, importa ponderar a posição relativa dos contraentes, verificando-se que, no caso, a instituição bancária integrada num grupo de prestígio à escala mundial é uma parte economicamente muitíssimo mais forte do que os interessados a admitir num processo de participação num plano estratégico de desenvolvimento dos serviços bancários que essa instituição pretendia desenvolver em Portugal.

II - Por isso, a instituição de crédito, que decidiu pôr em marcha esse plano antes da sua aprovação pela entidade de supervisão, não podia deixar de advertir expressamente os interessados relativamente aos pontos essenciais, face aos interesses contratuais destes, que estavam dependentes da supervisão; um desses pontos era precisamente a possibilidade de os futuros agentes financeiros poderem constituir sociedades para dirigirem estabelecimentos onde se negociariam produtos financeiros dessa instituição de crédito num regime contratual ao tempo inovador em Portugal.

III - Mas, para além da responsabilidade da instituição de crédito por omissão dos deveres de informação, ela incorre em responsabilidade por acção ao induzir em erro os interessados na medida em que os incentivou a constituir sociedades que iriam gerir esses estabelecimentos, sociedades que não foram consentidas pela entidade de supervisão.

IV - Tal incumprimento dos deveres de informação e de lealdade constituem a instituição de crédito em responsabilidade pré-negocial ou por culpa na formação dos contratos (art. 227.º do CC) sendo ressarcíveis os danos sofridos por aqueles que negociaram com a instituição de crédito, mas não os prejuízos da sociedade que se constituiu em momento ulterior à ruptura negocial levada a efeito pelos interessados que a constituíram, sociedade que, portanto, nunca tratou com a instituição de crédito, não podendo, assim, invocar um investimento de confiança comprovadamente inexistente.

V - Justifica-se a indemnização a título de danos morais de 20 000 € para cada um dos lesados que viram, assim, frustrada a sua pretensão de exercer a actividade nos termos salientados, verificando-se que alguns deles deixaram emprego que exerciam há anos em instituição de crédito para abraçarem este projecto inovador.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA, BB, CC, DD, Lda. demandaram EE, S.A com fundamento em responsabilidade pré-contratual deduzindo os seguintes pedidos: - Declarar-se que a ré incumpriu os seus deveres pré-contratuais e contratuais para com os AA, violando com culpa grave e com dolo, por acção e omissão, nos moldes descritos no presente articulado, o princípio da boa fé no âmbito da responsabilidade civil pré-contratual (artigo 227.º do Código Civil).

- Que dessa actuação culposa da ré resultaram danos para os AA pelo que aquela se constituiu na obrigação de os indemnizar.

- Condenar-se a ré a pagar aos A, a título de indemnização, a importância global de 263.351,83 euros, como se segue: a) Ao autor AA o valor total de 62.793,83 euros.

[2.000€ de quotas realizadas na sociedade autora num capital social de 5.000€; consideradas as despesas sociais infra indicadas de 76.367,26€, o remanescente (71.367,26€) foi suportado pelos AA na proporção das quotas realizadas e, assim, suportou este autor o custo de 28.546,90€; porque o autor, tendo em vista a sua função de agente financeiro da ré pediu a demissão de gerente do B…, perdeu de indemnização por antiguidade 16.180,73€ a que acresce o montante de 4.389,42€ que corresponde ao valor em espécie do uso total da viatura que lhe foi atribuída. Às referidas importâncias importa acrescentar o valor de 20.000 euros a título de danos não patrimoniais. Com base nas previsões dos resultados mínimos para os primeiros 5 anos de actividade (artigo 465 da petição) o autor auferiria 42.793,83 circunscrevendo o pedido pela compensação deste dano (ver 469 da petição) que resulta da não celebração do contrato ao somatório desta quantia com os 20.000 euros, ou seja, 62.793,83€] b) Ao autor BB o valor total de 72.793,83 euros [2.000€ de quotas realizadas na sociedade autora num capital social de 5.000€; consideradas as despesas sociais infra indicadas de 76.367,26€, o remanescente foi suportado pelos AA na proporção das quotas realizadas e, assim, suportou este autor o custo de 28.546,90€: porque o autor BB era gerente do B…, desvinculando-se do contrato laboral em 20-3-2001, teria a receber 30.026,82€ por indemnização de antiguidade, reclamando ainda a título de danos morais a quantia de 30.000€; com base nas previsões dos resultados mínimos para os primeiros 5 anos de actividade (artigo 465 da petição) o autor auferiria 42.793,83: ora circunscrevendo o pedido pela compensação deste dano que resulta da não celebração do contrato (artigo 469 da petição) ao somatório desta quantia com os 30.000 euros, ou seja, 72.793,83€].

  1. Ao autor CC o valor total de 51.396,91 euros.

    [ 1.000€ de quotas realizadas na sociedade autora num capital social de 5.000€; consideradas as despesas sociais infra indicadas de 76.367,26€, o remanescente foi suportado pelos AA na proporção das quotas realizadas e, assim, suportou este autor o custo de 14.273,45€; a título de danos morais reclama a quantia de 30.000€; com base nas previsões dos resultados mínimos para os primeiros 5 anos de actividade (artigo 465 da petição) o autor auferiria 21.396,91€: circunscreve o pedido pela compensação deste dano que resulta da não celebração do contrato (ver artigo 469 da petição) ao somatório desta quantia com os 30.000 euros, ou seja, 51.396,91€].

  2. À sociedade autora o valor total de 76.367,26 euros, o qual já inclui os créditos vencidos [por serviços prestados à ré:7.126,28€; rendas pagas pelas instalações arrendadas no Campo Pequeno: 3.400.000$00/16.959,13€ a que acrescem serviços e outras despesas: 15.310.262$82/76.367,26€ (artigos 405 a 421 da petição].

    1. A sentença de 1ª instância julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré a pagar à sociedade a quantia de 71.085,58€ acrescida de juros à taxa legal desde o dia 9 de Junho de 2004, absolvendo a ré dos pedidos de condenação no pagamento de quantias aos demais AA.

      Considerou a sentença que o dano indemnizável é o do interesse contratual negativo e, assim, estão em causa as verbas mencionadas nos pontos 37 (rendas pagas pela sociedade: 16.959,13€) 38 e 39 da matéria de facto (54.126.45€/10.851.379$00).

    2. O Tribunal da Relação julgou as apelações parcialmente procedentes condenando a ré a pagar a cada um deles a título de indemnização por danos não patrimoniais a quantia de 20.000€ com juros de mora à taxa legal desde a citação, absolvendo a ré do pedido contra ela deduzido pela sociedade.

    3. Factos provados 1- Na revista Visão publicada no dia 2 de Junho de 1999 saiu um artigo intitulado “Banqueiros por conta própria” no qual são atribuídos a J… M… L…-F…, director da divisão de agentes financeiros da EE, as seguintes frases: “o nosso objectivo é criar um canal alternativo de distribuição de produtos financeiros e de seguros”; “a grande diferença entre o agente financeiro e uma qualquer sucursal do Banco é que no primeiro caso quem está atrás do balcão é um empresário e não um funcionário” e “os agentes não trabalham com dinheiro e operações como levantamentos só poderão ser feitas em caixas automáticas ou aos balcões do próprio Banco” (A).

      2- Do artigo referido consta o seguinte: “ o EE procura sócios […]. A instituição financeira escolheu a Expofranchising […] para apresentar em Portugal aquilo a que chamou um movo conceito bancário através do qual empresários e profissionais independentes actuam como seus representantes […] a instituição fornece a marca, o know-how e os produtos financeiros a comercializar e o resto fica por conta dos investidores que, desde que reúnam os requisitos necessários, passam a ser donos do seu próprio banco […]. O investimento inicial inclui uma taxa de adesão de 2.400 contos e os montantes necessários para pagar as instalações […]. As comissões dos produtos transaccionados e as suas margens financeiras são repartidas a 50% entre o agente e o banco, podendo variar nalguns casos específicos […] A estrutura ainda está a ser criada e a instituição tem um batalhão de advogados e consultores a trabalhar no assunto e a estudar a legislação portuguesa. É que, à partida, as actividades de carácter bancário só podem ser exercidas por bancos e o facto de haver agentes comerciais a efectuá-las pode levantar questões de natureza legal. O assunto não preocupa J… M… L…-F… […]. Os agentes financeiros funcionam, na prática, como intermediários entre o EE e os clientes e, nesse contexto, poderá negociar produtos como fundos de investimento, seguros, planos de pensões e de poupança reforma ou empréstimos para o consumo ou habitação (B).

      2-A Do mesmo artigo consta ainda: “ em Portugal, o projecto arranca a sério no próximo mês de Julho […] estado em curso a “ […] fase de pré-selecção de candidatos” (aditado pela Relação).

      3- No Jornal de Negócios publicado a 24-6-1999 saiu um artigo intitulado “ EE estuda aquisições em Portugal” e que constitui uma entrevista dada por H… C…, presidente da ré (C).

      4- Nesse artigo, na parte referente às respostas dadas por H… C…, constam...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT