Acórdão nº 2258/07.5TBSTS.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelPAULO SÁ
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: AGRAVO Decisão: CONCEDIDO PROVIMENTO Sumário : I – A excepção de caso julgado tem como pressuposto a repetição de uma causa decidida por sentença que já não admite recurso ordinário, repetindo-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir – cf. arts. 497.º, n.º 1, e 498.º, n.º 1, do CPC –, exercendo essa excepção duas funções: a) uma função positiva; e b) uma função negativa. Exerce a primeira quando faz valer a sua força e autoridade, e exerce a segunda quando impede que a mesma causa seja novamente apreciada pelo tribunal.

II – O pedido é a enunciação do direito que o autor quer fazer valer em juízo e da providência que para essa tutela requer.

III – A causa de pedir não consiste na categoria legal invocada, no facto jurídico abstracto configurado pela lei, mas, antes, nos concretos facto da vida a que se virá a reconhecer, ou não, a força jurídica bastante e adequada para desencadear os efeitos pretendidos pelo autor, traduzindo-se nos acontecimentos da vida em que o autor apoia a sua pretensão.

IV – Fundando o autor a sua pretensão no incumprimento pelo Réu de um contrato de compra e venda de um veículo automóvel com ele celebrado, enquanto na oposição à execução, em que intervieram os mesmos sujeitos processuais, não se discutia incumprimento contratual, mas antes a inexistência de obrigação cambiária aparentemente titulada por cheques, não ocorre a excepção de caso julgado.

V – O pedido principal deduzido na acção declarativa, de resolução do contrato e restituição do preço e das demais quantias pagas, e o pedido subsidiário, de cumprimento integral do contrato e indemnização pela mora, não têm similitude com o pedido formulado na oposição, que se traduz na extinção da execução.

VI – O caso julgado material formado na oposição à execução circunscreve-se à obrigação exequenda, dele estando excluídas outras obrigações que, por serem conexas, poderiam, na acção declarativa comum, dar lugar a uma cumulação de pedidos ou a um pedido reconvencional, que não se compadecem com a função instrumental da acção de oposição.

VII – Todas as questões e excepções suscitadas e solucionadas na sentença, por imperativo legal e conexas com o direito a que se refere a pretensão do autor, estão compreendidas na expressão “precisos (…) termos em que julga”, contida no art. 673.º do CPC, ao definir o alcance do caso julgado material, pelo que também se incluem neste.

VIII – Se os factos relativos ao contrato de compra e venda já estivessem integralmente compreendidos na causa de pedir da execução, não se poderia já discutir esse contrato.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

– AA instaurou, no Tribunal Judicial de Santo Tirso, onde foi distribuída ao 2.º Juízo Cível, sob o n.º 2258/07, acção declarativa com processo sumário contra BB, peticionando que a acção seja julgada procedente e, em consequência, ser declarado resolvido o contrato de compra e venda da viatura Mercedes ..-..-.. e ser restituído ao A. o preço de € 8.000,00 e todas as demais quantias pagas ao R. devido ao negócio; ou, subsidiariamente, ser o R. condenado a entregar ao A. a declaração de venda do Mercedes e a indemnizar o A., em execução de sentença, pelos danos decorrentes da mora no cumprimento desta obrigação.

Para tanto alegou, em síntese, os seguintes factos: Em Setembro de 1998, A. e R. celebraram um contrato de compra e venda, verbal, de uma viatura Mercedes-Benz, 190 D, matricula ..-..-.., tendo sido fixado o preço da viatura em Esc. 1.600.000$00, quantia que o A. pagou já integralmente ao R., sendo uma parte em numerário e o restante através da entrega, em retoma, de outra viatura.

Desde 1998, o A. passou a usar o automóvel Mercedes, nele se fazendo transportar e à sua família, sendo quem, exclusivamente, suporta todos os encargos com a viatura.

Sucede que, até ao momento, o R. ainda não entregou ao A. a declaração de venda do Mercedes, sem a qual o A. está impedido de averbar em seu nome o automóvel.

Ora, em 15/4/2003 o carro foi apreendido pela GNR pela falta do respectivo registo em nome do proprietário, tendo o A. sido intimado a regularizar a situação, no prazo de 90 dias, sob pena de o veículo ser declarado perdido a favor do Estado.

O A. logo solicitou ao R. a emissão da declaração de venda do Mercedes, mas, até ao momento, o R. ainda não entregou tal documento ao A.

E, face à insistência do pedido do A., o R. passou a reclamar o pagamento de mais € 4.875,00, alegadamente ainda em dívida do negócio do Mercedes e, de seguida, instaurou uma acção executiva, tendo já penhorado bens móveis e o salário do A.

  1. deduziu oposição à execução e participou criminalmente contra o R., mas sem êxito.

    O R. continua a recusar-se a emitir a declaração de venda a favor do A. e a falta de averbamento e registo do Mercedes a favor do proprietário impede a sua utilização, ou mesmo alienação, por parte do A..

    Daí que, devido à falta da declaração de venda, o Mercedes se encontre imobilizado na garagem do A. há mais de três anos, e o A. teve de adquirir outra viatura para se fazer transportar, o que o R. sabe.

    Face à mora do R. em permitir o registo do Mercedes, o A. perdeu o interesse no cumprimento da referida prestação e na manutenção do negócio e sofreu danos.

    Citado o R., veio este contestar, desde logo deduzindo a excepção de caso julgado, uma vez que, diz, esta acção já é a terceira tentativa de o A. não pagar o que deve, tendo sido as anteriores a participação criminal, que foi arquivada, e a oposição à execução, que foi julgada improcedente.

    Adianta que essa execução foi instaurada pelo aqui R. contra o aqui A. e corre termos por este Juízo e Tribunal com o n.º 1508/04.4TBSTS, tendo como títulos três cheques que o A. entregou ao R. para pagamento final do automóvel identificados nos autos, sendo que o A. deduziu oposição, invocando os factos também alegados na petição inicial.

    Mais diz que, tendo sido realizado o julgamento e proferida decisão sobre a matéria de facto, o Tribunal deu como provados, com interesse para os presentes autos, os seguintes factos: 1– Em Setembro de 1998, o exequente vendeu ao executado um Mercedes de matrícula ..-..-...

    2– Aquando do acordo de venda, o exequente comprometeu-se a entregar todos os documentos da viatura e a proceder ao averbamento do veículo em nome do executado quando o preço daquela estivesse totalmente pago.

    3– Em 2003, o executado solicitou ao exequente os documentos do Mercedes, tendo-lhe este exigido, para o efeito, o pagamento do montante de € 4.875.

    4– Nessa ocasião, o executado argumentou que precisava de proceder ao averbamento do automóvel em seu nome, em virtude de o mesmo ter sido apreendido por falta de inspecção periódica obrigatória, ao que o exequente respondeu que sim mas que primeiro teria de pagar a quantia em dívida (€ 4.364,48) acrescida de juros, tendo-se então fixado o montante de € 4.875, quantia esta que o executado se obrigou a pagar.

    5– Nessa sequência, o executado entregou ao exequente cinco cheques por si assinados, com datas de 10.08, 10.09, 10.10, 10.11 e 10.12 de 2003, que foram preenchidos por uma trabalhadora do exequente e tinham o valor de € 500, o primeiro, € 250, os três seguintes e € 3.625 o último, 6– Os cheques com vencimento em 10.08, 10.09 e 10.10 foram apresentados a pagamento e pagos, enquanto que os outros dois não foram pagos por o executado ter dado ordem de revogação com o fundamento de vício na formação da vontade.

    O R. comprometeu-se a entregar todos os documentos da viatura e a proceder ao averbamento do veiculo em nome do A. quando o preço daquela estivesse totalmente pago.

    Esta matéria fixada por sentença, já transitada...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT