Acórdão nº 09B0368 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL, ARTIGOS 374º, 376º, 905º E SEGS., 910º, 911º, 913º, 914º, 1420º, 1421º, 1424º, 1432º Jurisprudência Nacional: ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE: 3 DE ABRIL DE 2003, PROC. Nº 03B809; 19 DE JUNHO DE 2008, PROC. Nº 08B1078; 12 DE MARÇO DE 2009 (PROC. 08A4071); 19 DE MARÇO DE 2009 , PROC. Nº 07B3697; 28 DE ABRIL DE 2009, PROC. Nº 08B078 Sumário : 1. A circunstância de a coisa vendida ser uma fracção autónoma de um prédio urbano – e não a cobertura do prédio, ou parte dela – não isenta o vendedor de responder, perante o comprador, pelos vícios que a desvalorizam ou que impedem a sua utilização normal.

  1. Não podem ser invocadas pelo vendedor de uma fracção autónoma quaisquer limitações que o regime da propriedade horizontal imponha às decisões que afectem partes comuns, ou à execução de obras nas mesmas, para se exonerar, perante o comprador, da responsabilidade pela existência de defeitos na coisa vendida.

  2. Os documentos particulares escritos cuja autoria tenha sido reconhecida têm força probatória plena quanto à emissão das declarações que deles constam e quanto aos factos desfavoráveis a que estas se referem.

  3. É admissível a indemnização por danos não patrimoniais no âmbito da responsabilidade contratual.

    Decisão Texto Integral: Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. Em 28 de Junho de 2002, AA e BB instauraram uma acção contra CC na qual, alegando terem-lhe comprado em Abril de 1999 a fracção autónoma designada pela letra D do prédio urbano situado em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 276 e descrito na 5ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa, com o nº 252, pediram a sua condenação no pagamento de € 12.805,65 que vão ter que gastar com a reparação da respectiva cobertura e de € 1.496,39 com o arranjo provisório, por sofrer infiltrações e deixar passar águas pluviais, e de € 4.988, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

    Alegaram ainda que as infiltrações começaram em Agosto de 1999 e que por diversas vezes contactaram a vendedora que se disponibilizou para proceder às reparações necessárias, sem todavia as ter realizado, tendo chegado a proceder à sua notificação judicial em Março de 2000.

    A ré contestou e requereu a intervenção acessória de C... e Filhos, Lda, empresa que realizou as obras de reparação da referida fracção, sustentando ser a responsável pelos prejuízos que eventualmente venha a ter de indemnizar.

    Na réplica, os autores opuseram-se à intervenção requerida, mas que foi admitida por despacho de fls. 117.

    A chamada contestou e requereu a intervenção acessória de P... – Sociedade de Construções, Fibras e Madeiras, Lda e de N. C...& R..., Lda.

    Os autores responderam, nomeadamente opondo-se às intervenções, que todavia foram admitidas, por despacho de fls. 143.

    P... requereu a intervenção acessória de N...& F..., Lda, que não foi admitida (despacho de fls. 215).

    As intervenientes contestaram, e os autores responderam.

    A fls. 580, os autores vieram requerer a ampliação do pedido para € 14.443,64, “quantia que os AA. já despenderam” com obras que tiveram que realizar e despesas com a legalização de obras feitas pela ré. A ré opôs-se, mas a ampliação foi admitida por despacho de fls.611.

    Por sentença de fls. 831, a acção foi julgada parcialmente procedente. A ré foi condenada “a pagar aos Autores as seguintes quantias: - € 1.496,39, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados à taxa anual de 7% até 30/04/2003 e à taxa anual de 4% desde 01/05/2003, devidos desde 19/09/2002 até integral pagamento; - € 2.399,62, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados à taxa anual de 4%, devidos desde 30/04/2007 até integral pagamento; - € 10.890,00, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados à taxa anual de 4%, devidos desde 30/04/2007 até integral pagamento; - € 934,39, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados à taxa anual de 4%, devidos desde 30/04/2007 até integral pagamento; - € 219,63, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados à taxa anual de 4%, devidos desde 30/04/2007 até integral pagamento;”, por despesas realizadas e, como indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos, -“ € 4.000,00, acrescido de juros de mora vincendos, contados à taxa anual de 4% e devidos desde a data de prolação desta sentença até integral pagamento.” Esta condenação veio a ser confirmada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de fls.928.

  4. Inconformada, CC recorreu para o Supremo Tribunal da Justiça; o recurso foi admitido como revista, com efeito meramente devolutivo.

    Nas alegações que apresentou, formulou as seguintes conclusões: “1. A matéria de facto assente não revela qualquer venda de coisa defeituosa.

  5. É que a cobertura do edifício, onde residem os problemas, é uma parte comum do mesmo, pelo que não constituiu, nem poderia ter constituído, objecto da compra e venda celebrada entre as partes.

  6. O que a R. alienou aos AA. foi a fracção autónoma designada pela letra "D" e, por arrasto, o seu direito de compropriedade sobre as partes comuns, por força do princípio da incindibilidade, consagrado no art. 1420º/2 do C.C..

  7. A reparação e impermeabilização da cobertura do edifício carece de aprovação da assembleia de condóminos, por maioria dos votos representativos do capital investido, e os respectivos encargos devem ser suportados por todos os condóminos em proporção do valor das suas fracções (arts. 1427°, 1430º/1, 1432º/3 e 1424º/1 do C.C.).

  8. A R. não pode ser responsabilizada por anomalias detectadas numa das partes comuns do edifício, cuja reparação não lhe compete e, mais do que isso, está legalmente impedida de efectuar (o regime da venda de coisas defeituosas não tem, pois, aqui qualquer cabimento, sendo o art. 914° do C.C. de aplicação impossível, pois os AA. não podem exigir da R. a reparação ou substituição da cobertura do edifício, carecendo estas obras de deliberação da assembleia de condóminos).

  9. Os AA. não lograram provar que a R. se obrigara, perante eles, a efectuar, previamente ao negócio, obras na cobertura do prédio ou que estas tenham sido determinantes na compra do andar (resposta ao quesito 2º). Assim, a R. não praticou qualquer ilícito contratual, susceptível de originar uma obrigação de indemnização (a fracção autónoma que vendeu aos AA. não apresentava quaisquer defeitos - a cobertura sim - e as obras que realizou no telhado não resultaram de qualquer obrigação que tivesse assumido perante eles).

  10. Apenas o condomínio responde perante os AA. pela reparação ou substituição da cobertura do edifício e pelo ressarcimento de eventuais danos.

  11. Se os AA. suportaram, com o arranjo provisório da cobertura e com os trabalhos de engenharia necessários à obra definitiva, as quantias de € 1.496,39 e € 10.890,00, respectivamente, suportaram-nas indevidamente, pois, de acordo com o regime jurídico da propriedade horizontal, as mesmas são da responsabilidade de todos os condóminos (arts. 1424° a 1426° do C.C.).

  12. Ainda que a R. tivesse cumprido defeituosamente o contrato de compra e venda celebrado entre as partes, o que apenas se admite por mera hipótese académica, nunca poderia ser condenada a reembolsar os AA. de quantias que, nos termos da lei, não lhes cabia a eles suportar; se os AA. pagaram tais quantias, pagaram mal; trata-se de danos totalmente injustificados e que poderiam ter sido evitados, pelo que não merecem a tutela do direito.

  13. Acresce que, no que respeita à obra na cobertura, os AA. limitaram-se a provar que despenderam a quantia de € 10.890,00, a título de...

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