Acórdão nº 01074/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelDULCE NETO
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. A…, B… e C…, com os demais sinais dos autos, recorrem para este Supremo Tribunal da decisão do T.A.F. de Loulé que julgou improcedentes as reclamações que deduziram contra os despachos do Chefe do Serviço de Finanças de Vila Real de Santo António, proferidos em 25/03/2009 e 27/05/2009 na execução fiscal n.º 1155 2006 01000063 e apensos, de indeferimento dos pedidos que cada um deles aí formulou, na qualidade de executados por reversão, no sentido de que fosse declarado que não eram responsáveis pelo pagamento das dívidas exequendas provenientes de coimas e despesas aplicadas à sociedade originária devedora.

Terminaram as respectivas alegações de recurso enunciando as seguintes conclusões:

  1. Sobre a adequação do meio processual utilizado: a. O meio processual utilizado (reclamação de despacho da Fazenda Pública que recaiu sobre requerimentos dos ora Recorrentes e que afectou direitos e interesses legítimos destes) é adequado, não tendo ocorrido erro na forma de processo.

    b. O requerimento sobre o qual recaiu o despacho desfavorável de que se reclamou, para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, impetrava que a Administração Tributária declarasse que os executados por reversão não eram responsáveis pelo pagamento de coimas e despesas aplicadas à sociedade “D…” e que, em consequência, se ordenasse o não prosseguimento, contra eles, das execuções atinentes a tais coimas e despesas.

    c. Os ora Recorrentes alegavam, em síntese, a inconstitucionalidade do art.º 8.° do R.G.I.T., quanto à responsabilidade subsidiária dos administradores, gerentes ou outras pessoas que tenham exercido a administração de pessoas colectivas originariamente devedoras (questão de conhecimento oficioso e que poderia ser invocada em qualquer altura e não somente no prazo da Oposição e através desta (mesmo depois de transcorrido o prazo da Oposição).

    d. Face ao despacho desfavorável do Serviço de Finanças de Vila Real de Santo António, sobre questão de conhecimento oficioso (desde logo pela Administração Pública), que afectava direitos e interesses legítimos dos ora Recorrentes, podiam estes reclamar, como fizeram, para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, nos termos do art.º 276.° do C.P.P.T.

    e. Nada obsta, por exemplo, a que essa questão seja suscitada em acção para o reconhecimento de um direito ou interesse legítimo em matéria tributária, prevista no art.º 145.° do C.P.P.T., uma vez que esta acção será sempre um meio processual mais adequado para assegurar, de forma plena, eficaz e efectiva, a tutela dos direitos e interesses dos contribuintes, do que a oposição prevista no art.º 203° e segs. do C.P.P.T. (em que os direitos dos oponentes são sempre inferiores aos que lhes são assegurados em quaisquer processos de natural penal ou contra-ordenacional).

    f. Ora, se a acção do art.° 145.º poderá ser usada para o fim acima indicado, nada obsta a que a Administração Fiscal, oficiosamente reveja a sua posição em qualquer fase do processo executivo, ou por sua iniciativa ou a requerimento do(s) interessado(s).

    g. No segundo caso, se o despacho for desfavorável ao(s) interessado(s), pode(m) este(s) reclamar nos termos e no prazo dos arts 276° e segs. do C.P.P.T.

  2. Sobre a inconstitucionalidade das normas do art.º 8.°, n.° 1, alíneas a) e b) do R.G.I.T.

    h. O Acórdão n° 129/2009, de 12 de Março, do Tribunal Constitucional rompe com o entendimento que, sobre a matéria, vinha sendo seguida por esse Tribunal.

    i. O mesmo Acórdão vem também contrariar jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Administrativo, no sentido de que os gerentes e administradores de empresas não poderiam ser responsabilizadas pelo pagamento de coimas em cujo pagamento haviam sido condenadas as empresas.

    j. Apesar da posição veiculada no citado Acórdão n.° 129/2009, do TC, não estamos ainda no âmbito de uniformização de jurisprudência.

    k. Mesmo tendo em consideração a posição manifestada no citado Acórdão do TC - e da qual discordamos, acompanhados de muita e sábia jurisprudência e doutrina - ainda assim, para ser ressarcida dos danos fiscais causados pela sociedade, teria a Administração Fiscal de desencadear um processo autónomo destinado a provar a ilicitude e a culpa dos gerentes ou administradores (o que, no caso “sub judice”, manifestamente não fez).

    l. As normas das alíneas a) e b) do n° 1 do art.º 8° do R.G.l.T., no sentido de que o n.º 1 do art.º 8° do R.G.I.T., aprovado pela Lei n° 15/2001, de 5 de Junho, na parte em que se refere à responsabilidade civil subsidiária dos administradores e gerentes por coimas aplicadas a pessoas colectivas em processo de contra-ordenação, são inconstitucionais.

    m. A questão da inconstitucionalidade dessas normas do art.º 8° do R.G.l.T. é de conhecimento oficioso, podendo ser apreciada pela Administração Tributária, por sua iniciativa ou a requerimento do(s) interessado(s), e podendo estes, em caso de despacho desfavorável sobre a sua impetração nesse sentido, reclamar para o Tribunal Fiscal da 1ª Instância.

    n. O n.º 3 do art.º 30° da C.R.P. enuncia o princípio da intransmissibilidade das penas que, embora previsto apenas para estas, deverá aplicar-se a qualquer outro tipo de sanções, uma vez que estas têm como fim a prevenção (especial e geral) e a repressão, e não a obtenção de receitas.

    o. A aplicação de sanção a pessoa a quem não deve ser imputada responsabilidade pela sua prática não é necessária para satisfação dos fins que a previsão de sanções tem em vista e, por isso, é constitucionalmente proibida a sua aplicação, por força do art.º 18°, n.º 2, da C.R.P.

    p. A presunção legal de que a falta de pagamento consubstanciadora da infracção fiscal é imputável aos gerentes é inconstitucional por inconciliável com a presunção de inocência vigente em matéria sancionatória (art.º 32°, n.º 2, da C.P.).

    q. O n.º 10 do art.º 32.° da C.P. assegura ao arguido, em processos sancionatórios (incluindo contra-ordenações) os direitos de audiência e de defesa, que não são assegurados ao revertido.

    r. Conclui-se que, no domínio do Ilícito contra-ordenacional, se deve aplicar os princípios da intransmissibilidade das coimas e da presunção de inocência, pelo que estas não podem ser exigidas ao revertido, nos termos do art.° 8° do R.G.l.T.

    s. Face à inconstitucionalidade das alíneas a) e b) do n° 1 do art.° 8° do R.G.l.T., não pode a Administração Fiscal cobrar dos ora Recorrentes os montantes relativos a quaisquer coimas atinentes à Sociedade “D…”, por reversão.

  3. Sobre as normas Violadas: Com o devido respeito, consideramos que, no douto aresto recorrido, o Meritíssimo Juiz “a quo” violou o art.º 276.° do C.P.P.T., e os arts 18.º, n.° 2, 30.°, n.° 3, e 32.°, n°s 2 e 10, todos da Constituição da República Portuguesa (segundo os quais deverão ser julgados inconstitucionais as normas das alíneas a) e b) do n° 1 do art.º 8.° do R.G.l.T.).

    Termos em que Deve ser revogada douta sentença recorrida, sendo substituída por outra que acolha a posição defendida pelos Recorrentes, julgando adequado o meio processual por estes utilizado (reclamação de despacho da Administração Fiscal) e declarando a inconstitucionalidade das normas das alíneas a) e b) do n° 1 do art.º 8.° do R.G.I.T.

    Assim se fazendo JUSTIÇA! 1.2.

    A Recorrida não apresentou contra-alegações.

    1.3.

    O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, com a seguinte argumentação: «Os recorrentes defendem ser a reclamação prevista no artigo 276.° do CPPT, o meio processual adequado para o revertido impugnar, contenciosamente, o despacho da Administração Fiscal que indeferiu a pretensão de declarar que os executados por reversão não eram responsáveis pelo pagamento de coimas e despesas aplicadas à sociedade.

    No que a este fundamento do recurso respeita entendemos que a decisão recorrida fez uma correcta interpretação e aplicação da lei. Com efeito, a jurisprudência deste Supremo Tribunal vem há muito defendendo que a oposição à execução fiscal é o meio processual adequado para o revertido impugnar contenciosamente o despacho que ordena a reversão. Ver, entre outros, os acórdãos de 29/06/2005, recurso n.º 501/05; de 07/06/2007, recurso n.° 313/06; de 07/02/2007, recurso n.° 436/06; de 16/05/2007, recurso n.° 47/07; de 04/06/2008, recurso n.° 76/08; de 25/06/2008, recurso 123/08; de 27/05/2009, recurso n.° 448/09 e de 28/10/2009, recurso n.° 578/09.

    Sufragamos o entendimento perfilhado naqueles doutos arestos, bem como a sua fundamentação e discurso jurídico.

    Alegam também os recorrentes a inconstitucionalidade da norma do artigo 8.°, n.º 1, alíneas a) e b) do RGIT, aprovado pela lei 15/2001, de 4 de Junho.

    Também, no que a esta matéria respeita, entendemos que a decisão recorrida fez uma correcta interpretação e aplicação da lei, em conformidade, aliás, com a mais recente jurisprudência do Tribunal Constitucional, que decidiu não julgar inconstitucional aquela norma, na parte em que se refere à responsabilidade civil subsidiária dos administradores e gerentes por coimas aplicadas a pessoas colectivas em processo de contra-ordenação (acórdão n.º 129/2009, de 12 de Março de 2009, proferido no processo n.° 649/08)».

    1.4.

    Com dispensa dos vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, atenta a natureza urgente do processo, cumpre decidir.

    1. Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto: A- A Administração Fiscal instaurou os presentes autos de execução fiscal e apensos conta a executada D…, NIPC …, para cobrança coerciva de dívidas de IRC dos anos de 2001 a 2004, IVA de 2004 e Coimas Fiscais de 2006 - cfr. fls. 2 e segs. dos presentes autos.

      B- Por despachos de 18/09/2007, a execução a que se refere a alínea anterior reverteu contra os ora Reclamantes - cfr. fls. 20 a 25 destes autos.

      C- Os Reclamantes B… e C… foram citados em 08/10/2007 - cfr. fls. 31 a 34 e 52 a 55 dos presentes autos - C1- Em 15/03/2009, os Reclamantes a...

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