Acórdão nº 01300/05 de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Dezembro de 2009

Magistrado ResponsávelJosé Correia
Data da Resolução15 de Dezembro de 2009
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam, em conferência, no 2º Juízo da 1ª Secção (Contencioso Administrativo) do Tribunal Central Administrativo Sul.

1 - RELATÓRIO O Ministério Público, junto do TAF de Sintra, intentou nesse Tribunal acção administrativa especial de impugnação movida contra o Município de Cascais pedindo a declaração de nulidade: - da deliberação de 09.01.1998, da autoria da Câmara Municipal de Cascais, através do qual foi aprovada a reversão em favor da Contra-interessado C...de três parcelas de terreno que esta anteriormente havia cedido ao Município de Cascais, cedência essa titulada pela escritura pública de doação outorgada a 13.01.1983; - da deliberação da mesma edilidade de 29.07.1998, mediante a qual, como aditamento à deliberação de 09.01.1998, foi aprovada e reversão de parte das três parcelas de terreno anteriormente cedidas pela cooperativa C...ao Município de Cascais; - do contrato de reversão outorgado em 05.08.1998, e mediante o qual reverteram para a C...parte das três parcelas de terreno anteriormente cedidas/doadas pela cooperativa ao Município de Cascais e do contrato de compra e venda da mesma data e mediante o qual a Contra-interessada I...adquiriu as parcelas objecto da reversão mencionada; e da deliberação de 22.04.1998, da autoria da Câmara Municipal de Cascais, que aprovou a alteração ao alvará de loteamento n.º 704/84,prevendo o parcelamento em lotes de terreno para construção numa área que fora de cedência para o domínio público municipal. Requerendo ainda que seja determinado o cancelamento do registo dos actos de aquisição emergentes dos actos administrativos e dos contratos acima referidos.

Nessa petição foram indicados como contra-interessados a C...

– Cooperativa de Habitação Económica dos Trabalhadores da Estoril-Sol e a firma I...- Gestão e Comercio de Produtos Lda.

Por acórdão de 07.07.2005, o Tribunal “ a quo” julgou a acção parcialmente procedente, declarando a nulidade da deliberação de 22.04.1998, da autoria da CM de Cascais, que aprovou a alteração ao alvará de loteamento n.º 704/84, predizendo o parcelamento em mais lotes de terreno para construção numa área que fora cedida para o domínio público municipal.

Inconformados com a decisão, quer o Ministério Público, quer a contra interessada INTERMEGA, recorreram para este TCAS.

*RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO : O Ministério Público rematou a sua alegação recursória, do modo seguinte: “I - Recorre-se da aliás douta sentença proferida nos autos, de fls. 268 a 306 (do processo SITAF), em função do decidido nos segmentos referenciados no decisório sob as alíneas a), b), c), e e), com o que se não concorda.

II- Com efeito, em tais segmentos decidiu o Mmo. Juiz a quo:

  1. Não declarar a nulidade do acto administrativo datado de 09.01.1998, da autoria da Câmara Municipal de Cascais, e mediante a qual foi aprovada a reversão em favor da Contra-interessada C...de três parcelas de terreno que a mesma antes cedera ao Município de Cascais, cedência essa titulada pela escritura de doação outorgada a 13.01.1983.

  2. Não declarar a nulidade do acto administrativo datado de 29.07.1998, da autoria da Câmara Municipal de Cascais, e mediante o qual, por aditamento à deliberação de 09.01.1998, foi aprovada e reversão de parte das três parcelas de terreno anteriormente cedidas pela cooperativa C...ao Município de Cascais.

  3. Não declarar a nulidade do contrato de reversão outorgado em 05.08.1998, e mediante o qual reverteram para a C...parte das três parcelas de terreno anteriormente cedidas pela cooperativa ao Município de Cascais.

  4. Não declarar a nulidade do contrato de compra e venda outorgado também a 05.08.1998, e mediante o qual a Contra-interessada I...adquiriu as parcelas objecto da reversão mencionada.

    III- Pelo decidido foi pois determinada a parcial improcedência da pretensão processual do Ministério Público, e daí a razão do presente recurso por se continuar a entender que o quadro factual invocado no nosso articulado, e que aliás foi levado à sentença, era de modo a determinar diferente solução jurídica, justamente inversa à decidida e que agora se pretende seja reconhecida.

    Vejamos pois: IV - Por despacho datado de 17 de Novembro de 1977, da autoria do Presidente da Câmara Municipal de Cascais, fora aprovada uma operação de loteamento urbano para um prédio composto por várias parcelas de terreno, com a área total de 60.930m2, sito na Aldeia de Juzo, Freguesia e Concelho de Cascais, parcelas essas então descritas na respectiva Conservatória do Registo Predial sob os números 945, da 1a Secção, a fls. 142 do Livro B-28; 17600, da mesma Secção, a fls. 6v°, do Livro B-52; e 17601, também da mesma Secção, a fls. 7 do Livro B-52; 8961, a fls. 38, do Livro B-27; 21258- a fls. 15v°, do Livro B-63; 4118, a fls. 83 do Livro B-12; e 15567, a fls. 20 do Livro B-46; e inscritas na matriz predial da Freguesia de Cascais sob os artigos números 357, 466, 424, 359 e 355, todos da Secção 35.

    V- Na sequência desse acto de licenciamento, que previa o parcelamento do prédio em 200 lotes de terreno para construção urbana, foi emitido a 18 de Dezembro de 1984 o respectivo alvará de loteamento, com o n°708/84, em favor da sociedade Chesol, como proprietária do prédio e requerente no procedimento.

    VI - Por via do loteamento resultou uma cedência em favor do Município de Cascais de três parcelas de terreno, com a área total de 37.068m2, cedência consignada no alvará de loteamento e em escritura de doação irrevogável outorgada a 13 de Janeiro de 1983, num caso e noutro se mencionando que a cedência integrava três parcelas: a) uma com a área de 12.130m2, destinada a arruamentos.

  5. uma outra com a área de 3.900m2, destinada a edifício escolar.

  6. uma outra com a área de 21.038m2, destinada a zonas livres (parque), também referenciada na escritura notarial como zonas verdes dispersas.

    VII - Muito depois disto, mais precisamente a 02.10.1996, a C...veio requerer à Câmara Municipal de Cascais a devolução das parcelas de terreno, que antes cedera, o que lhe foi deferido pela deliberação da Câmara, de 9.01.1998, que aprovou a "...reversão das parcelas de terreno respeitante aos lotes cuja constituição será autorizada na operação de loteamento, com a área e confrontações definidas na planta n°7, constante do processo de loteamento".

    VIII - Aliás mesmo antes de tal deliberação a C... apresentara, a 28.08.1997, um pedido de alteração ao alvará 708/84, com vista à constituição de mais lotes de terreno para construção nas parcelas que cedera ao Município, o que veio a obter por deliberação da Câmara de 22.04.1998.

    IX- Posteriormente, em reunião de 29.07.1998, a Câmara Municipal de Cascais aprovou como um aditamento à deliberação de 9 de Janeiro de 1998, que antes aprovara a reversão em favor da C...das parcelas cedidas, nova autorização de reversão mas agora com a menção das áreas e descrição predial das mesmas.

    X - Em função desta segunda deliberação a reversão consistiria: a) numa parcela com a área de 2.517,70m2, a desanexar da descrição n°28.650, a fls. 1v°, Livro B-112, antes cedida para escola.

    b)numa parcela com a área de 1.318,35m2, a desanexar da descrição n° 28.649, a fls. 100, do Livro B-111, que antes fora cedida para arruamentos.

  7. numa parcela com a área de 3.490,65rn2, a desanexar da descrição n°28.651, a fls. 2 do Livro B-112, que antes fora cedida para parques, e zonas livres ou zonas verdes dispersas.

    XI- Na sequência das mencionadas deliberações da Câmara Municipal de Cascais, de 09.01.1998 e de 29.07.1998, que aprovaram a reversão, foi outorgada uma escritura notarial no mesmo sentido, titulada «contrato de reversão», lavrada a 05.08.1998, por forma a transferir para o património da C...as três referidas parcelas de terreno, e ainda nesse mesmo dia esta sociedade vendeu à firma I...aquelas três parcelas de terreno mediante escritura pública de compra e venda.

    XII - Sucede que, ao contrário do decidido na sentença, os actos administrativos mediante os quais foi autorizada a reversão em favor da C...são nulos e de nenhum efeito, e de igual nulidade padecem os subsequentes contratos de reversão e de compra e venda, mediante os quais se operou a transferência sucessiva de propriedade das três parcelas de terreno referenciadas nos autos.

    XIII - Com efeito, a cedência das mesmas pela Chesol, e por via da aprovação da operação de loteamento urbano, determinou a sua passagem para o domínio público municipal, o que significa que passaram a constituir res extra commercium. Isto redundou na sua inalienabilidade, ou indisponibilidade legal, a qualquer título de acordo com o disposto no art. 202°, n°2, do Código Civil, e em função do regime daqueles bens.

    XIV- Não era também sequer possível aprovar a reversão em favor da entidade cedente, porque se não verificarem os pressupostos que a lei então exigia para permitir a reversão. E de acordo com o disposto no art. 16°, nº 3 e 4, do DL 448/91, de 29 de Novembro, a reversão só seria possível se em função do comportamento do cessionário houvesse "...desvio da finalidade da cedência", e tal desvio não pode consistir numa pura omissão antes supõe um acto, material ou jurídico, de modo a aplicar o terreno a fim diverso daquele que determinou a cedência do bem, e que nunca existiu.

    XV- Este pressuposto da reversão, que consta do art. 16°, n°3, do DL 448/91, é pois bem diverso do que resulta da norma do art. 5°, n°1, do Código das Expropriações (versão do DL 438/91), onde se basta uma mera não aplicação do bem ao fim que justificara a expropriação.

    XVI - Ora, resulta que as parcelas de terreno não foram nunca utilizadas fará fim diverso do que determinara a cedência, a mera não utilização ou o estado de "zona verde não tratada" em que sempre se mantiveram era o que tinham à data da cedência e à da reversão, justamente porque da parte da Administração Municipal (Entidade Pública Demandada) nunca ocorrera uma intervenção sobre as parcelas, daí que os actos de aprovação da reversão, tanto o primeiro como o segundo, vieram...

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