Acórdão nº 0663/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Novembro de 2009

Magistrado ResponsávelALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Data da Resolução05 de Novembro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em subsecção, na secção do contencioso administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

1.1.

B… e outros, identificados nos autos, intentaram acção popular contra o Presidente da Câmara Municipal de Cascais e A….Lda., pedindo a declaração de nulidade da licença de construção titulada pelo alvará de licença de construção nº 1554, de 14/12/2001, respeitante a prédio no Estoril.

1.2.

Pelo Ministério Público foi suscitada a irrecorribilidade do acto impugnado. Essa questão foi decidida pelo despacho de fls. 344-346, transitado em julgado, pelo qual se decidiu: “[…] os recorrentes identificam de forma clara e entendemos que correcta, o acto que pretendem impugnar e que, entendemos também, é contenciosamente impugnável.

Trata-se não do alvará de construção – que é um mero documento que serve de título ao acto de licenciamento – e sim da licença de construção, ou licenciamento da construção.

No caso dos autos, não existiu propriamente uma deliberação da Câmara Municipal ou um despacho da entidade com delegação de competências para o efeito, no sentido expresso do licenciamento da construção. Houve duas aprovações de projectos, da arquitectura e das especialidades, a que se seguiu a emissão do título do licenciamento.

É do licenciamento – que decorre da aprovação daqueles projectos – que os recorrentes vêm recorrer contenciosamente.

O que se admite.” 1.3.

Por sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, de fls. 402 e segts., foi julgada procedente a acção e declarada a nulidade do acto administrativo datado de 25.2.2000, praticado pelo Presidente da Câmara Municipal de Cascais.

1.4.

Discordando, o Presidente da Câmara Municipal de Cascais deduziu o presente recurso, concluindo nas respectivas alegações: “I - A douta sentença recorrida faz uma errada interpretação das normas constantes das alíneas a) e b) do art. 27° do Regulamento do Plano Director Municipal de Cascais; II - A interpretação das normas do RPDM, em especial do art. 27°, não pode alhear-se dos princípios materiais que informaram o PDM, designadamente, a classificação das categorias de espaços e o espírito que presidiu a essa classificação; III - Quando da elaboração do PDM, constatou-se que no topo Norte do Casino, bordejando a Praça Almeida Garrett, existia já uma bancada de edifícios de média densidade; IV - Para se ir de encontro à realidade existente, o PDM classifica essa zona como espaço urbano de média densidade, a qual se estende ao terreno onde se encontra implantado o edifício licenciado; V - O quarteirão passou, com a entrada em vigor do PDM, a ser dividido em termos de planeamento em duas zonas distintas; VI - Essa distinção, reflectir-se-á necessariamente na interpretação do art. 27° do Regulamento, que deste modo quando fala de quarteirão ou de cérceas, se reporta apenas a parte do quarteirão integrante da categoria no espaço territorial respectivo; VII - Pelo que situando-se o edifício em espaço urbano de média densidade, o acto de licenciamento é perfeitamente válido, porque cumpre todos os parâmetros e condicionamentos constantes do Regulamento do Plano Director Municipal”.

1.5.

A…, Lda. também recorreu, concluindo: “I - MODIFICAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO

  1. O Tribunal não deu como provados os seguintes segmentos de facto, que são relevantes para o efeito desta acção e - estando, de resto, em parte implícitos na sentença - decorrem de documentos não impugnados: • que o quarteirão em que está integrado o prédio dos autos, situado a tardoz deste, se situa - com excepção da construção em apreço - numa zona classificada como de baixa densidade, porque é isso que resulta dos documentos referenciados nos factos assentes da sentença recorrida e ainda da planta do Departamento de Urbanismo e Infraestruturas da Câmara Municipal de Cascais junta como Doc. 3 à p.i ..

    • que o imóvel em apreço evidencia uma cércea claramente inferior ao prédio situado no outro lado do arruamento e uma cota claramente inferior ao prédio situado a norte (para além de que a sua fachada não ultrapassa os 16 metros), como decorre das fotografias não impugnadas juntas como Docs. 9 e 10 à audição prévia que consta do processo instrutor.

  2. Tais factos foram expressamente invocados na contestação da Recorrente, devendo ser considerados assentes, nos termos do art. 712° n° 1 do C.P.C.; ou, caso assim se não entendesse, o Tribunal não deveria ter passado à fase de alegações sem esclarecimento desta matéria de facto, pelo que, nessa hipótese, o processo deve baixar à 1ª instância para a produção da prova arrolada na contestação da ora Recorrida, nos termos do art. 712° n° 4 do C.P.C ..

    II - A PRETENSA VIOLAÇÃO DO ART. 27°-a) do RPDM DE CASCAIS C) A sentença assenta num pressuposto errado: o de que o índice admissível seria, no limite, de 0,44; mas não tem razão, porque, no caso da construção dos autos, o índice de utilização aplicado - 1,00 - respeita o PDM.

  3. O prédio em apreço integra uma zona de média densidade, quando a restante parte (quase totalidade) do quarteirão se integra numa zona de baixa densidade.

  4. E a sentença parte do princípio de que a obra deveria respeitar o índice de utilização existente no quarteirão, como resultaria da parte final da alínea a) do art. 27° do RPDM.

  5. Mas não tem razão, porque o índice de utilização existente no quarteirão só teria de ser considerado se todo o quarteirão integrasse a mesma categoria de espaço urbano, o que aqui não acontece, pois no quarteirão em apreço o PDM quis estabelecer uma distinção entre uma zona de média densidade e outra de baixa densidade - cfr. as plantas de ordenamento, que constam do Doc. 3 junto à p.i. - que evidenciam à saciedade que são bem distintas as manchas de média densidade e de baixa densidade que a carta de ordenamento prevê para o local em apreço.

  6. Não faz qualquer espécie de sentido aplicar à zona de média densidade o índice da zona de baixa densidade, sob pena de se tornar inútil a diversa classificação atribuída pelo PDM aos espaços urbanos em causa.

  7. É que se os espaços de média densidade tivessem de ponderar médias com espaços de baixa densidade inseridos no mesmo quarteirão, a consequência poderia ser - como seria no caso presente, em que temos uma pequena mancha de média densidade num vasto quarteirão de baixa densidade - a de anular completamente o efeito da classificação de média densidade, submetendo essa área a critérios que só se justificam para a baixa densidade.

  8. Estamos, pois, perante um prédio integrado numa zona de média densidade sem características bem definidas, o que deve levar à aplicação dos parâmetros aplicáveis aos loteamentos, por força da aplicação analógica do art. 25° n° 1- a). 1 do RPDM.

  9. Ora, nos termos do art. 29° do RPDM, que se aplica aos loteamentos dos espaços de média densidade, o índice de utilização pode ir até 1,00, com uma altura máxima de 16 metros para a fachada e demais características definidas nesse preceito legal, o que a obra - já executada - respeitou integralmente, sem prejuízo, obviamente, de também terem sido respeitadas as características morfológicas dominantes, tal como resulta dos princípios do PDM que previu uma mancha de média densidade no coroamento a Praça Almeida Garrett, a norte do Casino do Estoril, com a evidente intenção de estabelecer uma consolidação da frente edificada neste espaço, fazendo uma transição de cérceas para as áreas de baixa densidade situadas a tardoz.

  10. A sentença recorrida faz, pois, uma errada interpretação do PDM, já que não há qualquer violação do PDM nem de qualquer norma de direito administrativo, uma vez que não é o art. 27º - a) do RPDM que se aplica ao caso dos autos, mas os princípios consignados nos arts. 25° nº 1-a). e 29° nº 2 do RPDM, devidamente conjugados, já que o prédio dos autos se situa numa zona de média densidade sem uma envolvente com características bem definidas, tendo a tardoz um quarteirão integrado num espaço de baixa densidade.

    III - A PRETENSA VIOLAÇÃO DO ART. 27°-b) DO RPDM L) A sentença considera ainda que a nulidade do acto recorrido decorre da violação da alínea b) do art. 27° do RPDM, porque a altura da fachada excederia os 16 metros, como resultaria da alínea J) dos factos assentes.

  11. Na verdade, tal limite deve ser respeitado, não por força da alínea b) do art. 27° do RPDM, mas em resultado da aplicação do art. 29° nº 2-c) do RPDM.

  12. Porém, a sentença recorrida assenta em vários equívocos, a saber: • a alínea J) dos factos assentes reproduz o alvará de licenciamento da construção, mas não mede a altura da fachada na construção que efectivamente foi efectuada no local; • mais grave: confunde cércea com altura da fachada, que são conceitos...

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