Acórdão nº 2688/07.2TBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Outubro de 2009

Magistrado ResponsávelMANSO RAÍNHO
Data da Resolução29 de Outubro de 2009
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: PARCIALMENTE PROCEDENTE Sumário: I - Estando provado que a casa projectada era um sonho antigo dos autores, que vivem tristes e angustiados com a falta de construção da casa e ainda que tinham urgência na conclusão e entrega da mesma, o que era do conhecimento das rés, o que se compreende na medida em que se sabe que vivem em casa de pequenas dimensões e não adaptada à deficiência de uma das filhas, perdurando a irresolução do assunto há já bastante tempo, dizem as apelantes que não é identificável aqui um prejuízo não patrimonial indemnizável.

II – A nosso ver carecem de razão. Não estamos perante simples incómodos ou aborrecimentos que devam passar ao lado da tutela jurídica indemnizatória, mas sim perante danos respeitáveis, que podem e devem ser reparados.

Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na Secção Cível da Relação de Guimarães: César S...

e mulher Maria S...

demandaram, pelo tribunal da comarca de Viana do Castelo, M... & S... Construções, Lda e M... & S... Imobiliária, Lda, peticionando que se declarasse resolvido o contrato que estabeleceram com as rés por efeito de incumprimento destas, e se condenassem as rés no pagamento de indemnização pelos prejuízos líquidos e a liquidar que os autores sofreram em decorrência de tal incumprimento, acrescendo juros de mora.

Alegaram para o efeito, em síntese, que contrataram com a primeira ré a realização por parte desta de uma obra (edifício) em lote de terreno deles autores, sendo o preço pago mediante a entrega às rés, que entraram na posse respectiva, de um outro prédio pertença dos autores e que a segunda ré se propunha depois vender. Sucede que a primeira ré, alegando falta de disponibilidade financeira para execução da obra, acabou por abandonar a obra que já havia iniciado, incumprindo-se assim o contrato celebrado. Por efeito da conduta das rés têm os autores direito á resolução do contrato e à indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais que indicam, e que às rés compete reparar.

Contestaram as rés, concluindo pela improcedência da acção. Mais deduziram reconvenção, peticionando a condenação dos autores no pagamento à primeira ré da quantia que indicam, acrescida de juros de mora. Disseram para o feito, em síntese, que contrato algum chegou a ser concluído entre as partes, mas, não obstante, a primeira ré, na suposição da concretização do contrato, levou a cabo no prédio dos autores diversos trabalhos que estes viram beneficiar o seu património, cumprindo-lhes assim repristinar o respectivo valor.

A final foi proferida sentença que julgou improcedente a reconvenção e parcialmente procedente a acção, sendo declarado resolvido o contrato aludido pelos autores e as rés condenadas a pagarem a estes a quantia de € 16.635,86, acrescida de juros de mora, bem como a quantia que se liquidasse subsequentemente.

Inconformadas com o assim decidido, apelam as rés.

Da respectiva alegação extraem as seguintes conclusões: 1ª. A matéria do quesito 40 da base instrutória foi objecto da reclamação de fls. 164 e ss. dos autos, no que às cláusulas nele identificadas respeita, já que corresponde à transcrição integral das alterações a que se reporta a alínea N) dos factos assentes.

  1. Essas alterações constam dos documentos apresentados pelos recorridos, juntos aos autos com a p.i., como docs. 7 e 8 (fls. 52 a 61), documentos esses que não foram impugnados, nos termos e para os efeitos do disposto no artº 374º do Cód. Civil.

  2. Pelo que, atento o seu reconhecimento, fazem prova plena quanto ao seu teor, nos termos do disposto no artº 376º do Cód. Civil, sendo certo que não foi arguida nos autos a sua falsidade.

  3. Assim, a decisão que indeferiu a reclamação relativa ao quesito em causa, com fundamento na impugnação genérica feita no artº 41º da réplica, viola o disposto nos artigos 374º e 376º do Cód. Civil.

  4. Pelo que, deverá a reclamação de fls. 164 e segs. ser atendida, neste ponto, passando a constar dos factos assentes a matéria das cláusulas do quesito 40 da base instrutória.

  5. De acordo com a prova produzida nos autos, recorrentes e recorridos acordaram na execução de uma obra (construção de uma habitação), a realizar pelos recorrentes, em terreno pertencente aos recorridos, obra essa a que foi atribuído o valor de € 250 000,00, e cujo pagamento do preço seria efectuado através da permuta com um imóvel pertencente aos recorridos – cfr. alíneas H), I) e J) , dos factos assentes.

  6. Deste acordo, resultavam para recorrentes e recorridos obrigações de prestação diversa, sendo que a obrigação dos recorrentes consistia na execução de uma obra (construção de uma habitação) e a contraprestação dos recorridos era a troca (permuta) por um imóvel que lhes pertencia.

  7. Ora, da natureza de cada uma das prestações do acordo em causa, resulta que recorrentes e recorridos negociaram um contrato misto, através do qual uma das partes (os recorrentes) se obrigava a uma prestação do tipo contratual de empreitada, pertencendo a contraprestação do outro contraente (recorridos) ao tipo contratual diferente da compra e venda (aplicável à permuta).

  8. A este tipo de contratos mistos, na modalidade de prestações pertencentes a contratos distintos, também apelidados de contratos de tipo duplo, têm a doutrina e jurisprudência entendido, em consagração da teoria da combinação, que deve “aplicar-se a cada um dos elementos integrantes da espécie a disciplina que lhe corresponde dentro do respectivo contrato (típico)” – Antunes Varela, “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, pág. 294 10ª. Ora, no caso dos autos, nenhuma razão existe para subsumir a prestação adstrita aos recorridos ao regime do contrato de empreitada, subtraindo-a à disciplina do regime da compra e venda, tanto mais que, do objecto da prestação em causa - transmissão do direito real de propriedade sobre um imóvel - a lei impõe um regime de forma apertado, de natureza “ad substanciam”, por razões de segurança e certeza jurídicas.

  9. Por exigência de forma, a compra e venda (permuta) de bens imóveis só é válida se for celebrada por escritura pública (artº 874º e 875º do Cód. Civil) e, no domínio da promessa de contratar a futura transmissão da propriedade sobre o imóvel, deverá o contrato ser reduzido a escrito (artº 410º do Cód. Civil).

  10. Assim, atentas as exigências de forma, atinentes à prestação dos recorridos supra aludida, forçoso é de concluir que o acordo em causa depende da observância de forma escrita para assegurar a sua validade.

  11. Ora, resultando dos autos que as partes não se vincularam quanto às suas prestações recíprocas por documento escrito, forçoso é também de concluir que o acordo obtido, nos termos referidos em 6, não é suficiente para considerar que aquelas celebraram qualquer contrato.

  12. Acresce que, exigindo a lei, nos termos do disposto no artº 364º do Cód. Civil, como forma de declaração negocial, documento escrito, não pode este ser substituído por outro meio de prova ou por outro documento que não seja de força probatória superior.

  13. “Diz-se contrato o acordo vinculativo, assente sobre duas ou mais declarações de vontade (oferta ou proposta, de um lado; aceitação do outro), contrapostas mas perfeitamente harmonizáveis entre si, que visam estabelecer uma composição unitária de interesses”.

  14. “Para que haja contrato, em obediência à livre determinação das partes que está na base do conceito, torna-se indispensável que o acordo das vontades, resultante do encontro da proposta de uma das partes com a aceitação da outra, cubra todos os pontos da negociação (artº 232º C Civil)”.

  15. “Se a resposta do destinatário da proposta contratual não for de pura aceitação, haverá de considerá-la, em homenagem à vontade do proponente, como rejeição da proposta recebida ou como formulação de nova proposta, até se alcançar o pleno acordo dos contraentes (artº 233º C Civil)”. - In, A. Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I.

  16. Para além do acordo referido em 6, recorrentes e recorridos acordaram que eram as recorrentes encarregadas da elaboração das minutas dos contratos a enviar aos recorridos – cfr. alínea L) dos factos assentes, 19ª. O que fizeram em 23 de Outubro de 2006, e às quais os recorridos sugeriram alterações em meados de Novembro de 2006, tudo conforme consta dos documentos de fls. 44 a 51 e 52 a 61, juntos aos autos pelos recorridos, documentos esses que constituem a matéria das alíneas M) e N) dos factos assentes.

  17. Ora, as cláusulas que os recorridos pretendiam incluir e alterar nos respectivos contratos (quesito 40), contrariavam e alteravam significativamente os termos do negócio que havia sido previamente acordado entre recorrentes e recorridos, no que ao preço diz respeito, configurando uma nova proposta quanto aos termos do negócio – cfr. alínea J) dos factos assentes 21ª. Nos termos dessa nova proposta, os recorrentes teriam de suportar o pagamento das quantias de € 27.500,00 respeitante ao IVA, e a quantia de € 20.000,00, a título de mais valias, perfazendo o montante global de € 47.500,00. – cfr. ponto 41 dos factos provados da sentença.

  18. Ora, pretendendo impor às recorrentes o encargo adicional do pagamento daquelas quantias, cuja obrigação em sede tributária incide exclusivamente sobre os recorridos, mais não propunham estes, na prática, a diminuição do preço da empreitada que, previamente e de mútuo acordo, tinham estabelecido – (€250.000 – €47.500 = €202.500).

  19. Estas alterações não foram aceites pelos recorrentes – cfr. resposta ao quesito 8º-, sendo certo que era aos recorridos que competiria o ónus da prova sobre tal facto.

  20. Ora, nos termos do disposto no artº 233º do Cód. Civil, a nova proposta dos recorridos contendo as alterações – minutas de fls. 52 a 61 – implica a recusa da proposta negocial formulada pelos recorrentes – cfr. minutas dos contratos de fls. 44 a 51.

  21. Da falta de acordo sobre o preço – elemento essencial do negócio – resulta que o contrato não fica concluído – cfr. artº 232º do Cód. Civil.

  22. Daí...

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