Acórdão nº 2043/06.1TBLRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Julho de 2009

Magistrado ResponsávelDR. ARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução07 de Julho de 2009
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra Autor: A...

, residente na Rua de ..., ..., X......

Ré: B...

com sede em ..., ....., Y....

O autor alega que comprou à ré - que se dedica à venda de veículos novos e usados - um automóvel para seu uso doméstico, especificamente um Nissan com motor a gasóleo e matrícula de Janeiro de 2003, dando à troca o veículo que então possuía. Foi atendido pelo sócio gerente da ré, tendo este afirmado, além de outras coisas, que o veículo contava apenas com 49.242 quilómetros.

Para si era essencial na compra do veículo o número de lugares (cinco), o motor a gasóleo, o bom estado de conservação e a pouca quilometragem.

Concretizado o negócio, reparou logo no dia seguinte que o veículo apresentava dois problemas, no velocímetro e no rádio-leitor de CD. Mais tarde veio a saber que o veículo contava com cerca de cem mil quilómetros, ou seja, o dobro dos quilómetros indicados no taquímetro; se soubesse disso, nunca teria comprado tal veículo.

Apesar de lhe ter sido comunicado este facto, a ré - através do seu legal representante - foi respondendo que ia ver o que se podia fazer, sem propor qualquer solução e, a partir da data de vencimento do último cheque entregue para pagamento, quebrou unilateralmente todas as negociações.

O autor afirma que foi claramente enganado pela ré e que nunca desejou um veículo com aquela quilometragem; pretende ver o contrato resolvido, dispondo-se a entregar o veículo contra a entrega do preço que deu, acrescido de juros. Caso assim se não entenda, deve operar-se a redução do preço do veículo, para o que se terá em conta a quilometragem real do mesmo e a existência dos dois defeitos que assinalou.

Conclui defendendo que a presente acção deve ser julgada procedente por provada e a ré condenada na resolução do contrato de compra e venda, condenando-se a ré à devolução da quantia entregue pelo autor a título de preço do veículo em causa - ou seja, em € 17.250,00 - acrescida de juros de mora contados desde 23 de Dezembro de 2005 e até ao integral cumprimento (desde já se obrigando o autor a devolver o veículo à ré), devendo ainda ser condenada no pagamento ao autor da quantia de € 2.500,00 a título de indemnização por danos morais.

Caso assim se não entenda e "em alternativa", deverá a ré ser condenada a reduzir o preço do veículo para a quantia de € 16.739,00 - o que perfaz uma devolução ao autor da quantia de € 511,00 - e a proceder à reparação do leitor de CD, substituição do quadrante do velocímetro e conta quilómetros (taquímetro), bem como à substituição dos quatro amortecedores do veículo; condenada ainda no pagamento da quantia de € 2.500,00 a título de indemnização por danos morais sofridos pelo autor, bem como nos juros de mora sobre as quantias descritas, contadas desde a carta de 28 de Dezembro de 2005 até ao integral pagamento.

Ainda "em alternativa" ao pedido anterior, deverá a ré ser condenada a reduzir o preço do veículo para a quantia de € 16.739,00 - o que perfaz uma devolução ao autor da quantia de € 511,00 - e a pagar ao autor a quantia de € 2.183,93 - correspondente ao custo da reparação do rádio-leitor de CD, do quadrante do velocímetro e conta quilómetros e ainda dos quatro amortecedores e respectiva mão-de-obra; condenada ainda no pagamento da quantia de € 2.500,00 a título de indemnização por danos morais sofridos pelo autor, bem como nos juros de mora sobre as quantias descritas, contadas desde a carta de 28 de Dezembro de 2005 até ao integral pagamento Contestando a acção, a ré confirma a venda ao autor do veículo Nissan, refutando no entanto os factos que por ele são relatados quanto às circunstâncias em que se realizou o negócio.

Afirma que, no exercício da sua actividade, adquiriu o veículo para revenda e sujeitou-o a uma revisão geral; nega categoricamente ter alterado os quilómetros que apresentava.

Refuta o preço afirmado pelo autor, alegando que o valor atribuído ao Nissan foi de € 16.000,00 - para cujo pagamento o autor, além do seu veículo (avaliado em € 4.750,00), entregou dois cheques com datas de emissão distintas, nos montantes de € 1.250,00 e de € 10.000,00. Por altura da data em que este cheque deveria ser depositado, o autor dirigiu-se às instalações da ré, comunicando a impossibilidade de pagar na data aprazada, afirmando a existência de desentendimento com a respectiva entidade patronal, inviabilizando a intenção que tinha ao adquirir a viatura (de utilizar a mesma ao serviço da sua entidade patronal, debitando esta o valor dos quilómetros efectuados, assim conseguindo aumentar o valor dos seus rendimentos mensais) e pretendendo que a ré ficasse com o cheque em "carteira", aguardando o seu pagamento conforme as possibilidades do autor - o que aquela não aceitou; só então o veículo, cujo estado era perfeitamente satisfatório, passou a ter todos os defeitos do mundo.

Alega que o contrato já não pode ser resolvido, em primeiro lugar porque a ré não possui o veículo que o autor entregou e, em segundo lugar, porque não se vislumbra qualquer desconformidade, a qual nem sequer foi indicada.

Conclui defendendo que deve julgar-se a acção improcedente, com a consequente absolvição do pedido.

O autor veio responder à contestação, reafirmando que o preço do Nissan foi de € 17.250,00 e que o valor de retoma do seu veículo foi fixado em € 6.000,00. Refutou a intenção alegada pela ré relativamente à aquisição da viatura (afirmando que a respectiva entidade patronal sempre lhe atribuiu um veículo, sem que alguma vez se tenha verificado a utilização de veículo próprio do funcionário com a cobrança de quilómetros), bem como a alegada existência de dificuldades relativamente ao pagamento do cheque.

Conclui afirmando a improcedência das excepções invocadas pela ré e reitera os termos da petição inicial.

Com dispensa da audiência preliminar, foi proferido despacho saneador tabelar e seleccionou-se a matéria de facto relevante para a decisão da causa, fixando-se a matéria provada e a controvertida, de que reclamou o autor, quanto à base instrutória, o que foi indeferido, cf. despacho de fl.s 120 e 121, já transitado.

Procedeu-se à realização da audiência de julgamento, com observância do legal formalismo, com gravação dos depoimentos prestados.

Após o que foi proferida a sentença de fl.s 283 a 294 v.º, na qual se decidiu o seguinte: "1.1 Declaro resolvido o contrato de compra e venda do veículo com a matrícula 00-00-UN, outorgado entre autor e ré e, em consequência, condeno a ré a restituir ao autor a quantia de € 16.000,00 (dezasseis mil euros), correspondente ao preço do veículo e contra a restituição do mesmo pelo autor.

1.2 Condeno a ré a pagar ao autor os juros de mora calculados sobre o aludido montante, à taxa legal sucessivamente em vigor, actualmente de 4% ao ano, desde 27 de Dezembro de 2005 e até integral pagamento.

  1. Absolvo a ré do pedido relativamente ao remanescente que era reclamado pelo autor a título principal e julgo prejudicada a apreciação dos restantes pedidos, formulados a título subsidiário.

  2. Custas a cargo de autor e ré, na proporção 1/5 a cargo do primeiro e de 4/5 a cargo da segunda.

    * Notifique e registe.".

    Inconformada com tal decisão, interpôs recurso a ré, recurso, esse, admitido como de apelação e com efeito devolutivo (cf. despacho de fl.s 323), concluindo a respectiva motivação, com as seguintes conclusões:

    1. As respostas aos quesitos 14.º e 15.º devem ser alteradas para não provado.

    2. Não está demonstrado que o veículo tivesse cerca de 100.000 kms.

    3. O contrato em causa nos presentes autos não é de compra e venda mas de permuta.

    4. A existir divergência na quilometragem do veículo, a ré nada teve a ver com tal facto.

    5. Mas ainda que existisse tal divergência, essa diferença não afectaria a utilidade do veículo.

    6. Só aparentemente o autor peticionou a resolução do contrato.

    7. O que o autor verdadeiramente pretende com a acção, é que a ré lhe recompre o veículo pelo preço de 17.500,00 €.

    8. Não existe direito a resolver um contrato quanto se exige mais que aquilo que se entregou.

    9. Ainda que se decida haver lugar à resolução, enquanto o valor a entregar pela ré não se tornar certo e líquido, não é possível a sua...

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