Acórdão nº 7566/04.4TBVNG.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Julho de 2009

Magistrado ResponsávelURBANO DIAS
Data da Resolução14 de Julho de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

AA-Comércio de Automóveis Lª intentou, no Tribunal Judicial da Comarca de Vila Nova de Gaia, acção ordinária, contra BB -Comércio de Automóveis, S. A., pedindo a sua condenação no pagamento de 85.102,62 €, a título de indemnização de clientela, e 11.995,30 €, relativamente ao custo que suportou de materiais adquiridos, bem como 4.165,26 €, de custos de obras efectuadas, tudo tendo em conta o contrato que ambas celebraram, e que, posteriormente, foi denunciado por esta.

A R. defendeu-se, pedindo a sua absolvição, impugnando, para tanto, parte da factualidade vertida na petição e alegando que a denúncia ocorreu por virtude da nova legislação comunitária.

Seguiu-se a réplica e toda a demais tramitação normal até julgamento, e, findo este, foi proferida sentença a julgar a acção parcialmente procedente e, consequentemente, a condenar a R. no pagamento à A. de 21.275,65 € e juros, a título de indemnização de clientela.

Ambas as partes manifestaram desacordo com o julgado e daí que tivessem apelado para o Tribunal da Relação do Porto, com vista a fazer vingar pretensões diametralmente opostas: a A. pretendendo obter ganho total de causa; a R., batendo-se pela absolvição pura e simples ou, no caso de condenação por virtude do reconhecimento do direito à indemnização de clientela, que esta seja fixada noutros moldes, com alteração de parte da factualidade dada como provada.

A Relação do Porto negou provimento à apelação da A. e deu parcial razão à R., absolvendo-a do pedido de indemnização a que havia sido condenada.

Continuando inconformada, eis que a A. pede revista a coberto das conclusões seguintes: - O contrato celebrado entre A. e R. qualifica-se como um contrato atípico de sub-concessão comercial, ao qual se aplicam, por analogia, as regras do contrato de agência, previstas no Decreto-Lei nº 178/86, de 03.07, desde logo, as regras respeitantes à indemnização de clientela e ao respectivo cálculo, constantes dos artigos 33° e 34° do mencionado diploma.

- O acórdão recorrido considerou, e bem, que a R. beneficiou da clientela que a A. fidelizou e angariou, a quem revende, após a cessação do contrato de sub-concessão, veículos adquiridos ao Importador, com o qual, aliás, a R. outorgou novo contrato de concessão.

- Ocorreu, nesse contexto, após a cessação do contrato de sub-concessão, uma transferência da clientela da R. para a A., nas circunstâncias supra referidas, pelo que se encontra preenchido o requisito da angariação de novos clientes para a R., a que alude a primeira parte da alínea a) do nº 1 do artigo 33° do Decreto-Lei nº 178/86, de 03.07.

- O acórdão recorrido considerou igualmente, e bem, que se mostra preenchido o requisito negativo a que alude a alínea c) do nº 1 do artigo 33° do mencionado diploma, na medida em que, após o termo do contrato, não existiu qualquer acordo entre a A. e a R. no sentido desta continuar a pagar àquela uma certa quantia pelas operações negociais que levasse a efeito com os clientes angariados pela A..

- A consagração legal da indemnização de clientela exprime fundamentalmente uma preocupação de justiça, dirigida à protecção do interesse ou posição do agente, enquanto intermediário ou auxiliar no circuito de distribuição de bens ou serviços, em face de um resultado típico valorado pelo ordenamento como desvalioso.

- Esse resultado desvalioso consiste na privação, suscitada pelo termo do contrato, da possibilidade de o agente continuar a participar no aproveitamento do excedente produtivo gerado pelo fluxo de trocas com a clientela angariada e desenvolvida à custa do risco económico que suportou e através de uma actividade fortemente condicionada pela contraparte.

- Esta indemnização visa compensar o agente da actividade por si desenvolvida e de que o principal veio a beneficiar; é o ressarcimento de uma mais valia acrescida colocada ao serviço do principal, criada ou incrementada pelo esforço do agente.

- No que respeita aos benefícios a auferir pelo principal, nos termos e para os efeitos previstos na alínea b) do nº 1 do artigo 33° do Decreto-Lei nº 198/86, de 03.07, não se mostra necessário que eles tenham já ocorrido, bastando que, de acordo com um juízo de prognose, seja bastante provável que eles se venham a verificar, isto é, que a clientela angariada pelo agente constitua, em si mesma, uma chance para o principal.

- A recorrente não tinha qualquer possibilidade de diferenciar "os negócios eventualmente celebrados ou perspectivados celebrar de forma a ser possível a emissão de um juízo de prognose conducente à verificação ou não do requisito em análise", como exigido pelo acórdão recorrido, uma vez que tais factos respeitam à actividade comercial da recorrida e a recorrente não tem conhecimento dos mesmos.

- Será, por isso, adequado fazer intervir aqui a presunção (natural ou judicial, na medida em que corresponde às máximas da experiência do mundo dos negócios) de que um aumento, reputado considerável, da procura dirigida à empresa se virá a traduzir em benefícios, também consideráveis, para o empresário.

- A recorrente logrou provar que em virtude do mérito com que exercia a sua actividade, conseguiu fidelizar, à marca Toyota e ao seu estabelecimento, diversos clientes com os quais sabia poder contar no futuro.

- Ficou igualmente provado que, ao longo de dezassete anos de duração do contrato de sub-concessão comercial estipulado entre a A. e a R., a A., com enorme esforço e de forma ininterrupta, angariou e fidelizou diversos clientes, a quem, desde 1 de Outubro de 2003, a R. revende veículos automóveis que continua a adquirir ao Importador; - Nestas específicas circunstâncias, é inequívoco que, depois da cessação do contrato, a recorrente deixou uma clientela para os veículos automóveis que a recorrida vende, continuando a recorrida a beneficiar da actividade angariadora e fidelizadora da recorrente.

- Nessas mesmas específicas circunstâncias, os benefícios da recorrida com a actividade da recorrente de angariação e fidelização de clientela são necessariamente consideráveis, uma vez que todos os diversos clientes angariados e fidelizados pela recorrente, ao longo de 17 anos de duração do contrato de sub-concessão, passaram a comprar, desde 1 de Outubro de 2003, veículos automóveis "Toyota" à recorrente nos seus estabelecimentos em Oliveira do Douro e em Espinho, sendo certo que, em 1995, a clientela da A. foi directamente disputada pelo próprio Importador à recorrente.

- É de presumir que o fluxo de trocas que deu origem à margem média de lucro bruta de € 85.102,62, auferida pela recorrente nos últimos cinco anos de vigência da sub-concessão, se manterá, mas agora apenas no âmbito da actividade de concessionária da recorrida, na medida em que esta, a partir de 1 de Outubro de 2003, passou a revender aos clientes angariados e fidelizados pela recorrente os veículos automóveis que continua a adquirir ao Importador.

- Uma vez que a margem de lucro do concessionário é forçosamente superior à do subconcessionário, pode-se admitir com segurança que a actividade desenvolvida pela recorrente traz benefícios consideráveis à recorrida, na medida em que, após o termo da sub-concessão, a recorrida passou a contar com um acréscimo na sua margem de lucro bruta equivalente a um valor médio anual superior a € 85.102,62.

- Um...

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