Acórdão nº 195/2000.C2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Maio de 2009

Magistrado ResponsávelSEBASTIÃO PÓVOAS
Data da Resolução07 de Maio de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: AA, intentou acção, com processo ordinário, contra o "Banco BB, SA" (actualmente "Banco CC, SA") pedindo a condenação do Réu a repor na sua conta depósito (n.º 000/0000000) a quantia de 3.340.000$00, com juros de mora, à taxa legal, desde 31 de Maio de 1996 (sendo os vencidos no montante de 2.178.159$00) até integral pagamento.

Alegou, nuclearmente, ser titular daquela conta depósito, juntamente com DD; que em 31 de Maio de 1996 existia um saldo superior a 3.340.000$00; que, nessa data, a agência do Réu de Tomar debitou-lhe a quantia referida em resultado do pagamento de um cheque, supostamente preenchido e assinado, no mesmo dia, pela co-titular DD e endossado ao Réu; que a DD falecera em 21 de Janeiro de 1990, data em que a conta teria o saldo aproximado de 200.000$00; que as assinaturas do cheque não eram da autoria do titular do depósito; que os funcionários do Réu agiram negligentemente.

Em contestação o Réu disse ter feito queixa-crime para apuramento dos responsáveis, pelo que essa questão é prejudicial em relação a esta causa; que o seu funcionário não foi negligente; que as quantias depositadas eram a pensão de reforma da DD, que continuou a ser-lhe paga após a sua morte, não sendo devidos ao Autor.

Na 1ª Instancia a acção foi julgada improcedente, o Réu absolvido do pedido e o Autor condenado como litigante de má fé.

Mas a Relação de Coimbra anulou o julgamento para que fosse ampliada a matéria de facto.

Entretanto o Autor ampliou o pedido para, no caso de procedência, o Réu fosse condenado a transferir o saldo, até 31 834,60 euros, para a "Caisse Nationale D´assurance Vieillesse".

De novo foi proferida sentença a julgar a acção improcedente e condenando o Autor como litigante de má fé na multa de 3 UC s e em igual quantia de indemnização ao Réu.

Apelou o Autor para a Relação de Coimbra que confirmou a sentença apelada.

Pede, agora, revista formulando as seguintes conclusões: 1.ª O facto essencial a apreciar nos autos é este: no dia 31 de Maio de 1996 o réu - então BPA - entregou a quantia de 3.340.000$00 em dinheiro, no balcão de Tomar, ao portador de um cheque desse montante que aí lhe foi apresentado já com as "assinaturas" de saque e de endosso da sacadora, dizendo o portador que a titular se encontrava no exterior do balcão da agência, se fosse necessária a sua presença, por ser pessoa idosa, e cujo Bilhete de Identidade apresentou, sendo que esta já tinha falecido em 21 de Janeiro de 1990.

  1. O A. era contitular da referida conta, cuja 1.ª titular era sua mãe DD, ex-emigrante em França e para aí tinham sido transferidas as pensões de reforma de sua mãe mesmo após o seu falecimento, sendo que as Caixas francesas vieram entretanto reclamar o retorno das verbas indevidamente enviadas para Portugal.

  2. O A. considerando assim violado o contrato de conta estabelecido com o Banco veio pedir a condenação deste a repor na dita conta a mencionada quantia de 3.340.000$00 acrescida de juros legais desde 31-05-1996.

  3. O A. foi condenado como litigante de má fé a indemnizar o R., por ter omitido a proveniência do dinheiro, ter pedido a sua restituição e ter omitido o óbito de sua mãe quer ao R. quer às Caixas francesas, factos considerados essenciais à descoberta da verdade.

  4. Porém, o A. não pediu que o Banco fosse condenado a pagar-lhe a ele próprio o que quer que fosse mas sim que o Banco fosse condenado a repor na conta a mesma quantia que daí tinha indevidamente retirado e pediu também posteriormente que o Banco fosse condenado a transferi-la para as Caixas francesas.

  5. Não está sequer provado factualmente que o A. tenha omitido ao Banco e às Caixas Francesas o falecimento de sua mãe, sendo certo que também não se demonstra que pretendesse ou pudesse beneficiar ele próprio com tal ocultação ou prejudicar o R.

  6. Aliás, foi o A. que obrigou o R. a esclarecer a verdade sobre o pagamento do cheque, enviando-lhe a carta de 24-09-1998 cuja cópia está junta aos autos, onde logo explicava ao Banco que o problema era precisamente que as Caixas francesas iriam exigir a reposição do referido montante, receando o A. ver-se arrastado e envolvido nesse problema, dada a sua qualidade de herdeiro.

  7. É assim descabido dizer-se que o A. ocultou ao Tribunal a proveniência do dinheiro e que este só com a contestação veio a ter conhecimento de tais factos, pois o que acontece é que o A. restringiu a acção à mesma causa de pedir que já naquela carta e cerca de dois anos antes tinha anunciado ao réu: sentir-se defraudado por ter sido cometida uma irregularidade numa conta de que era titular.

  8. A condenação do A. como litigante de má fé não tem sustentação legal e corresponde em rigor a uma sanção imposta unicamente com base na opção deste por determinada causa de pedir que não contemplava nem tinha de contemplar a discussão quanto à propriedade das quantias transferidas para a referida conta, antes se baseando exclusivamente na violação dos contratos de conta e de cheque por parte do R.

  9. O R. infringiu as mais elementares regras de prudência ao pagar ao balcão um cheque de 3.340.000$00 sem ao menos identificar a pessoa do portador a quem pagou aquele montante e de quem normalmente seria de exigir a assinatura, pois como portador do cheque que se apresentou no Banco a cobrá-lo deveria aquele ser também o último endossante.

  10. Competindo ao Banco verificar a regularidade da sucessão de endossos, corno lhe era imposto pelo artigo 35.º da LUCH.

  11. Se o Banco réu tivesse cumprido escrupulosamente os deveres contratuais que se lhe impunham ter-se-ia evitado que a conta fosse movimentada irregularmente e no mínimo seria facilmente identificado o beneficiário do pagamento irregular! 13.ª Não é despiciendo, contrariamente ao entendimento da Relação, que se tenha mencionado no verso do cheque uma conferência de assinatura da endossante por referência ao número do respectivo Bilhete de Identidade, quando este documento contém menos um apelido do que a dita "assinatura".

  12. Seria também de exigir que o endosso de um cheque pago ao balcão fosse feito presencialmente, como é habitual, sendo certo que se tal tivesse sido exigido e à frente do funcionário bancário, logo se tomaria impossível concretizar o pagamento porque a titular DD já não era viva há mais de 6 anos.

  13. É ainda relevante que a operação de pagamento do cheque tenha ocorrido muito depois de o Banco saber que a DD tinha falecido, pois a carta da Caixa Francesa junta a fls. 131 (por requisição do Tribunal), datada de 2 de Janeiro de 1995, começa por referir: «permitimo-nos retomar o contacto convosco na sequência do óbito da Sra. DD...».

  14. Bem como é relevante o facto de ter sido o próprio funcionário do Banco EE que preencheu o cheque, nele inscrevendo o valor que praticamente esgotava o saldo existente na conta, como se consignou na sentença do processo-crime n° 120/99.2TBTMR, junta aos autos por certidão.

  15. A imputação de culpa predominante ao A. por não ter providenciado pela guarda ou restituição dos módulos dos cheques ao R. é inaceitável, pois os mesmos tinham ficado em casa de seu irmão FF, última residência de sua mãe, e esse facto não pode ser considerado senão causa muito remota da fraude e nunca uma causa adequada.

  16. A...

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