Acórdão nº 08P3040 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução22 de Abril de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. AA instaurou, em 20 de Setembro de 2005, no Tribunal do Trabalho de Matosinhos, contra GOP - Gestão de Obras Públicas da Câmara Municipal do Porto, acção emergente de contrato de trabalho pedindo a condenação da Ré: a) a integrá-la no Gabinete Jurídico existente na sua estrutura funcional, de acordo com as suas qualidades profissionais enquanto jurista e para as quais foi contratada; b) a distribuir à Autora os serviços necessários a permitir-lhe realizar a sua prestação de trabalho no âmbito das funções jurídicas a desempenhar; c) a atribuir-lhe a categoria de técnica superior, desde Setembro de 2003 e a correspondente remuneração a ser fixada nos termos do artigo 265.º do Código do Trabalho; d) a pagar à Autora as diferenças salariais resultantes da liquidação pedida em c), desde Setembro de 2003, e cujo valor fixou provisoriamente em € 16.754,00 acrescida de juros à taxa legal; e) a pagar-lhe a título de danos não patrimoniais a quantia que vier a ser fixada pelo Tribunal, mas nunca inferior a € 5.000,0.

Alegou, em síntese, que: - Em 1 de Novembro de 2001 celebrou com a Ré, verbalmente, um contrato de trabalho, passando a integrar, desde essa data, o quadro de pessoal da empresa com a categoria de técnica jurista, integrando comissões e júris de procedimentos concursais promovidos no que concerne às empreitadas de obras públicas e aquisição de bens e serviços, cooperando na elaboração de determinados contratos de projecto, revisão de projecto, fiscalização de empreitadas, fornecimentos, estudos auxiliares e secretariando o Conselho de Administração da Ré; - Em meados de 2003, a Ré propôs à Autora a assessoria jurídica do Gabinete Pós-Construção, implementado nessa altura como nova estrutura organizacional da Ré, com a promessa de que progrediria mais rapidamente na carreira, e que lhe seria atribuída a categoria de técnica superior, face ao que a Autora aceitou as "novas funções" que iniciou em Setembro de 2003, deixando de exercer as que até à data exercia; - Contudo, a Autora veio a verificar que as "novas funções" não a ocupavam a tempo inteiro e começaram até a rarear, o que a levou, inclusivamente, a exercer tarefas que não se enquadravam nas suas funções específicas (de natureza jurídica); - Perante o "vazio" de funções em que se encontrava, em Setembro de 2004, a Ré convidou a Autora a pôr termo ao contrato de trabalho por mútuo acordo, o que não foi por esta aceite; - Desde então, a Autora tem desempenhado tarefas que não se ajustam à sua categoria profissional, passando por uma situação de quase não atribuição de qualquer trabalho, sendo que a Ré não a promoveu à categoria de técnica superior, como havia prometido, e atribui-lhe remuneração desajustada tendo em conta as remunerações atribuídas aos demais juristas, como é o caso de uma jurista que foi assumir as funções exercidas pela Autora antes do seu ingresso no referido Gabinete, à qual a Ré atribuiu a categoria de técnica superior e uma remuneração mensal ilíquida de € 1.250,00, muito superior à auferida pela Autora à data da contratação daquela (€ 860,80).

A Ré contestou, a pugnar pela improcedência da acção, alegando, em resumo, que: - A Autora nunca exerceu as funções de assessoria jurídica com espírito de iniciativa, diligência, produtividade e qualidade e que a sua integração no referido Gabinete teve por finalidade proporcionar à Autora a oportunidade de demonstrar aqueles atributos, o que não aconteceu, sendo certo que, actualmente, ela é pouco solicitada pelos demais colegas do Gabinete para o aconselhamento na área jurídica; - Acresce que à Autora, como responsável única do referido Gabinete, a nível jurídico, competia tomar determinadas iniciativas e procedimentos, o que não fez, tendo, antes, optado por "trabalhar menos"; - Por isso, e atendendo ao pouco rendimento da Autora, não se justificava qualquer progressão na carreira nem qualquer actualização salarial; - E a jurista, que a Ré contratou para preencher a deslocação da Autora para o Gabinete de Pós-Construção, passou a colaborar com os diferentes sectores da empresa.

Após resposta da Autora, prosseguiram os autos, vindo a realizar-se a audiência de discussão e julgamento, na sequência da qual foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, com a consequente absolvição da Ré do pedido.

Apelou a Autora, com relativo sucesso, pois o Tribunal da Relação do Porto concedeu provimento parcial ao recurso, condenando a Ré "a pagar à Autora, a título de diferenças salariais, a quantia de € 14.501,00 (reportado ao período que vai de Setembro de 2003 a Setembro de 2005), acrescida dos juros à taxa de 4% ao ano, a contar da data do vencimento de cada uma das prestações parcelares e até integral pagamento", bem como "a título de diferenças salariais, e a partir de Outubro de 2005, as quantias a apurar oportunamente e até à data em que reponha o salário da Autora nos montantes auferidos pela outra jurista", absolvendo-a dos demais pedidos.

  1. Do acórdão que assim decidiu veio a Ré pedir revista, para ver julgada a acção totalmente improcedente, terminando a respectiva alegação com as conclusões que se transcrevem: «1.ª - O douto Acórdão sob censura, na parte recorrida, tem subjacente a consideração de que se provou ter existido, por parte da recorrente, [ ] um tratamento salarial diferenciado entre a recorrida e outra jurista, sua Colega de trabalho, pelo que teria sido violado o princípio da igualdade de tratamento; 2.ª - Ora, como vem sendo orientação jurisprudencial deste Alto Tribunal, cabia à recorrida - que se considerou discriminada - alegar e provar que o seu trabalho era igual ao da outra jurista admitida em Setembro de 2003, não só quanto à natureza mas também quanto à qualidade e quantidade; 3.ª - Sucedeu que a recorrida não alegou nem provou quais eram as funções específicas que executava para a recorrente a fim de se poder comparar a respectiva natureza e o respectivo conteúdo com as que vieram a ser desempenhadas pela "nova jurista"; 4.ª - E isso mesmo se constatou no douto Acórdão recorrido que, sem dar a devida relevância a tal falta, concluiu: "Tendo em conta a matéria provada - em especial a referida sob os n.os 3, 11, 12, e 14 do § II do presente acórdão -, podemos concluir que a Autora conseguiu provar que ela e a outra jurista exercem funções de assessoria jurídica, mas auferem remunerações diferentes (...)"; 5.ª - O facto de se ter provado que a recorrida e a Colega a que se opõe exercem, para a recorrente, funções de assessoria jurídica não deve conferir, só por si, à recorrida o direito a receber igual retribuição; 6.ª - Para tal teria ela de alegar e provar os elementos do referido princípio da igualdade de trabalho, 7.ª - designadamente, que a quantidade e qualidade desse trabalho era igual à da outra Colega de trabalho; 8.ª - Só assim se poderia concluir pela existência, ou não, de discriminação ou diferenciação de tratamento, 9.ª - tudo dependendo, então, de a recorrente conseguir, ou não, provar que tal diferenciação não assentava em critérios meramente subjectivos, mas objectivos; 10.ª - O que invocou a recorrida - que ela e a outra jurista foram admitidas ao serviço da recorrente para lhe prestarem assessoria jurídica - é, manifestamente, insuficiente, genérico e impreciso; 11.ª - Nas assessorias jurídicas podem existir diferenças substanciais, quer em natureza do trabalho, quer em quantidade do trabalho, quer, ainda, em qualidade de trabalho, que bem podem justificar, e justificam, por regra, diferenças substanciais nas remunerações dos assessores; 12.ª - As funções até podem ser as mesmas. Mas ser bem diferente a forma de as exercer, tendo em conta a quantidade e a qualidade dos serviços prestados; 13.ª - Sucede, no entanto, no caso dos autos, que existe matéria de facto dada como provada que, claramente, aponta no sentido de que as funções da recorrida e as da outra jurista começaram por ser, e são, diferentes; 14.ª - Na verdade, a admissão da nova jurista - em Setembro de 2003 - coincidiu com a reestruturação dos serviços da recorrente em que, 15.ª - por um lado, a recorrida aceitou ir desempenhar novas funções no novo Gabinete de Pós-Construção, enquanto, 16.ª - por outro lado, a nova jurista passou a integrar o novo Gabinete...

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