Acórdão nº 08P0581 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelSOUTO DE MOURA
Data da Resolução20 de Novembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. No processo comum n° 218/03.4JASTB das Varas de Competência Mista do Tribunal da Comarca de Setúbal, e em Tribunal Colectivo, AA, nascido a 23.04.74, e BB, nascido a 18.11.58, foram julgados, conjuntamente com outros arguidos, e condenados por acórdão de 21/4/2006 (fls. 1219 e seg.), entre o mais, nas seguintes penas: 3 anos e 6 meses de prisão por cada um dos dois crimes de roubo do artº 210º nº 1 e 2 com referência ao artº 204º nº 2 al. g), ambos do C. P., em que os dois arguidos foram condenados, e 6 anos de prisão o Artur, e 8 anos de prisão o Carlos, pelo crime de violação do artº 164º do C.P., imputado também a cada um deles.

    Em cúmulo, foram condenados nas penas únicas, o AA de 8 anos de prisão e o BB de 10 anos de prisão.

  2. Desta decisão, recorreu para o S.T.J., o Mº Pº (fls. 1295 e seg.), por considerar que os arguidos deveriam ter sido condenados, ainda, pela prática, em concurso efectivo, do crime de sequestro do artº 158º nº 1 do C.P.. O arguido AA ofereceu a sua resposta (fls. 1502 e seg.).

    Recorreu também este mesmo arguido AA para o Tribunal da Relação de Évora (fls. 1317 e seg.), tanto de facto como de direito, e ainda o arguido Carlos (fls. 1407 e seg.), que porém limitou o seu recurso à medida da pena que lhe fora aplicada. O Mº Pº formulou a pertinente resposta (fls. 1461 e seg.) aos recursos interpostos pelos arguidos.

    Os três recursos foram admitidos a fls. 1444, considerando-se o Tribunal da Relação de Évora o competente para conhecer de todos eles.

  3. Por acórdão de 12/12/2006, o tribunal da Relação de Évora conheceu de todas as questões colocadas, e decidiu: - Proceder a uma correcção, de erro na qualificação dos factos referentes aos crimes de roubo imputados, que atribuiu a mero lapso, [onde se escreveu "artº 204º nº 2 al. g)" deveria ter-se escrito "artº 204º nº 2 al. f)"].

    - Considerou improcedentes os recursos dos arguidos.

    - Deu parcial provimento ao recurso do Mº Pº, e, consequentemente, revogou o acórdão recorrido na parte em que absolvera ao arguidos do crime de sequestro que lhes era imputado na acusação.

  4. Deste acórdão do Tribunal da Relação de Évora interpôs recurso para o S.T.J. o arguido Artur (fls. 1666 e seg.) e o arguido BB (fls. 1707 e seg.), os quais foram admitidos, mas com subida diferida, conjuntamente com a do recurso que se viesse a interpor da decisão final, "uma vez que foi julgado procedente o recurso do Ministério Público".

    O Mº Pº respondeu (fls. 1728 e seg.).

  5. Os autos baixaram à 1ª instância, foi dado cumprimento ao artº 358º nº 3 do C.P.P., reabrindo-se a audiência, e proferido novo acórdão (fls. 1935 e seg.) a 25/5/2007. Foi alterada a qualificação dos factos por via da imputação de mais um crime de sequestro (fls. 1961 a 1963) e bem assim, consequentemente, as penas aplicadas (fls. 1969 e seg.).

    O arguido AA ficou condenado na pena única, em cúmulo, de 9 anos de prisão, e o arguido BB na de 11 anos de prisão.

  6. O arguido AA interpôs mais uma vez recurso (fls. 1993 e seg.), desta feita da última decisão referida, recurso que pretendeu que fosse acompanhado do recurso que havia interposto do acórdão da Relação de 12/12/2006.

    O mesmo fez o arguido BB (fls. 2021 e seg.).

    O Mº Pº respondeu (fls. 2044 e seg.).

    Cumpre portanto conhecer dos recursos interpostos por ambos os arguidos do acórdão de 12/12/2006, do tribunal da Relação de Évora, bem como do segundo acórdão da 1ª instância, de 25/5/2007.

    A - FACTOS DADOS POR PROVADOS NOS ACÓRDÃOS DE PRIMEIRA INSTÂNCIA RELATIVOS À MATÉRIA CRIME (transcrição).

    "1) Na madrugada de 20 de Abril de 2003, a horas não concretamente apuradas, CC e DD encontravam-se no interior da viatura automóvel de marca Ford, modelo Fiesta, com a matrícula ...-...-..., propriedade do primeiro.

    2) Esse veículo encontrava-se estacionado na serra da Arrábida, junto ao convento, onde os dois procuravam desfrutar da paisagem que os envolvia, após terem mantido relações sexuais.

    3) A dado momento, foram ambos surpreendidos por um indivíduo que -munido de um objecto não apurado - partiu o vidro da janela dianteira do lado direito do veículo.

    4) Os estragos infligidos no veículo automóvel importaram num prejuízo aproximado de € 90,00 + IVA (custo do vidro quebrado).

    5) Sem que tivessem tempo de reagir foram cercados por 3 indivíduos que desde logo os ameaçaram; um deles (BB) empunhando uma arma de fogo e outro (EE) uma arma branca.

    6) Esses indivíduos gritaram para abrirem as portas imediatamente e não se mexerem.

    7) Os arguidos entraram, então, no interior da viatura, sendo que um dos indivíduos, de tez morena (FF) ocupou o lugar do condutor, um outro, que aparentava ser o mais velho, (BB) empunhando uma arma de fogo, sentou-se no lugar do pendura e um terceiro (EE) sentou-se junto das vítimas, no branco traseiro, fazendo gestos ameaçadores com uma faca.

    8) FF conduziu a viatura do CC para um local ermo, levando o CC e a DD contrariados na sua vontade, e parando a marcha junto das antenas.

    9) FF não possui carta de condução nacional nem é portador de outra habilitação legal para conduzir veículos automóveis.

    10) Sabia esse arguido que para conduzir na via pública ou equiparada um veículo automóvel com as características daquele que dirigia, necessitava de documento próprio que lhe permitisse desenvolver essa actividade.

    11) Durante todo o percurso BB, que ia sentado no lugar do pendura, ia proferindo diversas ameaças, empunhando sempre a arma de fogo.

    12) Uma vez chegados à zona das antenas, na serra da Arrábida, surge um outro indivíduo (AA) até então desconhecido das vítimas, e que conduziu uma outra viatura de marca Honda, modelo Civic, matrícula ...-...-..., seguindo-os até aquele local.

    13) Nesta sequência os arguidos exigiram ao CC e à DD, a entrega dos cartões de débito e de crédito que possuíssem, bem como os respectivos códigos PIN.

    14) Desse modo obtiveram o cartão de débito de CC - referente a uma conta do banco Totta & Açores, de dependência de Palmela, com o n° .... e o código que forçaram a entregar-lhes.

    15) Após, AA e BB afastam-se do local na viatura Honda, tendo os outros dois co-arguidos amarrado o CC.

    16) Dirigiram-se à Av. ...... (Setúbal) e, no terminal de ATM aí existente levantaram primeiro 150 Euros, depois mais 40 Euros e, por fim, mais 10 Euros. Encaminharam-se seguidamente para a Av. das..... e do terminal de ATM disponível lograram levantar, ainda, mais 100 Euros.

    17) Decorrida cerca de uma hora, regressam então esses dois indivíduos com a quantia de 300 Euros que haviam retirado da conta do CC, mas referindo que só haviam conseguido levantar 150 Euros.

    18) O BB e o AA exigiram então à DD que saísse do carro, levando-a contra a sua vontade e apesar dos seus veementes protestos, para um local mais afastado onde permaneceram cerca de 30 minutos.

    19) Durante o tempo em que a DD esteve com tais indivíduos, estes forçaram-na a praticar sexo oral com o arguido BB e sexo vaginal com ambos os arguidos.

    20) Um dos arguidos, o mais baixo, BB, contra a sua vontade, levou a cabo cópula completa sem uso de preservativo, penetrando o pénis na vagina da DD e aí ejaculando (facto aditado em conformidade com o disposto no artigo 358°, n° 1 do C.P.P), não sem antes a ter forçado a manipular-lhe o pénis e a praticar-lhe sexo oral, introduzindo-lhe igualmente o pénis na sua boca (facto aditado em conformidade com o disposto no artigo 358°, n° 1 do C.P.P.).

    21) O outro, mais alto e entroncado, o AA, manteve com ela, sem o seu consentimento ou desejo, cópula vaginal, mediante a introdução do seu pénis na respectiva vagina (facto aditado em conformidade com o disposto no artigo 358°, n° 1 do C.P.P.), com o uso de preservativo.

    22) Por fim regressaram com a DD até ao local onde estavam os outros dois arguidos com o CC.

    23) Reunidos os quatro arguidos exigiram todos os bens das vítimas, designadamente: três telemóveis (cartões com os n°s ......, ..... e ....., sendo dois do CC, no valor de 150 Euros e um da DD, de valor não apurado), todo o dinheiro que tinham consigo (numa soma que não foi possível precisar), diversos CD's musicais, equipamento de mergulho (barbatanas) e um par de ténis, do CC, tudo no valor de 165 Euros e um par de botas da DD, no valor de cento e tal euros, bem como um relógio no valor de 50/70 euros e uma pulseira em ouro cujo valor não foi possível determinar (factos aditado em conformidade com o disposto no artigo 358°, n° 1 do C.P.P.).

    24) Os ofendidos ficaram privados da sua liberdade ambulatória durante todo este lapso de tempo até à fuga dos arguidos que os abandonaram nesse local.

    25) Os arguidos usaram, como meio para a plena concretização dos seus intentos apropriativos, violência física e psíquica contra os ofendidos por forma a obstar a qualquer tipo de resistência por parte destes, tendo-os perturbado de tal forma que ficaram intimidados e não ofereceram qualquer tipo de resistência, sendo coagidos a abrir mão dos objectos e valores supra referidos.

    26) Ao assenhorearem-se desses bens e valores, levando-os em seu poder, os arguidos tiveram o propósito de os integrar no seu património, fazendo-os coisa sua, bem sabendo que estes não lhe pertenciam e que actuavam, sem qualquer autorização, contra a vontade e em prejuízo dos seus legítimos donos.

    27) AA e BB tinham conhecimento da circunstância de não poderem utilizar o cartão multibanco do ofendido CC, e que a realização de levantamentos de quantias monetárias a seu favor e contra a vontade do CC, mediante a utilização (digitação) do seu código numérico de acesso à respectiva conta bancária implicava a utilização desses dados sem autorização.

    28) AA e BB tinham conhecimento que ao manterem práticas sexuais com a ofendida, contra a sua vontade, desrespeitavam de forma grave, a sua liberdade sexual.

    29) Os arguidos agiram, sempre, de forma livre, voluntária e deliberada, não desconhecendo a reprovabilidade dos seus comportamentos.

    30) Os arguidos, quanto aos factos descritos sob os n°s 5 a 8; 11 a 17 e 24 agiram em comunhão de esforços e...

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