Acórdão nº 08A1941 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Setembro de 2008

Magistrado ResponsávelPAULO SÁ
Data da Resolução16 de Setembro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - No Tribunal da Comarca de Lisboa (3.ª Vara Cível) veio E... - C... E... de N..., F... e I..., L.da intentar acção declarativa de condenação, em processo comum, sob a forma ordinária, contra a Câmara Municipal de A...

(deve entender-se como dirigida contra o Município de A...

, que é a autarquia) pedindo a condenação da Ré, no pagamento à Autora da quantia de 3.257.690$00, acrescida da quantia que se vier a liquidar na acção, nos termos do art. 471.º, n.º 2, 2ª parte, ou que se vier a liquidar em execução de sentença, nos termos do art. 661.º, n.º 2, do CPC, acrescida de juros moratórios à taxa legal, contados a partir dos 60 dias seguintes à entrada nos cofres da autarquia, dos montantes recebidos da CEE.

Alega, para tanto e em síntese: Em 19 de Agosto de 1986 celebrou com a R. um contrato de prestação de serviços, nos termos do qual se comprometeu a elaborar um "Plano de Desenvolvimento, abrangendo a área do Município de A...", destinado a ser apresentado à Comunidade Económica Europeia, para efeito de eventual financiamento a fundo perdido de investimentos contemplados por esse plano.

Para esse efeito, a R. obrigou-se a fornecer, no prazo de 15 dias, vários elementos necessários à elaboração do "Plano de Desenvolvimento", nomeadamente o plano de actividades e orçamento para 1986, as linhas de orientação e prioridades a que deveria obedecer o plano e os critérios metodológicos definidos pela Comissão de Coordenação da Região Norte ou pelo agrupamento de Concelhos de Entre Douro e Vouga.

Como remuneração dos serviços previstos no contrato, a R. pagaria 1.000.000$00, em duas prestações de igual valor, e 3% sobre o valor global dos financiamentos feitos pela CEE (FEDER, FEOGA e Fundo Social), respeitantes a propostas de investimentos constantes do "Plano de Desenvolvimento", a pagar em 60 dias contados da entrada desses financiamentos nos cofres da Câmara Municipal.

Ficou ainda estabelecido que, na retribuição relativa à percentagem de 3% sobre o valor global dos investimento, seriam contabilizados e descontados os 1.000.000$00, mas se os financiamentos pagos pela CEE fossem de valor inferior a esse montante, então a A. não seria obrigada a repor os 1.000.000$00 que já havia recebido.

Ora, a A. elaborou o "Plano de Desenvolvimento" previsto no contrato, com base nos elementos inicialmente fornecidos pela R.

No entanto, a Câmara Municipal não cumpriu o contrato integralmente, porque não forneceu à A., nem procuração ou credencial para efeitos de acompanhamento do Plano junto das entidades competentes, nem forneceu os planos de actividades e orçamentos relativos aos anos seguintes, para efeitos de eventuais correcções e ajustamentos a introduzir no plano inicial.

Por outro lado, a R. somente pagou à A. os 1.000.000$00 previstos a título de retribuição inicial, não tendo pago até à data os 3% sobre o valor dos financiamentos efectivamente recebidos da CEE, nem informou a A. dos valores assim recebidos.

Desde logo, relativamente a 7 projectos, que a A. identificou, veio a mesma a saber que a R. já recebeu financiamentos do FEDER no valor de 141.923.000$00, tendo a A. direito à retribuição de 4.257.690$00, correspondente a 3% desses financiamentos, a que há a deduzir os 1.000.000$00 já recebidos antecipadamente.

Mas, haverá outros financiamentos que a R. recebeu e que a A. desconhece ainda e, por isso, deverá a R. ser condenada no que se vier a apurar em execução de sentença.

Citada regularmente a R. contestou, dizendo em síntese que o documento que a autora apresentou à R., pouco mais era que a transcrição dos planos de actividades, linhas de orientação e prioridade da CMA, não tendo a suportá-lo qualquer estudo, pelo que devido a tais deficiências a CMA não aprovou o plano, por considerá-lo incoerente.

A A. apresentou réplica.

A acção prosseguiu os seus posteriores termos, tendo sido proferido despacho saneador, com especificação dos factos assentes e da base instrutória, da qual não houve reclamações.

Finda a produção de prova, foi respondido aos quesitos, por decisão de que não houve reclamações.

De seguida, foi proferida sentença, que julgou a acção improcedente por não provada e, em consequência, absolveu a R. do pedido contra si formulado.

Desta sentença recorreu a A., tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por douto acórdão de fls. 351 a 359, decidido anular a sentença e determinar que se procedesse a novo julgamento que deveria decidir as contradições verificadas na matéria de facto, nomeadamente na resposta aos quesitos 1.º e 8.º.

Tendo os autos regressado à 1.ª instância, foi ordenada a repetição do julgamento quanto aos quesitos sobre os quais havia sido detectada a contradição, tendo-se designado data para julgamento, o qual decorreu com observância das formalidades legais.

No decurso da audiência, a A. veio ampliar o pedido, concretizando o mesmo na parte em que o havia feito em termos genéricos, pois entretanto já teriam sido aprovados outros projectos de financiamento pela CEE atribuídos à R., pelo que concluiu pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de € 67.748,09, a acrescer ao pedido inicialmente formulado na petição inicial.

A ampliação do pedido foi admitida e finda a produção da prova, foram respondidos aos mencionados quesitos, por decisão de que não houve reclamação das partes.

Foi proferida sentença, em que se julgou a acção improcedente e se absolveu a R. do pedido.

Inconformada, recorreu a autora, recurso que foi admitido como apelação.

A Relação de Lisboa veio a proferir acórdão no qual julgou procedente o recurso de apelação interposto, revogou a sentença recorrida e em sua substituição, condenou a R. no pagamento à autora da quantia de 79.035,23 euros (setenta e nove mil e trinta e cinco euros e vinte e três cêntimos), valor esse acrescido de juros de mora à taxa legal, contado a partir de 60 dias da data de entrada dos montantes relativos aos financiamentos aprovados, nos cofres da R., até integral pagamento.

De tal acórdão veio a ré a interpor recurso de revista, recurso que foi admitido.

A R. apresentou as suas alegações, formulando, em síntese, as seguintes conclusões: I - Cometeu o Tribunal da Relação um erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa ao não ter tido em conta a prova decorrente de um documento autêntico, violando o disposto no art.º 371 do C. Civil.

II - Violou também o disposto no art.º 342 do C. Civil, no tocante à repartição do ónus de prova.

III - Considerou, erradamente, sempre salvo melhor opinião, aplicável ao caso o n.º 2 do art.º 1170.º do C. Civil.

IV - Quando deveria ter aplicado os arts 1170.º, n.º 1 e 1172.º do C. Civil.

A A. apresentou contra-alegação ao recurso da R., concluindo pela total improcedência deste recurso.

Colhidos os vistos cumpre apreciar e decidir.

II - Fundamentação

  1. De Facto Na 1.ª instância foram dados como provados os seguintes factos que a Relação manteve: 1) A A. dedica-se à prestação de serviços a empresas, designadamente à consultadoria em matéria de estudos, projectos, investimentos, financiamentos, orientação e formação profissionais - (Al. A) da Especificação); 2) No exercício da sua actividade celebrou com a Câmara Municipal de A..., em 19 de Agosto de 1986, contrato de prestação de serviços, conforme documento junto sob o n.º 1 de fls. 9 a 12 o qual se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos - (Al. B) da Especificação); 3) Nos termos desse contrato, comprometeu-se a A. para com a R. a elaborar um Plano de Desenvolvimento, abrangendo a área do Município de A... - (Al. C) da Especificação); 4) Tal plano destinava-se a ser apresentado à Comunidade Económica Europeia para efeito de eventual financiamento a fundo perdido de investimentos contemplados pelo referido plano, por parte da...

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