Acórdão nº 07P3230 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelSORETO DE BARROS
Data da Resolução21 de Maio de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. Na sequência da denúncia de factos que, na óptica de AA,(1) configuravam a prática, por parte de BB (...) do tipo legal de crime p. p. no C. P. art. 369.º, n.º 1" (2), e do arquivamento do respectivo inquérito, (3) veio aquele requerer a abertura de Instrução(4) e, entre outras considerações, articulou a seguinte ordem de razões: "1º A arguida é Juiz de Direito e, nessa qualidade, é titular do processo n.º 34/2002 que corre os seus termos no 3º Juízo do Tribunal Judicial de Ponta Delgada.

    1. Tais autos são constituídos por inventários acumulados para partilha judicial de heranças, nas quais o queixoso é interessado principal.

    2. Nesse processo, o assistente, em 2 de Junho de 2003, suscitou incidente de remoção de cabeça de casal.

    3. O qual só conheceu decisão em 23 de Abril de 2004.

    4. Precisamente, dois dias volvidos sobre a apresentação na Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa de queixa/denúncia que o queixoso apresentara contra a arguida, por denegação de justiça (NUIPC 12/04.5TRLSB).

    5. A decisão proferida no incidente foi desfavorável ao assistente.

    6. A 10 de Maio de 2004, o assistente, via postal registada, interpôs recurso de tal decisão.

    7. A despeito do disposto no art. 160º CPC, a verdade é que, decorridos mais de 6 meses, tal despacho não foi produzido.

    8. A ausência de despacho no requerimento para interposição de recurso provoca o resultado vivido até 23 de Abril: arrastamento do incidente na primeira instância, sem fim à vista.

    9. Por outro lado, a arguida revela firmeza na intenção de denegar justiça ao assistente.

      De facto, 11º A 22 de Setembro de 2004 o assistente dirigiu aos autos de inventário já aqui mencionados requerimento o qual culminou peticionando: Devem ser imediatamente proferidos os despachos de admissão/não admissão referentes aos requerimentos de interposição de recurso apresentados pelo requerente em 10/05 e 14/06 ambos de 2004.

    10. Mas nem esse obteve resposta.

    11. O requerimento de interposição de recurso de 14/06/2004, só em 23 de Setembro de 2004 obteve resposta.

    12. Além de não decidir em matéria da sua exclusiva competência, tendo sido legalmente requerida para isso, a denunciada mostra-se insensível ao prejuízo que, com essa omissão, vem causando ao assistente e a respeito do qual lhe foi dado, por duas vezes, conhecimento.

    13. Não pretendendo explorar, nem aflorar a previsão do nº 2 do art. 369º CP, porque registou a premonitória resistência que as queixas que apresentou tiveram, 16º Resta-lhe concluir que a prática da acção imputada o foi livre e conscientemente.

    14. A arguida praticou, pois, um crime de denegação de justiça p.p. no art. 369º, 1 CP".

  2. 1 No Tribunal da Relação de Lisboa, o juiz de instrução entendeu que, "Por tal requerimento não satisfazer as exigências legais tem que ser rejeitado, por inadmissibilidade legal da instrução art. 287-3 do Cód. Proc. Penal e, consequentemente, determinado o arquivamento dos autos".

    (5).

  3. 2 Sindicado tal despacho, (6) este Supremo Tribunal, dando provimento ao recurso interposto pelo assistente, revogou a decisão recorrida, ordenando, do mesmo passo, que fosse substituída por outra que declarasse aberta a instrução.

    (7) 1.

    3 Aberta a referida fase processual, efectuadas as diligências reputadas pertinentes e o Debate Instrutório, (8) veio a ser lavrado Despacho de Não Pronúncia.

    (9) 1.

    4 Após o que o assistente recorreu, quer do despacho que determinou "o desentranhamento do requerimento de fls. 203 a 207", quer do teor da decisão instrutória.

    (10) 1.

    5 Chamado a pronunciar-se, o Supremo Tribunal decidiu "julgar procedente o recurso interposto do despacho que determinou a não inserção processual de documentos nos termos requeridos pelo assistente", sendo certo que "a presente decisão sobre o despacho interlocutório tornou irrelevante a análise do restante recurso interposto e a análise dos elementos constitutivos do crime de denegação de justiça (...)".

    (11) 1.

    6 Retornados os autos ao Tribunal da Relação, foram instruídos com nova certidão do processado realizado no Proc. n.º 34/2002 (Inventário), pendente no 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Ponta Delgada (12) e, efectuado Debate Instrutório,(13) foi exarado Despacho de Não Pronúncia.

    (14) 1.

    7 Novamente irresignado, o assistente interpôs recurso, terminando a motivação com a formulação das seguintes conclusões : (15).

    1 - O elemento subjectivo do crime imputado à arguida está confirmado até pela própria decisão a quo (fls. 387 e s. dos autos).

    2 - A decisão recorrida falha, no entanto, quando considera que a arguida agiu sem dolo directo.

    3 - Para tanto, apoia-se no inciso conscientemente que surge no enunciado da norma incriminadora (CP art. 369,n.º1). (Fls. 389 dos autos).

    4 - Simplesmente, esse termo não tem o alcance que lhe dá o Venerando Tribunal a quo.

    5 - O vocábulo conscientemente serve para distinguir os erros de ofício dos erros de malícia, conforme se expressava a nossa antiga doutrina.

    6 - Ou seja: traça a distância que corre entre uma decisão juridicamente infundada, mas que foi proferida porque o seu autor estava convicto da sua bondade; e aquela que se toma, quando perfeitamente se sabe que se está a agir contra legem.

    7 - Parece manifesto que foi este o comportamento da arguida.

    8 - O despacho de arquivamento, na fase de inquérito deste processo (fls. 10 e s. dos autos), em lugar de justificar o comportamento da arguida, só veio provar que esta conhece o seu dever magistrada e tem competência para o cumprir de modo positivo.

    9 - Nem poderá valer à arguida a tese de que, prazos como o que ela largamente infringiu (CPC art. 160.º, n.º1), são prazos meramente ordenadores, porque mesmo estes não dispensam os destinatários da obediência devida.

    10 - Para reforço da ideia de ter a arguida agido com dolo directo, o assistente remete para o depoimento do Ex.mo Conselheiro Ferreira de Almeida (fls. 188 a 191 dos autos), depoimento ao qual é difícil exigir maior eloquência.

    11 - E termina lembrando o final do acórdão ferido por esse Supremo Tribunal (fls. 73 dos autos).

    Termos em que, não pronunciando a arguida, o Venerando Tribunal a quo fez incorrecta aplicação da lei, porque não interpretou devidamente ao norma do CP art. 369.º, n.º1, pelo que se requer a revogação da decisão recorrida, com as consequências legais!".

  4. 8 Admitido o recurso e notificados os intervenientes processuais, a arguida não se pronunciou e o Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu como segue: (16) "1º Contrariamente ao que vem alegado pelo recorrente o despacho recorrido interpretou devidamente a norma que ali se diz violada - o artº 369º do C. Penal - uma vez que não resultou da instrução, como já não tinha resultado do inquérito, indiciação suficiente da prática pela arguida de factos integradores do crime pelo qual o recorrente entende que a mesma deve ser levada a julgamento.

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