Acórdão nº 07S4106 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução21 de Maio de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. AA demandou, em acção com processo comum emergente de contrato individual de trabalho, proposta em 26 de Setembro de 2005 no Tribunal do Trabalho da Maia, "Residencial Aeroporto, Lda.", pedindo a condenação desta no pagamento da quantia global de € 26.027,09 - respeitante a indemnização por rescisão do contrato com justa causa (€ 3.880,56), indemnização por danos não patrimoniais (€ 5.000,00), diferenças salariais (€ 3.099,94), subsídio de alimentação (€ 2.392,91), subsídio de alimentação em períodos de férias (€ 433,01), "prémio de línguas" (€ 2.163,67), abono para falhas (€ 1.496,86), retribuição do mês de Setembro de 2004, férias não gozadas, proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao trabalho prestado em 2004 (€ 1.565,95) e remuneração de trabalho suplementar (€ 5.990,19) -, acrescida dos juros vencidos e vincendos à taxa legal, desde a data da cessação do contrato até à efectivo e integral pagamento.

Alegou, em síntese, que: - Foi admitida ao serviço da Ré em 13 de Novembro de 1998, para, sob as suas ordens, direcção, fiscalização e no seu interesse, exercer as funções de empregada de rouparia, tendo, à data da cessação do seu contrato de trabalho, a categoria de recepcionista de 2.ª; - O contrato de trabalho que vigorava entre as partes foi por ela rescindido, em 30 de Setembro de 2004, com fundamento em justa causa, consubstanciada em ofensas à integridade física, à honra e dignidade praticadas pelo sócio-gerente da Ré, em virtude das quais sofreu danos não patrimoniais.

- Auferia, à data da rescisão, a retribuição base mensal de € 399,54, quando a estabelecida no Contrato Colectivo de Trabalho aplicável era de € 444,00, e a Ré não lhe pagou as importâncias a que tinha direito, nos termos do mesmo instrumento de regulamentação, referentes a subsídio de alimentação, "prémio de línguas", abono para falhas, nem lhe pagou as quantias correspondentes à retribuição do mês de Setembro de 2004, a férias não gozadas, proporcionais de férias, subsidio de férias e subsídio de Natal relativos ao trabalho prestado em 2004, e a trabalho suplementar.

Na contestação, a Ré pediu a absolvição da instância, alegando correr processo-crime contra o seu sócio-gerente, relativamente aos factos invocados como justa causa para a rescisão e, em todo o caso, impugnou a versão desses factos constante da petição inicial, bem como a idoneidade dos documentos juntos com esse articulado para provar os créditos reclamados.

Houve resposta da Autora, à qual se seguiu requerimento da Ré para pedir que fosse considerada nula na parte em que excedeu a matéria de excepção.

Em audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, tendo sido elaborada a condensação, com a especificação dos factos assentes e a organização da base instrutória, sem reclamações.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova, e decidida, sem reclamações, a matéria de facto, foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, absolvendo a Ré dos pedidos.

  1. Tal decisão foi impugnada pela Autora que, em recurso de apelação, com vista a sustentar a revogação da mesma, pugnou pela alteração da matéria de facto, defendendo, outrossim, que, independentemente de vir a proceder a pretendida alteração da matéria de facto, sempre ela teria direito, com base nos factos provados, aos créditos que reclamara, a título de "diferenças salariais, subsídio de alimentação, prémio de línguas, abono para falhas, retribuição do mês de Setembro e proporcionais relativos ao trabalho prestado em 2004", terminando a alegação a pugnar no sentido de "a acção ser julgada provada e procedente, condenando-se a recorrida no pedido".

    O Tribunal da Relação do Porto rejeitou o recurso sobre a matéria de facto e confirmou a sentença.

    Ainda irresignada, a Autora interpôs o presente recurso de revista, que veio a motivar mediante peça alegatória onde formulou as seguintes conclusões: 1.ª Independentemente da alteração ou não da matéria de facto, a Recorrente teria direito aos créditos peticionados, tais como diferenças salariais, subsídio de alimentação, prémio de línguas, abono para falhas, retribuição do mês de Setembro e os proporcionais relativos ao trabalho prestado em 2004.

    1. Resulta do presente processo (factos assentes, depoimentos e documentos) o seguinte: - data de admissão da Recorrente 13/11/98 e data da cessação efectiva da prestação de trabalho e do contrato de trabalho - 1/10/04; - a sua categoria era a de recepcionista de 2.ª, falava línguas e fazia a "caixa" diariamente no fim do seu turno; - a sua remuneração ilíquida era de Euros 399,54, nada mais constando dos recibos de vencimento além desta; - a Recorrente era sindicalizada; - à sua actividade aplica-se o Contrato Colectivo de Trabalho identificado pelo Sindicato, numa declaração junta aos autos em 8/03/2006, que não foi objecto de qualquer impugnação; - desse CCT resulta que a Recorrente, tinha direito às alterações salariais, ao subsidio de alimentação, ao prémio de línguas e ao abono para falhas, - decorre do art. 249.º do CT que a Recorrente tem direito à retribuição correspondente aos dias que trabalhou; - e dos arts. 211.º, 221.º, 254.º e 255.º que tem direito aos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.

    2. Estes são os factos constitutivos do seu direito, que a Recorrida "impugnou" não alegando que pagou ou que não pagou, mas alegando apenas que tais créditos estão dependentes da existência ou não de justa causa.

    3. Argumento este que carece de fundamentação legal.

    4. Os factos levados à base instrutória são factos negativos - pontos 6 a 9, 11 a 13, são factos negativos cujo ónus da prova incumbiria à Recorrida, nos termos do disposto nos arts. 342.º e segs do CCivil.

    5. Ou seja, por serem factos negativos de prova muito difícil para a Recorrente, incumbiria à Recorrida provar que a Recorrente não teria direito a tais quantias ou, então que já pagou tais quantias.

    6. Prova essa que a Recorrida não logrou fazer.

    7. A sentença recorrida viola assim o disposto no CCT, aplicável in casu, bem como os arts. 249.º, 211.º, 221.º, 254.º e 255.º do CT e ainda, art. 342.º e segs. do C.Civil, pelo que é nula.

    8. O douto Acórdão Recorrido viola igualmente Lei de processo, pelo que é o mesmo admissível nos termos do disposto, nos arts. 722.º, n.º 1 e 754.º, n.º 2 do C.P.C..

    9. A decisão recorrida rejeitou o recurso da matéria de facto, por entender que o que a Recorrente pretendia, seria um segundo julgamento a realizar pela 2.ª instância, duplo julgamento que a Lei não consagra.

    10. Tudo isto com base nos argumentos aduzidos no Acórdão, nas páginas 6 a 8 que por uma questão de economia processual, aqui se dão por inteiramente reproduzidos.

    11. Tais argumentos não podem colher, porquanto resulta do Acórdão que o Tribunal da Relação não reapreciou a prova gravada, nem a prova documental.

    12. Não examinando os meios de prova, também não fundamentou devidamente, em nosso modesto entender, a sua decisão de rejeitar o recurso da matéria de facto.

    13. Os argumentos expostos pelos Exmos. Desembargadores estão em clara contradição, com o Acórdão proferido por este mesmo Tribunal, em 21-06-2007, no processo n.º 06S3540, publicado in site www.dgsi.pt.

    14. A decisão recorrida violou assim o disposto no art. 712.º do C.P.C., bem como o dever de fundamentação consignado nos arts. 205.º, n.º 1 da C.R.P. e 158.º do C.P.C., pelo que é nula.

    TERMOS EM QUE, NOS MELHORES DE DIREITO E COM O SEMPRE MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVE A DECISÃO DE 2.ª INSTÂNCIA SER REVISTA, COM AS DEMAIS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS, COM O QUE SE FARÁ, ALIÁS COMO SEMPRE, INTEIRA E SÃ JUSTIÇA.

    A recorrida não contra-alegou e, neste Supremo Tribunal, o Exmo. Magistrado do Ministério Público exarou parecer, que não foi objecto de qualquer resposta, no sentido de ser negada a revista.

    Corridos os vistos, cumpre decidir.

    II 1. Vêm suscitadas nas conclusões do recurso as seguintes questões, que se enumeram por ordem de precedência lógica: 1.ª Saber se acórdão impugnado é nulo, por violação dos artigos 712.º do CPC e do dever de fundamentação consignado nos artigos 205.º da Constituição da República Portuguesa; 2.ª Saber se, independentemente da alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, a Autora tem direito aos créditos peticionados a título de diferenças salariais, subsídios de alimentação, "prémio de línguas", abonos para falhas, retribuição do mês de Setembro de 2004, e "proporcionais" de retribuição de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao ano de 2004.

  2. Da nulidade do acórdão: Dispõe o artigo 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho (CPT), que "[a] arguição de nulidades da sentença é feita expressa e separadamente no requerimento de interposição de recurso".

    Tal exigência, justificada por razões de celeridade e economia processual, que, marcadamente, inspiram o processo laboral, visa possibilitar ao tribunal recorrido a rápida e clara detecção das nulidades arguidas e respectivo suprimento, daí que a explanação das razões pelas quais se suscita a nulidade haja de constar do requerimento de interposição de recurso, dirigido à instância recorrida.

    As razões que justificam o regime especial de arguição das nulidades da sentença estabelecido na lei adjectiva laboral permanecem válidas quando se trate da imputação de nulidades ao acórdão da Relação.

    Por isso, de há muito, este Supremo, no entendimento de que a remissão constante do artigo 716.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC) - ao mandar aplicar aos acórdãos da 2.ª instância o que se acha disposto nos artigos 666.º a 670.º, e, pois, o regime de arguição de nulidades da sentença da 1.ª instância - contempla, tratando-se de processo laboral, o regime especial consignado no artigo 77.º, n.º 1, do CPT, do que decorre que a arguição das nulidades do acórdão da Relação deve ser feita, expressa e separadamente, no...

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