Acórdão nº 08A1187 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Maio de 2008

Magistrado ResponsávelMOREIRA CAMILO
Data da Resolução06 de Maio de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I - No Tribunal Judicial de Ponta Delgada, Electricidade dos Açores, S.A., em acção com processo ordinário, intentada contra AA e mulher BB, pediu que, com a procedência da acção, se profira "sentença que produza os efeitos da declaração negocial dos faltosos RR, declarando-se a transmissão da gleba de terreno identificada em 3 supra a favor da A.".

Para fundamentar a sua pretensão, invoca a celebração de um contrato-promessa entre as partes, com o preço acordado integralmente pago na data de tal celebração (30.04.2004) e com cláusula de execução específica, bem como a recusa dos Réus em outorgarem a escritura do contrato definitivo de compra e venda da parcela de terreno que é objecto do contrato-promessa.

Na sua contestação, os Réus arguiram a excepção dilatória de ilegitimidade da Ré, com o fundamento de que não é parte do contrato celebrado, e defenderam a improcedência da acção, invocando factualidade que, na sua óptica, implicam a nulidade ou a anulabilidade do contrato-promessa em causa.

Após a réplica da Autora, os Réus apresentaram uma tréplica, articulado que viria a não ser admitido.

No despacho saneador, foi decidido julgar-se improcedente a excepção de ilegitimidade da Ré.

A final, foi proferida sentença, segundo a qual se decidiu:"julgo a presente acção procedente e, como tal, supro a declaração de venda em falta, dos réus à autora, pelo preço de 17.458,00 €, de uma gleba de terreno com a área de 1158 metros quadrados do imóvel constituído por 7140 metros quadrados de área total, sito ao Calço da Má Cara, Rua da Arquinha, descrito na Conservatória do Registo Predial de Ponta Delgada sob o número 266/Matriz, e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 84, secção nº 3".

Após apelação dos Réus, foi, no Tribunal da Relação de Lisboa, proferido acórdão, nos termos do qual o recurso foi julgado improcedente, mantendo-se o decidido na 1ª instância.

Ainda inconformados, vieram os Réus interpor o presente recurso de revista, o qual foi admitido.

Os recorrentes apresentaram alegações, formulando as seguintes conclusões: 1ª - A impressão digital só é válida se for aposta presencialmente perante notário e este fizer menção de que o rogante não sabe ou não pode assinar no próprio acto do reconhecimento da assinatura e depois de lido o documento ao rogante.

  1. - Não tendo resultado provado que o contrato foi lido e explicado o seu conteúdo aos RR., o contrato é nulo e de nenhum efeito.

  2. - Para haver lugar a execução específica, é necessário que as partes atribuam eficácia real e procedam à inscrição no registo, devendo constar de escritura pública a promessa a que as partes atribuam eficácia real, mas 4ª - Não tendo as partes atribuído eficácia real ao contrato, gozam do direito de arrependimento, com as consequências inerentes ao incumprimento contratual, devolução em dobro se este ficar a dever ao promitente vendedor, perda do sinal no caso do arrependimento se ficar a dever ao promitente comprador. Sem prescindir, 5ª - O R. tinha à data do contrato 90 anos e a Ré esposa 70.

  3. - Não sabem ler, nem escrever, e apenas o R. AA sabe assinar o seu nome.

  4. - A gleba de terreno do contrato celebrado situa-se na cidade de Ponta Delgada, em zona privilegiada e de grande expansão urbanística, quer junto do maior hospital dos Açores, quer do maior centro comercial da Região, quer da própria Ré (ter-se-á querido escrever Autora), concessionária da electricidade dos Açores.

  5. - O terreno dos RR., não obstante ser rústico, é apto para a construção urbana, tendo projectados 9 lotes.

  6. - A venda da parcela de terreno à Ré (ter-se-á querido dizer Autora) inviabiliza a construção de quatro dos noves lotes.

  7. - O custo do terreno para a construção na zona em que se insere o terreno é de cerca de 350,00 € m2, ou seja, cerca de 20 vezes mais do que o preço "acordado" para a venda.

  8. - O R. AA foi contactado inúmeras vezes por representantes da A. antes de assinar o contrato e só o fez porque estes lhe disseram que o teria que alienar forçosamente, por acordo ou por expropriação.

  9. - O R. AA não queria vender o prédio, só o tendo prometido vender pelo preço que acordou porque estava convencido que caso aquele viesse a ser expropriado, o que tinha por certo, não receberia preço superior ao ajustado.

  10. - Os RR. não têm qualquer experiência em negócios de compra e venda de terrenos.

  11. - O facto do terreno ser rústico no momento do contrato, insere-se todavia em plena zona urbana estando na esfera da disponibilidade dos proprietários o deixar de o ser a qualquer momento.

  12. - O que conta não é o que o terreno é, mas aquilo que vale de acordo com o potencial e a finalidade que lhe poderá vir a ser atribuído e dele se extrair.

  13. - E tanto assim que a A. não o quer para semear couves, batatas ou repolhos. Quere-o para fins comerciais e industriais.

  14. - O terreno dos RR. é potencialmente um terreno urbanizável dotado de óptimos acessos, com rede de abastecimento de água e luz, curiosamente precisamente de cada um dos lados, e de saneamento.

  15. - O valor do solo apto para construção calcula-se por referência à construção que nele seria possível efectuar se não tivesse sido sujeito à venda forçada, num aproveitamento económico normal.

  16. - Significa isso que, com a privação da área objecto do contrato promessa, os RR. deixaram de poder vender 4 lotes de terreno e de, pelo menos, receber 349,160,00 €, contra os 17.458,00 € que a A. lhe quer dar.

  17. - Não fora a idade, estado mental e inexperiência dos RR. e jamais teriam assinado tão ruinoso e desproporcional contrato.

  18. - Ninguém pode ser forçado a ter que vender o que não quer, e, mesmo que o seja através de expropriação, o expropriante está obrigado a pagar a justa...

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