Acórdão nº 07P4833 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Março de 2008
Magistrado Responsável | RAÚL BORGES |
Data da Resolução | 26 de Março de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
No âmbito do processo comum colectivo nº 1158/06.0PASJM, foi submetido a julgamento o arguido AA, solteiro, empregado fabril, filho de BB e de CC, nascido a 13 de Setembro de 1968, residente na Rua do Poder Local, entrada ...,..., em São João da Madeira, preso preventivamente no Estabelecimento Prisional do Porto, à ordem deste processo desde 10-12-2006.
Por acórdão do Colectivo do Círculo Judicial de Oliveira de Azeméis, de 28-09-2007, foi o arguido condenado, pela autoria material, em concurso real e como reincidente: - De um crime de detenção de arma proibida, na forma continuada, p. e p. pelo artigo 86.º, n.º 1, al. c), da Lei n.º 5/06, de 23 de Fevereiro e 30.º, n.º 1 e 79.º, do Código Penal, na pena de 18 meses de prisão; - De dois crimes de coacção grave, na forma consumada, p. e p. pelo art. 154.º, n.º 1 e 155.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, nas penas de 18 meses de prisão para cada um deles; - De um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 131.º; 132.º, n.º 1 e n.º 2, al. j); 22.º, n.º 1 e 2, al. b) e c) e 23.º, todos do Cód. Penal, na pena de 6 anos de prisão.
Em cúmulo jurídico, na pena única de 7 anos e 6 meses de prisão.
Inconformado, o arguido interpôs recurso, apresentando a motivação de fls. 494 a 505, que remata com as seguintes CONCLUSÕES: I. O instituto da reincidência não actua automaticamente, sendo pois necessário que, em cada caso concreto, se demonstre, inequivocamente, que a condenação ou condenações anteriores não constituíram suficiente prevenção contra o crime.
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Ora, salvo o devido respeito que sempre nos merece o Tribunal a quo, o Recorrente entende que, in casu, não foi demonstrada, inequivocamente, nem indagada suficientemente, matéria de facto que permita concluir ou operar o funcionamento desta qualificativa.
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Se é certo que se verificam os requisitos formais da reincidência, não podemos olvidar que as condenações anteriores se referem a factos praticados em 1993, 1996 e 1997, sendo que, as delongas da Justiça, não deverão funcionar como "bloqueios" do sistema judicial e das garantias dos cidadãos.
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Acresce que as condenações anteriores se referem a factos intrinsecamente relacionados com o consumo de estupefacientes e dele derivados e que, por isso, tinham subjacente uma prob!emática ou realidade diferente da respeitante aos factos dos presentes autos.
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Não deverá pois o arguido ser condenado como reincidente, pelo que, não tendo decidido dessa forma, o douto Tribunal a quo violou o art. 75° do C.P. e, por via disso, o art. 71° do mesmo diploma legal.
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Tendo em consideração os factos dados como provados, a culpa do arguido e as exigências de prevenção - gerais e especiais - aplicáveis in casu, as penas parcelares a que o arguido foi condenado, e concomitantemente, a pena única aplicada em cúmulo jurídico, revelam-se excessivas, desproporcionais e desadequadas, tendo sido, assim violado o disposto no art. 40° e 71° do C.P.
VII Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo não considerou concretamente, todas as circunstâncias atenuantes aplicáveis, nomeadamente as referentes (condições pessoais do arguido, nomeadamente o facto de aquele estar perfeitamente inserido na comunidade, gozando de uma boa imagem, contar com o apoio familiar, ter tido, e vir a ter, quando em liberdade, uma boa integração no mercado de trabalho (conforme referido pela testemunha de defesa, DD, seu ex-patrão, não obstante tudo o sucedido, o mesmo não hesitará em emprega-lo novamente, ter dois filhos menores, um com cerca de 3 anos de idade e outro com 10 meses.).
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Entende o recorrente que as penas aplicadas são, pois, demasiado severas e, salvo o devido respeito, "integram" em si uma punição por todo um passado e não apenas pelos específicos crimes dos autos. A sua redução aos mínimos legais - sem prescindir do exposto anteriormente quanto à questão da reincidência - e a aplicação de uma pena única que não ultrapasse os 5 anos, verifica-se como medida justa e adequada às finalidades da punição e ressocialização, não advindo daí qualquer atropelo ou contenda quer com as exigências de prevenção geral, quer especial.
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Acresce que, a redução da pena é não só justa como permitirá aflorar a questão de uma eventual suspensão da pena.
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Nesse sentido militam não só as circunstâncias alegadas quanto à questão da medida da pena, mas também o espírito que norteia a legislação penal e as finalidades de recuperação e ressocialização do indivíduo subjacentes à aplicação de qualquer pena e previstas no art. 71° do C.P.
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Acresce que o arguido tem dois filhos de tenra idade, pelo que o cumprimento de uma pena de prisão efectiva, além de perturbar, ou mesmo interromper os laços afectivos e o normal desenvolvimento dos menores, colocará, na verdade, em causa a satisfação das necessidades básicas de tão jovens crianças, com todas as consequências nefastas dai decorrentes, já que a sua companheira se encontra desempregada XII. Ora, se é certo que estas condutas desviantes têm que ser punidas e evitadas, não será menos verdade que uma Verdadeira Justiça tem que contrabalançar todos os valores em causa, de forma a assegurar não só o respeito pelas normas vigentes como prevenir ou evitar as consequências menos positivas que podem advir, não só para o arguido, como para terceiros, neste caso as crianças, de uma efectiva privação da liberdade.
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Todas as mencionadas circunstâncias podem e devem conduzir a um juízo de prognose favorável no que respeita à futura reintegração do recorrente bem como à condução da sua vida segundo as regras e padrões dominantes.
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Ora, reduzindo a pena única aplicada ao arguido nos termos supra expostos, entende o recorrente que se encontram reunidos os pressupostos que podem e devem fazer actuar a suspensão da execução da pena.
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A suspensão da execução da pena de prisão, ainda que condicionada a algum dever ou conduta, revela-se como medida suficiente e adequada, acabando assim nas suas finalidades punitiva e ressocializadora.
O Mº Pº junto do Tribunal recorrido apresentou a resposta de fls. 522 a 531, dizendo no que respeita à reincidência, que o arguido não deveria ter sido condenado como reincidente, o que só aconteceu por lapso do Mº Pº ao deduzir a acusação, bem como do tribunal a quo ao condenar o arguido como tal.
Em função dessa posição e atentos os "novos" limites mínimos das penas aplicáveis, propõe novas penas parcelares e a pena única de 6 anos, podendo baixar para 5 anos e 6 meses de prisão, estando fora de causa a suspensão da execução.
Os autos foram remetidos ao Tribunal da Relação do Porto, sendo então ordenada baixa para admissão do recurso.
Proferido despacho a admitir o recurso, foi ordenada a remessa dos autos ao STJ.
A Exma. Procuradora Geral-Adjunta neste Supremo Tribunal, a fls. 549, defendeu a rejeição de recurso, por ter sido interposto fora de prazo.
Cumprido o artigo 417.º, n.º 2, do CPP, veio o recorrente dizer, a fls. 555/6, ter sido o acórdão depositado em 04-10-2007 e não em 28-09-2007, sendo tempestivo o recurso.
A decisão recorrida foi proferida e o recurso interposto já no domínio da vigência da nova redacção dada ao CPP pela Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, entrada em vigor em 15-09-2007, sendo que não foi requerida audiência.
Passou a dispor o n.º 5 do artigo 411º, do CPP: "No requerimento de interposição de recurso o recorrente pode requerer que se realize audiência, especificando os pontos da motivação que pretende ver debatidos".
Não tendo sido requerida audiência, o processo prossegue com julgamento em conferência, nos termos do artigo 419º, n.º 3, alínea c), do CPP.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
Questão Prévia Tempestividade do recurso Neste Supremo Tribunal a Exma. Procuradora-Geral Adjunta suscitou a questão da intempestividade do recurso por o acórdão ter sido depositado em 28-09-2007, tendo o recurso sido interposto em 24-10-2007, tendo o 20.º dia do prazo ocorrido em 18-10-2007.
O arguido respondeu nos termos assinalados.
Apreciando.
Como se vê de fls. 433, o acórdão está datado de 28 de Setembro de 2007 e no canto inferior esquerdo há um carimbo a atestar o depósito em 28-09-2007.
A seguir à assinatura do 2º adjunto consta (assinado em 02/10/2007) e mais abaixo à direita está outro carimbo, em tudo semelhante ao primeiro, divergindo na data, que é de 4/10/2007.
O recurso foi interposto em 24 de Outubro de 2007, como resulta de forma clara e abundante de fls. 443, 455, 468, 493 e 506.
Só após aquela data a secção entregou cópia do acórdão ao recorrente.
As assinaturas dos membros do tribunal constituem requisitos da sentença - artigo 374º, nº 3, alínea e), do CPP, ficando o acórdão "completo" apenas em 02-10-2007, seguindo-se-lhe o subsequente depósito, agora válido e eficaz, porque de acórdão completo, que teve lugar apenas em 4 de Outubro de 2007.
Na definição do prazo de recurso rege o artigo 411º do CPP, na nova redacção introduzida pela Lei nº 48/2007 de 29 de Agosto, entrada em vigor em 15 de Setembro, aplicável ao presente caso, nos termos do nº 1 e por não se verificar nenhuma das excepções previstas no n.º 2 do artigo 5º do CPP.
Estabelece tal preceito: 1 - O prazo para interposição do recurso é de 20 dias e conta-se: b) Tratando-se de sentença, do respectivo depósito na secretaria.
Tendo o depósito sido feito, de forma válida, eficaz, firme e definitiva, apenas em 4 de Outubro de 2007, foi o recurso interposto ao 20º dia, pelo que é manifestamente tempestivo.
Conclui-se, pois, pela tempestividade do recurso.
* Como é jurisprudência pacífica, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, é pelas conclusões que o recorrente extrai da motivação apresentada, onde resume as razões do pedido (artigo 412º, nº 1, do CPP) que se fixa e delimita o objecto do recurso.
Questões a decidir Como resulta das conclusões, as razões de discordância do recorrente têm a ver com: 1 - Reincidência - conclusões I a V; 2 - Medida da pena - conclusões VI a VIII; 3 - Suspensão da execução da pena...
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