Acórdão nº 07S3380 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Março de 2008

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução12 de Março de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

"AA" demandou, através de acção instaurada em 24 de Novembro de 2000, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, "Empresa-A, S.A.", alegando, no essencial, que: - Foi admitido ao serviço da antecessora da Ré, "Telefones de Lisboa e Porto, S.A. (...)", em Janeiro de 1974, tendo sido promovido, em 24 de Maio de 1984, à categoria de Técnico Superior Especialista, que detinha quando os TLP se fundiram na Ré, em Maio de 1994, e manteve até 30 de Novembro de 1999; - Em Junho de 1992, foi convidado pela Administração para desempenhar outras funções mais complexas, que acarretavam a atribuição de um nível salarial superior, um subsídio de 30% da retribuição a título de isenção de horário de trabalho (IHT), telefone de serviço com direito a 3.000 impulsos anuais gratuitos e utilização de uma viatura com todas as despesas inerentes à mesma a cargo da Ré, convite que aceitou, passando a desempenhar tais funções; - Apesar de a Ré ter aprovado a atribuição daquelas correspondentes regalias, nunca lhas pagou e só lhe atribuiu a viatura até 1995.

- Os respectivos valores, que o Autor tem direito a receber, devem, ainda ser integrados na prestação que a Ré lhe vem pagando, por força do acordo de suspensão do contrato de trabalho, celebrado entre as partes em 23 de Novembro de 1999.

Com tais fundamentos, pediu a condenação da Ré: i) no pagamento da quantia de Esc.: 38.637.410$00, referente a diferenças de retribuição, entre o que a Ré lhe pagou e o que devia ter-lhe pago nos anos de 1992 a 2000; ii) a rever a retribuição que se encontra a pagar-lhe em virtude da suspensão do contrato de trabalho, aumentando-a em Esc.: 476.203$00 mensais.

Na contestação, a Ré, a pugnar pela improcedência da acção, disse, em resumo, que, em 23 de Novembro de 1999, celebrou com o Autor um acordo de suspensão do contrato de trabalho no qual foi estipulado que, até à pré-reforma do Autor, a Ré lhe pagaria a quantia de Esc.: 423.665$00 (cláusula 2.ª); que esse acordo foi livremente aceite por ambas as partes e nele não foi salvaguardado o direito de o Autor receber quaisquer outras prestações; que tal acordo se mantém em vigor e só poderá ser alterado por escrito no âmbito de novo acordo das partes, conforme ficou clausulado, sendo que o Autor não põe em causa a sua validade. No mais, impugnou a factualidade alegada na petição inicial.

  1. Realizado o julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a Ré do pedido.

    O recurso de apelação, que o Autor levou ao Tribunal da Relação de Lisboa, foi julgado parcialmente procedente, em consequência do que se decidiu: [...] - Condenar a R. Empresa-A, S. A. a pagar ao A. AA, as quantias supra indicadas nos pontos 16, 17 e 18 da factualidade provada, referentes a diferenças salariais entre a remuneração pelo nível 8 e a recebida pelo A.; a IHT correspondente a 30% do vencimento e diuturnidades; a diferença entre o valor dos 1 000 e os 3 000 impulsos telefónicos, vencidos desde Junho de 1992 até 30/11/1999, bem como as quantias mensais referidas no ponto 19 da factualidade provada, relativas à atribuição de viatura e vencidas entre Abril de 1995 e 30/11/1999, a liquidar, se necessário, em execução de sentença.

    - Confirmar, no mais, a decisão recorrida.

    [...] Ambas as partes se revelaram inconformadas com esta decisão, tendo, cada uma delas, apresentado o seu requerimento de interposição de recurso de revista.

    O recurso do Autor não foi recebido por ter sido julgado extemporâneo, não tendo o despacho que assim decidiu sido objecto de impugnação.

    Admitido o recurso da Ré, veio esta apresentar a respectiva alegação, que terminou com as conclusões, assim redigidas: 1. O Douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Lisboa é nulo por violação da alínea d) do n.º 1 do Art.º 668.º do C.P.C. e artigos 217.º e 863.º do C.C., por entender que o Tribunal A Quo não se pronunciou sobre questões pertinentes e porque conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento e que vão além da matéria considerada provada 2. O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa fez uma leitura e interpretação desconforme com a matéria que foi considerada provada.

  2. Foi considerado provado pelo Venerando Tribunal A Quo, um facto não provado (que serviu de fundamento à decisão agora em crise), designadamente, que o Autor teria exercido as funções específicas no "Grupo Especial" entre Junho de 1992 e até à suspensão do contrato de trabalho em 30/11/1999.

  3. Da análise da matéria que foi considerada provada quanto a este particular, designadamente das alíneas F) e G) e Pontos 1., 3., 8. e 12., não existe um único ponto da matéria de facto que delimite o período em que o Autor teria desempenhado as funções naquele grupo especial.

  4. Aliás, embora se encontre determinada a data do início no "Grupo Especial", como sendo em Junho de 1992, e exista uma outra data, 03/04/1995, que delimita o fim de atribuição de viatura de serviço ao Autor.

  5. Não existe qualquer alocução quanto ao período da cessação das funções.

  6. Assim sendo, só através da fundamentação da resposta à matéria de facto é possível delimitar a data em que teria cessado o mencionado "Grupo Especial" que, dando relevância ao depoimento da testemunha BB, o Meritíssimo Sr. Juiz do Tribunal de Primeira Instância atendeu ao seguinte: "... quando os TLP passaram a S.A. contratou três pacotes de seguros - e como prémios estavam a ser absorvidos foi criado um gabinete de auditoria - o "pacote" remuneratório foi proposto e aceite e foi dada ao Eng. CC para disponibilizar duas viaturas (o autor e DD tinham os carros e combustível Galp sem limite. O "memo" devia ter "ido" à testemunha para processar o vencimento do autor e dos outros mas tal não aconteceu). Mais referiu que a equipa funcionou até Março/Abril de 1995 - tendo o director dos recursos humanos decidido acabar com a equipa e suspensas as funções dos membros ...

    " 8. "O grupo funcionou até à fusão e não lhes pagaram." (o sublinhado é nosso) 9. Foi igualmente considerado provado no Ponto A. dos Factos Provados o seguinte: "A sociedade "Empresa-A, SA" resultou da transformação e fusão das empresas "Telefones de Lisboa e Porto - TLP, SA", Teledifusora de Portugal (TDP, SA), e Telecom Portugal, SA."", sendo do conhecimento público, e do artigo 1.º da Petição Inicial, que a fusão que deu origem à sociedade "Empresa-A, S.A." foi instituída e criada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 122/94, de 14 de Maio.

  7. Consequentemente, podemos concluir que o "Grupo Especial" que o Autor integrou, manteve-se activo entre Maio de 1994 e Março/Abril de 1995, data que deverá ser considerada como sendo a da cessação do exercício de funções especiais do Autor.

  8. E daí entendermos que o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa errou quanto à apreciação da matéria de facto, dando como provados factos que realmente não foram considerados provados.

  9. Assim e na sequência do que atrás é alegado, não serão devidas ao Autor o pagamento de quaisquer importâncias calculadas a partir de Abril de 1995.

  10. E aproveitando o raciocínio propalado no Douto Acórdão do Tribunal A Quo, no fim da página 17 e início da pág. 18, tendo o Autor deixado de exercer as funções especiais e de prestar qualquer actividade laboral à Ré, não tem sentido receber tais importâncias.

  11. Pelo que e por maioria de razão, se deve entender apenas só serem devidas importâncias ao Autor desde que e enquanto se verificasse ter este exercido funções especiais, as quais, de acordo com os fundamentos acima descritos se limitam em Abril de 1995, data até à qual "a equipa funcionou", "tendo o director dos recursos humanos decidido acabar com a equipa e suspensas as funções dos membros".

  12. Por outro lado, resulta da matéria considerada provada (Pontos B., D. e E.), que a partir de Maio de 1992 o Autor tinha a categoria de Técnico Superior Especialista Nível 4, desempenhando as funções previstas para aquela categoria profissional e descritas no BTE, 1.ª Série, n.º 38, de 15/10/1991.

  13. Consequentemente, a partir de Abril de 1995 e após a extinção do grupo especial, o Autor continuou a desempenhar as funções próprias da sua categoria profissional, no seu local de trabalho, dentro do horário normal, pelo que nada lhe é devido quanto a esse particular.

  14. Além do mais, encontra-se demonstrado através da análise dos documentos referentes à duração e permanência do Autor na Empresa ("picagens" de entrada e saída nos diversos períodos), que este, em igualdade de condições com os outros trabalhadores, praticava horários flexíveis, utilizando as plataformas de entrada e saída deslizantes, situação que permite a cada um dos trabalhadores gerir o seu horário segundo os seus interesses.

  15. Pelo que, e também neste particular, deveria o Venerando TRL ter decidido no sentido de que, a existirem créditos do Autor, estes só deveriam ser contabilizados até à data do fim do exercício de funções especiais, ou seja, Abril de 1995.

  16. Por outro lado, discordamos igualmente do Douto Acórdão do TRL na parte em que entende que a assinatura do acordo de suspensão celebrado entre o Autor e a Ré, onde esta se comprometeu a pagar àquele elevadas quantias em dinheiro (Pte: 423.665$00, correspondente a € 2.113,23 no ano de 1999), sem que este tivesse que prestar qualquer actividade laboral à Ré, que tal pagamento não representava uma verdadeira remissão de créditos.

  17. E não concordamos porque em nossa opinião as regras de direito civil não têm de colidir com as de direito laboral, devendo em situações idênticas prevalecer a declaração negocial e a vontade.

  18. É neste sentido que entendemos que os acordos de suspensão celebrados assinados pelo Autor e a Ré, devam ser considerados como verdadeiros contratos ou negócios jurídicos bilaterais.

  19. Ora, o contrato de suspensão do contrato trabalho foi celebrado sem vícios e de livre e espontânea vontade, colocando-se então a questão de saber qual o seu valor no quadro das relações laborais e qual o sentido e...

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