Acórdão nº 07S2907 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelSOUSA PEXOTO
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo tribunal de Justiça: 1.

Em 11 de Agosto de 2004, a autora AApropôs, no Tribunal do Trabalho de Cascais, acção emergente de contrato individual de trabalho contra BB, Sociedade Turística, L.da, pedindo que fosse declarada a ilicitude do despedimento de que foi alvo por parte da ré e que esta fosse condenada a reintegrá-la ao serviço, com efeitos reportados à data do despedimento e sem prejuízo da respectiva retribuição, antiguidade e categoria profissional, ou, em alternativa, a pagar-lhe a indemnização por antiguidade a que se reporta o art.º 439.º, n.º 1 do Código do Trabalho, em montante a fixar pelo tribunal nos termos do normativo referido, e a pagar-lhe todas as retribuições vencidas e vincendas desde a data do despedimento até à data da sentença, bem como a quantia de € 1.185,35 a título das retribuições já vencidas (€ 453,00), de férias vencidas em 1.1.2004 (€ 453,00), de subsídio das ditas férias (€ 453,00), de fracção proporcional das férias que se venceriam em 1.1.2005 (€ 71,45) e de fracção proporcional do subsídio de Natal do ano da cessação do contrato (€ 71,45).

Em resumo, a autora alegou que foi ilicitamente despedida, em 25 de Fevereiro de 2004, na sequência de processo disciplinar que lhe foi instaurado, por se ter recusado a cumprir a ordem que lhe foi dada pela ré, para, durante o mês de Dezembro de 2003, ir trabalhar para o "CC", resultando a ilicitude do despedimento do facto de a sua recusa ser legítima, uma vez que, nos termos da cláusula 56.ª do CCT publicado no BTE n.º 33/81, de 8/9, a sua deslocação temporária para outro local de trabalho carecia do seu acordo expresso.

Em 23 de Dezembro de 2004, a autora DDpropôs, no mesmo tribunal, acção contra a mesma ré, com pedido e causa de pedir idênticos aos da autora AA.

A ré contestou as duas acções, alegando, em resumo, que o CCT aplicável não era o indicado pelas autoras, mas sim o CCT celebrado entre a Associação dos Sindicatos de Portugal (de que a ré é associada) e a FESHAT - Federação dos Sindicatos da Hotelaria e Turismo de Portugal e outros, publicado no BTE n.º 37/83, de 8/10, que nada dispõe acerca da deslocação temporária do trabalhador.

A acção proposta pela autora DD foi apensada à da AA e, realizado o julgamento, foi proferida sentença, julgando as acções improcedentes no que toca à ilicitude do despedimento, com o fundamento de que a conduta das autoras configurava um caso de abuso do direito, apesar da sua recusa em cumprir a ordem que lhes foi dada pela ré tivesse sido legítima, face ao disposto na cláusula 56.º do CCT por elas invocado, que o M.mo Juiz considerou ser o aplicável ao caso, e condenando a ré a pagar, à autora AA, a quantia de € 906,00, a título das férias vencidas em 1.1.2004 e respectivo subsídio, e a quantia de € 204,78, a título de proporcionais de férias, de subsídios de férias e de Natal referentes ao trabalho prestado no ano da cessação do contrato, acrescidas dos juros de mora, contados desde 23.9.2004, e à autora DD, a quantia de € 906,00 a título das férias vencidas em 1.1.2004 e respectivo subsídio, acrescida de juros de mora contados desde 23.9.2004.

As autoras apelaram da sentença, por entenderem que a sua conduta não era subsumível à figura do abuso do direito e, nas contra-alegações, a ré não requereu a ampliação do objecto do recurso, apesar de ter sustentado que o CCT aplicável não era o invocada pelas autoras O Tribunal da Relação de Lisboa considerou que o CCT aplicável era o que foi invocado pelas autoras, mas entendeu que estas não tinham agido com abuso do direito e, na sequência disso, julgou ilícitos os despedimentos e condenou a ré a pagar: i) à autora AA, a quantia de € 5.436,00 a título de indemnização de antiguidade e as retribuições vencidas desde 0 30.º dia que antecedeu a data de propositura da acção, ou seja, desde 11.7.2004 até ao trânsito da decisão, deduzidas das importâncias que ela comprovadamente tivesse obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e do montante do subsídio de desemprego auferido pela autora, montante este que a ré deve entregar na segurança social; ii) à autora DD, a quantia de € 12.080,00 a título de indemnização de antiguidade e as retribuições vencidas desde o 30.º dia que antecedeu a data de propositura da acção, ou seja, desde 23.11.2004 até ao trânsito da decisão, deduzidas das importâncias que ela comprovadamente tivesse obtido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e do montante do subsídio de desemprego auferido pela autora, montante este que a ré deve entregar na segurança social; iii) a ambas as autoras, os juros de mora, contados desde o vencimento de cada uma das prestações, no que toca às retribuições vencidas e vincendas e desde a data do acórdão no que concerne à indemnização de antiguidade.

A ré interpôs recurso de revista, concluindo as respectivas alegações do seguinte modo: 1 - De acordo com a legislação em vigor à data dos factos (artigo 7.°, n.° 1, do D.L. 519--C1/79, de 29/12, princípio que é mantido pelo artigo 552.º do Código do Trabalho), as convenções colectivas de trabalho obrigam os empregadores que as subscrevem e os trabalhadores ao seu serviço, inscritos nas associações sindicais outorgantes.

2 - Ora, no caso em apreço, a recorrente é associada na AHP e as recorridas no Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Hoteleira, Turismo, Restauração e Similares do Sul.

3 - A AHP aderiu ao CCT indústria hoteleira publicado, no BTE n.° 9, de 8//03/1982, tendo o cuidado de expressamente referir que o acordo de adesão "não é extensivo à convenção referida no seu artigo 1.°", isto é, ao CCTV publicado no BTE n.° 33, de 8/9/1981 (doc. 1).

4 - Pode ler-se no acordo de adesão publicado no BTE n.° 28, de 29/07/1983, que: "O presente acordo de adesão reporta-se exclusivamente ao instrumento acima enunciado e não é extensivo à convenção referida no seu artigo 1.º, a qual relativamente às empresas filiadas na Associação dos Hotéis de Portugal é aplicada e mantém-se em vigor nos termos decorrentes da P.E. publica da no BTE, 1.ª Série, n.° 43, de 21 de Novembro de 1981" (doc.1).

5 - Assim, a redacção do acordo de adesão publicado no BTE, 1.ª Série, n.° 28 de 29/0711983, é bem elucidativa de que a AHP nunca quis ser outorgante do CCTV publicado no BTE n.° 33, de 8/9/1981, admitindo a sua aplicação mas somente por força da Portaria de Extensão (citado doc. 1).

6 - Deste modo, a AHP aderiu somente às tabelas salariais publicadas no BTE n.° 9, de 8/03/1982, e não ao CCTV publicado no BTE n.° 33, de 8/09/1981, que, de acordo com adesão, continuaria a aplicar-se às empresas filiadas na AHP e aos seus trabalhadores, mas somente por força da Portaria de Extensão, publicada no BTE n.° 43, de 21/11/1981, como melhor resulta do acordo de adesão que se junta sob doc. 1.

7 - Em 1983, a AHT subscreveu o CCTV publicado no BTE n.° 37. de 08/10/1983, juntamente com outra Associação Patronal e outros Hotéis.

8 - Diz-nos a cláusula 16.ª do CCTV publicado no BTE n.° 37. de 8/10/1983: "mantêm-se em vigor todas as disposições constantes dos instrumentos de regulamentação anteriores, relativamente às partes suas outorgantes, que não sejam derrogadas pela aplicabilidade das normas deste instrumento" (sublinhado nosso).

9 - Assim, por força da cláusula 16.ª, n.° 1, do CCTV publicado no BTE n.° 37, de 8/10/1983, o CCTV publicado no BTE n.° 33/81, de 8/09/1981, mantém-se em vigor somente relativamente às partes outorgantes desta convenção e não a outras. É isso que significa, na cláusula 16.ª, n.° 1, do citado CCTV, a expressão "relativamente às partes suas outorgantes".

10 - Ao contrário do referido no douto acórdão, com a redacção da cláusula 16.ª da citada convenção, a AHP não acordou a manutenção da vigência do CCTV publicado no BTE n.° 33/81 em relação a terceiros, o que fez foi admitir que esta convenção se mantivesse em vigor, mas somente quanto às partes que a outorgaram e não em relação a si que não a outorgou.

11 - Acresce que a associação patronal signatária do CCTV publicado no BTE n.° 33/81 (APH) foi extinta, o que conduziu à caducidade desta mesma convenção por "morte" de uma das partes outorgantes.

12 - Para não cumprir a ordem da recorrente, alegaram as recorridas que a ordem é ilegítima porquanto, nos termos da cláusula 56.ª do CCTV publicado no BTE n.° 33, de 8/9/1981, a deslocação (temporária) do trabalhador, para posto ou local de trabalho diferente do habitual, carece de acordo expresso entre a entidade patronal e o trabalhador.

13 - Acontece que, como demonstrado, a convenção colectiva que regula as relações de trabalho entre Recorrente e Recorridas é o CCT publicado no BTE n.° 37, de 8/10/1983, e não o CCTV publicado no BTE n.° 33, de 8/9/1981 (doc.2).

14 - Assim, relativamente à deslocação (temporária) do trabalhador para outro local de trabalho, aplica-se a legislação geral do trabalho, que permite à entidade patronal transferir o trabalhador para outro local de trabalho se essa transferência não lhe causar prejuízo sério (artigo 24.º do D.L. 49408, de 24/11/1969 ou 316.º do Código do Trabalho).

15 - Ora, da transferência temporária não resultava qualquer prejuízo para as recorridas e a ordem de serviço indica o motivo da transferência (muito baixa ocupação prevista para os messes de Novembro e Dezembro e férias de funcionários) e o tempo de duração da transferência (30 dias para cada uma das Recorrentes).

16 - Deste modo, a ordem da Recorrente é lícita e legítima e, consequentemente, a desobediência é ilegítima e ilícita.

17 - Ainda que se entenda que à relação laboral é aplicável CCTV publicado no BTE n.° 33, de 8/911981, o que só por mera hipótese académica e sem conceder se admite, entende a recorrente que, face aos factos dados como provados, existe justa causa de despedimento, como muito doutamente explana o voto de vencido.

18 - De facto, ainda que se venha a entender que a cláusula 56.ª do CCTV publicado no BTE n.°...

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