Acórdão nº 07P3131 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Janeiro de 2008

Magistrado ResponsávelMOREIRA CAMILO
Data da Resolução29 de Janeiro de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I - Nos presentes autos de inventário facultativo, instaurados por óbito de AA (Condessa de ....), que visam também a partilha dos bens móveis deixados pelo seu falecido marido, em obediência ao acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça proferido a 26.10.2004, procedeu-se no 1º Juízo Cível da Comarca de Coimbra à produção de "prova complementar ou extrínseca" que permitisse clarificar a real intenção da "de cuius", enquanto testadora que foi de deixa de determinados legados a seus herdeiros legitimários.

Produzida a competente prova, foi proferido despacho, onde se decidiu: "Considerar que, ao aceitar os legados em substituição das legítimas, os interessados, BB, CC, DD e EE, perderam o direito à legítima mas conservam a sua posição de herdeiros legítimos, concorrendo à herança no que toca à quota disponível, prosseguindo o inventário nos termos supra mencionados".

Após recurso da interessada FF, foi, no Tribunal da Relação de Coimbra, proferido acórdão, "a negar provimento ao agravo, alterando-se a decisão "a quo" apenas no que tange à alusão a qualquer quota disponível, e ordenando-se que a partilha do referido remanescente de bens se faça em conformidade com as regras gerais da sucessão legítima".

Ainda inconformada com tal decisão, dela veio a referida interessada interpor recurso de agravo, o qual foi admitido.

A agravante apresentou alegações e respectivas conclusões, pedindo a revogação do acórdão recorrido.

Contra-alegou apenas o agravado BB, defendendo a improcedência do recurso.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II - O acórdão recorrido remeteu para a matéria de facto dada por provada na 1ª instância, que é do seguinte teor: 1. No testamento que efectuou, a inventariada legou diversos bens móveis ao filho, GG, tendo declarado, no mesmo testamento, que, para evitar mais conflitos entre os filhos, resolveu, da maneira mais justa e equitativa que a sua consciência lhe ditava, fazer a disposição de última vontade que consta do referido testamento.

  1. A inventariada elaborou, pelo seu próprio punho, de entre os bens que existiam na Quinta das Sete Fontes, uma relação dos que eram propriedade do seu filho, GG, especificando no testamento quais os bens que legava a esse seu filho.

  2. A inventariada pediu à Ourivesaria ..... uma avaliação das pratas e das jóias que pertenciam à herança, bem como a composição subsequente de lotes com esses mesmos bens para serem distribuídos por todos os seus herdeiros, esclarecendo-se, no que toca às jóias, que a inventariada pretendia distribuí-las pelas netas.

  3. Essa avaliação e formação de lotes foram feitas com o conhecimento e acordo da inventariada, chegando cada um dos lotes a ser atribuído a cada um dos herdeiros, sendo certo, porém, que não chegaram a ser entregues.

  4. A partilha por morte do inventariado, HH, foi feita através de escritura pública e com o acordo de todos os herdeiros.

  5. Existiram desavenças entre os herdeiros após a morte do inventariado, HH.

  6. Após a morte da inventariada, reuniram-se na Quinta das Sete Fontes todos os seus herdeiros, pessoalmente ou através de representantes, para procederem à leitura do testamento, facto que ocorreu em 15.02.1995.

  7. Lido esse testamento, todos trocaram impressões entre si, sobre as disposições testamentárias, tendo marcado uma nova reunião para o dia 18.02.1995 para traçarem as directrizes das partilhas.

  8. No dia 18.02.1995, houve nova reunião entre os herdeiros, na qual, entre outras questões, foi solicitada ao representante do cabeça-de-casal a relação dos bens móveis a partilhar, quer do pai, quer da mãe.

  9. Ou seja, após a leitura e interpretação pessoal do testamento por parte de todos os herdeiros, todos quiseram proceder à partilha, em partes iguais, dos bens móveis da herança (com exclusão dos legados ao GG).

  10. E quando, mais tarde, foi requerido o presente inventário, manteve-se tal disposição dos herdeiros, apenas tendo sofrido alteração já numa fase avançada dos presentes autos quando foi levantada pela interessada, FF, a questão técnica da indivisibilidade da vocação.

  11. Até esse momento, nenhum dos interessados havia pensado que os aceitantes dos legados em substituição da legítima perdiam o seu direito aos seu quinhão nos bens móveis da herança.

  12. A inventariada confidenciava a pessoas das suas relações que queria evitar, a todo o custo, uma questão judicial entre os filhos, depois do seu falecimento.

  13. Referia também que tinha feito um testamento e que, se os filhos com ele concordassem, era impossível haver conflitos entre eles.

  14. O filho, GG, ficava beneficiado por ter sido o que a amparava e acompanhava desde a morte do seu marido.

  15. A inventariada dizia também que beneficiava o filho, BB, com o que ele mais desejava, a "Quinta da Boiça", para evitar que depois da sua morte houvesse desentendimentos.

  16. Antes de fazer o testamento, a inventariada contactou um advogado, entretanto falecido.

  17. A inventariada pediu à Ourivesaria ...... uma avaliação das pratas e das jóias que pertenciam à herança, bem como a composição subsequente de lotes com esses mesmos bens para serem distribuídos por todos os seus herdeiros, esclarecendo-se, no que toca às jóias, que a inventariada pretendia distribuí-las pelas netas.

  18. Ao colocar as etiquetas nos móveis pertencentes ao filho mais velho, GG, a inventariada pretendeu separar os móveis que pertenciam a este seu filho dos restantes móveis.

  19. Nos últimos dois meses de vida, era fisicamente impossível à inventariada proceder, ela própria, à descrição e anotação de várias centenas de móveis que existiam na sua casa das Sete Fontes.

    III - 1. Segundo o nº 1 do artigo 2165º do Código Civil, "Pode o autor da sucessão deixar um legado ao herdeiro legitimário em substituição da legítima".

    "A aceitação do legado implica a perda do direito à legítima, assim como a aceitação da legítima envolve a perda do direito ao legado" e "O legado deixado em substituição da legítima é imputado na quota indisponível do autor da sucessão; mas, se exceder o valor da legítima do herdeiro, é imputado, pelo excesso, na quota disponível" - nºs 2 e 4 do mesmo artigo.

    Estabelece o nº 1 do artigo 2187º do mesmo Código que "Na interpretação das disposições testamentárias observar-se-á o que parecer mais...

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