Acórdão nº 07P4279 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Janeiro de 2008
Magistrado Responsável | HENRIQUES GASPAR |
Data da Resolução | 23 de Janeiro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. "AA", advogado, veio requerer abertura de instrução visando a comprovação judicial da decisão do Ministério Público junto do tribunal da Relação do Porto, que determinou o arquivamento do inquérito realizado na sequência de queixa apresentada pelo requerente contra a juíza de direito BB, a quem imputava a prática de um crime e abuso de poder.
No requerimento de abertura de instrução alegou, fundamentalmente e em resumo, que as decisões proferidas pela arguida como juiz de um processo não se encontram fundamentadas; por causa de um relacionamento afectivo a arguida tornou-se ela amiga de um arguido (Comissário Marinheiro) nesse processo pendente no Tribunal Judicial de Chaves e na instrução desse processo, designadamente no interrogatório de vários arguidos (entre os quais o dito amigo), a arguida determinou a saída da sala de todos os aí presentes, quando antes havia proferido despacho autorizando a presença dos mandatários forenses nos interrogatórios dos vários arguidos; não permitiu ao queixoso, enquanto mandatário, que arguisse em acta uma nulidade, como questão prévia a uma diligência, nem permitiu que fizesse exarar um protesto atinente a tal proibição; não permitiu ao queixoso o acesso aos autos daquela instrução, dificultando assim o exercício do patrocínio; sem qualquer justificação condenou a cliente do queixoso numa multa ilegal; por tudo isto, a arguida agiu com o propósito de obter benefícios para si e para aquele arguido seu amigo (Comissário Marinheiro) e de causar prejuízos à cliente do requerente e ao próprio requerente (afectando a sua imagem e exercício profissional).
2- Admitida a intervenção do requerente como assistente e aberta a instrução no Tribunal da Relação, procedeu-se à inquirição das pessoas indicadas no requerimento de abertura de instrução, bem como a audição do próprio assistente, e procedeu-se ao interrogatório da arguida, BB.
Realizadas as diligências, e após debate instrutório, o juiz de instrução proferiu despacho de não pronúncia, por considerar que os factos indiciados não permitiam integrar os elementos do crime por que o assistente pretendia o julgamento da arguida.
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Não se conformando, o assistente recorre para o Supremo Tribunal, como os fundamentos constantes da motivação que apresenta e que termina com as seguintes conclusões: 1ª - Existem nos autos indícios suficientes de que a arguida com consciência de que a sua conduta era proibida por lei, praticou os factos constantes dos nºs 14 a 23 de fls. 209/209 (numeração repetida) a 210, nas circunstâncias aí descritas.
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- Tais indícios resultam quer de prova documental (fls. 2 a 57, 102 a 109, 165 a 180,254 a 282; do apenso I, fls. l a 9, 13 a 16: do apenso II, fls. 13 e 14,22,23,30, 31,32, 34,38,41 a 46,48,49 e verso, 50 e verso, 54 a 60, 65, 75, 79, 83, 84, 87, 88 do apenso II; e do apenso III, fls. 8 a 11, 13, 14, 18, 19, 21. 38. 40, 41 e 42), quer dos depoimentos de fls. 69, 70,283,284,294.295,297, 298.299 e 300.
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- Existindo suficientes indícios da prática pela arguida de tais factos, deve a mesma ser pronunciada pelos mesmos por se subsumirem ao artigo 382° do CP 4ª - Ao ter entendido de outra forma, violou a decisão recorrida o artigo 308° do CPP, com referência ao artigo 283° do mesmo Diploma 5ª - Revogando-se a decisão recorrida nos termos reclamados, far-se-á justiça O magistrado do Ministério Público respondeu à motivação, pronunciando-se pela improcedência do recurso.
A arguida respondeu também à motivação, defendendo o rigor da decisão recorrida, por não existirem «indícios de preenchimento do elemento objectivo ou do elemento subjectivo do tipo legal de crime».
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No Supremo Tribunal, a Exmª Procuradora-Geral Adjunta teve intervenção nos termos do artigo 416º do CPP, entendendo «que da prova recolhida nos autos não se extraem quaisquer indícios de que ao decidir do jeito como o fez [...] tivesse havido da parte da arguida qualquer intenção de obter para si ou para terceiro benefício ou ocasionar prejuízo a outrem, o que tanto basta para apartar a possibilidade de pronunciá-la pela prática do referenciado crime que, como bem se sabe, exige para preenchimento do tipo a existência de dolo especifico por banda do agente».
Notificado, o requerente manteve a sua posição.
Colhidos os vistos, o processo foi à conferência, cumprindo decidir.
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A decisão recorrida fixou os seguintes factos: 1. No Tribunal Judicial de Chaves foi distribuído à aqui arguida o processo de Instrução n° 245/03.1TACHV foi realizada por sorteio ordenado e presidido pela então Juiz Presidente do Tribunal da Comarca de Chaves, não tendo a arguida qualquer interferência no mesmo.
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Depois de no processo crime n.º 245/03. 1 TACHA, a sra juíza-arguida ter determinado a abertura de instrução requerida por vários arguidos e designado dias para inquirição de arguidos e de testemunhas no mesmo, concluiu o seu despacho deste modo: «Desde já se consigna que as diligências supra agendadas são efectuadas sem a intervenção do Ministério Público e dos mandatários/defensores dos arguidos» (despacho de 25-12005, a fls 9ss) 3. Na sequência do requerimento do denunciante, de fls 12, onde ele pedia um esclarecimento quanto à parte do despacho acabada de transcrever, a arguida proferiu novo despacho em que diz, entre outras coisas, o seguinte: «Ora, salvo o...
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