Acórdão nº 07P3742 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução10 de Outubro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Habeas corpus Acordam no Supremo Tribunal de Justiça_ No Processo nº 547/04.0JDLSB da 3ª VARA CRIMINAL DE LISBOA - 1• SECÇÃO, o arguido AA, melhor identificado nos autos, preso preventivamente no Estabelecimento Prisional de Lisboa, veio peticionar, através da sua Exma Mandatária, a presente providência de HABEAS CORPUS ao abrigo do disposto nos arts. 31° da Constituição da República Portuguesa e 222° do Código de Processo Penal, admissível ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 219º do mesmo diploma legal, na redacção decorrente da Lei n° 4812007 de 29 de Agosto, como consta da petição dirigida ao Exmo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, assim fundamentando: 1° - O ora Requerente foi inicialmente detido e constituído arguido, em 17 de Janeiro de 2005, no âmbito do processo nº 547/04.0JDLSB, então em fase de inquérito.

2° - Submetido a primeiro interrogatório judicial, foi-lhe aplicada a mais gravosa das medidas de coacção, A PRISÃO PREVENTIVA, em 18 de Janeiro de 2005, 3º - Situação em que se mantém ininterruptamente, desde então e até à presente data.

4° - Durante a fase de inquérito foi reconhecida e declarada, a fls., a EXCEPCIONAL COMPLEXIDADE dos presentes autos - aliás. indiscutível.

5° - Encerrada a fase de inquérito, foi deduzida acusação pública, e nesta imputada ao arguido, ora Requerente, a prática de um crime de fundação e chefia de associação criminosa, p. e p. pelo art. 299°, n° 1 e 3 do Código Penal, três crimes de burla Qualificada, p. e p. pelos arts. 217°, n° 1 e 218°, nº 2, alíneas a) e b), um crime de falsificação, p. e p. pelos arts. 256°, nº 1, alínea a), b) e 3 e um crime de receptação, p e p. pelo art. 231°, todos do aludido diploma legal.

6° - Não se conformando com tal acusação, requereu o arguido a abertura de instrução, vindo a ser proferido, em 2 de Maio de 2006, o despacho de pronúncia de fls. 15.988 e seguintes, 7° - Despacho este em que o Requerente é despronunciado do crime de fundação e chefia de associação criminosa, sendo pronunciado pelo CRIME DE ADESÃO À ASSOCIACÃO CRIMINOSA, p. e p. pelo art. 299º 2 do Código Penal, mantendo-se, no restante. a douta acusação pública.

8° - O processo segue então para a fase de julgamento, sendo distribuído à 1ª Secção da 3º Vara Criminal de Lisboa.

9° - A audiência de julgamento tem inicio em 1 de Fevereiro de 2007, decorrendo, desde essa data, em sessões ininterruptas ( cerca de 3 sessões semanais ).

10° - Não se encontrando ainda prevista data para o seu encerramento (designadamente por se encontrar prova da acusação por produzir).

11º - Não foi, pois, proferida ainda, nos autos em referência decisão em primeira Instância.

12° - Assim sendo, ENCONTRAM-SE JÁ ESGOTADOS OS PRAZOS MÁXIMOS DA PRISÃO PREVENTIVA, de acordo com o disposto no art. 215° do Código de Processo Penal, na redacção que lhe foi dada pela lei nº 48/2007 de 29 de Agosto, devendo o arguido, ora Requerente. ser restituído, de imediato. à liberdade - o que se requer.

Com efeito 13° - O art. 215º do Código de Processo Penal estabelece os prazos máximos do duração da prisão preventiva.

14° - No seu n° 1. estipula-se o regime-regra, aplicável ao comum dos processos criminais, 15° - No nº 2, alargam-se os prazos ali estabelecidos, em função da natureza do crime em causa nos autos, 16° - No n° 3 daquele normativo fixam-se os prazo máximos daquela medida de coacção, atendendo não apenas à natureza do crime imputado ao arguido, como ainda à especial complexidade do autos, devido, nomeadamente, ao número de arguidos ou de ofendidos ou ao carácter altamente organizado do crime.

17° - Considerando a natureza dos crimes imputados aos arguidos, nomeadamente ao Requerente - crimes estes que vêm previstos no catálogo do n° 2 do referido art 215º - bem como a declarada (e manifesta) excepcional complexidade dos autos, dúvidas não há que serão estes últimos os prazos pelos quais se há de aferir da legalidade da manutenção do arguido, ora Requerente, em situação de prisão preventiva.

Ora 18° - Tais prazos, nos termos do nº 1 e n° 3 do art. 215º do Código de Processo Penal, não podiam ultrapassar os 12 meses, sem que tivesse sido deduzida acusação, os 16 meses, sem que tivesse sido proferida decisão instrutória e 3 ANOS SEM QUE TIVESSE HAVIDO CONDENACÃO EM PRIMEIRA INST ÃNCIA.

19° - Este último, que importa agora considerar, foi SIGNIFICATIVAMENTE REDUZIDO com a entrada em vigor, no passado dia 15 de Setembro, da Lei n° 48/2007 de 29 de Agosto, que veio alterar a redacção daquelas normas legais, não excedendo agora os 2 ANOS E SEIS MESES.

20° - Sendo esta norma de aplicação imediata, tendo natureza substantiva (ou material), mesmo se inserida em lei processual, por colidir ( restringindo-o ) com o DIREITO FUNDAMENTAL que é A LIBERDADE ( cfr. art- 27° da CRP ) e sendo, também, manifestamente maia favorável ao arguido, é indiscutível que a mesma, atento o Principio da Aplicação da Lei Mais Favorável é, in casu, a aplicar.

Assim 21° - Encontrando-se o arguido, ora Requerente, em situação de prisão preventiva desde 18 de Janeiro de 2005,à ordem de um processo em que vem pronunciado por um dos crimes do catálogo do nº 2 do art. 215°, tendo o processo sido declarado de excepcional complexidade, decorrendo ainda a audiência de julgamento em primeira instância, onde não foi proferida, até ao momento, decisão final, esgotou-se o prazo da prisão preventiva em 18 de Julho de 2007, 22° - Pelo que, com a entrada em vigor, em 15 de Setembro de 2007, da lei nº 48/2007, deveria o arguido, ora Requerente, ter sido de Imediato e nos termos do disposto no art 217°, n° 1 do Código de Processo Penal, restituído à liberdade.

Na verdade 23° - Não existe qualquer outro processo à ordem do qual o arguido, ora Requerente, deva permanecer em prisão preventiva.

Porém 24° - Tal não aconteceu.

25° - E não aconteceu por, no entender da Ilustre Magistrada Presidente do Tribunal Colectivo que procede ao julgamento dos presentes autos (cfr. despacho de fls. dos autos) "lendo sido interpostos nos presentes autos dois recursos para o Tribunal Constitucional ( v. proc. 6008/06.5 já incorporado nestes autos e constituindo seu apenso, com os procs. 950/2006, da 2ª secção do tribunal Constitucional e 650/07 da 3ª Secção daquele mesmo Tribunal) e tratando-se este processo já judicialmente declarado em sede de inquérito como de especial complexidade, é ao caso aplicável o disposto no artº 215º nº 1, alínea c), 3 e 4 do Código de Processo Penal" - artº 215º, nº alínea c), nº 3 e 5 da actual redacção daquele diploma legal.

26° - Trata-se, salvo o devido respeito por tal entendimento, de uma interpretação e aplicação LITERAL. ACRITICA e acima de tudo, INCONSTITUCIONAL dos aludidos preceitos legais, nomeadamente do disposto no n° 4 do arte 2150 do Código de Processo Penal, na sua anterior redacção, actual nº 5 do mesmo art. 215°.

2'7º - É certo que, a dada altura, o Requerente, no exercício do seu direito de defesa, aliás constitucionalmente consagrado, recorreu para o Tribunal Constitucional.

De facto 28° - Como acima se refere, em 6° deste articulado, não se conformando com a acusação que lhe foi notificada, requereu o arguido AA, em tempo, a abertura de instrução.

29° - No seu requerimento de abertura de instrução suscitou diversas questões, de direito e de facto.

30° - Designadamente, arguiu a invalidade de um despacho, proferido em sede de inquérito pelo Digno Magistrado do Ministério Público titular do processo ao abrigo do disposto na Lei nº 5/2002 de 11 de Janeiro (Lei da Criminalidade Económica), determinante da Quebra do sigilo bancário, por, no entender do Requerente, o mesmo não se encontrar devidamente (minimamente) fundamentado, de direito ou de facto.

31° - Reconhecendo embora a falta de fundamentação do aludido despacho, entendeu o Juiz de Instrução Criminal, em sede de decisão instrutória, que tal invalidade, não constando do rol das nulidades dos arts. 119° e 1200 do Código de Processo Penal. teria de ser classificada como uma mera irregularidade, a qual, nos termos do disposto no n 1, parte final, do art. 123° do mesmo diploma legal, deveria ter sido arguida pelo Requerente nos três dias seguintes à notificação da acusação, e não - como o Requerente havia feito - no prazo previsto na alínea c) do nº3 do art. 1200 daquele Código (prazo da abertura de instrução ).

32º - Repare-se que tal despacho fora proferido no âmbito de um processo dito "monstruoso" isto é. um processo ao qual havia sido reconhecida especial complexidade, deduzindo o Ministério Público, no encerramento da fase de inquérito, ao longo de 477 páginas e 2.912 artigos, acusação contra 57 arguidos, imputando-lhes, entre outros, crime de fundação e chefia de associação criminosa, burla qualificada, falsificação de documentos. etc., ali identificando mais de um •• centena de alegados lesados e arrolando 215 testemunhas de acusação, comportando tal processo, à data da acusação, 40 volumes a titulo de autos principais ( mais de 13.000 páginas) e ainda cerca de duas centenas (200!) de apensos, entre processos crimes, documentação bancária, autos de busca e apreensão, transcrições de escutas telefónicas, etc., etc., etc.

33° - Não se conformando com tal decisão, recorreu o arguido para o Tribunal da Relação de Lisboa, onde em sede de autos de recurso nº 6008/2006 da 5- Secção, a mesma veio a ser mantida, pelos Exmos. Srs. Juizes Desembargadores.

34° - Ainda (e sempre) inconformado com aquela decisão, interpôs então...

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