Acórdão nº 07P2576 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Outubro de 2007

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução03 de Outubro de 2007
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No processo comum colectivo nº 358/06.8PBVIS do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Viseu foram submetidos a julgamento os arguidos: AA, solteiro, nascido em 06/02/1982, natural de Aveiro, residente em Glória, Aveiro; BB, solteiro, nascido em 16/9/1978, natural da Guiné-Bissau, residente em Aradas.

Por deliberação do Colectivo do Círculo Judicial de Viseu foi decidido: a) absolver os arguidos de todos os crimes de sequestro de que vinham acusados; b) condenar os arguidos pela prática, em concurso real, sob a forma de co-autoria material e consumada, de três crimes de roubo qualificados (de que foram vítimas CC, DD e EE, todas em Viseu), p. e p. pelos art.s 210º, nº 1 e 2, al. b), 203º, nº 1, 204º, nº 2, al. f), do Código Penal, e art.4º do D.L. 48/95, de 15 de Março, na pena individual de 4 anos e 6 meses de prisão por cada um deles; c) condenar o arguido BB pela prática, em concurso real com aqueles, sob a forma de co-autoria material e consumada, de um crime de roubo qualificado (de que foi vítima FF, em Aveiro), p. e p. pelas mesmas disposições legais, na pena de 4 anos de prisão; d) condenar o arguido AA pela prática, em concurso real com aqueles, sob a forma de co-autoria material e consumada, de um crime de roubo qualificado (de que foi vítima FF em Aveiro), p. e p. pelas mesmas disposições legais, na pena de 3 anos e 6 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico foram os arguidos condenados: - o arguido BB, na pena única de 10 anos de prisão; -o arguido AA, das penas parcelares supra descritas com as do PCS 691/04.3GCAVR, do 2º Juízo Criminal de Aveiro, na pena única de 9 anos e 6 meses de prisão.

Interpuseram recurso o Ministério Público, apresentando a motivação de fls. 912 a 921, o arguido BB, a de fls. 934 a 945 e o arguido AA, a de fls. 999 a 1003.

O Magistrado do Ministério Público rematou a motivação com as seguintes conclusões: 1.

O Tribunal Colectivo, no que concerne ao apuramento da medida da pena, deu como provados factos que apreciados no seu conjunto devem determinar um agravamento da pena; 2. O não fazer adequar a medida concreta da pena aos factos que a determinaram traduz uma contradição entre o que diz (factos provados) e a consequência necessária e adequada do que se aplica (a pena); 3. A ser assim, como na verdade nos parece que é, há violação do estatuído no art. 710, do Código Penal que diz que a determinação da medida da pena se faz dentro dos limites definidos na lei e, far-se-á, ainda, em função da culpa do agente, tendo ainda em conta as exigência de prevenção de futuros crimes e, 4. Nestes termos, entende o Ministério Público que a medida concreta da pena de cada um dos arguidos deverá ser agravada para 6 anos de prisão para o arguido BB e 7 anos de prisão para o arguido AA, por cada um dos crimes praticados e, em concurso a pena de 10 anos de prisão para o arguido BB e 11 anos de prisão para o arguido AA.

O recorrente BB finalizou a motivação com estas conclusões (transcrição): 1.

Vem o presente recurso interposto de fls. dos autos, que condenou o recorrente, BB, pela prática, em concurso real sob a forma de co-autoria material e consumada de quatro crimes de roubo qualificados, sendo em cúmulo jurídico condenado numa pena única de 10 anos de prisão; 2. Ao decidir como decidiu, aplicando ao recorrente a pena que aplicou, o tribunal à quo não observou os princípios plasmados nos artigos 77. °, 78.° e 79. ° n° I do Código Penal 3. Português. Isto é, não teve em linha de conta que a formulação do cúmulo jurídico não se reconduz " a meras operações aritméticas, impondo-se a consideração, em conjunto, dos factos e da personalidade do arguido" 4. Posto isto, a operação do cúmulo jurídico só se assegura e atinge com ponderação e valorização fundamentadas do que, em geral, propiciem os factos em concreto e a personalidade do agente que os praticou.

O tribunal recorrido deveria ter-se socorrido de todos os instrumentos que a lei fornece e que se destinam a auxiliar o julgador no conhecimento aprofundado da personalidade do agente.

  1. Conclui-se: "Que não é possível avalizar devidamente uma decisão de cúmulo jurídico, mesmo não havendo dúvidas quanto aos cálculos aritméticos feitos e ao acerto das regras utilizadas, acompanhada da respectiva fundamentação, sem ter em consideração conjunta os factos ocorridos e a personalidade do agente, elemento primordial para a determinação concreta da pena a aplicar".

  2. Ao decidir como decidiu, o tribunal "a quo", aplicando ao recorrente a pena de dez anos de prisão, atentas as circunstâncias já descritas e enumeradas nas alíneas A) a I) do presente recurso, não tendo valorado, como deveria essas atenuantes, aplicou uma pena que se mostra mais do que excessiva, pelo que violou os normativos do artigo 40º, nºs 1, 2 e 3 e 71º, nºs 1, 2 e 3, todos do Código Penal Português.

  3. Mostra-se por conseguinte ferido de nulidade o douto acórdão recorrido pela falta de fundamentação no tocante a uma análise aprofundada e meticulosa da personalidade do recorrente.

  4. Se o Código Penal Português toma uma posição clara quanto aos fins das penas e das medidas de segurança: protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade e define critério quanto à escolha da espécie e determinação da medida concreta da pena, por outro lado, (artigos 40°, 70° e 71°) a aplicação de uma pena excessiva, e consequente encarceramento, muito dificilmente o recorrente será reintegrado na sociedade após o cumprimento da mesma pelo que frustrar-se-á a finalidade da pena criminal.

  5. A pena de prisão deverá desencorajar ou intimidar aqueles que pretendem iniciar-se na prática delituosa por uma parte e ressocializar o agente por outra. Certo é também que o tribunal recorrido está a negar essa mesma oportunidade de ressocialização aplicando essa pena (Dez Anos) violando assim novamente os artigos 40º, nºs 1, 2 e 3 e 71º, nºs 1, 2 e 3, todos do Código Penal Português.

  6. A produção antecipada da prova, se por um lado facilita o trabalho do tribunal na descoberta da verdade material, uma vez que assim se podem produzir provas que à data de Audiência e Discussão e Julgamento não se poderiam produzir, em muito deixa a desejar quanto à veracidade ou não da prova que se possa produzir em sede de julgamento.

  7. A produção antecipada da prova, expediente "melindroso" que poderá ser enganador quanto aos factos relatados e posteriormente dactilografados, induzindo o julgador em formação de juízos de valores precipitados acerca do agente, sua personalidade e modo de actuação concreta que, poderão prejudicar o agente condenado, como estão a prejudicar.

  8. Ora, um dos princípios fundamentais do nosso ordenamento jurídico processual penal é o que impõe que toda a produção de prova é feita em Audiência Discussão e Julgamento, nomeadamente dando assim a hipótese de: quer a uma testemunha quer um ofendido, ser inquirido e contra inquirido sobre factos de depoimento já prestado quer dos que está a prestar e eventualmente sobre novos factos que surjam no decorrer da mesma Audiência que possam mesmo beneficiar o arguido.

  9. Salvo melhor opinião, não poderia nem deveria, o tribunal à quo, valorar este meio de prova de forma e interpretação taxativa como o fez, recorrendo-se única e simplesmente da "letra", esta já dactilografada após ser gravada em meios sonoros, antes sim, atribuir-lhe um valor que numa escala de 0% a 100% seria sempre de 80 %.

  10. Atente-se à "profissão" das ofendidas que se dedicavam à prostituição assim como à situação de ilegalidade em que se encontravam no nosso país. Pessoas de débil credibilidade que antecipadamente e minuciosamente prepararam as suas declarações.

  11. Assim não acontecendo, a produção antecipada da prova, pelo facto da mesma vir a produzir efeitos em A.D.eJ., põe em causa o princípio do contraditório, este resultante da Lei Constitucional (Artigo32º, nº 5). Pelo que, mostra-se violado este princípio fundamental de direito.

    16° Violados os normativos legais e princípios fundamentais de direito já enumerados, nunca ao recorrente deveria ter sido aplicada uma pena de prisão de máximo superior a 7 (sete) anos, a qual se tem por adequada ao quadro penal decorrente e em cúmulo jurídico das penas parcelares sofridas.

    Pede que o acórdão recorrido do cúmulo jurídico das penas parcelares seja anulado ou declarado nulo, ordenando-se a repetição do julgamento; ou, se assim não se entender, seja aplicada ao recorrente medida de prisão não superior a 7 anos, que tem por adequada ao quadro penal das condenações parcelares sofridas.

    O arguido AA apresenta as seguintes conclusões (em transcrição): I.

    A pena aplicada de 9 anos e seis meses é excessiva.

  12. O douto acórdão a quo, não tem em conta. a forma de crime continuado, que efectivamente corresponde à situação ocorrida quanto aos factos praticados em Viseu.

  13. Ao invés, computou os crimes de roubo como sendo individuais e sem ligação causal entre os mesmos, o que não é correcto.

  14. Assim como enquadrou erroneamente, o Tribunal a quo, os factos praticados em Aveiro, não podendo enquadrá-los juridicamente na forma de co-autoria, mas quando muito na forma de tentativa e dentro desta com desistência voluntária.

  15. Assim, além de não se alcançar os fins das penas, o acórdão prejudica gravemente o arguido nos seus direitos, liberdades e garantias, 6. Pugnando e optando por um regime muito mais gravoso para o mesmo, por interpretação jurídica demasiado formal e positivista e não como verdadeira Jusprudência de realização prática do direito.

  16. A moldura penal, atendendo-se à situação de crime continuado tem necessariamente que ser drasticamente reduzida.

  17. Também abandonando as concepções atávicas há muito ultrapassadas e as bíblicas no velho testamento de "olho por olho e dente por dente", a opção por outras medidas que não a reclusão em estabelecimento prisional, realizariam de forma mais premente a necessidade de ressocialização do arguido.

  18. Nomeadamente a adopção da medida de vigilância electrónica do arguido...

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