Acórdão nº 06P2808 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Setembro de 2007
Magistrado Responsável | SORETO DE BARROS |
Data da Resolução | 05 de Setembro de 2007 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.
O Tribunal da Comarca de Sintra, por acórdão de 14.07.05, proferido no âmbito do proc. n.º 20/03, decidiu : 'Julgar parcialmente procedente, por parcialmente provada, a douta acusação e pronúncia e, em consequência:
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Absolver o arguido AA da prática do crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos art.ºs 21.º, n.º 1 e 24.°, alínea c) do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C, anexa a este diploma, pelo qual vinha pronunciado; B) Condenar o arguido BB, nas seguintes penas parcelares: a) - pela prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p. pelos art.ºs 21.º, n.º 1 e 24.º, alínea c) do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C, anexa a este diploma, e art.º 26.º do C. Penal, com a pena de 8 (oito) anos de prisão; b) - pela prática, de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art.º 275.º, n.º 1 do C. Penal, com a pena de 3 (três) anos de prisão.
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Procedendo ao cúmulo jurídico das penas dos crimes em concurso - considerando, nos termos do art.º 77.º do C. Penal, em conjunto, os factos e a personalidade do arguido - condená-lo na pena única de 9 (nove) anos e 6 (seis) de prisão, no cumprimento da qual se descontará toda a prisão ou detenção sofrida pelo arguido à ordem deste processo (art.º 80.º do C. Penal).
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Condenar o arguido AA, pela prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21.º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C, anexa a este diploma, e art.º 26.º do C. Penal, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão; E) Condenar o arguido CC, pela prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21.º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C, anexa a este diploma, art.º 26.º do C. Penal, artigo 31.º do Dec. Lei n.º 15/93, de 22/1, e art.º 73.º do C. Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; F) Condenar o arguido DD, pela prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelos art.ºs 21.º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C, anexa a este diploma, art.º 26.º do C. Penal, art.º 4.º do Dec. Lei n.º 401/82, de 23/9, e art.º 73.º do C. Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão; G) Condenar o arguido EE, pela prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelos art.ºs 21.º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C, diploma, e art.º 26.º do C. Penal, com a pena de 5 (cinco) anos de prisão; H) Condenar o arguido FF, pela prática, em co-autoria, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelos art.ºs 21.º, n.º 1 do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência à tabela I-C, anexa a este diploma, e art.º 26.º do C. Penal, com a pena de 5 (cinco) anos de prisão.
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Nos termos e pelas razões supra expostas suspendem: ao arguido CC a execução da pena em que vai condenado, pelo período de 3 (três) anos; e ao arguido DD a execução da pena em que vai condenado, pelo período de 4. (quatro) anos.
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Nos termos e pelos fundamentos supra expostos, decretar o perdimento a favor do Estado: (...) (...) 1.
1 Os arguidos BB, AA, EE e FF recorreram para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 14.03.06, deliberou 'negar provimento aos recursos de todos os arguidos recorrentes, à excepção da pena única em que foi condenado o arguido BB, que fixou em nove anos de prisão, mantendo, no mais, o acórdão recorrido' . (fls. 2776 a 2879) 1.
2 Ainda inconformados, recorrem para o Supremo Tribunal de Justiça os arguidos AA e BB .
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2.1 O recorrente AA termina a motivação com as seguintes conclusões, que se transcrevem : 1ª - Mui embora seja jurisprudência assente que a matéria de facto considerada assente é, em principio insindicável perante o STJ, o facto é que tal regra não tem aplicação, caso se verifiquem, no texto da decisão recorrida, os vícios previstos nas diversas alíneas do nº 2 do artº 410 do CP 2a - Segundo a decisão recorrida os factos considerados provados sob o nºs 3., 4, 5,7 e 13, estribaram-se no depoimento do arguido CC no das testemunhas de acusação GG e HH.
3a - O texto da decisão recorrida remete para o da 1ª instância, na parte onde refere que: "...
pelas intercepções apuraram que o indivíduo Espanhol, que se encontrava em Badajoz e nunca se deslocou a Portugal, era o AA, um meio irmão do DD" 4ª - Todavia Colendos a correcta e crítica apreciação deste depoimento só permitiria uma conclusão, a de que o mesmo era inapto a dar o facto como provado. Desde logo nas intercepções telefónicas jamais surge ou é referido o nome do AA .
5ª - Por outro lado cumpre notar que a transcrição das intercepções foi efectuada a 4/12/03, Apenso IV fls. 2 ou seja, 2 meses depois do suposto contacto e da detenção dos co-arguidos e apesar disso no apenso IV ainda conta INI (indivíduo não identificado).
6a - Logo nessa altura, ou seja decorridos dois meses, ainda não se sabia quem era o INI. e depois disso não existem quaisquer intercepções telefónicas! 7a - Pelo que quando o Tribunal fundamenta o facto aqui em causa com base nas intercepções incorre no vício previsto na al. c) do nº 2 do artº 410 do CPP, ou seja erro notório na apreciação da prova, vício esse que consta da decisão recorrida.
8ª - Constatação essa que sai reforçada através da conjugação de tal texto com as regras da experiência comum, em face das quais a conclusão retirada pelo tribunal "a quo" , ao secundar a da 1ª Instância é ilógica, arbitrária e violadora dessas regras.
9a - Pois o que efectivamente resulta das intercepções telefónicas é tão só que o indivíduo com quem o Varandas contactava utilizava os telefones, ... e ..., telefones esses que pertencem à rede de Espanha.
10a - Ora se o agente GG titular do inquérito, inquirido pela signatária sobre se investigou a quem pertenciam os referidos nomes respondeu que não.
11ª - O recorrente pergunta com base em que prova foi possível dar como provado que o interlocutor do arguido BB era o arguido AA? 12a - É que para esse efeito o Tribunal teria que dar como provado que os números ... e ...constantes do Apenso IV pertenciam ao recorrente ou, pelo menos, eram por este utilizados.
13a - Não o tendo feito, até porque não tinha elementos para tal, o tribunal incorreu também no vício previsto na al. a) do nº 2 do artº 410 do CPP, ou seja insuficiência da matéria de factos provada, para a decisão de direito ou seja a condenação do recorrente, vício esse que deverá ser declarado com as legais consequências .
14a - Nem se diga que o facto de o recorrente ser meio-irmão do co-arguido DD permite fundamentar o facto.
15a - Apesar de as escutas falarem num irmão, tal referência é manifestamente insuficiente para fundamentar a prova deste facto, tanto mais que consta de matéria factícia assente, mantida pelo Tribunal" a quo" que: " 43. II, nascido a 24/06/1983, está registado como, filho de ... e de ... (cfr. doc. de fls. 1054)." 16a - Ou seja, o co-arguido DD têm pelo menos outro irmão, o II (facto dado como provado).
17a - No que se reporta à parte da fundamentação do primeiro acórdão também ela mantida e repetida na decisão recorrida, em que se alude ao depoimento da testemunha HH ( pag. 18 do acórdão) agente da PSP a prestar serviço nas Brigadas Anti-crime em Cascais, a qual declarou em determinada altura que ":deteve o arguido AA, dias depois dos factos, quando veio de Espanha com mais 18 pessoas, e a mulher do CC lhe telefonou aflita que estavam uns espanhóis a tentar entrar em casa, onde se deslocou e verificou que aí estavam umas 3 ou 4 viaturas espanholas; abordaram os indivíduos e reconheceram o AA ... " 18a - De resto a única conclusão a retirar é que o recorrente veio de Espanha a Portugal e foi detido, não porque tivesse algo a ver com estes autos ou com os espanhóis referidos mas porque a testemunha o reconheceu e sabia que contra ele pendiam mandados de captura para cumprimento de pena noutro processo, de resto aquele à ordem do qual se encontra preso e que nada têm a ver com o presente.
19a - Por outro lado não descortina a defesa que ligação possa existir entre estas declarações e os factos mantidos como provados nos presentes autos, ou melhor dizendo que facto provado em concreto é que esta parte da decisão recorrida se destina a fundamentar.
20a - Acresce inexistir qualquer ligação entre o AA e os familiares dos co-arguidos espanhóis que foram encontrados.
21a - Aliás veja-se até que os espanhóis faziam-se transportar em carros de matrícula espanhola, e o AA fazia-se transportar num veículo alugado a uma Rent-a-Car em Portugal. O que prova, ao contrário do que se refere o auto de detenção de fls. 540 a 543, que o AA não veio com os espanhóis de Espanha. Estava ali sozinho, até tinha veículo português.
22a - Assim, não enxerga o recorrente a relevância prática do trecho da decisão recorrida supra transcrito, tanto mais que os factos nele ínsitos não constam, de entre os provados, logo jamais a decisão recorrida, em sede de fundamentação se poderia ter alicerçado neles.
23a - Padecendo assim a decisão recorrida do vício previsto na alínea a) do nº 2 do artº 410 do CPP, ou seja insuficiência da matéria provada, para decisão de direito, vício esse que deve ser declarado.
24a - Colendos mais do que um espaço demasiado entre facto conhecido e facto adquirido, verifica-se mesmo a impossibilidade de assentar a ponte lógica por ausência do último elemento de fixação - a existência, demonstrada, de algum elemento sólido e objectivo que permita estabelecer a ligação entre o tal INI das intercepções com o recorrente .
25a - Sem esse elemento de facto provado, não é possível o "salto lógico" para dar como provado que os contactos telefónicos estabelecidos pelo Varandas o foram com a pessoa do arguido AA e não com outra qualquer.
26a - Além do depoimento destes...
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