Acórdão nº 98B057 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Maio de 1998

Magistrado ResponsávelMIRANDA GUSMÃO
Data da Resolução06 de Maio de 1998
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I 1. No Tribunal de Círculo de Leiria, A e mulher B intentaram acção com processo ordinário contra C e mulher D e E, pedindo que lhe seja reconhecido o direito de haverem para si o prédio vendido pelo preço declarado na escritura junta, para tanto alegando, e em síntese, que são há mais de 20 anos arrendatários habitacionais do 1. andar de um prédio urbano composto de uma moradia de rés-do-chão e 1. andar, sito na Rua ..., freguesia e concelho de Leiria e que, por escritura de 13 de Julho de 1993, os 1. Réus declararam vender ao 2. Réu o aludido imóvel pelo preço de 9000000 escudos, sem previamente darem-lhes conhecimento da realização, do negócio, do preço que iriam praticar, nem das condições de pagamento. O Réu E contestou excepcionando a caducidade e a renúncia do direito dos Autores, alegando que a vendedora por carta de 27 de Julho de 1989 notificou os arrendatários para, querendo, exercerem o seu direito de preferência, dando-lhes conhecimento das cláusulas do respectivo contrato, mas nenhum dos arrendatários, incluindo os Autores, exercitaram o seu direito de preferência; assim pagou aos vendedores em Dezembro de 1989 o preço acordado de 9000000 escudos, mas a escritura pública de compra e venda, por razões de amizade e confiança recíproca, só foi realizada em Julho de 1993. Replicaram os Autores referindo que a carta de 27 de Julho de 1989 apenas foi dirigida ao Autor/marido, que as condições de venda nela propostas são diferentes da concretizada, e que entre a data dessa carta e a concretização do negócio medearam quatro anos, período durante o qual se modificaram relevantemente as condições do mercado imobiliário, na zona. 2. No despacho saneador julgou-se improcedente a excepção de caducidade e relegou-se para a decisão final o conhecimento da excepção de renúncia do direito de preferência por depender de prova a produzir. 3. Procedeu-se a audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença a julgar a acção procedente, declarando que os Autores têm direito de haverem para si o prédio vendido pela escritura de 13 de Julho de 1993, pelo preço nela declarado. 4. O Réu contestante apelou. A Relação de Coimbra, por acórdão de 3 de Junho de 1997, negou provimento ao recurso. 5. O Réu contestante pede revista, formulando 47 conclusões onde submete a questão prévia da suspensão do presente recurso até ao trânsito em julgado da decisão a proferir na acção de despejo que intentou contra os Autores/recorridos, com o fundamento resolutivo verificado em momento posterior à venda do prédio locado. Para além desta questão prévia, submeteu à apreciação deste Supremo Tribunal de Justiça as seguintes questões: - a primeira, a modificabilidade das respostas aos quesitos 3 e 4 dadas pelo Tribunal Colectivo; - a segunda, a desnecessidade de se comunicar o projecto de venda a ambos os cônjuges quando só um deles é o arrendatário por intervenção no contrato de arrendamento; - a terceira, se não viola o estatuído no artigo 416 do Código Civil o facto de a comunicação para o exercício do direito de preferência indicar o nome de dois compradores e só um dos indicados ter celebrado o contrato de compra e venda. A segunda e terceira questões apresentam-se, na dinâmica das conclusões das alegações, como subquestões da questão fulcral: a de saber se houve renúncia ao direito de preferência. 6. Os Autores/recorridos apresentaram contra-alegações onde sustentam a irrelevância da questão prévia e pugnam pela manutenção do acórdão recorrido. III Questões a apreciar no presente recurso. 1. Antes de mais, temos de apontar que este Supremo Tribunal não pode conhecer da questão da modificabilidade das respostas dadas pelo Tribunal Colectivo aos quesitos 3. e 4., por duas ordens de razões: - a primeira, não cabe exercer censura sobre o não uso pela Relação dos poderes conferidos no artigo 712 n. 1 do Código de Processo Civil - Acórdãos de 15 de Março de 1994 - B.M.J. n. 435, página 750 e Antunes Varela, Revista Legislação e Jurisprudência, ano 130, página 306. - A segunda, só conhece da matéria de facto em dois casos (o primeiro, para a hipótese de o Tribunal recorrido ter dado como provado um facto sem que se tenha produzido a prova que, segundo a lei, é indispensável a sua existência; a segunda, quando se tenha desrespeitado as normas que regulam a força probatória dos diversos meios de prova admitidos no nosso sistema jurídico), sendo certo que nenhum desses casos se verifica no caso dos autos. 2. Fechado este parêntesis, temos duas questões a apreciar, conforme sublinhado, ou seja; a questão prévia de saber se a decisão da presente acção de preferência está dependente do julgamento da acção com fundamento resolutivo verificado em momento posterior à venda da coisa locada, e a questão de saber se houve renúncia ao direito de preferência. Esta segunda questão só será apreciada em resultado da questão prévia desdobrar-se em duas subquestões: a primeira, se, no caso de procedência da acção de despejo intentada pelo Réu/recorrente contra os Autores/recorridos, com fundamento resolutivo posterior à venda da coisa locada, estes manterão (ou não) o direito de preferência que lhes foi conferido pelo artigo 1 da Lei n. 63/77, de 25 de Agosto; a segunda, se a decisão dessa acção de despejo no sentido da procedência do fundamento resolutivo posterior à da venda da coisa será prejudicial à decisão do presente recurso. A solução a dar à segunda subquestão depende da resposta que se der à questão fulcral do presente recurso: se houver renúncia ao direito de preferência. Daqui a necessidade da apreciação desta questão. Abordemos, pois, as questões enunciadas. III Se, no caso de procedência da acção de despejo intentada pelo Réu/recorrente contra os Autores/recorridos, com fundamento resolutivo posterior à da venda da coisa locada, estes manterão (ou não) o direito de preferência que lhes foi conferido pelo artigo 1 da Lei n. 63/77, de 25 de Agosto. 1. A questão não deixa de ser isenta de dificuldades na sua solução, o que não aconteceria se a violação do contrato de arrendamento por parte do arrendatário habitacional se verificasse em momento anterior à venda da coisa locada. Neste caso (situação) a solução seria encontrada com base na eficácia retroactiva quer do reconhecimento judicial do direito de preferência quer da resolução do contrato de arrendamento: - por um lado, a procedência da acção de preferência tem como resultado a substituição, com eficácia ex tunc do adquirente pelo preferente - Antunes Varela, Revista Legislação e Jurisprudência, ano 103, páginas 470 e seguintes: Acórdãos...

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