Acórdão nº 97P1255 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Janeiro de 1998
Magistrado Responsável | MARIANO PEREIRA |
Data da Resolução | 13 de Janeiro de 1998 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Sob acusação do Ministério Público foi julgado em processo comum e tribunal colectivo na 1. Vara Criminal de Lisboa o arguido: - A, divorciado, Sargento Ajudante do Exército, reformado, nascido em 11 de Dezembro de 1929, em Proença-a-Nova, residente na Avenida ... na Damaia. Era-lhe imputado a autoria material de três crimes de homicídio na forma tentada dos artigos 131, 132 ns. 1 e 2 alíneas c) e g) e 22 e 23 todos do Código Penal. Foi deduzido pedido de indemnização cível pela ofendida B que requereu a condenação do arguido no pagamento de uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos no montante de 30000000 escudos. Após julgamento, foi decidido: 1- declarar que o arguido A praticou os factos dados como provados os quais a Lei Penal tipifica como três crimes de homicídio, sob a forma tentada, dos artigos 131 e 132 n. 2 alínea g) do Código Penal. 2- Declarar o arguido inimputável, relativamente à prática desses crimes por os ter praticado em virtude de sofrer de uma psicose delirante de tipo paranóide que o incapacitou de avaliar, no momento da sua prática, a sua ilicitude e de se determinar de acordo com essa avaliação. 3- Declarar ainda que por virtude do distúrbio psicopatológico que padece, a natureza e gravidade dos factos praticados se considera existir um fundado receio que o arguido venha a praticar factos graves da mesma natureza, susceptiveis de afectar a integridade física, a saúde ou a vida de terceiras pessoas. 4- Determinar o internamento do arguido em estabelecimento clínico especializado por um período nunca inferior a três anos, a fim de ser submetido ao tratamento psiquiátrico adequado à sua patologia. 5- Condená-lo no pagamento de uma indemnização à assistente nos termos do disposto no artigo 498 n. 1 do Código Civil que de acordo com os juízos de equidade aí estabelecidos se fixa em 10000000 escudos. Inconformados com o decidido, recorreram o Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal "a quo" e a Assistente B. Motivando o recurso conclui aquele Magistrado: 1. Discorda-se da declaração de inimputabilidade do arguido e considera-se que o arguido deveria ser declarado imputável diminuído e condenado pela prática de três crimes de homicídio tentado. 2- Havendo divergência entre a decisão proferida no processo n. 579/93.1SC exame e o relatório pericial destes autos, deveriam os peritos ser convocados para prestarem esclarecimentos nos termos do artigo 158 alínea a) do Código de Processo Penal. 3- Há contradição insanável na fundamentação do acórdão ao afirmar-se que "o arguido congeminou a forma que melhor entendeu para numa só ocasião exercer vindicta sobre a sua ex-mulher e aquele que supunha ser seu amante" e a conclusão de que "agiu de forma não-livre e sem consciência das implicações penais e sociais das normas que violava". 4- Constando tal contradição do texto da decisão recorrida, verificando-se o vício previsto no artigo 410 n. 2 alínea b) do Código de Processo Penal deve declarar-se a existência desse vício e ordenar-se o reenvio para novo julgamento nos termos do disposto no artigo 436 do Código de Processo Penal. No seu recurso, a ofendida conclui: 1- O arguido foi julgado imputável por decisão proferida no processo n. 579/93 1JC ALM que correu termos pelo Tribunal Judicial de Almada e no qual foi julgado e condenado em 16 anos de prisão pelo crime de homicídio qualificado cometido cerca de 1 hora após ter praticado os factos por que foi julgado nos presentes autos. 2- Tal decisão transitou em julgado. 3- Não foi alegado nem provado que entre as 19.30 horas de 8 de Julho de 1993 (momento em que o arguido disparou 2 tiros contra o corpo da ofendida) e as 20 horas e 30 minutos do mesmo dia (momento em que o arguido praticou o crime de homicídio na Aroeira) tenha havido qualquer alteração da anomalia psíquica - "perturbação delirante de tipo paranóide" de que o arguido padece, segundo os relatórios médicos juntos aos autos. 3a) Assim, atento o disposto nos artigos 674, 674A e 675 do Código de Processo Civil aplicáveis "ex vi" do artigo 4 do Código de Processo Penal, o acórdão recorrido ofendeu caso julgado na questão concreta da imputabilidade do arguido. 4- Por outro lado, a factualidade tida por provada no Acórdão recorrido, nomeadamente os relativos à forma como o arguido preparou com premeditação e executou os factos de que foi acusado nos presentes autos - homicídio tentado de que foram vítimas a ofendida a B e C - demonstram segundo "as regras da experiência comum" - artigo 410 n. 2 do Código de Processo Penal que ele tinha capacidade de no momento da prática dos factos avaliar a ilicitude destes e de se determinar de acordo com essa avaliação (artigo 20 n. 1 do Código de Processo Penal). 5- Decidindo de modo diferente o acórdão recorrido violou também os artigos 514 n. 1 do Código de Processo Civil e 20 n. 1 do Código Penal. 6- Acresce que constando dos autos o douto despacho do Tribunal de Almada que julgou o arguido imputável em sentido contrário ao dos pareceres constantes dos mencionados relatórios médicos e tendo a questão da imputabilidade sido necessariamente suscitada em julgamento por fazer parte da acusação, julgou-se que para completo esclarecimento desse facto essencial para o apuramento da verdade, era imprescindível que os peritos médicos em causa fossem ouvidos pelo Tribunal Colectivo e eventualmente interrogado pela acusação, defesa e representante da ofendida B conforme previsto no artigo 351 do Código de Processo Penal o que não aconteceu. 7- Deste modo o Tribunal "a quo" desrespeitou igualmente o princípio da imediação da prova, consagrado no artigo 351 do Código de Processo Penal. 8- O valor da indemnização não corresponde à gravidade dos danos que foram causados à ofendida B, nomeadamente a situação de paraplegia permanente só podendo locomover-se em cadeira de rodas, a circunstância dos esfíncteres, a total dependência de terceiros, etc. 9- O arguido deve ser considerado imputável e como tal condenado a título de culpa uma indemnização que se aproxime do reclamado na petição da recorrente (artigo 483 e seguintes do Código Civil). 10- É que o arguido agiu com dolo manifesto e bem notório em face dos factos e circunstâncias provadas nos autos. 11- Por outro lado são diferentes os conceitos de inimputabilidade vertidos no artigo 20 do Código Penal e no artigo 488 n. 1 do Código Civil sendo certo que não resulta dos autos, bem pelo contrário, que no momento da prática dos factos o arguido estivesse "por qualquer causa incapacitado de entender ou querer". 12- E nos termos do artigo 129 do Código Penal indemnização de perdas e danos emergentes de crime é...
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