Acórdão nº 12586/03 de Tribunal Central Administrativo Sul, 28 de Fevereiro de 2008

Magistrado ResponsávelRui Pereira
Data da Resolução28 de Fevereiro de 2008
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO 1º JUÍZO LIQUIDATÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL I. RELATÓRIO João ...

, Manuel ...

, João ...

, Filomena ...

e Maria ...

, todos oficiais de justiça a exercer funções no Tribunal de Vila do Porto, Ilha de Santa Maria, nos Açores, vêm interpor RECURSO CONTENCIOSO DE ANULAÇÃO do despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, que lhes foi notificado em 29-5-2003, que indeferiu o recurso hierárquico necessário que, em 10-1-2003, interpuseram do despacho do Subdirector-geral da Administração da Justiça que revogou os actos de processamento dos subsídios de residência no período compreendido entre Novembro de 2001 e Setembro de 2002, pedindo que o mesmo seja anulado, em síntese, com fundamento em: - Vício de forma por preterição do "...trâmite procedimental da audiência dos interessados", contrariando o disposto nos artigos 100º e 103º, nº 2, alínea a) do CPA; - Vícios de violação de lei por erro sobre os pressupostos de direito, por a revogação dos actos de processamento dos subsídios de residência atribuídos aos recorrentes se fundamentar numa errada e insustentável mudança de interpretação, a de que o DL nº 38.610, de 22-1-1952, foi revogado, e, por isso, tais actos, constitutivos de direitos, só poderem ser revogados com fundamento na sua invalidade e não numa mudança de interpretação administrativa; - Vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto, por não ter sido respeitado o efeito suspensivo decorrente da interposição de recurso hierárquico de um despacho sobre o mesmo assunto.

A entidade recorrida pugna pela manutenção da decisão recorrida com os fundamentos do acto recorrido.

Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 67º do RSTA.

Os recorrentes apresentaram alegações, enunciando as seguintes conclusões: "I. O despacho recorrido é inválido por vício de forma, e deve ser anulado, uma vez que não cumpriu, contrariando a alínea a) do nº 2 do artigo 103º e o artigo 100º do Código do Procedimento Administrativo, o trâmite procedimental da audiência prévia dos interessados.

  1. O acto administrativo impugnado é inválido por erro sobre os pressupostos de direito porque a revogação dos actos de processamento dos subsídios de residência atribuídos aos recorrentes [actos constitutivos de direitos] encontra-se fundamentada numa mera mudança de interpretação jurídica que pressupõe que o Decreto-Lei nº 38.610, de 22 de Janeiro de 1952, já não esteja em vigor ou já não se aplique aos recorrentes, o que não corresponde à realidade jurídica.

  2. O acto administrativo objecto do presente recurso é inválido por violação de lei uma vez que pretende revogar actos constitutivos de direitos [os actos de processamento dos subsídios] praticados anteriormente com fundamento numa mudança de interpretação administrativa à qual se pretende atribuir efeitos retroactivos, em violação do nº 1 do artigo 145º do CPA.

  3. O acto administrativo impugnado é inválido por erro sobre os pressupostos de facto porque a revogação dos actos de processamento dos subsídios de residência atribuídos aos recorrentes [actos constitutivos de direitos] encontra-se fundamentada numa mera mudança de interpretação jurídica, constante de um acto administrativo, e esse acto administrativo encontrava-se com eficácia suspensa por força da interposição de um recurso hierárquico necessário.

  4. Como o órgão recorrido na sua resposta informa que, na sua opinião, o acto objecto do presente recurso contencioso de anulação pretendia incluir a revogação do direito ao subsídio de residência estabelecido pelo Decreto-Lei nº 38.610, de 22 de Janeiro de 1952, e não só a revogação dos actos de processamento dos subsídios relativos aos meses de Novembro de 2001 a Setembro de 2002, razões de mera cautela, determinadas pelos dados novos aportados na resposta do órgão recorrido, levam a que se apontem também os vícios que invalidam a pretendida revogação do direito ao subsídio de residência.

  5. A vigência do Decreto-Lei nº 38.610, de 22 de Janeiro de 1952, não está dependente de qualquer alteração de interpretação administrativa. Assim, o acto impugnado é desde logo inválido por violação de lei, uma vez que a cessação do pagamento do subsídio de residência contraria, frontalmente, o Decreto-Lei nº 38.610, de 22 de Janeiro de 1952.

  6. O acto impugnado é ainda materialmente inválido dada a invalidade da revogação administrativa do Decreto-Lei nº 38.610, de 22 de Janeiro de 1952. Trata-se, aliás, de acto nulo quer por usurpação de poderes quer por violação directa do princípio constitucional da hierarquia dos actos jurídicos. O Decreto-Lei nº 38.610, de 22 de Janeiro de 1952, encontra-se em vigor, pelo que a tentativa de o revogar por via administrativa padece de usurpação de poderes. Por outro lado, viola, claramente, o princípio da hierarquia dos actos jurídicos consagrado no artigo 112º da Constituição. Ora, o acto impugnado, enquanto acto consequente de acto nulo, é também ele nulo.

  7. A cessação do pagamento do subsídio de residência aos recorrentes contraria, também, todas as concepções básicas de igualdade, tal como plasmadas no artigo 13º da Constituição. Na verdade, toda esta actuação é tanto mais incompreensível quanto existem funcionários públicos [alguns dependentes do próprio Ministério da Justiça] que continuam [e bem] a perceber o subsídio de residência. Assim, ainda que se entendesse, que o Decreto-Lei nº 38.610, de 22 de Janeiro de 1952, havia sido legislativamente revogado [o que se está apenas a configurar em benefício do raciocínio] sempre se diria que tal revogação era inconstitucional por violação do princípio da igualdade, e nulo o acto administrativo consequente".

    A entidade recorrida contra-alegou, formulando as seguintes conclusões: "

    1. As alegações [fls. 99 a 124] não acrescentam nada de novo à petição; b) Os fundamentos da petição foram contraditados na resposta [fls. 82 a 90] dada por reproduzida; c) Contrariamente ao entendimento que os recorrentes persistem em adoptar, em causa está, única e exclusivamente, um único procedimento administrativo; d) Como se tem vindo a assinalar, o que se discute é a eventual (i)legalidade do processamento do subsídio de residência atribuída aos oficiais de justiça colocados na Comarca de Vila do Porto/Ilha de Santa Maria. Desta discussão extraem-se, de imediato, dois sub-itens: a cessação do pagamento do subsídio previsto no DL nº 38.610, de 22-1-52, e a revogação dos actos de processamento do citado subsídio com a necessária reposição das quantias indevidamente recebidas; e) O facto de os impetrantes se terem pronunciado quanto ao primeiro sub-item [cessação do pagamento do subsídio] dispensa, ao abrigo da alínea a) do nº 2 do artigo 103º do CPA, o apelo à audiência dos interessados. Revelar-se-ia como pleonástico um novo procedimento por partes dos rogantes nesta sede; f) É indiscutível que os oficiais de justiça têm um regime de direito público privativo, isto é, encontram-se abrangidos por um direito constituído essencialmente por normas especiais.

    g) Este complexo normativo tem admitido, pelo menos desde 1982, a percepção de um subsídio de residência para situações similares à dos recorrentes; h) Apresenta-se, pois, como despido de alcance o consagrar - em duplicado - a percepção de um subsídio de residência com o mesmo escopo, como acontece com o consignado no DL nº 38.610, de 22-1-52; i) Além do mais, o próprio âmbito de aplicação pessoal do diploma objecto de controvérsia incide tão somente sobre os funcionários do Ministério da Justiça, arredando, necessariamente da sua previsão os oficiais de justiça; j) Como se disse na resposta junta aos autos de fls. 82 a 90: "Por funcionários do Ministério da Justiça dever-se-á entender os indivíduos providos [nomeados] em lugares dos quadros das diferentes Direcções-Gerais, Institutos e Organismos equiparados. Relativamente a estes funcionários encontramos um núcleo normativo comum. Na verdade, aplicam-se na generalidade as mesmas regras em matéria de recrutamento, mobilidade, remuneração, etc. Situação bem diversa é a que se assinala aos funcionários de justiça/oficiais de justiça que, como é consabido, têm um regime específico, "privativo". Basta pensarmos nas regras particulares que têm em sede recrutamento, mobilidade, remuneração, etc.; i) O despacho recorrido está inteiramente conforme às disposições legais aplicáveis, não ostentando nenhuma das patologias invocadas".

    O Exmº Magistrado do Ministério Público, em obediência ao disposto no artigo 53º da LPTA, emitiu, no sentido do provimento do recurso, o seguinte parecer: "1º - Os recorrentes, como bem se alcança da petição e alegações, imputam ao impugnado acto vícios de forma, violação de lei e de usurpação de poderes que, de seguida, passaremos à sua apreciação.

    1. - Seguindo a ordem estabelecida pelos recorrentes diremos que, vistas as argumentações dos recorrentes e autoridade recorrida, temos para nós, na senda do que vem defendido pelos recorrentes, que o acto impugnado relativo à revogação do subsídio de residência dos meses de Nov. de 2001 a Set. de 2002 padece de vício de forma.

    2. - A autoridade recorrida, com efeito, cumpriu o mecanismo do artigo 100º do CPA, como se alcança de fls. 20 a 34, quando notificou os recorrentes do projecto de decisão da suspensão do subsídio de residência na sequência do que ordenou a sua suspensão.

    3. - Ora, como os autos mostram, o acto que ordenou a referida suspensão tem um objecto diferente do acto que ordenou a revogação do mesmo subsídio, ambos os actos foram praticados em momentos diferentes e num quadro circunstancial diferente.

    4. - E, embora os sujeitos sejam os mesmos, certo é que os objectos dos respectivos actos são diferentes, diferente é a respectiva lesividade e menos certo não é que o acto de revogação do subsídio de residência não se apresenta como consequência necessária ou execução do acto que ordenou a sua suspensão.

    5. - Os recorrentes, como...

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