Acórdão nº 00749/06.4BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 09 de Outubro de 2008
Magistrado Responsável | Dr |
Data da Resolução | 09 de Outubro de 2008 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O Ministério Público, inconformado, interpôs recurso da decisão judicial proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que, em 18 de Maio de 2007, absolveu o Município de Coimbra, a Associação … – Organismo Autónomo de Futebol, com sede na Rua …, e T…, S.A., com sede na Rua …, Lisboa, do pedido formulado na Acção Administrativa Comum, sob a forma Ordinária.
Alegou, tendo concluído do seguinte modo: I – Em 29 de Julho de 2004, é celebrado o “Acordo de Utilização do Estádio … (E…)”, entre a Câmara Municipal de Coimbra e a Associação … / Organismo Autónomo de Futebol (A…/OAF); II – Com este “acordo”, o Réu Município de Coimbra cedeu à A…/OAF, e esta aceitou, o direito de utilização do E… (Estádio …), enquanto sede da prática desportiva profissionalizada da modalidade de futebol da A…/OAF, pelo prazo de 10 anos, renovável automaticamente por períodos de 5 anos; III – A cedência do direito de utilização do E… (Estádio) compreende não só todas as instalações e infra-estruturas desportivas, mas também espaços destinados a comércio, restauração e serviços; IV – Tal contrato representa, por si só, pela aplicação e execução do seu clausulado, um financiamento indevido a um clube de futebol profissional, pelas garantidas possibilidades que ele encerra de gerar para a Ré A…/OAF elevadas vantagens económico-financeiras; V – Por isso, sobre o Autor – Ministério Público não recai o ónus de alegar factos concretos, contabilísticos ou financeiros, demonstrativos de que a Ré A…/OAF beneficiou, de facto, com o contrato, porquanto tal só seria possível no seu termo ou, pelo menos, após execução parcial; VI – A própria Ré A…/OAF, em aplicação do “acordo”, no período da sua execução até Fevereiro de 2007 (nele incluindo, é certo, a época desportiva 2003/04), entende que a Câmara Municipal de Coimbra lhe deve a quantia de 156.526,52 €; VII – As receitas que o “acordo” possibilita à Ré A…/OAF serão canalizadas exclusivamente para si e para desenvolvimento do futebol profissional; VIII - O “Acordo de Utilização do Estádio … (E…)”, celebrado entre a Câmara Municipal de Coimbra e a Associação … / Organismo Autónomo de Futebol (A…/OAF), é uma forma indirecta e encapotada de subsídio ao desporto profissional; IX – Por isso, o “acordo” viola o disposto no art. 3º, nº 3, do Decreto-Lei nº 432/91, de 06/11, sendo nulo por força do art. 280º, nº 1 do CCivil; X – Ao não entender assim, a M. ma Juíza “a quo” violou as normas citadas dos arts. 3º, nº 3, do Decreto-Lei nº 432/91, de 06/11, e 28ºº, nº 1, do C.Civil.
Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, deverá revogar-se a douta sentença recorrida, e, em consequência, julgar-se a acção procedente, declarando-se a nulidade do “Acordo de Utilização do Estádio … (E…)”, celebrado em 29 de Julho de 2004, entre o Réu Município de Coimbra e a Ré “Associação … / Organismo Autónomo de Futebol” (A…/OAF).” O Município de Coimbra contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso interposto, embora sem formular conclusões.
A recorrida T…, S.A., contra-alegou, embora de forma extemporânea, tendo sido desentranhada tal peça processual.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
O Tribunal a quo deu como assente a seguinte matéria de facto: 1 - Em 22/11/2002 foi celebrado, no âmbito do III QCA, Contrato-Programa de Desenvolvimento Desportivo entre o Município de Coimbra, o Presidente da Comissão de Coordenação da Região Centro, o Instituto Nacional do Desporto e o Coordenador Nacional da Intervenção Operacional Regionalmente Desconcentrada da Medida de Desporto, pelo qual foi concedida uma comparticipação financeira global até ao montante máximo de 3.740.984,23 Euros, destinada à remodelação e ampliação do Estádio Municipal de Coimbra, em consonância com a candidatura apresentada e aceite pela Unidade de Gestão do Eixo Prioritário 3 do Programa Operacional Regional do Centro; 2 - Do conteúdo do contrato descrito no ponto anterior consta, além do mais, a cláusula 5ª, n.º 1, al. f), que reza o seguinte: “O Promotor obriga-se a: (…) f) Não ceder, dar de exploração, locar ou alienar, no todo ou em parte, excepto a favor de entidades sem fins lucrativos e quando previamente autorizado pelas outras partes, os empreendimentos comparticipados e os bens e equipamentos integrantes do projecto, durante o prazo referido na cláusula Décima Terceira, sob pena de devolução das comparticipações recebidas no âmbito deste contrato acrescidas dos respectivos juros; (…)”.
3 - Da acta referente à reunião da Câmara Municipal de Coimbra realizada em 17/02/2003 consta, no que concerne à deliberação n.º 1882/2003, relativa ao assunto “ Modelo de Organização e Gestão do Estádio Municipal de Coimbra “, além do mais, o que se segue: (…) (…) encontra-se realizado o essencial do investimento financeiro desta relevante infra-estrutura desportiva, num orçamento directo de cerca de 45 milhões de euros aplicados exclusivamente no Estádio Municipal.
(…) devem ser cuidadosamente estudadas e preparadas fórmulas e possibilidades de valorização e gestão do renovado Estádio Municipal de Coimbra que permitam naquele horizonte temporal, senão a amortização global, pelo menos a amortização do investimento municipal.
(…) propõe-se a elaboração de estudo técnico aprofundado sobre o novo modelo de gestão e organização do Estádio Municipal de Coimbra.
(…).
4 - Da acta referente à reunião da Câmara Municipal de Coimbra realizada em 03/06/2004 consta, relativa ao assunto “Modelo de Organização e Gestão do Estádio Municipal de Coimbra”, além do mais, o que se segue: (…) (…) Em sua opinião, qualquer proposta no sentido de aliviar a pressão sobre a Câmara Municipal num equipamento desta natureza, é positiva. A manutenção do Estádio na versão mais baixa do gasto é de cerca de 2.100.000 Euros/ano, o que significa que não são considerados juros e recomposição de capital. A Câmara Municipal para poder explorar todas aquelas áreas e também o negócio do futebol teria de fazer investimentos que não fez, como por exemplo na área dos restaurantes, por ter pensado que o utilizador o poderia fazer. Depois teria a necessidade de criar um núcleo de pessoas da Câmara Municipal de Coimbra qualificadas para gerir uma unidade daquelas. No conjunto, a despesa que tem de ser feita é substancialmente elevada. (…) (intervenção do Presidente da Câmara Municipal de Coimbra) (…) O Sr. Presidente (…) referiu que este Estádio, com as dimensões e características que tem, só faz sentido ser gerido por uma equipa de futebol que esteja a disputar a superliga. Não pode comparar um clube mais pequeno com um estádio daqueles, porque esses clubes não o conseguem rentabilizar. Há que haver um parceiro que esteja interessado e que consiga tirar valor do estádio. (…) O Sr. Vereador L… (…) se existirem terceiros na gestão prevista tem de se saber com toda a transparência quais são as verbas que a Câmara Municipal deixa de suportar e que verbas anuais é que a Associação …/OAF vai ter de contrapartidas. Finalmente, gostaria de saber como é que o Município de Coimbra pretende apoiar o futebol profissional.
O Sr. Presidente (…) a vinculação que existe é uma função da inequívoca utilização do espaço por uma determinada entidade. Disse ainda que queria deixar de dar apoios à Associação …/OAF, sendo o único apoio aquele que advém deste acordo.
(…) O Sr. Presidente disse que se trata de um equipamento que tem uma valência e que não pode ser despido dessa mesma valência, tendo de ser encontrada uma forma de ser rentabilizado. A grande questão é que a Câmara Municipal não tem vocação para fazer isso e há que encontrar uma solução. (…) Foram feitos os contactos necessários para a criação da empresa municipal, mas sem qualquer sucesso. O conteúdo da proposta, em termos gerais, é útil para a Câmara Municipal em função dos números, pois do ponto de vista da despesa há números inferiores ao estudo encomendado pela Câmara Municipal à K…, o que significa que daria maior margem de lucro em relação à receita e a Associação … diminui a despesa prevista.
(…) 5 - A Câmara Municipal de Coimbra, em reunião realizada em 15/06/2004, relativa ao assunto “Acordo de Utilização do Estádio …”, deliberou aprovar o dito acordo (deliberação n.º 4687/2004); 6 - Da acta referente à sessão da Assembleia Municipal de Coimbra realizada em 23/07/2004 consta, relativa ao assunto “ Exploração do Estádio … “, além do mais, o que se segue: (…) Intervenção do deputado municipal C… (PS): (…) não posso deixar de o acompanhar na sua análise, de que a gestão do Estádio por este Executivo seria ruinosa. Não tenho, de facto, dúvidas nenhumas que a ser feita...
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