Acórdão nº 0624/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Abril de 2009

Magistrado ResponsávelFREITAS CARVALHO
Data da Resolução02 de Abril de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso do Supremo Tribunal Administrativo O Instituto da Segurança Social IP, identificado nos autos, recorre, ao abrigo do artigo 150, do CPTA, do acórdão de 17-04-2008, do Tribunal Central Administrativo do Sul que negou provimento o recurso jurisdicional interposto do acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal que julgou procedente a acção administrativa especial que A..., identificado nos autos, intentou contra o recorrente, anulando o despacho da Directora do Núcleo de Desemprego do Centro Distrital de Solidariedade e Segurança Social de Lisboa que indeferiu o pedido de atribuição das prestações de desemprego, formulado pelo aqui recorrido ao abrigo do DL n.º 119/99, de 14 de Abril.

O recorrente formula as seguintes conclusões: 1 - O Douto Acórdão recorrido não teve em consideração o disposto nos artigos 4° e 10º do CC, na interpretação e aplicação das normas constantes dos artigos 145° e 146° do CPC ao procedimento administrativo.

2 - O recurso à analogia, em que se baseia a formulação dos argumentos do Douto Acórdão, pressupõe que se a lei prevê e regula de certa maneira, da mesma maneira teria regulado outros casos relativamente aos quais devessem proceder as mesmas razões justificativas daquela regulamentação.

3 - Se o Douto Acórdão reconhece que no cumprimento dos prazos peremptórios e preclusivos do procedimento administrativo verificam-se as mesmas razões que justificam o justo impedimento nos prazos (peremptórios e preclusivos) do processo civil, então, recorrendo à analogia das normas reguladoras desse instituto jurídico, tem de aplicar não só o conceito, mas também o regime de alegação e prova ali disciplinado.

4 - Pois, aqui é caso de aplicar a analogia da lei e não a analogia do direito, por, como o próprio Douto Acórdão reconhece, não é necessária a mediação de um princípio normativo, podendo aplicar-se directamente as normas dos artigos 145° e 146°.

5 - Constituindo o instituto do justo impedimento uma regra geral válida para todos os prazos peremptórios, por força do princípio da justiça, então, deve o mesmo ser invocado e exercido nos termos preceituados no artigo 146° do CPC, de harmonia com o princípio da unidade do sistema jurídico.

6 - Mas, na verdade, o Douto Acórdão, embora argumentando nos termos da aplicação analógica, acaba a resolver o diferendo por equidade, considerando, fundamentalmente, as especiais circunstâncias do caso concreto, ao admitir a alegação do justo impedimento, para além do momento imediato à sua cessação, e na apresentação da prova em momento desfasado deste e sem ser pelo meio qualificado que a lei impõe.

7 - Face ao que dispõe o artigo 4° do CC, não se nos afigura, s.m.o., que essa decisão seja legal.

8 - Cabia ao aqui recorrido ter invocado o justo impedimento e oferecido de imediato a respectiva prova, logo que cessou a causa impeditiva, não cabendo à Administração o poder-dever de formular qualquer convite para aquele apresentar a prova em falta ou de indagar, por outros meios, da veracidade da alegação.

9 - O Acórdão recorrido violou, ainda, o disposto nos artigos 61° e 63°, do referido Dec.-Lei n° 119/99, ao admitir como válida a comunicação da situação de doença, decorridos mais de 90 dias da data do desemprego, e que o requerimento do subsídio de desemprego apresentado em 04/07/2003 foi tempestivo.

10 - Só a confirmação da doença pelos serviços de verificação de incapacidade é que tem a virtualidade de suspender o prazo legal para requerer o subsídio de desemprego e não a simples comunicação da baixa.

11 - Porém, à data de 16/04/2003 já se encontrava esgotado o prazo de 90 dias, pelo que a comunicação da doença feita naquela data não poderia, obviamente, suspender qualquer prazo, pelo que, também, o requerimento apresentado em 04/07/2003 era manifestamente extemporâneo.

12 - Para que assim não fosse, o aqui recorrido deveria ter apresentado o requerimento do subsídio de desemprego, alegando o justo impedimento por motivo de doença e oferecendo logo a respectiva prova, tudo em 16/04/2003.

O recorrido contra alegou apresentando as seguintes conclusões: I - O recurso ora contraminutado é de revista para o Supremo Tribunal Administrativo, em terceira instância jurisdicional, ao abrigo do disposto no n° 1 do artigo 150 do CPTA, conforme se lê no respectivo requerimento de interposição e nas alegações que o acompanham.

II - O recurso de revista, como terceiro grau de jurisdição, tem natureza excepcional e só é admissível se se verificarem os respectivos pressupostos de admissão, a serem verificados "ad hoc" e sumariamente no próprio STA por um colégio composto por três Juízes Conselheiros escolhidos de entre os mais antigos que integram a respectiva secção do contencioso administrativo - cfr. n° 5 do artigo 150 do CPTA.

III - Tal como se mostra fundamentado e estruturado, o presente recurso integra-se na hipótese concedida pelo legislador e constituída pela clara necessidade de uma melhor aplicação do direito - situação que não ocorre nos presentes autos, já que o Tribunal Central Administrativo do Sul fez, no douto Acórdão sob revista, correcta e clara interpretação e aplicação das normas em causa, aliás confirmando, também, douto Acórdão de primeira instância.

IV - Assim sendo, o recurso em apreço não pode ser admitido por ausência de verificação dos respectivos pressupostos de admissibilidade, devendo ser indeferido face ao disposto no n° 3 do art. 687 do C.P.Civil, aplicável "ex vi" artigo lO do CPTA; V - Aliás, no caso concreto, os pressupostos da sua admissibilidade entrecruzam-se com os próprios fundamentos do recurso, o que desde já permite antecipar a conclusão de que o presente recurso não pode proceder; VI- Na realidade, no presente recurso o recorrente diz interpô-lo para obter uma melhor interpretação e aplicação do disposto nos artigos 145 e 146 do C.P.Civil aos procedimentos administrativos, o que limita as normas que nele podem ser objecto de apreciação.

VII -Motivo por que não pode ser objecto de apreciação: a) o artigo 4º do Código Civil, já que decisão não foi proferida por apelo ou aplicação dos princípios da equidade; b) os artigos 61 e 63 do Decreto-Lei n° 119/99, de 14 de Abril, porque não têm que ver com a interpretação e aplicação dos artigos 145 e 146 do C.P.Civil.

VIII - Acresce que a interpretação que o recorrente deles faz está em manifesta contradição com o decidido no douto Acórdão n° 275/2007, do Tribunal Constitucional, proferido no processo n° 205/2007.

IX - A tese sustentada pelo recorrente está também em manifesta contradição com o douto Acórdão do STA de 25/11/1998, invocado no douto Acórdão sob revista; X - A tese sustentada pelo recorrente no recurso em apreço está em manifesta contradição ainda com a factualidade tida como provada, fazendo tábua rasa da prova pericial médica no processo.

XI - E ignorando a função essencial da audiência prévia em sede de procedimento administrativo, aonde logo foram invocados factos integradores do justo impedimento, completamente obliterados na decisão administrativa impugnada neste processo; XX - O recorrente litiga com manifesta má-fé processual ao interpor o presente recurso por não poder ignorar nem a ausência dos seus pressupostos, nem a sua falta de fundamento, constituindo mero expediente dilatório para cumprimento da obrigação constitucional instituída e de que é aplicador.

XXI - A sua natureza de Instituto Público agrava tal comportamento, pelo que deve ser, ao abrigo do disposto no artigo 8° do CPTA e nos artigos 456 e 457 do CP.Civil, condenado em exemplar multa e correcta indemnização a favor do recorrido, já que não e à taxa de juros moratórios supletiva que o compensa dos prejuízos sofridos.

O Exm.º Magistrado do Ministério Público junto deste STA emitiu douto parecer no sentido do provimento parcial do recurso, cuja parte útil se passa a transcrever: "O recorrente não questiona a aplicabilidade do instituto do justo impedimento em procedimento administrativo mas contesta o modo da sua aplicação ao caso em apreço realizada pelo aresto recorrido.

Com expressa invocação e adesão à doutrina do douto acórdão deste STA, de 25/11/98, rec. 34284 in "Cadernos de Justiça Administrativa", nº 15, nos termos do qual "o prolongamento do termo do prazo para a prática de actos com fundamento em justo impedimento, regulado nos arts 145, nº 5 e l46 do CPC, representa regra geral válida para todos os prazos peremptórios, independentemente da sua natureza substantiva ou adjectiva (...), o acórdão recorrido considerou que o "Autor encontrava-se numa situação de justo impedimento que inviabilizou a apresentação do requerimento de comunicação do estado de baixa médica por doença", nos termos do artº 63, nº 1, a) e nº 3 daquele referido DL, traduzido "numa situação de incapacidade acidental que o impediu de se determinar e, nesta medida, observar os prazos legais" (cfr fls 373/372 e 446).

Ora, a razão parece estar do lado do recorrente quando, neste ponto, alega erro de julgamento pelo facto de o acórdão recorrido ter considerado como justo impedimento da atempada comunicação da situação de doença do recorrido, para efeito da suspensão do prazo de 90 dias para requerer as prestações de desemprego, um evento obstaculizante para além do momento imediato da sua cessação. Na verdade, a alegação de justo impedimento traduzido em doença psiquiátrica incapacitante das faculdades de compreensão, determinação e de decisão, designadamente para apresentar as declarações médicas de suspensão dos prazos para pedir as prestações de desemprego - doença que afectou o A no período de 15 de Novembro de 2002 até 16 de Abril de 2003 - só viria a ocorrer em 29 de Agosto de 2003, no âmbito do exercício do seu direito de audiência - cfr. factos provados sob os n.s 5, 12 e 16 a 20.

Através do seu requerimento de 16/4/2003, o A limitou-se a comunicar a situação de baixa por doença desde 6/8/2002, precisamente para efeito de suspensão do prazo para requerer as...

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