Acórdão nº 0319/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelROSENDO JOSÉ
Data da Resolução09 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO A... e mulher B..., com os sinais dos autos, interpõem recurso da sentença da Mma Juíza do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a presente acção de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito que os ora recorrentes instauraram contra o ESTADO PORTUGUÊS, por alegados danos decorrentes da violação do direito fundamental a uma justiça atempada e a uma definição judicial, em prazo razoável, na acção de condenação, por si instaurada, que correu termos no 1º Juízo Cível da Comarca de Vila Nova de Gaia sob o nº 52/95 e no subsequente processo executivo.

Termina as suas alegações, formulando as seguintes CONCLUSÕES:

a) Considerar que, apesar de ter havido inobservância do correspondente dever de zelo, assim como violação de diversas normas legais, nomeadamente dos artº 160º, nº 1 e 265º do CPC, tudo a demonstrar grosseira falta de capacidade de dar resposta, em tempo útil, às circunstâncias do caso, no desempenho das suas funções, a1) - ou seja, ter havido lesão de um direito "conatural", direito constitucionalmente consagrado, com carácter autónomo ou com dimensão constitutiva do direito à tutela judicial efectiva e que tem como destinatários passivos todos os órgãos do poder judicial.», para concluir pela responsabilidade do Estado por facto ilícito extracontratual, é fazer correcta aplicação e interpretação dos artº 20º, nº 1 da CRP e do Dec. Lei nº 48051, de 21 de Novembro e 1967 e artº 6º, nº 1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ratificada pela Lei nº 65/78, de 13.10 e aplicável por isso, na nossa ordem jurídica interna, como se referiu nos locais citados acima em 28, 33 e 34 destas.

b) Dar como assente que houve os pedidos insistentes dos A.A.

, apontados nas alíneas T), Q), X), NN), QQ), RR, da matéria de facto e que houve "forte ansiedade", traduzida no temor de que, "com a desvalorização do mercado imobiliário, venha a não conseguir ressarcimento", "pois que o crédito de capital e juros atinge no momento mais de 6.399.030$00" e "o imóvel está avaliado em vinte milhões de escudos", "a que há de deduzir eventualmente benfeitorias de cerca de dez milhões"- (ponto RR) da mesma especificação, e concluir que não se alegou nem provou dano é chocar com as regras da presunção e notoriedade do facto.

Viola, pois, as regras dos artº 514º e 659º, nº 3 do CPC- na interpretação que dele faz, por ex., o Prof. Lebre de Freitas, in "Acção Declarativa Comum" , Coimbra editora 2000, pág. 284, na senda do ensinamento de Castro Mendes - e 349º e 351º do C.C.

c) Considerar que, com tal matéria de facto, não houve dano é prescindir da realidade e subsumir em sede fáctica aquilo que seria matéria de direito - merecer ou não a tutela do direito - artº 496º, nº 1 do CC., e colidir com a posição do STA em acórdão de 07 de Março de 1989 que, a propósito do nexo de causalidade, consagrou que bastava «alegar e provar que o juiz só cinco anos após o julgamento proferiu a sentença para se extrair daí...e na ausência de factos desculpabilizantes, que o facto ilícito culposo é causa adequada do dano...» (sic).

d) Tendo em conta que a violação do direito à decisão em "prazo razoável" é violação de "um direito com carácter autónomo ou com dimensão constitutiva do direito à TUTELA JUDICIAL, QUE PERTENCE A TODOS OS PARTICULARES QUE SEJAM PARTE NUM PROCESSO JUDICIAL"- Prof. G. Canotilho, in RLJ, ano 123, pág. 306.

é merecedora da tutela do direito por não ser mero "incómodo natural"- Prof. Gomes Canotilho, in "O Problema da Responsabilidade do Estado por Actos Ilícitos", pág. 283- citado, aliás, no aresto do STA de 30.10.03.

d1) - e que há que "presumir-se que da violação de um direito fundamental resulta um dano moral, mas essa presunção será uma presunção natural, susceptível de ser ilidida..." - apud aresto do STA de 01164/06, de 17.01.2007, da 2ª Subsecção do CA - Rel. JORGE DE SOUSA.

afastar a indemnização sem que se faça prova de algo que tal afastasse, é violar por erro de interpretação a regra dos artº 349º e 342º do CC, tal como se sublinha nesse aresto.

e) Assente que se deve considerar verificado o ilícito, a imputação, dano não patrimonial e nexo de causalidade, mesmo que não se obtenha uma mensuração da diferença patrimonial.

deixar de fixar indemnização é violar a regra do artº 496º, nº 3 do CC- ac. STJ de 11.03.03, relatado pelo Cons. Afonso Correia: "É claro que, pela sua natureza, os danos não patrimoniais são insusceptíveis de medida em termos concretos e objectivos, como quer o Estado. Por isso a lei - artº 496º, nº do CC, manda fixar o montante da indemnização equitativamente, o que significa dever adoptar-se a solução mais oportuna ou razoável, em face das circunstâncias concretas do caso." f) Sob pena de violação da regra do artº 8º do C.Civil, deve tal indemnização, em juízo equitativo, ser fixada em € 14.963,94.

Há, pois, que revogar a douta sentença para condenar o Estado, E fixar a indemnização em €14.963,94.

*Contra-alegou o Réu, CONCLUINDO: 1- A prova da existência de um dano, no caso não patrimonial, é elemento fundamental para a procedência da acção em que se invoque a responsabilidade civil do Estado, por actuação da administração fiscal.

2- Competindo aos Autores essa demonstração, na falta da sua prova em julgamento e perante as consequentes respostas negativas a todos os quesitos formulados a tal respeito, não se verificam os elementos constitutivos da responsabilidade civil extracontratual do Estado, que são de verificação cumulativa, pelo que deve ser confirmada a absolvição do Réu Estado Português.

*Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

*II - OS FACTOS A sentença recorrida consignou a seguinte matéria de facto provada, resultante da discussão e julgamento da causa:

A) Em 13 de Janeiro de 1995, na comarca de Gaia, os ora AA intentaram uma acção de condenação contra C..., D... e mulher E..., que foi distribuída ao 1º Juízo Cível sob o nº 52/95.

B) Tal acção destinava-se a exercer direito de regresso contra os herdeiros de H..., para reembolso da quantia de 4.288.000$00 paga pelo Autor, como fora condenado, solidariamente com aquele H..., por douto Acórdão da Relação do Porto de 10 de Abril de 1986, de igual teor à cópia constante de fls. 15 a 29 dos presentes autos, que aqui dou por integralmente reproduzida.

C) A 8 de Março de 1995 foi ordenada a notificação da contestação e pedido de apoio judiciário, formulado pelos referidos C... e filho e nora na referida acção nº 52/95 do 1º Juízo Cível de V. N. Gaia, para os aqui AA, querendo, deduzirem oposição.

D) Com data de 22 de Maio de 1995, foi dado a conhecer aos aqui AA, o despacho saneador, com a especificação e o questionário.

E) Sendo que em 07 de Junho de 1995 foi o A. notificado para responder à reclamação a tais peças.

F) Tendo prosseguido a tramitação normal após esta fase e passado o período de férias judiciais, a 27 de Outubro de 1995, foi designado o dia para julgamento, para mais de 4,5 meses depois: 5 de Março de 1996.

G) Nesta data - 05.03.96 - o mandatário dos AA faltou à audiência de julgamento, tendo informado que se atrasou devido ao trânsito intenso, tendo o julgamento sido adiado por motivo da sua falta para o dia 17.06, pelas 14h (cfr. fls. 76 e 77 da certidão apenas junta com a contestação do R.).

H) Realizado o julgamento, foi notificada aos AA a decisão final em 08 de Outubro de 1996, proferida em 03.10.96, 19 meses após a instauração da acção, reconhecendo aos mesmos o direito a serem pagos pelos RR da quantia peticionada: o crédito de reembolso de 4.228.000$00, tendo sido, no entanto, limitado o valor da responsabilidade dos ali Réus, ao valor da herança aberta por óbito de H... (cf. fls. 41 a 45 dos autos, que aqui dou por integralmente reproduzido).

I) Porque a obrigação não tivesse tido cumprimento espontâneo, os AA, em 30 de Janeiro de 1997, porque detentores de um título executivo baseado em sentença condenatória, requereram a execução da mesma, com imediata nomeação de bens à penhora, nos termos do artº 924º do CPC, nos termos do requerimento executivo de igual teor a fls. 47-48 dos presentes autos, que aqui dou por integralmente reproduzido.

J) Decorridos quase 4 meses sobre a apresentação do requerimento inicial da execução, ou seja, a 13 de Maio de 1997, foi o Autor notificado de certidão negativa da citação da executada C... K) Mas, antes disso, após terem sido passadas as guias e paga a taxa de justiça, foi efectuada em 27.02.97 a penhora em imóveis de fls. 99 da certidão apenas junta com a contestação do Réu e foram notificados os co-executados que vieram deduzir oposição à penhora, por requerimento de 17.03.97, tendo a certidão negativa da executada C... sido lavrada em 30.04.97 (cf. fls.100 a 114 da certidão apensa).

L) Na sequência da notificação aos AA da certidão negativa da citação da executada C..., vieram estes requerer se ordene a citação nos termos de requerimento de igual teor ao de fls. 116 da certidão apensa, apresentado em 15.05.97, tendo sido proferido despacho de 16.05.97, a ordenar a realização de diligência com vista a apurar a residência da referida executada, na sequência do que veio a referida executada a ser notificada em 12.08.97, após o que veio deduzir oposição à penhora em 19.09.97 (cfr. fls. 117 a 122 da certidão apensa).

M) Após isto e aberta conclusão ao Mmo. Juiz com data de 6 de Outubro de 1997, o processo aguardou despacho judicial até 28 de Janeiro de 1998, ou seja durante cerca de três meses e meio, nos termos documentados a fls. 59 dos presentes autos, ali se determinando a notificação dos exequentes do requerimento de oposição e para se pronunciarem sobre o mesmo.

N) Notificado o exequente, por carta datada de 02 de Fevereiro de 1998, da oposição à penhora deduzida pelos executados e ainda, para em 10 dias, se pronunciarem, vieram os exequentes, em 12 de Fevereiro de 1998, responder que o respectivo...

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