Acórdão nº 0664/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 01 de Outubro de 2008

Magistrado ResponsávelMIRANDA DE PACHECO
Data da Resolução01 de Outubro de 2008
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1- A..., S.A. vem recorrer da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, a fls. 304 e seguintes, nos termos da qual foi julgada improcedente a reclamação que deduzira do despacho da Directora Municipal de Finanças de Lisboa que havia indeferido o pedido de suspensão do processo de execução fiscal n.º 2751/97, (5.º Juízo, 2.ª secção) e consequente accionamento da garantia prestada e pagamento do remanescente, tendo formulado as seguintes conclusões: 1) Os presentes autos têm origem na reclamação do acto da C. M. Lisboa que, perante a pendência de impugnação de normas em que assentam as dívidas em execução n.° 2751/97 - 5° Juízo, 2 Secção (1106199701118366), negou a suspensão da mesma execução por falta de fundamento legal, tendo accionado de imediato a garantia bancária no valor de € 1.099.086,58; 2) As questões fundamentais a decidir na reclamação apresentada eram: i) subida imediata da reclamação sob pena de perda de efeito útil da mesma; ii) apreciação da recusa de manutenção da suspensão da execução fiscal; 3) Era necessário, para efectuar a devida apreciação das questões analisar, analisar a referida impugnação das normas em que assentou a liquidação das taxas objecto da execução, o que não sucedeu; 4) Aliás, a douta sentença recorrida não deu sequer como provada a pendência da referida impugnação de normas.

5) Contudo tomou-a em consideração na fundamentação da sentença, o que constitui uma incongruência grave e insanável, impondo-se, ao abrigo do disposto no artigo 712° n.º 1 alínea a) do Código de Processo Civil (adiante CPC), aplicável ex vi artigo 2° alínea e) do CPPT, a modificação da decisão de facto em face dos documentos juntos aos autos; 6) Não considerando como facto assente a impugnação de normas nem tendo sido efectuada qualquer análise do teor da mesma, torna-se incompreensível a conclusão de que a mesma não é um meio adequado para efeitos de recurso às garantias conferidas pelo Artigo 169° do CPPT; 7) A sentença recorrida defende, por um lado, que o artigo 169° n.º 1 contém um conceito mais amplo que o da "legalidade da liquidação" e, por outro, conclui pelo carácter taxativo dos meios de defesa indicados no referido artigo 169° n.º 1 do CPPT, não admitindo a pretensão da ora recorrente, sendo tal contradição insanável; 8) Para além de não ter especificado os fundamentos de facto que justificam a decisão - não considera provada a pendência da impugnação de normas - a fundamentação é manifestamente contraditória, pelo que a sentença é nula nos termos do disposto no artigo 668° n.º 1 alíneas b) e c) do CPC, aplicável ex vi artigo 2° alínea e) do CPPT; 9) A douta sentença recorrida, admite inicialmente que as reclamações dos actos dos órgãos de execução devem ter subida imediata quando a sua retenção provoque uma inutilidade da lide; 10) Porém, em seguida desconsidera o anteriormente sustentado apenas referindo que não foi invocado qualquer prejuízo irreparável e que, por isso, não havia lugar a subida imediata da presente reclamação; 11) A fundamentação de facto e de direito é também por aí contraditória, pelo que a sentença padece de nulidade nos termos do artigo 668° n.º 1 alínea b) e c) do CPC, aplicável ex vi artigo 2° alínea e) do CPPT; 12) A douta sentença recorrida veio ainda condenar os legais representantes da Recorrente em multa nos termos do disposto nos artigos 278° n.° 6 do CPPT, artigo 102° alínea a) do Código das Custas Judiciais e artigo 456° n.° 1 do CPC sendo certo que, atendendo ao normativo legal invocado, o tribunal a quo apenas poderia condenar a parte e não os seus representantes legais; 13) Mesmo que tivesse sido invocado o artigo 458.° do CPC, a verdade é que a douta sentença recorrida não arguiu quaisquer factos que comprovem a má fé dos representantes legais; Tão pouco, foi observado o princípio do contraditório; 14) Não foram, pois, apontados os motivos de facto e de direito para a multa, sendo nula a sentença nos termos do artigo 668° n.°1 alínea b) do CPC; 15) A Recorrida, para além de ter alegado a existência de um prejuízo irreparável, defendeu ainda que a não subida imediata da reclamação implica inutilidade da lide; 16) O despacho reclamado originador da sentença recorrida fazia cessar a suspensão do processo executivo e despoletava o accionamento da garantia bancária prestada na execução e, bem assim, dos meios necessários à cobrança do valor remanescente, sendo certo que, uma vez accionada a mesma, o Banco satisfará as pretensões da CML exigindo, de imediato, o valor da mesma à ora Recorrente; 17) Perante o Banco a Recorrente nada pode fazer o que lhe causa um prejuízo irreparável; 18) O despacho reclamado, solicitando ainda o pagamento do remanescente no montante de €162.902,00, sob pena de penhora de bens, permitirá à CML proceder à penhora de bens da Recorrente o que implica grave e irreparável prejuízo uma vez que penhorados e vendidos os bens não poderão os mesmos ser reavidos; 19) Noutro cenário possível, a CML procederá a uma pesada oneração dos bens da Recorrente, completamente injustificada e desproporcionada, e que implicará um grave e irreparável prejuízo já que, uma vez penhorados os bens, não poderá a Recorrente usar ou dispor dos mesmos; 20) Alegou ainda a Recorrente que, estando o órgão de execução em condições de proceder à penhora de bens fá-lo-ia violando as normas sobre a suspensão do processo executivo, pelo que deveria a reclamação apresentada ter tido subida imediata nos termos do disposto no artigo 278° n.° 3 alínea d) do CPPT; 21) A Recorrente invocou, pois, ao contrário do que a sentença recorrida afirma, uma ilegalidade prevista no artigo 278° n.° 3 do CPPT; 22) Assim, relativamente à prova do prejuízo irreparável, de nada mais carecia o Tribunal a quo para aferir do mesmo para além da demonstração de que o despacho reclamado era e é absolutamente ilegal. Mais. A penhora de bens e a subsequente venda dos mesmos é, claramente um prejuízo irreparável, pois os terceiros adquirentes iriam adquirir de boa fé, vedando à Recorrente a possibilidade de reavê-los 23) Não se diga que o prejuízo irreparável deve ser um prejuízo efectivo pois conforme sustenta Jorge Lopes de Sousa, in "Código de Procedimento e de Processo Tributário - anotado", 33 Edição, 2002, Vislis Editores, pág. 1165: "O alcance da tutela judicial efectiva, não se limita à possibilidade de reparação dos prejuízos provocados por uma actuação ilegal, comissiva ou omissiva, da administração, exigindo antes que sejam evitados os próprios prejuízos sempre que possível. Por isso, em todos os casos em que o diferimento da apreciação jurisdicional da legalidade de um acto lesivo praticado pela Administração puder provocar para os interessados um prejuízo irreparável, não pode deixar de se admitir a possibilidade de impugnação contenciosa imediata pois é a única forma de assegurar tal tutela."; 24) Actualmente, a perspectiva de penhora e venda de bens decorrentes de um acto ilegal é claramente um prejuízo irreparável: i) prejuízo, relativamente à venda dos bens em si; ii) irreparável, porque é impossível reaver os bens penhorados e vendidos a terceiros de boa fé; 25) Mesmo que assim não se entendesse, a Recorrente alegou ainda que a subida imediata da reclamação era essencial para que a mesma não perdesse efeito útil tendo baseado a sua posição no autor acima mencionado quando o mesmo afirma que: "Parece mesmo dever ir-se mais longe e assegurar-se a subida imediata das reclamações sempre que, sem ela, elas percam toda a utilidade. Na verdade, prevendo-se na L.G.T. a obrigatoriedade de assegurar a possibilidade de reclamação de todos os actos lesivos (arts. 95.°, n.° s 1 e 2, alínea», e 103.°, n.° 2 da L.G.T.) e sendo reconhecida a supremacia das regras da L.G.T. sobre as do C.P.P.T. (art. 1.º deste e alínea c) do n.° 1 do art. 51.° da Lei n.° 87-B/98, de 31 de Dezembro), este código não poderá afastar a possibilidade de reclamação em todos os casos em que o acto seja praticado no processo de execução fiscal seja potencialmente lesivo."; 26) No seguimento desse argumento, o mesmo autor menciona que "Nos casos em que a subida diferida faz perder qualquer utilidade à reclamação, a imposição deste regime de subida reconduz-se à denegação da possibilidade de reclamação, pois ela não terá qualquer efeito prático, o que é incompatível com a L.G. T. e o referido sentido da lei de autorização legislativa. (...) Um exemplo de situação em que a subida diferida faz perder qualquer utilidade à reclamação é a da decisão que recuse suspender o processo de execução (...)"; 27) Tal doutrina é ainda perfilhada por João António Valente Torrão, in "Código de Procedimento e Processo Tributário - anotado e comentado", 2005, Almedina, página 939, sustentando ainda o mesmo autor que "A reclamação deverá também subir imediatamente quando a retenção tornar posteriormente inútil a sua apreciação, o que sucede, por exemplo, com as decisões sobre a suspensão do processo de execução (...)" 28) Esta doutrina foi, inclusivamente invocada na própria sentença recorrida, não se compreendendo os motivos pelos quais não foi acolhida pois, neste caso, torna-se desnecessária a invocação de qualquer ilegalidade descrita no n.° 3 do artigo 278° do CPPT na medida em que bastaria a alegação de que a retenção da reclamação geraria a inutilidade da lide; 29) O prejuízo irreparável é justamente o facto de a reclamação poder ser considerada inútil, com violação do princípio constitucional da tutela jurídica efectiva; 30) Quer por via da invocação e comprovação da existência de prejuízo irreparável e consequente ilegalidade prevista pelo artigo 278° n.° 3 alínea d) do CPPT, ou atendendo-se ao facto de que a retenção da reclamação torná-la-ia inútil, é inequívoca a necessidade de subida imediata dos autos, pelo que andou mal a sentença recorrida, devendo a mesma ser revogada; 31) Actualmente a legalidade da norma que habilita a Câmara...

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